Faltava cerca de uma hora
para o MMMMM Encontro Secular dos Magos e das Bruxas de Todo o Mundo. Ao longo
dos séculos foi cancelado apenas uma vez, devido à Inquisição. Desde que o Homem
descobriu a Magia, os humanos com poderes mágicos sempre se encontraram para
conversar, conviver, trocar feitiços e habilidades ou até para se matarem uns
aos outros, uma vez que há uma grande rivalidade entre eles. Neste século o
encontro ia ser no Minho, numa aldeia invisível aos olhos dos mortais.
Com o avanço da Tecnologia,
também a Magia foi influenciada. Hoje em dia os magos e as bruxas são convocados
por e-mail, o controlo da assiduidade é feito através de cartões magnéticos. As
montadas deles (dragões, unicórnios, mulas sem cabeça, grifos e hipogrifos,
serpentes emplumadas, tapetes, vassouras e aspiradores voadores, que ao
contrário do que se pensa são animais racionais, entre outros) já têm garras e
cascos de liga leve, GPS, selas em pele de anaconda ou crocodilo, colunas de som
(ou cordas vocais) com o quádruplo do tamanho, saias, entre muitas outras
modificações. Mas, retomando a história, os imortais, como se auto-intitulavam
os magos e as bruxas, já tinham começado a estacionar as suas montadas no parque
de estacionamento delimitado por raios laser. A grande mesa na qual iam jantar
já estava posta. Nela, morcegos no espeto, espetadas de cacto e olhos de jibóia,
copinhos com sumo de aranha e sapo venenoso, víboras assadas à Bairrada,
especialidade das bruxas portuguesas, ovos-moles apodrecidos vindos directamente
de Aveiro, bagas venenosas recheadas com excrementos de ratazana misturados com
cérebros de papagaio, cogumelos de Chernobyl fritos, entre outros, esperavam
para ser consumidos. Depois do almoço, D. Oninha, o feiticeiro especialista em
maus cheiros, procurava o seu Chow Chow com três cabeças, de seu nome Midas, que
foi encontrar ao pé de uma Caniche mundana.
“O dono desta cadela vai ter
uma surpresa, daqui a algum tempo”pensou D. Oninha.
Noutro lado, Eranderis, a
atlante (raça de humanos anfíbios com a pele quase translúcida, os olhos
completamente brancos e um poder mágico bastante limitado), passeava o seu
trasgo-da-floresta de estimação perto de um lago. Devido à sua natureza anfíbia,
não resistiu a dar um mergulho. Achou as águas refrescantes e revitalizantes e
ficou felicíssima quando um peixe lhe roçou a perna. Ia chamar o seu trasgo para
a água, mas apercebeu-se de que ele já lá estava, comendo um peixe à maneira
típica dos trasgos: primeiro desfê-lo com as garras, depois comeu a carne e
bebeu o sangue. Sentiu, através do seu sexto sentido a aproximação de um mortal.
Tinha de activar a sua camuflagem mágica, e depressa. Mas como, se o seu nível
de poder mágico estava abaixo da média, uma vez que tinha ovas? (O nível médio
de poder mágico varia de espécie para espécie e é medido pelo Magígrafo). Se
este fosse um humano normal não tinha visto Eranderis debaixo de água, e teria
pensado que o trasgo dela (que se chamava Grocha) era apenas uma pedra coberta
por musgo em que alguém tinha posto dois pauzinhos para enfeitar. Mas aquele não
era um humano normal. Era Hadessha, o caçador de monstros indiano. E Eranderis
percebeu-o. Rapidamente teria tomado a postura defensiva dos atlantes, se o seu
nível de magia fosse mais elevado. Optou por desovar ali, quando percebeu que
não podia escapar à Morte (os imortais não morrem de idade, mas podem morrer por
ferimentos graves ou artefactos sagrados). Após a postura atacou com unhas e
dentes (que eram afiados como navalhas) para defender os seus ovos. E era
exactamente isso que Hadessha estava à espera que ela fizesse. Habilmente tirou
do bolso uma estaca de madeira-sacra, a madeira fatal para os imortais, e
espetou-a no coração dela, sem que algum traço de pena ou arrependimento se
notasse no seu rosto. Em seguida, apanhou com uma rede os ovos da atlante que
era já um cadáver.
Há séculos que a família de
Hadessha caçava monstros. Mas houve uns que sempre o fascinaram: os atlantes.
Hadessha estudava-os há décadas e quando Marqrath, o espírito maligno lhe propôs
que os controlasse, Hadessha não hesitou. Hadessha tinha um aspecto jovem, não
parecia mais do que um adolescente, mas tinha já cento e vinte e três anos, e a
sua aparência jovem devia-se ao seu pacto com o demónio. O seu plano era
conquistar o mundo, capturando ovas de atlante, fazendo com que elas eclodissem
e transformando os pequenos atlantes em autómatos. Claro que ele sabia que os
imortais iam tentar impedi-lo mas julgava-se capaz de os vencer. Julgava-se…
O ataque dos imortais foi
rápido e inesperado. Hadessha ainda conseguiu matar bastantes, mas eles eram
muitos e poderosos. Todos os imortais que tinham capacidade de mandar um feitiço
destrutivo fizeram-no, o que produziu um jacto de energia que desafiou todas as
leis do tempo e do espaço. Hadessha e aquele que o controlava, Marqrath, tinham
sido destruídos. Os atlantes juntaram-se para resgatar as crias dos seus irmãos
de raça e regressaram a Atlântida, a cidade submersa.
Sessenta dias após o
encontro, algures no Minho, uma Caniche dá à luz os quatro cachorrinhos mais
estranhos que já puseram as patas neste mundo…
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