| 
              
            171
 
              
            
             
            A«Ninho de pobres, a Murtoza, sem 
            vinculos na grande historia da humanidade que radiou outros 
            horisontes; ali, á beirinha do Oceano, cresceu muito e foi 
            desenvolvendo as suas variadas industrias de pesca, os diferentes 
            ramos da sua atividade por todos os cantos do paiz». 
            .  .   .   .   
            .   .   .   .   .   
            .   .   .   .   .   
            .   .   .   .   .   
            .   .   .   .   .   
            .   .   .   .   .   
            .   .   .   .   .   
            . 
            E’ assim que fala o meu conterraneo 
            Lopes Pereira nos seus perfis da A Murtoza, modesto livro que 
            publiquei em 1899 a propósito da autonomia Murtoza e Bunheiro. 
            Ninho de pobres sim, mas hoje 
            transformada em elegantes edificios, produto dum persistente 
            trabalho e de grandes sacrificios. 
            O povo da Murtoza, essa raça 
            priveligiada, onde o trabalho tem por devisa a honestidade e a 
            honradez, é sem contestação um modelo na sua classe – a classe 
            piscatoria. Em parte alguma do nosso paiz se encontram pescadores 
            conhecedores da sua arte, arrojados no seu trabalho, que excedam ao 
            povo da Murtoza. Não temem os perigos do mar, não recuam nessas 
            noites frijidissimas de inverno para se lançarem ao rio quasi 
            gelado! E’ que o pescador da Murtoza tem o seu alvorecer ao som do 
            ruido do mar, é logo nos primeiros dias embalado pelas suas ondas. O 
            seu tratar é rude, como rude é o seu trabalho, mas o seu genio, a 
            sua indole é pacifica, ordeira e respeitadora. No entanto, ha hoje 
            na sua classe piscatoria homens ilustrados que vão dando a seus 
            filhos uma educação literaria e scientifica, e assim a Murtoza já dá 
            o seu contingente muito respeitavel para a Universidade e para as 
            escolas superiores. 
            As mulheres da Murtoza, essas gregas do 
            Oriente, como lhes chamou Pinheiro Chagas, são outras tantas 
            auxiliares, já nos trabalhos da pesca, já dedicando-se a outros 
            misteres, como, por exemplo, a compra e venda de galinhas, industria 
            que exercem em grande escala em todo o distrito de Aveiro e em 
            particular do de Coimbra. A mulher da Murtoza pertence a uma raça 
            verdadeiramente carateristica, forte, robusta, dotada duma rara 
            beleza; a mulher da Murtoza é essencialmente trabalhadora até ao 
            sacrificio. Quantas percorrem o nosso distrito distrito com os 
            filhos nos braços e canastra á cabeça em procura do pão para si e 
            sua familia? 
            O trabalho está representado nessa raça 
            sublime. Aos oito anos jà o procuram em toda a parte, desde Melgaço 
            até ao Cabo de Santa Maria, e por isso nós vamos encontrar 
            verdadeiras colonias de mortuzeiros no Porto, Vila Franca de Xira, 
            Lisboa, Setubal, Faro, etc., etc. 
            A sua colonia no Brazil, muito 
            especialmente no Parà, é importantissima tanto no comercio como na 
            industria. E’ dali que vem a maior fonte de riqueza para a Murtoza 
            e, sem duvida, devido á grande emigração para as terras de Alem-mar 
            é que a Murtoza se tem desenvolvido nos ultimos anos duma maneira 
            assombrosa.
 
