Escola Secundária José Estêvão, n.º 4, Jul. - Set. de 1991

Fala-se tão insistentemente do atraso do ensino secundário; vê-se tanta gente preferir-lhe os primores do ensino congénere doutras épocas, que se torna necessário, e até urgente, defendê-lo no que ele tiver de defensável, e melhorá-lo no que realmente apresentar digno de censura.

Parece-nos, porém, que há um grande exagero, quando não ignorância e má fé, nas apreciações dos censores. Cremos que não são coisa que evoquemos saudosamente as aulas de Português, de Francês, de lnglês, de Sciências Naturais, de Matemática, de História, de Geografia e de Desenho, com que nos mimoseavam a grade maioria dos nossos mestres. Vai passado o tempo, felizmente, em que se não curava propriamente da educação do estudante; em que qualquer disciplina era mero pretexto para inconcebíveis exercícios de memória, e estamos a ver, em espírito. o fero magister a tomar a lição: punha inquisitorialmente as lunetas, e, de olhos fitos no livro, ia verificando com todo o escrúpulo se ao aluno escapava alguma das palavras do texto marcado, ou se alguma vírgula deixava de ser por êle levada em linha de conta!

Ora os alunos de hoje não sairão dos liceus com um cabedal de conhecimentos que assombre; não papaguearão ipsis verbis os compêndios; mas com certeza possuem uma cultura geral, uma disciplina de espírito e uma educação mais perfeitas e harmónicas do que os dêsses tempos ditos mais cultos e felizes do que os nossos.

Quer isto dizer que devamos embasbacar-nos diante das excelências do bom ensino que já se vai ministrando, e cruzar os braços, à espera de que alguém, lá para o futuro, se encarregue de lhe dar novo impulso? De modo algum: cumpre ao professor esforçar-se constantemente por melhorar, aplicando os mais sãos e racionais preceitos pedagógicos e didácticos modernos, e mostrar aos pais dos seus alunos, e mesmo aos estranhos, o que ensina e como ensina.

Foi êste pensamento que deu origem a esta publicação. A ânsia do progresso, o desejo de aperfeiçoar o que julguemos defeituoso trouxe-nos a esta tentativa de revista liceal, que não é a primeira entre nós, mas que não tem antes de si outra com o mesmo carácter. Eis o nosso programa, que, em poucas palavras, eloqüentemente dirá o que temos em vista: aqui mostraremos até a onde vão os nossos esforços em ensinar e investigar; aqui exporemos o que pensamos da pedagogia e da didáctica do ensino secundário nos seus diferentes distritos; aqui publicaremos e discutiremos os diplomas oficiais que nos digam respeito; aqui defenderemos tudo quanto possa contribuir para o aperfeiçoamento do ensino secundário e para o engrandecimento da classe do professorado liceal, como meio de extensão da cultura; aqui inseriremos pequenos trabalhos e artigos scientíficos e pedagógicos, solicitados a altos espíritos de Portugal, e mesmo do estrangeiro; aqui, finalmente, daremos conta de tudo quanto se prenda com a vida interna e missão educativa do estabelecimento de ensino onde com um afinco e fé inabaláveis transmitimos conhecimentos e moldamos caracteres.

Muito tempo pensámos sôbre o nome com que baptizaríamos a revista. Nenhum nos satisfazia, porque ou não traduzia suficientemente o nosso fim e pensamento, ou nos parecia enfático e pedante, e nós queríamos apresentar aos leitores somente aquilo que o título da publicação fizesse esperar. Um pouco mais, sim, se tal coubesse em nossas fôrças; menos, não, que seria vergonhoso.

Um dedicado amigo, que é ao mesmo tempo um dos mais brilhantes espíritos de Portugal, na actualidade o sr. Carlos Duarte –, veio em nosso auxílio e tornou-se, sem querer, o paraninfo da revista. Tratando dos nossos projectos, concluía êle em carta, depois de gracejar a propósito das nossas hesitações: – «Folgo muito com as boas notícias da revista que, espalhando cultura, virá estimular as actividades intelectuais do público e será simultaneamente órgão dos professores que trabalham a sério no liceu e a sério tomam a sua nobre missão, da revista «Labor», por conseqüência». Assim nasceu o nome. Quanto a nós, sentimo-nos muito honrados com ter aproveitado a sugestão do ilustre homem de letras, cujo o talento é tão grande, pelo menos, como a sua modéstia. «Labor»? Sem dúvida!

A Direcção


Fac-símile da 1.ª página do N.º 1 da "Labor" (Janeiro de 1926) e transcrição integral do seu primeiro texto.

 

Aliás, Escola Secundária José Estêvão

 

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