ROSTO DE

UM FUNDADOR

Ainda muito moço, mal o dia clareava, estrada fora, montado na bicicleta em despique com o vento, alheio a fadigas, chegava à Gafanha num ritual repetitivo, só alterável quando outras obrigações, fora de Aveiro, a tal o obrigavam.

Transpunha de bateira, bicicleta ao lado, o Esteiro Oudinot. Uma passagem fugaz, (ou não) pelo barco, constituía a sua primeira preocupação diária. Depois era o ver e o ouvir; daí tirava as linhas com que fazia a pauta por onde ia regendo a sua sinfonia. Como todo o maestro procedia às correcções devidas e dava as ordens que entendia necessárias; agia preferentemente, de molde a inspirar os outros com o seu exemplo. Foi esse um dos grandes segredos do seu êxito, pois não era homem que trabalhasse sozinho.

Poucas vezes o receio do fracasso o fez vacilar. A força da sua certeza era impressionante; tornou-se lendária a sua capacidade de previsão.

Contudo, por vezes, era homem irónico e travesso; de espírito jovem, associando-se ao seu clã quando se planeava uma festa ou qualquer jantar de confraternização. Mesmo o seu aspecto físico pouco se alterou no decurso de muitos anos. Sentia que não podia envelhecer.

Aqueles que melhor o conheceram podem afirmar que toda a sua força provinha de uma combinação de virtudes, como energia, inteligência e memória, aliadas a uma ambição natural.

Tinha a noção exacta do seu valor, do seu poder, sem, todavia, ser vaidoso.

Agreste, de quando em quando, para, com aqueles de quem mais gostava, ferindo-lhes a sensibilidade como num alerta para o melhoramento do trabalho pessoal, o progresso da EPA e o chamamento à imitação da sua pessoa. Homem de preferências marcadas; amigo do seu amigo!

...Mas Egas Salgueiro não era eterno; sentindo o peso dos anos, entregou o seu cargo com a mesma força com que o assumiu e, calmamente, afastou-se, de vez, com a satisfação da verdadeira realização de uma obra que foi, é e será sempre EPA.

Maria Armanda Grangeon

 

 

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