Henrique J. C. de Oliveira, Os Meios Audiovisuais na Escola Portuguesa, 1996. |
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O
vídeo interactivo
ou
CD-I é, tal como nos é dito no livro oficial da Philips sobre este suporte
audiovisual[1],
uma nova tecnologia, uma nova arte em expansão, cujos títulos já existentes só
agora [em 1992] começam a revelar as potencialidades deste meio, cujo advento
contribuiu para aumentar as possibilidades dos
sistemas multimédia. O CD-I é, segundo o mesmo livro, a mais recente e sofisticada forma técnica
de
multimédia
e o primeiro sistema multimédia destinado a um vasto público, resultante
de uma forma de conhecimento anteriormente desenvolvida, na década de 1960, por
Ted Nelson
, e que se tornou familiar a todos quantos têm utilizado os programas
Apple HyperCard
para computadores
Macintosh. De uma maneira acessível e antes de desenvolvermos alguns conceitos /
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ligados a este novo sistema multimédia interactivo, poderemos dizer que o CD-I,
desenvolvido conjuntamente pela Sony e pela Philips e lançado em 1991, nos
Estados Unidos e no Japão, e em 1992 na Europa, é um suporte multimédia capaz
de armazenar, num pequeno disco compacto de 12 centímetros, imagens fixas ou
animadas, sons, textos e gráficos, podendo conter num único disco, por
exemplo, o conteúdo completo de uma enciclopédia formada por 20 volumes. Os
discos de CD-I podem ser visionados por meio de um aparelho acoplado ao
televisor e diferem dos discos de vídeo já existentes pelo facto de permitirem
a interactividade. Os domínios de aplicação do
CD-I são múltiplos: dicionários e enciclopédias ilustrados com imagens, gráficos,
curtas metragens e sons; livros
audiovisuais interactivos
sobre as mais diversas áreas do conhecimento; jogos de vídeo simplesmente
lúdicos ou educativos; livros audiovisuais de arte; livros de contos; etc. Para que a interactividade seja possível, os leitores de CD-I podem ser comandados por meio de teclado, telecomando, rato ou uma pequena alavanca no estilo de um joystick ou, em alguns modelos portáteis, por meio de ecrã táctil, bastando tocar nos objectos ou botões visionados no próprio ecrã para se ter acesso aos sectores pretendidos. Mas a maneira mais simples de
explicar o que é um CD-I é a que utiliza
Frédéric Lorenzini
, num artigo recentemente publicado acerca deste suporte audiovisual
interactivo: «O
CD-I (I para Interactivo) é um conceito novo; não substitui uma tecnologia
mais antiga, como fez, por exemplo, o CD áudio. Para os que ainda não tiveram
a ocasião de brincar com este aparelho, lembramos que se trata de um leitor que
se coloca debaixo do televisor e uma manete de jogo. Basta em seguida colocar um
disco no leitor para começar um jogo interactivo ou a aprendizagem da guitarra,
para descobrir a pintura de Van Gogh ou para ouvir um concerto. Estas diferentes facetas do CD-I têm
em comum a interactividade: afixa-se no ecrã uma pergunta e compete ao
utilizador escolher a resposta certa por meio da pequena alavanca. Se se
pretender visitar S. Petersburgo, com a mesma pequena alavanca pode-se criar o
itinerário, começando pelos museus, os monumentos ou, então, pelas grandes
avenidas. Enfim, numa noite de insónias, um jogo de vídeo como "Tétris"
poderá ajudar a passar o tempo (...).»[2] Na definição com que iniciámos
a abordagem do CD-I, baseada no livro da Philips, faz-se referência a um
conjunto de conceitos importantes no domínio da moderna tecnologia audiovisual:
multimédia
e
interactividade
. E, conjuntamente com estes dois vocábulos, surgiu também um outro
conceito importante:
hipertexto e
hipermédia
. O vocábulo
interactividade
é um conceito relativamente recente, que surge com o aparecimento de uma «ferramenta»
poderosa de trabalho tecnologicamente recente – o computador – e que anda
associado à palavra hipermédia e multimédia.
