Agostinho Marques Pião tem 75 anos e nasceu Lisboa (1923).
Conhecido pelas gentes da cidade pelo "Malabarista", foi considerado o
melhor jogador de todos os tempos do Beira Mar. Sente-se aveirense e
torce sempre, em primeiro lugar, pelo Beira Mar; e, só depois, pelo
Sporting. É a história de um homem que afirma ter nascido com talento
para jogar. O primeiro jogador profissional da equipa aveirense conta
como foram os anos que dedicou ao futebol.
Começou o seu percurso futebolístico com 16 anos, no
Desportivo dos Olivais, onde jogou durante três épocas. Depois, foi para
o Sporting, que pagou pela sua transferência 10 contos. «Na altura era
muito dinheiro!». Vestiu a camisola dos "leões" durante dois anos e,
depois, foi emprestado, em 1946, ao Beira Mar que nunca o comprou, mas
que também «nunca mais me deixou sair. E ainda bem! Foi em Aveiro que
conheci a minha Joana: a mulher mais bonita da cidade, com quem casei,
há 50 anos. Tivemos filhos e netos; tenho uma vida muito agradável e uma
família muito bonita». Por causa do Beira Mar nunca o ter deixado sair,
o Sporting cortou relações com aquele clube, durante 16 anos.
No Sporting teve grandes treinadores como o Joaquim Ferreira, o mestre
Cândido de Oliveira
−
considerado o melhor treinador do mundo
−,
entre outros. No Beira Mar, conheceu homens de grande talento como Viriato, Artur
Baeta e Artur Daniel.
É um homem feliz e orgulhoso de uma carreira que assume ter sido brilhante. Jogou até aos 30
anos que diz terem sido «os melhores anos da minha vida. Tínhamos uma
equipa muito unida, havia muita camaradagem e fazíamos muitas malandrices...»
Dos momentos que mais o marcaram salienta a vitória contra o Viena de Áustria e não
esconde o orgulho de ter feito parte «do melhor plantel que o Beira Mar
já teve. Era uma equipa muito forte.» Não esquece os seus companheiros e
fala, com muito carinho, de alguns homens, também, eles com muito jeito
para a bola, como o Magalhães, o Barreto, o Adolfo, o Augusto... No Beira
Mar ganhou muito dinheiro, mas «era muito gastador. Gastei quase tudo.»
Deixou de jogar no Beira Mar, porque «já não podia.
Estava cansado e, fui para o Bustos como jogador-treinador. Eles pagavam
em géneros: sacos de batatas, pipas de vinho, eu sei lá! Davam-me tudo.»
Em 1960, começou a treinar os miúdos do Beira Mar. Mas custou-lhe deixar de jogar à bola.
«Mesmo assim, durante os cinco anos que treinei os seniores e os juniores, não foi tão difícil porque podia matar o
bichinho a treinar os garotos. Continuava envolvido no futebol». E mais
uma vez não esconde o orgulho de ter lançado jogadores à primeira
categoria, «o que nos últimos anos não tem acontecido.»
Lamenta que o Beira Mar não seja a equipa de antigamente. «Hoje, estão lá jogadores que no
meu tempo nem nas cabinas entravam para nos ver vestir!»
Aos 40 anos deixou, para sempre, o futebol. Mas nunca esqueceu o Beira Mar. Continua a
gostar de futebol
− do Beira Mar em particular
− e preocupa-o que a
equipa esteja em baixo. «O Beira Mar não tem meio-campo e falta-lhe um
avançado. «Não é preciso ir buscar estrangeiros para fazer uma
boa equipa. Bastava dar uma volta ao distrito de Aveiro. O que não falta
são rapazes maravilhosos.»
Acredita que os jogadores não ganham demais, porque as
suas carreiras acabam cedo. «É uma carreira muito curta, e, a não ser que
saibam investir, se não ganhassem muito dinheiro terminavam a vida na
miséria.»
Um homem que jogou por amor fica triste pelo facto do
futebol não ser tão puro, mas compreende a situação como resultado do evoluir dos tempos.
Aos 75 anos sente-se feliz pelo que deu ao futebol e pela vida que tem. Só lamenta que o seu
neto, Fernando Miguel, «muito talentoso», não queira dedicar-se ao
futebol.
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A
equipa em 1946, considerada o Grupo de Honra do Beira Mar e a melhor
do distrito na época de 1946/47. |
Ora, bolas!
Agostinho Pião conta:
«O melhor jogador português foi o Coluna! Os melhores
jogadores de hoje são: o Simão Sabrosa e o Figo.»
«Fomos fazer um jogo de treino a Vagos, na altura da
festa da Nossa Senhora e, de cada vez que marcávamos um golo, a banda
tocava. Então o Conceição disse-me: "Vamos pôr a música a tocar sem parar!" Foram 15 golos!»
«Saber jogar futebol é uma coisa que nasce connosco. O futebol não se ensina; corrige-se.»
«Fazíamos muitas malandrices... Uma vez, a malta disse ao
Magalhães que eu sabia cortar o cabelo. Ele acreditou e pediu para que eu lho cortasse. Eu cortei, mas fiz-lhe um lindo serviço... é que eu nunca
tinha sido barbeiro! O Magalhães era um santo.»
« Estávamos a perder contra o Espinho por duas bolas a zero e, a vinte minutos
do fim, o treinador tirou-me da posição de interior e colocou-me
a extremo direito: dei dois golos a marcar e marquei mais dois. Ganhámos quatro a dois!»
«O Beira Mar não aproveita os jogadores que tem. O caso
do Ribeiro, que é excelente a meio-campo, está a jogar na posição de
lateral! Estão a atirá-lo para o entulho!» |