Como sabem, ou saberão agora, não sou de discursos. Digo
aquilo que me apraz dizer. Aquilo que, no momento, a razão puxa. E o que
me vem à cabeça é que Abril está por cumprir. Mal começado. Que arranca
ao fim de cinquentas anos? Quem sabe? O que gostava era que fossem
vocês, rapaziada, a declamar os princípios da Liberdade.
Para
já, venho pedir-vos o seguinte: olhem. Em volta, quantos colegas opinam?
Quantos de vós sorriem? Olhem e contem as mãos-dadas. Quantos na rua ou
no recreio reunidos? Digam-me, amigos, que as escolas de outrora jamais
de novo divididas. Que meninas à esquerda e meninos à direita, não! Que
para cima de dois, recordo-vos: infundado ajuntamento. Proibida
conspiração. E que um isqueiro, nesse tempo, só com devidas licenças,
sabiam? O país funcionava à base do lápis-azul – esse pedaço de madeira
cujo intuito passava por queimar nossas palavras, calar nossos gestos.
Hoje, por outro lado, fala-se e fala-se muito, mas a cada
verão um incêndio, alguém morto, alguém sem casa. Nas cidades, o número
de sem-abrigos exponencia. As aldeias estão vazias. É isto que me apraz
dizer: se antes estávamos mal, agora um niquinho de nada menos.
Está nas vossas mãos, gente nova. Vejam para além do pão
e da casa, da religião e do trabalho. Ensinem vossos irmãos a mudar as
mentalidades. Mudem também aquilo que já era de mudar. Pensamento
próprio é orgulho. Fazer arte, trabalho. Entorpecimento, cumplicidade.
Abram os pulmões, soquem a mesa, abanem o estabelecido. Direitos e
deveres são para todos, ouviram? Olhem e contem-me quantas senhoras ao
volante de veículos pesados, quantos senhores de rosa. Liberdade é usar
cores. É democratizar o gosto. É lembrar-vos de onde viemos para que
saibam a distância a que estamos de lá voltar.
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