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            Na época das chuvas, em Zala, a Norte de 
            Luanda, as estradas ficavam praticamente intransitáveis. O quartel 
            onde estávamos ficava inacessível às colunas de abastecimento que, 
            mensalmente, traziam, desde Luanda, o que fazia falta aos cerca de 
            400 soldados. Passávamos algumas semanas em que o abastecimento era 
            feito por aviões, que lançavam os caixotes com comida e outros bens 
            necessários. Por vezes, o vento estava a favor do “inimigo”, 
            presenteando-o com a carga dos pára-quedas desviados do 
            alvo…Passávamos então dias e dias a comer salchichas com arroz!
 Lembro-me duma altura em que, para nos deslocarmos 40 kms, até ao 
            quartel mais próximo, situado na fazenda Madureira, demorámos uma 
            semana, encontrando algumas vezes, no lugar da picada, um caudaloso 
            rio que fazia desaparecer grandes troços do caminho, transformado 
            num pântano...
 
 Nesses pântanos era frequente os veículos mais pesados ficarem 
            atascados até aos eixos, o que significava um ou dois dias de 
            atraso, gastos a salvar a viatura do atoleiro. Apenas esses veículos 
            milagrosos chamados “Unimog” conseguiam passar, recorrendo ao 
            guincho montado na frente. O cabo era preso a uma árvore na direcção 
            do nosso destino e o guincho arrastava esses “burros do mato” para 
            terreno seco.
 
            Aliás, eu inventei um sistema de reboque utilizando dois ou três 
            unimogues com guincho e algumas roldanas, conseguindo, ao colocar os 
            cabos a puxar de várias direcções e alturas, retirar pesados camiões 
            desses atoleiros. Lembro-me dum camião, marca “Magirus", creio, que 
            fora dado como perdido, depois de as tropas de Engenharia, munidas de 
            bulldozers e gruas, terem desistido de o retirar.
 Recorrendo aos guinchos dos “burros do mato”, conseguiu-se 
            endireitar o camião e, depois, arrastá-lo para terreno firme. Claro 
            que a carga, que constava, entre outras preciosidades, de muitas 
            garrafas de whisky, desapareceu misteriosamente. Consta dos 
            relatórios que caiu nas mãos do “inimigo”, mas, cá por mim, penso que 
            o destino da carga foi outro, pois, também misteriosamente, muitos 
            soldados, no resto do caminho, cantavam alegremente, tais eram as 
            bebedeiras…
 
            Quem também ficou muito contente foi o 
            condutor e dono do camião. Só faltou beijar-me os pés, agradecido… 
            Álvaro Costa, Terça-feira, Abril 29, 
            2008 |