A
facilidade com que os alunos podem encontrar informação
“on-line”, cortar e colar tornou o “cibercopianço”
cada vez mais frequente. Por preguiça ou por desconhecer as
regras elementares da citação, alguns assumem-no como um
acto normal. A Internet é vista como um supermercado sem preço,
onde se vai buscar música, filmes e... trabalhos dos outros.
Vários professores contam como apanharam casos de plágios
mais ou menos descarados. Por Isabel Leiria e Bárbara Wong
Enquanto
estava a corrigir um trabalho de Sociologia da Comunicação,
Rita Figueiras, professora na Universidade Católica
Portuguesa, de Lisboa (UCP), começou a aperceber-se de que as
ideias e as palavras utilizadas pelo aluno lhe eram
familiares. Não se deu conta imediatamente que aquele
discurso tinha sido escrito por si própria, mas também não
demorou muito a reconhecer a intervenção que tinha feito num
congresso.
Durante
cerca de três anos, um professor do ensino superior manteve
uma página pessoal na Internet onde facultava o acesso a vários
trabalhos da sua autoria: textos académicos, pequenos
artigos, planos de aula. Um dia recebeu uma mensagem de um
outro docente de uma escola superior de Educação,
pedindo-lhe que retirasse os textos da página. É que já
tinha detectado vários plágios a partir desses documentos.
Desde então,
não só a página está desactivada como o professor decidiu
rever os métodos de avaliação dos alunos. Passou a atribuir
uma menor importância na classificação final aos trabalhos
escritos e a submetê-los a discussão nas aulas. Os
interrogatórios deixaram de destinar-se apenas à avaliação
do conhecimento sobre o tema, mas também a tentar apurar se
os textos foram redigidos pelos próprios estudantes ou por mãos
alheias.
Trocas
com colegas
E por várias
vezes este professor apanhou casos mais ou menos
“descarados” de situações de plágio. “Ou eram
copiados de livros que qualquer docente minimamente informado
conhecia ou resultavam de uma permuta com colegas de anos mais
avançados, ou até de outras escolas. Alguns eram
simplesmente copiados de páginas institucionais da
Internet”, relata.
Ainda que
este possa não ser o comportamento habitual dos estudantes
portugueses, a verdade é que, sobretudo com a multiplicação
da informação na Net e o seu fácil acesso, tornou-se cada
vez mais simples ir buscar material produzido por outros.
Nada de mal até aqui, não fora os alunos esquecerem-se
muitas vezes de citar a fonte ou fazerem cópias integrais.
“Pode ser
uma questão geracional. Existe a ideia de que a Internet é
de todos, é um meio democrático e não há a noção de que
há propriedade intelectual. A Internet é vista como um
supermercado sem preço, onde se
vai buscar
a música, os filmes e também o trabalho dos outros”,
acredita Rita Figueiras.
Para José
Ferreira Gomes, vice-reitor da Universidade do Porto (UP), o
problema coloca-se de forma semelhante:
“Os
alunos são ensinados, praticamente desde a escola primária,
a ir buscar informações à Internet para realizar trabalhos.
Nos anos iniciais do ensino, o facto de essas informações
serem utilizadas de forma menos correcta não se põe com
tanta acuidade. Mas no ensino superior usar indevidamente
determinadas informações é completamente inaceitável”,
considera.
O que
preocupa, reforça Clara Pinto Correia, coordenadora das pós-graduações
e mestrados na Universidade Lusófona, em Lisboa, é a
“normalidade que este tipo de plágio está crescentemente a
ter para os alunos”. “Nem se apercebem de que estão a
plagiar e que o plágio é crime. Quando os repreendemos,
ficam muito surpreendidos. Já tive casos de desqualificar
trabalhos porque me tinham sido entregues iguais até à última
vírgula a material que estava ‘on-line’’, — conta.
Milhares
de trabalhos “on-line”
A proliferação
de “sites” na Internet que compilam teses, trabalhos
científicos, resumos de textos — os chamados “paper mills”
— que são disponibilizados a todos os cibernautas tornam
o consumo apetecível. O “essaysmart”, por exemplo, é um
desses e anuncia mas de 700 mil trabalhos “on-line”.
Mas existem
centenas de outros. Os temas são os mais variados: de
Albert Einstein ao expressionismo alemão, do aborto ao
problema das chuvas ácidas. Quase tudo está em inglês, mas
encontram-se também muitos “sites” brasileiros ou
trabalhos em espanhol.
Um dos
avisos mais comuns prende-se exactamente com a utilização
menos correcta” do material produzido por outros autores.
Porque estes conteúdos devem ser instrumentos de auxílio à
pesquisa e não substituir a própria investigação.
Só que a
informação à distância de um dique no rato é tanta que
pode mesmo tornar-se difícil despistar casos de cibercopianço.
“Nem sempre é fácil de detectar mas, quando se trata de
teses de mestrado ou de doutoramento, há um cuidado muito
maior. Os elementos dos júris já têm por hábito fazer
algumas pesquisas na Internet para se certificarem
da originalidade dos trabalhos”, explica o
vice-reitor da UP.
Fraudes evidentes
José
Ferreira Gomes diz ainda que “o problema é relativamente
menor nas áreas científicas”. Até porque a Fundação
para a Ciência e a Tecnologia tem disponível uma plataforma
de informação bibliográfica e bibliométrica, a Web of
Knowledge, acessível às instituições de ensino superior.
Através dela é possível aceder a bases de dados que
possibilitam a pesquisa de títulos e resumos de artigos das
revistas científicas mais influentes e de actas de conferências.
Outras
vezes, a fraude torna-se por de mais evidente. “Em 1945, a
Armada Vermelha entrou em Pequim”, escreveu um aluno num
trabalho final. A frase deixou a professora Isabel Capeloa
Gil, da Faculdade de Ciências Humanas da UCP, intrigada. Dois
dias depois, a docente encontrou na Internet um artigo do
“New York Times” que começava assim: “In 1945, the Red
Army...”. Ou seja, o Exército Vermelho e não a Armada. O
texto do aluno não fazia qualquer referência ao artigo, do
qual traduziu vários excertos. E não tinha sido apenas
aquele aluno a plagiar.
“Normalmente,
os plágios são feitos de maneira pouco cuidadosa. Ou os
estudantes usam um tipo de linguagem à qual não nos tinham
habituado, ou são trabalhos muito elaborados por alunos que são
mais fracos”, e numera Capeloa Gil.
Ainda
assim, Clara Pinto Correia lamenta a falta de informação dos
alunos e acredita que “é urgente que haja uma movimentação
de professores para confrontar o assunto”. • S.S.C.
Britânicos atrás de quem
copia da Net
Milhares de estudantes do ensino
superior britânico que entregaram os seus trabalhos de
curso no mês passado foram submetidos a um teste de
despistagem de cibercopianço”, com a introdução, a nível
nacional, de um sistema informático capaz de detectar situações
de plágio. O processo é aparentemente simples:
o trabalho entregue pelo aluno é
introduzido no computador do professor e comparado com
milhares de outros textos, assim que o programa é
accionado. Quatro horas depois, o documento é “devolvido”.
Se mais de 75 por
cento do texto for encontrado em qualquer outro documento,
virá assinalado a vermelho. Se tal acontecer com menos de dez
por cento, virá a azul. Laranja, amarelo ou verde são as
outras cores utilizadas, de acordo com a quantidade de texto
copiado, O docente receberá ainda a indicação dos
“sites” de onde o material foi aproveitado. I. L.
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