Acerca de tigres e panteras |
Pois eu estou um pouco parecido com esta individualidade que só falou! Farto-me de gastar palavras, farto-me de as alinhar na superfície amarela dos aerogramas, e não digo nada de jeito. Estou para aqui a empatar-vos, e não consigo entrar no relato das minhas peripécias. Porque será? Uma fuga do meu subconsciente ao raspanete que levei do comandante, o tenente-coronel Soares Coelho? Sempre que posso, estou presente. Gosto de os ver, entusiasmados, com vontade de fazerem boa figura. Os Tigres de Quimbele, isto é, a malta da Terceira Companhia, querem rosnar bem alto e não ficar atrás das outras equipas. Por falar em rosnar, será que os tigres rosnam? Talvez! Se os tigres são felinos, se os gatos felinos são e rosnam quando não estão contentes, logo os tigres devem também rosnar. Dos gatos posso eu falar com conhecimento de causa, porque sempre me dei bem com eles e eles comigo. Estes sei eu que rosnam, embora nunca me tenham feito isto. Tirando uns miados melados e um ronronar de satisfação, quando lhes faço festas, não me posso queixar destes simpáticos bichanos. Como nunca fiz festas a um tigre, nem tenciono estar próximo de nenhum, a não ser dos meus camaradas de Companhia ou de Batalhão, não tenho qualquer experiência quanto a tigres de quatro patas. É espécie animal que não existe nestas paragens, segundo creio. Todavia, como andam por aqui tigres disfarçados de duas patas, não pertencentes ao pessoal militar, o melhor é andar sempre acautelado, para evitar maus encontros e algumas patadas ou arranhadelas pouco agradáveis. E não me refiro ao pessoal nativo. Se fosse deles, não os poderia associar aos tigres! Quando muito, a felinos escuros, como as panteras. Seguramente que muitos serão como elas. Ainda não tive o azar de me encontrar com nenhuma a ameaçar a minha segurança e integridade física, apesar de frequentemente as ouvir falar de nós na rádio. E algumas até são panteras brancas. Ouvi há tempos contar histórias acerca duma destas panteras traiçoeiras. Segundo me disseram, houve uma que abandonou o nosso exército e foi fazer guerra contra nós, através dos microfones de uma rádio argelina, que às vezes aqui sintonizamos em ondas curtas. Felizmente que são apenas ondas hertzianas, que rapidamente se perdem no espaço. Doutro modo, já estaríamos mortos.
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