Sonho de uma noite de Covid

A Automotora da Ria largou da estação de Aveiro e entrou no entroncamento que serve o porto comercial. Três pequenas secções, bem adaptadas ao conveniente distanciamento físico, permitindo passear à vontade no corredor central e gozar directamente do cheiro e dos sons “riamarenses”. Os assentos, perfeitamente ergonómicos, permitiam funções requintadas: eram poucos os de 2 lugares e evitando o frente a frente; e como os individuais podiam rodar suavemente para os turistas apreciarem a paisagem, que quase entrava pelas amplas janelas sem entraves inestéticos.

E que dizer do piso superior! Totalmente envidraçado, só com assentos individuais, um de cada lado e distanciados de modo a permitir um seguro face a face, as paisagens lindas também ajudam a ver pessoas lindas…

Com uma velocidade máxima de 50 km/hora, permitia apreciar todos os pormenores importantes pelo interesse ecológico e pela beleza natural. O percurso era pequeno, mas aqui e ali surgiam desvios à via-férrea principal: cuidadosamente escolhidos para melhor se observar o mundo à volta. Jogando com o horário dos comboios de mercadorias, havia lugar para breves e cuidadosas experiências pedestres. Eram também o momento para saudar a natureza e a amizade, não faltando, ocasionalmente o serviço de um lanche mais requintado, de um verdadeiro «pôr de sol».

Todas estas paragens permitiam a passagem dos comboios de mercadorias, que rumavam directos a Lisboa, Algarve, Sevilha… ao Porto, Vigo e além. E sobretudo directos a Madrid, donde seguiam para a Europa central, nórdica e de Leste. Comboios enormes, de quase 1 km. Como era divertido ler os mais variados destinos pintados com graça e bom gosto nos enormes contentores! Depois de se esconderem ao longe, chegava o momento de penetrar na zona mais comercial, como a zona marginal onde se concentrava toda a família de barcos, de bacalhoeiros ou de turismo, aconchegados pelas fábricas e serviços de manutenção.

Entrando no sector final, admirava-se o crescimento constante de actividade num dos mais agradáveis portos naturais do nosso país.

A Automotora da Ria travava docemente – mas a viagem de ida só acabaria quase em cima do paredão. Momentos de familiarização com o ambiente, logo seguidos do aviso para entrar na moderníssima lancha eléctrica, que deixaria os felizes viajantes ou em S. Jacinto ou ainda mais pela ria fora até à Torreira.

Vinha o regresso. É curioso como o mesmo caminho é tão diferente quando percorrido ao contrário!

O que se chama um dia bem passado: arejado, libertador, rico de cultura, de beleza – e dotado do ar estimulante desse «mar que ria» por nos ver tão contentes de celebrar o casamento entre a Ria e o Mar.

Alte da Veiga - 21-02-2021

 

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