Liturgia Pagã

 

A Escola de Cireneu

Domingo XII do tempo comum (ano C)

1ª leitura: Zacarias, 12, 10-11;13, 1

2ª leitura: carta aos Gálatas, 3, 26-29

Evangelho: S. Lucas, 9, 18-24

 

Já terá sido mais famosa. Mas ainda hoje em dia, quem faz o curso tem emprego certo… E quando surgiu, veio, como fica bem dizer, «colmatar uma grave falha».

A 1ª leitura é retirada de uma série de capítulos (9 a 14), erradamente atribuídos ao profeta Zacarias. Este profeta apenas é autor dos oito primeiros capítulos, onde encorajava o povo a «colmatar a falha» do cativeiro de Babilónia (finais do séc. VI a. C.), confiante em que Deus está sempre presente, na adversidade e boa sorte, ajudando-nos a olhar para o futuro de mãos dadas.

O autor dos capítulos seguintes (o autor de hoje), já sob o império grego (finais do séc. IV a. C), analisa vigorosamente «a falha» dos reis e dos poderosos (incluindo sacerdotes e profetas) que não querem reflectir sobre o que é a justiça, provocando a destruição com a insensatez. Denota um espírito religioso cada vez mais universal e exigente: o prometido Salvador não tem nada a ver com os que só desejam ser grandes neste mundo; e os «inimigos de Deus» deixaram de ser identificados aos inimigos do «povo de Deus» (ou aos «inimigos da Igreja»…) – «inimigos de Deus» são só aqueles que preferem alinhar com o mal, com a injustiça e com a falsidade.

Falou «sem papas na língua», vencendo o medo de ser perseguido e talvez torturado.

E Jesus? Mantém-se firme perante as dificuldades da vida e os momentos da tortura e da morte. E com a autoridade da sabedoria, ensina-nos a mostrar igual empenho por uma vida que não se confunda com a ilusão de possuir o mundo, mas que seja um dom ao mundo.

É com este dom que se podem vencer as situações de injustiça que ferem a humanidade. O mal, porém, faz ninho numa grave falta (ou «falha») de educação! Nem as várias igrejas cristãs conseguiram realizar esse dom com bom senso e coragem. Não se enfrentaram devidamente as desigualdades sociais, e sobretudo as atitudes e esquemas perversos dos poderes económicos e políticos, que impõem cruzes sem esperança de «ressurreição».

Perante esta «falha grave», é que S. Paulo fala da nova sociedade em que a honra da pessoa não é afectada por se ser «judeu ou grego, escravo ou livre, homem ou mulher» (2ª leitura). Um princípio base da Escola do Cireneu: a atenção aos outros.

Pode-se dizer que esta Escola nasceu do convite de Jesus a toda a gente para «tomar a sua cruz todos os dias». Jesus não convida ninguém à morte pela cruz: convida, isso sim, a viver mais e melhor, sabendo tirar proveito das maçadas, sofrimentos e trabalho de cada dia – que não matam mas moem... Calejados pela vida, penetramos melhor no sentido da vida e percebemos melhor o que o Mestre queria ensinar – um Mestre que incitava ao trabalho em grupo! A cruz de cada dia é mais fácil de levar quando atendemos à cruz dos outros, até ao fim.

Quando chegou a grande «hora da verdade», a caminho do Calvário, também Jesus foi ajudado a levar a cruz de condenado à morte. Simão, natural de Cirene, foi escolhido para esse trabalho. Talvez um pouco forçado, mas desempenhou-se tão bem que os seus filhos se tornaram bons elementos da primeira comunidade cristã (Marcos, 15, 21).

Pois é: o exemplo é a melhor estratégia de ensino, mesmo quando o mestre se sente forçado! (Pena é que a nossa desorganização tenha gerado dois grandes grupos: «trabalhadores à força» e «à força sem trabalho»…).

A Escola do Cireneu usa a eficaz «didáctica» da boa educação (sem medo dos risinhos de alguns passantes, como a caminho do Calvário). Ajuda a levar as cruzes da vida mas a lutar contra as «crucifixões» – o próprio Mestre crucificado lutou contra o mal infligido aos outros. Com «o trabalho em grupo» dos seguidores de Cristo, «a cruz de ajudar» transforma-se em «prazer de ajudar».

23-06-2013


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