Q — O que é escrever?
IC — O acto de ESCRITA é um trabalhar
a palavra. O escritor é alguém que se esforça por cumprir
isso, não é um E. T. nem um génio. É uma pessoa comum.
Q — É professor universitário e
Escritor. Se pudesse optar entre as duas actividades, qual
escolheria?
IC — Ser Escritor, sem dúvida. Ser
professor é muito trabalhoso, gasta-se muito tempo e
economicamente não compensa. Ser Escritor é a minha vocação.
Q — Quando escreve, fá-lo em silêncio?
lC — Antes de escrever, elabora-se
mentalmente aquilo que virá a ser o texto. Esse trabalho tanto
posso fazê-lo em silêncio como à mesa de um café. Agora, o
escrever, prefiro-o no silêncio, num ambiente que me
possibilite a concentração.
Q — Quando era pequeno pensou que viria
a ser Escritor?
lC — Sempre. O meu avô, que era
carteiro, tinha uma biblioteca bastante razoável. Recordo-me
que um dos livros que lá havia era Os
Fidalgos da Casa Mourisca, acerca do fim da nobreza e do
retomar das terras pela burguesia. Marcou-me muito.
Q — Porquê após Nas Fronteiras
do Tédio e As Evidências
e o Prisma abandonou a Poesia?
IC — De facto, não a abandonei.
Simplesmente acho que a minha poesia carece de unidade para ser
publicada em forma de livro. Assim, dedico-me mais ao conto ou
à crónica romanceada. Mas não sou romancista: é preciso uma
grande disciplina e disponibilidade de tempo para escrever
textos tão longos.
Q — Quando publica, tem medo?
lC — Boa pergunta! De certa forma, sim.
Escrever exige muito tempo para se atingir um bom resultado. É
como tratar de uma árvore, podando as expressões menos
felizes. Temos de nos preocupar com o lado estético. É isso,
para mim, a Literatura: beleza.
Q — Pensava que o obra Daqui
ouve-se o Mar iria ganhar o Prémio Miguel Torga?
IC — Embora não concorra para ganhar,
mas para me automotivar e para progredir, não fiquei admirado
quando recebi o prémio. Embora, nos concursos tudo dependa da
perspectiva do júri. Mas sou muito autocrítico, e este livro
agrada-me muito, bem mais do que Os
Sítios Nossos Conhecidos, escrito em princípios dos anos
setenta.
Q — Porque usa os regionalismos?
IC — Nasci em Alhadas na região
Gandaresa da Figueira da Foz, uma área algo isolada. Por isso
existe lá uma forma de falar que descende do Português
arcaico, e que se tem vindo a perder. Desejei perpetuá-la nos
meus escritos. Nesse sentido estou também a trabalhar num glossário
com mais de mil e quinhentos vocábulos. Palavras como
“perro” (‘coluna que sustenta a chaminé’) ou
“burra” (‘gancho usado para preparar comida ao ar
livre’) são exemplos disso. Tenho também interesse em que
certas peças sejam recolhidas num museu etnográfico.
Turma: 8º E, 13/Dez./1991
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