Contrastes meteorológicos |
Alto Zaza, 25 de Novembro de 1972
Depois de uma noite de chuva e trovoada, eis-nos em mais um dia de sol resplandecente. A trovoada fez tremer todos os edifícios, pois estava mesmo por cima de nós. Os clarões, que iluminavam todo o céu e o interior do meu quarto, eram imediatamente seguidos de um barulho ensurdecedor. Algumas faíscas estavam a cair bem perto!
Nas casernas, seguramente ninguém terá conseguido descansar durante a passagem da trovoada. No nosso edifício, eu e os furrieis, tivemos a curiosidade de abrir a porta e admirar o campo em frente. Via-se tudo com enorme nitidez, como se poderosos holofotes iluminassem tudo à nossa volta. Vimos mesmo algumas descargas caírem, com um barulho ensurdecedor, nas árvores da mata à nossa frente. Houve algumas que foram fendidas de cima abaixo, como se o Criador desferisse um tremendo golpe de catana no cimo do tronco.
Apesar de sabermos que dentro do edifício metálico estávamos protegidos das descargas, porque toda a construção funciona como uma gaiola de Faraday, mesmo assim tínhamos uma sensação de pequenez e impotência perante a fúria da natureza.
Felizmente, a trovoada passou depressa. Apenas uma chuvada violenta desabou durante um largo período, tendo-nos enchido todos os bidões de duzentos litros, em pouco mais de cinco minutos, com água pura destilada pelo sol.
A noite passou e temos, agora, uma manhã radiosa de sábado. Uma das coisas que maior prazer me dá nesta zona é este azul radiante do céu, contra o qual se destacam as copas das árvores e onde, de quando em quando, sobressaem umas grandes massas de algodão fofo muito branco, com formas cheias e arredondadas, que se recortam sob o azul desta imensa abóbada. E que pena não ter aqui uma boa máquina fotográfica, para registar estes tons luminosos e vivos, que dificilmente encontraremos em Portugal. Estou agora a lembrar-me do contraste e choque sofridos no dia do nosso desembarque em Luanda. Saímos de Portugal quase às portas do Inverno, todos enroupados para suportar o frio. Poucas horas depois, desembarcávamos num ambiente totalmente oposto, em plena época das chuvas, sob um calor sufocante. O que nos vale aqui, no Alto Zaza, é a altitude a que estamos e que torna o clima mais ameno e parecido com o do Verão da metrópole.
Tal como ontem à noite previra, hoje não há praticamente nada para fazer, tirando a rotina diária própria da vida de um aquartelamento em pleno mato. Assim, enquanto parte dos soldados se diverte no campo em frente, num renhido desafio de futebol, eu entretenho-me a conversar convosco, dando cumprimento às minhas palavras. Deixemos, então, o dia que passa, e aproveitemos esta radiosa manhã para saltar novamente no tempo. |
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