Adriano Casqueira Pires

Pintura

Nascia a madrugada
Das sombras da noite:
Uma pálida alvorada,
Um brilho irreal,
Um breve açoite
De luz da manhã.
O sol desponta sobre a ria
Num espelhar de rosa avermelhado.
A noite foi-se embora, envergonhada,
E dá lugar ao dia, à luz, à vida.
E surge a primeira passarada:
Um bando de gaivotas
Em formação militar,
Triângulo tão perfeito
Que se desmancha à entrada no mar.
Unidas no mesmo grito,
Abafam o motor
Do barco que sai para a faina.
No seu rasto de espuma,
Olho diamantes brilhando,
Gotas de sol salpicantes,
Estranhamente brilhantes...
Surgindo por trás da serra,
O sol já brilha, ofuscante!
Chegam mais embarcações,
Brancas, pretas, amarelas,
Despontam em contra-luz,
Mostrando seu corpo, suas velas...
E a ria vai-se animando
Num ballet que nos seduz:
Barcos nas ondas, dançando,
Motores, em fundo, roncando,
Sinfonia sem sentido,
Pintura sempre alterada.
Poesia que não rima,
Ópera nunca acabada!

                    Idos de Março de 2004

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