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Lanterna
mágica e projecção
fixa |
A câmara escura e a
lanterna mágica constituem os antepassados mais longínquos
da máquina fotográfica e das modernas máquinas de
projectar. A câmara escura deveria já ser conhecida na
Antiguidade, mas o seu estudo rigorosamente científico só
foi efectuado a partir do século XVI por
Leonardo da Vinci
, que, nos seus documentos
escritos, datados de 1558, efectua a descrição do princípio
óptico, referindo mesmo a possibilidade de obtenção de
imagens
com absoluto rigor de forma e de cor através da sua projecção
sobre uma folha de papel branco.
A
lanterna mágica só no século XVII foi inventada, tendo-se ficado a
dever ao jesuíta alemão Atanásio Kircher
[1]. Constitui o antecessor dos modernos sistemas de projecção
(diapositivos e cinema) e era um sistema de projecção de
imagens sobre um ecrã branco. As gravuras a projectar eram
desenhadas à mão sobre lâminas de vidro.
Alguns anos após a invenção da lanterna mágica, que
Kircher descreve na obra Ars Magna Lucis et Umbrae, o
dinamarquês
Walgenstein
substituiu, em 1660 o processo de iluminação por luz artificial.
Apesar de ter constituído inicialmente uma forma de diversão,
foi desde muito cedo utilizada como recurso pedagógico. De
acordo com a informação fornecida por Henri Dieuzeide[2], num período anterior à Revolução Francesa, «Parot, preceptor do Delfim, propunha que se utilizasse a lanterna mágica
para difundir, de uma forma sistemática, "da China ao
Canadá", imagens em vidro, cuja eficácia ele tinha
podido comprovar no seu ilustre e enfadonho pupilo.»
Pouco tempo depois, são dadas a conhecer as vantagens
da lanterna mágica por Jean-Paul Marat, numa comunicação
feita à Academia, mas as suas palavras não produziram
qualquer efeito, o mesmo sucedendo a Émile Raynaud, inventor
do teatro óptico, por volta de 1873, que recorreu a projecções
para ilustrar os seus cursos. Curiosamente, um escritor
português faz referência, em meados do século XIX, à
utilização da lanterna mágica como recurso educativo. Na
obra A cidade e as serras, Eça de Queirós é o
primeiro entre nós a sugerir o emprego das imagens
projectadas por meio de uma lanterna mágica como uma forma
eficaz de ensinar adultos analfabetos. Aliás, Jacinto, a
personagem queirosiana que decide iniciar uma actividade
educativa junto dos habitantes da sua região, pensa não
apenas no recurso às imagens projectadas como forma de educação,
mas também na utilização de livros com estampas:
«Jacinto meditava o bem das almas. Já encomendara
ao seu arquitecto, em Paris, o plano perfeito duma escola, que
ele queria erguer, naquele campo da Carriça junto à
capelinha que abrigava «os ossos». Pouco a pouco, aí
criaria também uma biblioteca, com livros de estampas, para
entreter, aos domingos, os homens: a quem já não era possível
ler. Eu vergava os ombros, pensando:- «Aí vem a terrível
acumulação das noções! Eis o
livro invadindo a serra!»
Perante o cepticismo do amigo, que ao saber que Jacinto
também quer fundar uma creche lhe diz que só falta criar
também um teatro, Jacinto responde-lhe que não será um
teatro, aquilo que pensou, mas sim uma sala para projecções:
«─ Não te falta senão um teatro! dizia eu,
rindo.
─ Um teatro, não. Mas tenho a ideia duma sala,
com projecções de lanterna mágica, para ensinar a esta
pobre gente as cidades desse mundo, e as coisas de África, e
um bocado de história.[3]»
Só passados vários anos, graças a sucessivos aperfeiçoamentos
técnicos, a projecção de imagens fixas começou a
conquistar lentamente terreno no campo pedagógico. O advento
da fotografia e os processos de inversão do negativo em
positivo permitiram uma maior facilidade e rigor na obtenção
de imagens projectáveis, tornando-se os diaprojectores bons
auxiliares no campo do ensino, passando a constituir um dos
diferentes recursos educativos englobado pela expressão «meios
audiovisuais», sendo a técnica da projecção fixa, no dizer
de H. Dieuzeide, «aquela que possibilita mais facilmente
uma base de lição e de estudo colectivo aprofundado, sob o
controlo do professor, para todas as disciplinas documentais e
a qualquer nível (...).[4]»
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Modelo
de lanterna mágica de 1908. Funcionava mediante
iluminação a vela ou a acetileno, com imagens
desenhadas sobre placas de vidro.
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A introdução do projector de diapositivos como
recurso educativo começa a ser encarado pelos pedagogos em
toda a Europa e no continente americano a partir dos começos
deste século, tendo conhecido um elevado incremento sobretudo
durante e após a Segunda Grande Guerra.
Além do diaprojector ou projector de diapositivos,
cujo antepassado é a lanterna mágica, existem actualmente
outros sistemas de projecção de imagens fixas: o episcópio,
o retroprojector e o data display. O episcópio permite
projectar imagens existentes em suportes opacos, tais como
livros, enciclopédias, fotografias, postais ilustrados, etc.,
exigindo o total escurecimento da sala, condição importante
para que as imagens projectadas possam ser observadas em boas
condições. O retroprojector, recurso tecnológico mais
recente ao serviço da educação, permite projectar não só
imagens em suportes transparentes, mas também objectos
opacos, obtendo-se imagens em silhueta. Tem a grande vantagem
sobre os outros sistemas de não necessitar do escurecimento
da sala. Este recurso, juntamente com o data display,
pequeno ecrã de cristais líquidos que se coloca sobre o
retroprojector, permite projectar imagens provenientes de um
computador, fazendo com que apenas um único aparelho destes
possa ser utilizado com melhor rendimento por toda uma turma.
Tal como refere
McClusky [5], a educação é conservadora e geralmente só
muitos anos após a sua invenção certos recursos tecnológicos
começam a ser utilizados pelos técnicos do ensino. Apesar do
advento da fotografia, a partir do século XIX, e das inovações
técnicas introduzidas na lanterna mágica, que a conduziram
aos modernos sistemas de projecção fixa, só a partir de
1920 começaram a surgir firmas comerciais que se dedicaram à
produção de transparências para projecção com objectivos
didácticos. Uma das primeiras firmas especializadas na produção,
quer de máquinas de projectar, quer de transparências, foi a
Keystone View Company de Meadville, na Pensilvânia,
que se tornou conhecida pela produção de diapositivos e
estereogramas para uso escolar.
In:
Henrique J. C. de Oliveira, Os meios audiovisuais na escola
portuguesa. Universidade do Minho, Instituto de Ciências
da Educação, Braga, 1996, pp. 49-52.
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