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In: "Ilustração Portuguesa", 2ª série, Nº 163, 5-4-1909, pp. 441-442

A destruição de Espinho

Clicar para ampliar.Quando um primeiro telegrama anunciou ao mundo o cataclismo de Messina, produziu-se um movimento universal de piedade, que repercutiu intensamente em Portugal. Viu-se então este pobre país distrair em lástimas pela alheia desgraça uma parte da dor em que o mantém imerso o seu próprio infortúnio. Desde os elementos oficiais, a nação inteira contribuiu para minorar com os seus socorros ou com as consolações do seu pesar os males tremendos que enlutavam a Itália. E contudo, sem a cenografia portentosa da catástrofe, uma tragédia se representava já a esse tempo, entre a indiferença nacional, nas regiões sacrificadas do Douro, onde a fome fizera a sua aparição sinistra. Foi necessário que uma voz de comiseração e de bom senso se erguesse para fazer sentir o contraste entre a insensibilidade perante as misérias próprias e a lamentação perante os males estranhos, para que confluíssem para o Douro essas correntes de piedade que estavam a desviar-se para a sobrevivência dos terramotos da Calábria. Um fenómeno idêntico se está dando com a destruição de Espinho.

Os que ainda têm casa

 

Enquanto o mar arrasava uma povoação, a cinco horas de Lisboa, o parlamento estilhaça carteiras. A indiferença cruel com que o país está assistindo a esse drama emocionante é verdadeiramente espantosa, e basta para definir o estado moral de um povo.

Debalde, dessa vila florescente, que as ondas estão implacavelmente devorando, partem clamores de angústia. Dir-se-ia que o rumor das vagas cobre o alarido das vítimas, e que o berreiro dos deputados cobre por sua vez o estrondo das ondas...

Igreja de Espinho a ser destruída pelo mar. Clicar para ampliar.

Igreja de Espinho a ser destruída pelo mar. Clicar para ampliar.

Foi necessário que o actual ministro das obras públicas acordasse a burocracia sonolenta para que enfim ela falasse com essa imponência com que sempre fala. Não vá pensar-se que inventamos.

Depois de alguns anos de reflexão e de mudez, quando os sacrificados esperavam a salvação, o tribunal de técnicos profere a sentença sapiente, digna de Salomão: «Que se mude Espinho, visto ele não poder mandar parar as ondas!»

Autor do texto não indicado.
Clichés do condutor de obras públicas, Sr. Abel Mota

Igreja de Espinho a ser destruída pelo mar.

 

Colaboração
Jorge Rino – Aveiro

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03-01-2013