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Conquista-me

Ilustração de H. Mourato. Clicar para ampliar.

Convencionaram chamar-te morte e apresentar-te sempre como coisa feia e má, vestida de negro e de gadanha em riste.

Não tenho nada contra o trajo negro e muito menos contra a gadanha. Por outro lado, concordo com não sei quem, que escreveu opinando ser o teu sorriso franco, honesto e para todos igual, filho da certeza de nunca poderes ser enganada.

Ao longo da minha existência fiz muita coisa, válida na opinião de uns, inútil segundo outros, o mesmo acontecendo quanto ao ser bom ou mau. Acho que nunca me acomodei, as permanentes inquietações sempre me fizeram crer em qualquer coisa mais para além. Também acreditei/confiei, para além de em mim, neste e naquele, ingenuamente. Enganei-me, julgo, várias vezes no caminho, mas ainda não perdi o norte. 

Apesar dos frequentíssimos e dolorosos desencantos sonhei voar, e, petulante, até cheguei a acreditar que podia influir, ser visto e ouvido. Não pensei muito em ti.

De algum tempo a esta parte, vens sendo o tema preferido, quase permanente, do espaço/tempo do meu pré e pós sono, aparecendo bastante envolvente e tentadora.

Por tudo isto, vejo-te hoje, confiadamente, como o ponto garantido de chegada, o último/único refúgio, onde finalmente pode haver paz.

No entanto, ainda não consigo abraçar-te. Por favor, conquista-me de vez.

 

Luís Jordão
Janeiro de 2005

Ilustração de

H. Mourato

 
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