            172
 
              
            Quem visitasse a Murtosa ha trinta anos, 
            só encontrara ninho de pobres sem vínculos na historia. Hoje não; ha 
            ali magnificos edificios, embora sem arruamento, devido ao desleixo 
            imperdoavel dos nossos municípios, a explendida praça de Pardelhas, 
            relativamente a mais importante em pescado de todo o paiz, tres 
            clubs, Associação de Socorros Mutuos, empreza das lanchas a vapor, 
            fabrica, imprensa, iluminação publica, etc. 
            *     * 
            * 
            A Murtosa é uma freguezia das mais 
            populosas do paiz. A sua população em 1890 era de 11.784 almas; hoje 
            deve atingir a 15.000, devididas pelos seus quatro logares, Monte, 
            Pardelhas, Ribeiro e Murtoza. Para demonstrar a sua importancia 
            basta dizer-se que só no distrito de Aveiro ha 8 concelhos de menos 
            valor coletavel que a Murtoza juntamente com o Bunheiro; – as duas 
            freguezias e em 1898 pediram a sua autonomia sendo apresentado um 
            projecto na camara dos deputados em 28 de abril desse ano pelo 
            saudoso deputado e amigo da Murtoza dr. Barbosa de Magalhães. 
            Para a camara de Estarreja, a que 
            pertence a Murtoza, paga esta anualmente perto de dois contos de 
            reis!! Para o Estado as duas freguezias Murtoza e Bunheiro, pagaram 
            em 1898 – 49.411:337 reis !!! Na industria da pesca de moliço 
            empregavam-se naquela data mil quatro centos e noventa e quatro 
            barcos!! 
            * 
            *     * 
            Pardelhas é o centro comercial mais 
            importante da Murtoza. Ha ali magnificos estabelecimentos como o 
            Leão da Moda do sr. José Maria Cabia; de fazendas de lã, Manuel 
            Maria Barbosa, Viuva Homem & Filho, Antonio Valente de Almeida & 
            Filhos, Francisco Nunes, João Ferreira Baptista; de mercearia dos 
            srs. Antonio José Barbosa, José Nunes, Antonio Valente de Almeida, 
            Clara Valente Sucessores, etc., etc. 
            No logar do Monte, tambem importante, ha 
            os estabelecimentos dos srs. Francisco Maria da Silva Portugal, 
            Antonio Maria Reis, fabrica a vapor de moagens de José Maria da 
            Fonseca. 
            No logar da Murtoza, propriamente dito, ha os dos srs. Antonio 
            Maria Cravo, José Augusto Soares, Silverio Antonio Pires. 
            Na Torreira empregam-se atualmente seis 
            companhas na industria da pesca de sardinha, sendo os seus arrais e 
            proprietarios os srs. Francisco Rodrigues Brandão, Albino Rebelo 
            Cebolão, Francisco Maria Tavares, João Augusto Tavares e Agostinho 
            Lopes Bartolo & C.ª. Não os bastante estes grandissimos factores 
            para o grande desenvolvimento da Murtoza, falta-lhe a proteção dos 
            poderes publicos para crear ali um vigoroso centro comercial que 
            garanta o emprego de capitais, e um centro comercial, só poderá ser 
            creado ligando a Murtoza com Estarreja por uma via férrea, assim 
            como a Torreira, donde saem, anualmente, centos e tantos contos de 
            reis de pescado que aí é vendido por baixo preço, ou é destinado a 
            adubos para as terras, visto a falta de transportes rapidos e 
            baratos. Ha anos em que a abundancia de sardinha é tanta, que não ha 
            meio de transporte para o retirar da beira-mar, ficando de um dia 
            para o outro, dando assim logar a ficar inutilisada para o consumo e 
            perdendo-se dezenas de contos de reis que seriam aproveitados se uma 
            linha férrea, via reduzida, ligasse a Torreira com Estarreja. 
            Seria um crime que nos causaria remorso 
            eterno, se não nos referissimos ao Hospital-Azilo – S. Lourenço de 
            Pardelhas – unica obra de caridade que existe na Murtosa e no 
            concelho de Estarreja, doado á camara de Estarreja… 
 
              
            173
 
              
            ...pelo grande benemerito já falecido, 
            Antonio José de Freitas Guimarães. Esta casa de caridade fica 
            situada no logar de Pardelhas. Não é um edificio modelar, nem 
            corresponde ao fim para que foi creado, mas a intenção do seu doador 
            era boa e a prepetuar-lhe o seu nome lá está uma lapide, simples, 
            mas bem significativa. 
            Alem do edificio, foram doados perto de 
            oitenta contos nominais de inscrições para sustentar um certo numero 
            de invalidos que precisem recolher-se a essa casa de caridade. 
            Oxalá outros lhe sigam o exemplo para 
            assim, em breve, se poder construir, na Murtoza, um edificio que 
            possa suprir as faltas do atual, embora esse dever pertença á camara 
            de Estarreja, que é quem administra e recebe os rendimentos da 
            importancia doada. 
            
            J. M. Barbosa 
            
  
              
            
  
              
            Vagos é séde de uma das boas comarcas de 
            terceira classe. 
            Dista 11 kilometros de Aveiro e 5 de 
            Ilhavo. 
            E' povoação muito antiga, pois parece 
            que já existia no tempo dos mouros, não havendo, porém, nada na 
            povoação que documente a sua antiguidade nem que recorde o seu 
            passado.A sua posição dominando o vale do rio Boco seria bela se não tivesse 
            sido desaproveitado o panorama pelos fundadores da povoação.
 
            E' atravessado pela estrada de Aveiro á 
            Figueira, que se acha em rasoavel estado de conservação entre Vagos 
            e Aveiro mas em estado crónico de ruína entre Vagos e Mira. 
            A povoação tem progredido pouco, devido 
            á sua proximidade de Ilhavo e ainda á sua posição topografica no 
            extremo ocidental do distrito. 
            Ha uma fabrica de lixa em Sôsa, uníca no 
            paiz e pequenas olarias em Vagos. 
            O concelho compõe-se de trez freguezias: 
            Vagos com 6053 habitantes, Sôsa com 3587 e Covão do Lobo com 2314.
 
              |