Acersso à hierarquia superior
 

Livro do 1.º Centenário do Liceu de Aveiro (1851-1951)


b) – A locução do Presidente da Câmara (Dr. Álvaro Sampaio) no salão nobre da Domus Municipalis.

Minhas senhoras

e

Meus senhores:

Quis o destino, sempre incerto e caprichoso, que fosse um antigo professor de muitos dos presentes, que estivesse a presidir, embora com escassos merecimentos, aos destinos deste concelho. Por esse facto, na mesma pessoa concorrem o mestre de outros tempos e o representante da cidade, o que duplica a alegria de Vos receber, o prazer de Vos saudar, a honra de vos acolher nesta casa que é a vossa casa. A essa circunstância devo a oportunidade de ver à minha volta antigos alunos meus, de lhes apresentar cumprimentos de boas-vindas e de lhes manifestar quanta emoção me causa vê-los aqui, frente a frente, passados tantos anos de ausência.

Acumulam-se no meu espírito imagens de outros tempos, recordações da vida de professor que leccionou quase um quarto de século, evocação de colegas e condiscípulos, episódios e excursões, de festas que se realizaram, de representações que se deram, de modestas realizações próprias, e a saudade de uma vida intelectual acima e fora das duras realidades. Alegra pensar que centenas de antigos alunos, alguns verdadeiros valores sociais no nosso país, passaram pelos bancos do nosso liceu e o honram agora em qualquer parte. Aqui estão muitos deles, em desinteressada devoção, satisfeitos porque vieram consagrar uma instituição que atravessou um século a preparar homens, a formar inteligências, a modelar caracteres. É preciso não esquecer que no liceu se criou e desenvolveu o desejo de saber, a capacidade de observar, de compreender, de julgar, de interpretar, em suma, de raciocinar.

Por isso a vossa romagem à casa onde passastes alguns anos da vossa mocidade, é de alto significado. No seu profundo sentido o que vos trouxe aqui transcende os limites de uma reunião de antigos escolares que vieram reviver um passado próximo ou longínquo, porque significa e traduz culto pela casa onde se iniciou a vossa formação, veneração pelos mestres que / 63 / contribuíram para a vossa preparação intelectual, preito de homenagem às virtudes educativas de um estabelecimento de ensino que completou um século de existência. E cem anos de vida de um instituto que preparou contingentes de homens que serviram a Nação, não é um facto banal, mas um acontecimento digno de relevo e de destaque.

Comemorando hoje esta data tão recuada e tão honrosa para os aveirenses, prestamos culto aos que tornaram possível, no nosso meio, criar e desenvolver uma casa já de brilhantes tradições e que vê a sua população escolar aumentando de ano para ano.

E porque o liceu não é apenas um edifício com professores e alunos, mas sim um complexo de solidariedades mentais ligadas por laços invisíveis, é que esta romagem tem o carácter de uma consagração em que se confundem instrutores e instruendos. Do liceu levaram todos os que aqui estão uma cultura mais ou menos profunda, cultura que permitiu, a uns, prosseguir nos estudos superiores, a outros, possibilidades de orientar a vida, criando e desenvolvendo aptidões para as mais variadas actividades. Quer o ensino liceal seja predominantemente clássico, o que não me parece de acordo com a época em que vivemos, quer tenha uma feição científica acentuada, de ordem prática, material e utilitária, só ele pode proporcionar adestramento intelectual e noções capazes de influir de forma decisiva na conduta dos indivíduos e da sociedade.

O liceu, liberto da necessidade de agradar, alheio ao interesse monetário, pode, na realidade, preparar uma juventude culta e estudiosa, garantia e penhor da perenidade da nossa pátria. Exaltar esse ensino, homenageá-lo, é dever de nós todos.

Louvores são devidos ao sr. Reitor, Dr. José Tavares, colega e amigo dos melhores, por se ter lançado, com êxito, nesta cruzada de trazer à «casa mater» da cultura média os que dela andam afastados por suas ocupações ou por terem escolhido outras terras para seu trilho de vida.

E para terminar, a todos, em nome da Cidade e em meu nome pessoal, apresento efusivas saudações e faço votos pelas felicidades de cada um de vós.

Tenho dito.
 

 

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