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Há um rapazito —
Fernando de Morais
Sarmento — verdadeiramente notável. Diz bem, representa melhor. Mas
o que é surpreendente neste fedelho é o ar consciente como "ouve", a
convicção com que se integra no conjunto. Numa idade crítica —
talvez quinze anos — prejudica-o, apenas, o timbre da voz — que, sem
ser de criança, ainda não é de homem. Lisboa aclamou-o. O Porto
decerto, seguir-lhe-á as pisadas. É estupendo! |
Entre os intérpretes da fantasia "Môlho de Escabeche" há
verdadeiras revelações artísticas. Fernando de Moraes Sarmento, um
estundantinho de treze anos, é das maiores. Espanta e encanta pela
surpreendente naturalidade. Diz bem e ouve melhor. No "É a dez
tostões!", "Altino", o "Parolinho" e "Nudista" tem êxitos. Os
"Galitos" sabem escolher e educar os seus cooperadores! |
Excerto da rábula "O
Pescador (avô) e o Rapaz (neto)
Rapaz — (Que se tem aproximado
do fundo, olha com interesse para a água.) Avô, o que é escuma?
Pescador — Não é escuma, rapaz, é
espuma!
Rapaz — Ai!...
Pescador — Ai! Ui! A espuma é o
produto do trabalho das áugas.
Rapaz — Não se diz áugas, Avô,
diz-se águas.
Pescador — O quê?!... Tu queres
ensinar-me a falar, monstrengo?!...
Rapaz — Ai! A Senhora na Escola
diz água.
Pescador — Ah sim?.. Também ela
vos ensinou a dizer escuma em vez de espuma?
Rapaz — Mas se eu disser áugas,
ela dá-me com a vara.
Pescador — (Com intimativa)
E eu desanco-te com o bertedouro se disseres águas... Agora escolhe. (Senta-se
na canastra onde estava.)
Rapaz — (Após uma pausa) O
que é auga, Avô?
Pescador — Vês, meu doitor de
bôrra! Nem sabes o que é áuga! É o que eu digo: — Se a tua Mãe não fosse
uma paxóla que p'rá'i anda, e quisesse guiar-se pelos conselhos cá do
velho, em lugar de te trazer nessa boa vida do estudo, chapava contigo
na marinha a acartar sal. Aprendias mais e escusavas de andar por aí, de
costa direita como os doitores... (Com arrependimento) Mas se um
homem fala, à que Deus que é pirrónico, que está fora da época!... (Pausa)
Com a tua idade já eu trabalhava como um mouco, oibiste? Ainda o sol
vinha em casa do diabo mais velho,... ala! Rabo de fora da enxerga. No
Verão p'ra canseira da marinha, no Inverno para o rio à chincha com o
teu bisavô.
Rapaz — (Com superioridade)
Mas vocemecê não sabe ler e eu...
Pescador — (Atalhando) E tu
sabes!... Olha a grande coisa! Como se isso tenha alguma dificuldade!
Rapaz — Ai!!!...
Pescador — Ai!... Ui!... Meu
sabichão das dúzias! A ler até os burros aprendem!
Rapaz — (Escarninho) Então
porque é que o Avô não aprendeu?
Pescador — Porque nunca fui
burro, entendeste?
Rapaz — (Confundido)
Nã senhora... |