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O
computador
é um instrumento de trabalho
que exige uma relação
permanente homem-máquina, na medida em que o utilizador, sentado frente a um
computador pessoal, comunica com ele através do teclado e do monitor ou através
de outros periféricos afins (rato, lápis óptico, track
ball, etc.). Através do teclado ou do rato, fornece os elementos ao
computador; através do monitor recebe e avalia os resultados obtidos,
estabelecendo-se assim uma espécie de diálogo que permite ao utilizador
progredir numa determinada actividade: recolha de informações textuais ou imagéticas
de uma base de dados; criação de textos mediante recurso a processadores específicos;
criação de desenhos e imagens; criação de gráficos, folhas de cálculo,
bases de dados; tratamento de sons, etc. É a esta relação permanente
entre utilizador e máquina, tendo em vista alcançar determinado objectivo, que
se dá o nome de
interactividade
. Mas a palavra não se limita
aos aspectos acabados de referir. Com a criação de programas em
hipertexto
[3],
tendo por estação de trabalho o computador e por suporte um programa específico,
a palavra interactividade volta a aparecer. Um programa em hipertexto (ou em
programas similares para computadores de tipo PC, como por exemplo
Toolbook
) é uma base de informação e de aprendizagem constituída por textos e por
imagens fixas, formando pequenas células informativas ligadas em rede, parcelas
de conhecimento que o utilizador vai a pouco e pouco pesquisando e captando, que
lhe permitem construir um conhecimento muito mais amplo. Um programa em
hipertexto
corresponde, tal como nos é referido por
Paulo Dias
e
Isabel Meneses
[4],
«à maneira humana de pensar e agir,
baseada na associação de ideias. Trata-se (...) de uma armazenagem não
sequencial de informação, com base na associação das unidades de informação,
privilegiando as relações paradigmáticas (associação de ideias que, por
exemplo, num texto vulgar, só é conseguida através de notas de rodapé), e não
só as sintagmáticas (sujeito/predicado) próprias de uma leitura linear
subjacente a qualquer texto. /p. 87/» E compete ao utilizador navegar,
segundo a sua vontade, saltando de ilha em ilha, visitando a /
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pouco e pouco todo
o arquipélago de conhecimentos. Estabelece-se assim uma relação permanente –
uma interactividade construtiva – entre o navegante e as ilhas de informação,
cuja rede constitui todo um universo de uma base hipermédia de conhecimentos. Mas, uma vez mais, a palavra
ainda não se confina aos aspectos acabados de referir. Se a uma base hipermédia
adicionarmos sons de todos os tipos e imagens animadas, passamos a dispor de uma
nova base de informações e de conhecimentos muito mais completa e próxima do
universo real. A base hipermédia adquire novas dimensões, passando a
constituir uma base de informação
multimédia
. E estamos chegados a um novo
conceito polissémico que, embora não sendo novo, passa a aplicar-se a novas
formas de conhecimento, que têm por base um suporte informático ou
informatizado. Não vamos aqui enumerar as várias
definições que pudemos encontrar para o vocábulo
multimédia
em diversas obras. Vamo-nos apenas limitar ao novo sentido adquirido por
este vocábulo, que é o de «reunião sobre um mesmo suporte de ficheiros contendo texto, som, imagem
fixa e animada e organizados por meio de uma programação informática.»[5] A definição transcrita está,
como facilmente se depreende, circunscrita a sistemas informáticos, exigindo um
programa devidamente estruturado que permita interligar de maneira lógica todos
os ficheiros, constituindo-se assim uma unidade mais ou menos completa de
conhecimentos sobre determinado tema e abrangendo as duas grandes vias
sensoriais de acesso ao conhecimento: visão e audição. E embora a definição
não o diga explicitamente, trata-se uma vez mais de uma forma interactiva de
acesso à informação, pois permite que a sua «leitura» se efectue não
linearmente, como num livro, mas por centros de interesse, de acordo com a
vontade do utilizador, que poderá «navegar» no espaço das informações como
muito bem entender.
