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1ª edição, Aveiro, Edição do Clube dos Galitos, 1960, página 5.


A pista de remo, mas tem que ser!

Palavras de D. João Evangelista quando a cidade pediu a pista de remo para os Galitos.

 

Eu nasci em Aveiro, ao que suponho na proa de al­guma bateira. Fui baptizado à mesma hora, nas águas da nossa Ria. Abriram-se-me os ouvidos ao som cadenciado dos remos no mar, ao pio estrídulo das famintas gaivotas, ao praguedo inocente dos pes­cadores. Encheu-se-me o peito à nascença do ar salgado da maresia. S. Francisco de Assis chamava a estas coisas irmãos, chamava a estas coisas irmãs: o irmão Vouga, o irmão luar que à noite o prateia, os irmãos peixes, as irmãs espumas, areias, estrelas.

Mas aqui há mais que uma simples fraternidade, há mais que a suave harmonia da natureza e da alma de Aveiro; chego a crer que há uma verdadeira incarnação, o encontro de duas coisas do mesmo ser.

Nós, os de Aveiro, somos feitos, dos pés à cabeça, de Ria, de barcos, de remos, de redes, de velas, de montinhos de sal e areia, até de naufrágios.

Se nos abrissem o peito, encontrariam lá dentro um bar­quinho à vela, ou então uma bóia, ou uma fateixa, ou então a Senhora dos Navegantes.

Assim plasmado de Aveiro, com os beiços a saber a sal­gado, a pingar gotas de ria por todo o corpo, por toda a alma, como poderia eu não estar agora aqui a aplaudir a pista de remo que já se avista?!

Eu sou uma nesga, embora minúscula, desta deliciosa aguarela de Aveiro; eu sou um pedação da nossa terra, que, embora já gasto, ainda pode clamar até ser ouvido:

A pista de remo, mas tem que ser!


 

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