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André Ala dos Reis, Vida. Poemas, Coimbra, Coimbra Editora Ldª, 1963, pp. 18 e 19.

EU ?

 

Fundo, muito fundo, ai!, muito fundo,
pra lá das arcarias de meus anos,
pra lá dos sóis imensos do meu céu,
há monstros e caveiras e eu mesmo,
maior, muito maior,
(grande gigante!)
sozinho,
espero.

 

Fundo, muito fundo, ai!, tão fundo,
longe deste minuto, deste mundo,
há um gigante imenso que eu julgava ser eu.
Ressona longamente, com estrondo,
mas não sou eu, não sou,
esse gigante,
que, Iá no fundo, só, espera em vão.

 

Fundo, muito fundo, no profundo
das costelas enormes do meu ser,
há um gigante imenso que ressona —
— que não sou eu, não sou, nem posso ser.

 

Fundo, muito fundo, ai!, no fundo
do poço de mim mesmo
(no meu mundo),
onde há monstros e ossos e caveiras a esmo
e segredos do deus que ninguém conheceu,
dorme um grande gigante...

 

Serei eu?

 

 

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