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As bases de informação
multimédia não se limitam apenas aos programas criados para computadores e
frequentemente apresentados, devido à elevada quantidade de informação que
envolvem, em discos compactos designados por CD-ROM. A partir de 1991, os meios
informáticos estenderam-se a outros suportes audiovisuais, permitindo a união
da televisão com a informática. Da união de um sistema de leitura de discos
compactos de vídeo com a tecnologia informática nasceu um novo tipo de
aparelho, geralmente acoplado ao televisor e coexistindo com os já tradicionais
gravadores de vídeo de salão - o leitor de vídeo interactivo CD-I. Mas,
enquanto um gravador de vídeo apenas permite um visionamento linear (quase
passivo), o CD-I não só permite como obriga mesmo a que se estabeleça uma
inter-relação homem-máquina, devido às potencialidades que lhe são
acrescentadas pela estrutura informática (e também pela maneira particular
como os programas estão elaborados). Além de grandes
potencialidades como forma de distracção e de cultura, muito especialmente
dentro da célula familiar, o CD-I pode ter elevadas potencialidades não só no
mundo profissional, mas sobretudo no campo do ensino. Relativamente a este último
aspecto, em que medida terá já entrado no conhecimento dos profissionais do
ensino? E em que medida terá já entrado nas escolas portuguesas? Cremos que o CD-I continua, por enquanto, praticamente desconhecido da grande maioria dos professores e que a sua existência é praticamente nula nas nossas escolas como pudemos constatar a partir da análise dos inquéritos elaborados.
[1]
- PHILIPS International, The CD-I
Design Handbook, 1ª ed., U.K., Addison Wesley Publishing Company, 1992,
pág. V. [2]
- Frédéric LORENZINI, CD-I.
L'interactivité pour tous, in: "Science et Vie", Fevereiro de
1995, nº 929, pp. 114-117. [3]
- O termo
hipertexto (1965) ficou a dever-se a
Ted NelsonTed Nelson
, cuja ideia, segundo palavras dele, o acompanhava desde há alguns anos.
Tal como ele próprio referiu, essa ideia surgiu-lhe «em
Outubro-Novembro de 1960, quando frequentava um curso de iniciação à
informática que, em princípio» deveria ajudá-lo a escrever os seus
livros de filosofia. Procurava ele «um
meio de criar, sem incómodo, um documento a partir de um vasto conjunto de
ideias de todos os tipos, não estruturadas, não sequenciais, expressas em
suportes tão diversos como um filme, uma banda magnética ou um pedaço de
papel.» Queria poder, por exemplo, «escrever
um parágrafo que apresentasse portas, atrás das quais um leitor pudesse
descobrir ainda muito mais informações que não aparecessem imediatamente
na leitura desse parágrafo. Actualmente, e porque o projecto Xanadu sofreu
alguns atrasos (...)», o autor do hipertexto procura ainda anotar as
suas ideias «em pequenos autocolantes» que classifica «por dias, por semanas e por anos e que correspondem a diferentes
projectos» que tem em mente. Vd.
A. BARIBAULT, Xanadu, in: "Science
et Vie Micro", Novembro de 1990, pp. 190-193. [4]
- Paulo DIAS e Maria Isabel C. MENESES, Problemática
da representação hipertextual, in: "Revista Portuguesa de Educação",
Instituto de Educação da Universidade do Minho, 1993, nº 3, pp. 83-91. [5]
- Consulte-se Pierre BROUSTE e Dominique COTTE, Le
multimédia: promesses et limites, Paris, ESF Editeur, 1993, p. 12. Outras definições de multimédia: Linda E. TWAY, Multimídia
para novos usuários, Rio de Janeiro, Berkeley Brasil Editora, 1993,
cap. I, pp. 3-13: «Qualquer forma de
comunicação que use mais de uma mídia para apresentar a informação:
programas de computador integrando texto, gráficos, animação e som.»
(p. 13). Steve FLOYD, Manual
de multimídia da IBM. (Guia completo para hardware e aplicações de
software), LTC Editora, 1991: «(...)
a multimídia é a soma de todas essas revoluções [da moderna
tecnologia audiovisual] concentradas em uma - uma revolução em personalização que combina o
poder audiovisual da televisão, o poder de publicação da máquina de
impressão tipográfica e o poder interactivo do computador. Você poderia
chamar esta revolução de "o supremo poder de mídia" - em uma
palavra, "Ultimídia" (...).» Thomas C. REEVES, Evaluating
Interactive Multimedia, in: "Educational Technology", Maio de
1992, vol. XXXII, pp. 47-52: «Multimédia
interactiva pode-se definir como uma base de informações computorizada,
que permite aos utilizadores aceder à informação de múltiplas formas,
incluindo texto, gráficos, vídeo e áudio. Multimédia interactiva é
especificamente concebida com nós de informação para permitir aos
utilizadores o acesso à informação de acordo com as suas próprias
necessidades. (...)» |
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