Voltaremos às colecções de pintura para mencionar algumas
espécies consideradas distintas.
Em primeiro lugar, o *
retrato da Infanta St.ª Joana em trajo da corte.
«Só por si vale uma viagem a Aveiro.» (Joaquim de
Vasconcelos).
Figurou na Exposição dos Primitivos dos Centenários de
1940. José de Figueiredo julgou-o cópia de um original autêntico de Nuno
Gonçalves, cópia que teria sido tirada no estrangeiro por artista
desconhecido. É discutível esta hipótese; mas o que é de todo o ponto
certo, pela tradição conventual e pormenores exactos, é que o quadro é,
além de admirável, verídico, representando
/ 490 /
o busto da Infanta no esplendor da sua mocidade, tocada já de certa
tristeza, e a indumentária que os painéis de S. Vicente nos garantem ser
a própria da época e da família real.
Outra pintura de valor é o *
S. João
Evangelista,
talvez de Frei Carlos.
As tábuas Senhora do Leite, Senhora da
Madressilva, Ecce Homo, S. Tiago, e dois trípticos,
um deles já mencionado por Frei Luís de Sousa, o outro, pequenino, da
escola neerlandesa, atribuído por José de Figueiredo ao mestre do
retábulo da capela de Miragaia, formam uma apreciável galeria de
«primitivos».
Do quadro da Senhora da Madressilva, conhecido também por
Senhora do Rosário, disse Joaquim de Vasconcelos o seguinte:
«O tipo especial da Senhora e do Menino, a interpretação
dos acessórios, a técnica da modelação (luz e sombra) onde o original
está intacto, enfim, a policromia abundante, o concerto das cores, dão a
este quadro um lugar à parte, sem analogias conhecidas entre os quadros
nacionais». O mesmo autor, escrevendo sobre S. João Evangelista, afirma
que «não é possível exceder a suavidade e doçura de feições do discípulo
amado de Cristo. O pintor quis ser exacto em tudo: nos detalhes do
cálice gótico; no estojo com pena e tinteiro que pôs à cinta do
apóstolo, e no desenho do elegante mosaico sobre o qual pousa levemente
o majestoso vulto do apóstolo.»
Em pintura contemporânea e desenho à pena,
avultam a colecção de costumes locais e regionais de aguarelas de
Alberto de Sousa, trabalhos de Eduarda Lapa, Fausto Sampaio, Fausto
Gonçalves, do desenhador aveirense José de Pinho, etc.
Solicitam ainda a atenção do visitante alguns quadros de
proveniências e épocas diversas, como, por ex., o Retrato de D.
Carlos, de Columbano, que pertenceu ao Governo de Moçambique; a
Anunciação, conhecido quadro de Masucci que serviu de original para
a composição em esmalte da Capela de S. João Baptista na Igreja de S.
Roque de Lisboa; uma Descida da Cruz de grande estilo, certamente
réplica de algum mestre não Identificado; bem como duas Vistas de
Roma no século XVIII; uma colecção de óleos sobre cobre,
representando a Vida de Cristo; e alguns retratos de Reis,
como D. José, D. Maria I, D. Pedro V, pelo pai de Columbano, D. Luís,
por Sousa Rodrigues, um vistoso documentário a óleo, do pintor Resende,
Gente da Murtosa na romaria do Senhor da Pedra, que pertenceu ao
Rei D. Fernando, etc. Outras telas poderão ver-se na galeria de pintura
moderna e contemporânea quando o permitirem as obras em que todo o
edifício anda envolvido no momento em que se escreve esta notícia
(1943),
/ 491 /
que não pode, pois, subordinar-se à disposição das colecções por salas.
Do Paço Patriarcal de S. Vicente de Fora, veio para o
museu um rico crucifixo, de mármore, tartaruga, marfim e prata, que é
das melhores peças da colecção, onde há mais alguns belos crucifixos de
marfim e madeira e numerosas esculturas de jaspe, barro e madeira, de
sentido religioso, maquinetas, presépios, credências, imagens de
oratório, etc.
De singular relevo, entre as esculturas, a composição
* notável Sagrada Família, de barro policromado, de Machado
de Castro, encantadora pela graciosidade das atitudes e indumentária,
genuína do século XVIII, que envolve as figuras. Outros trabalhos em
barro documentam a tradição dos mosteiros e ceramistas locais e
nacionais.
Objectos de metais não preciosos:
Embora pequeno, o grupo de artefactos de latão, cobre,
bronze, estanho e ferro é muito interessante, destacando-se um Cristo
de bronze dourado, os antigos padrões de pesos do Concelho, datados de
1499; candeeiros, lâmpadas, castiçais, gomis, espelhos de fechaduras e
ferragens várias.
Há ainda registos, gravuras, desenhos, iluminuras,
cravos, vasos, mísulas, edículos, cadeiras, contadores, armários,
quadros, esculturas, adornos, documentos, pergaminhos, chairéis,
azulejos, retábulos. E não falámos na capela dos Santos da Ordem de
S. Domingos, no carro do Bispo D. José Gameiro de Sousa, na maquete
da estátua de José Estêvão, em tantos outros espécimes e documentos de
valor histórico e artístico, de carácter religioso e profano, que enchem
o vasto edifício e não se encontram nem ordenados nem expostos no
momento desta edição.
Especializado em arte religiosa e conventual, o Museu
aveirense, pelo seu conjunto arquitectónico, pelas recordações que
evoca, pelos objectos de arte e curiosidades que encerra, é um dos bons
museus regionais do nosso País, não sendo fácil, quando ordenado,
apreciar-se num simples dia de visita.
|