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a natureza e a vida

pelo eng.º paulo seabra

 

3 – radioactividade

Em 1896, Henri Becquerel, ao estudar a fluorescência, verificou que um composto de urânio, depois de exposto aos raios solares, impressionou uma chapa fotográfica envolvida num papel preto opaco, junto da qual foi colocado. Ao prosseguir as suas investigações e faltando-lhe a luz solar para obter a fluorescência, meteu dentro de uma gaveta o composto de urânio junto da chapa fotográfica envolvida em papel opaco.

Seguiram-se dias nublados e, passadas algumas semanas, Becquerel voltou a pensar no assunto e lembrou-se de revelar a chapa que havia guardado, tendo então observado, com certa emoção, que a emulsão fotográfica fora impressionada pelo urânio, apesar de não haver fluorescência em causa.

Nas experiências que realizou em seguida, concluiu que as substâncias fluorescentes não impressionavam as chapas fotográficas, mesmo no estado fluorescente, mas em compensação todos os compostos de urânio, ainda que não fluorescentes, impressionavam as emulsões fotográficas, apesar de protegidas com papel preto ou delgadas lâminas de alumínio.

Foi assim que em 1896 Henri Berquerel descobriu a radioactividade – propriedade que certos elementos possuem de emitir espontânea e continuamente radiações invisíveis. Os elementos que possuem esta propriedade chamam-se elementos radioactivos ou radioelementos.


Pouco depois, em 1898, Madame Curie descobriu, em colaboração com seu marido Pierre Curie, mais dois elementos radioactivos, o polónio (nome dado por Madame Curie em homenagem à sua terra natal, a Polónia) e o rádio, radioelementos estes que se formam por decomposição radioactiva do urânio.

As radiações radioactivas têm a sua origem no núcleo do átomo e compõem-se de 3 espécies de partículas: os raios alfa (α), raios beta (β) e raios gama (γ).

Os raios α são núcleos de hélio, portanto com a massa 4 (2 protões e 2 neutrões), são / 35 / portadores de duas cargas eléctricas positivas e percorrem no ar uma distância de uns 6 centímetros, sendo retidos por uma simples folha de papel.

Os raios β são constituídos por partículas 1.850 vezes mais leves que um átomo de hidrogénio, animados de velocidade vizinha à da luz (300.000 km/s), são muito penetrantes e estão carregados de electricidade negativa igual à carga elementar, isto é, à carga de um electrão.

Os raios γ são radiações electromagnéticas do tipo das radiações luminosas, de velocidade igual à da luz, não são desviados pelos campos magnéticos ou eléctricos e são extremamente penetrantes, conseguindo atravessar lâminas de chumbo com vários centímetros de espessura.

Os núcleos atómicos, como já vimos, são constituídos por protões e neutrões. Estas partículas movem-se com velocidades enormes, de muitos milhares de quilómetros por segundo e estão sujeitas a forças de atracção e repulsão. As partículas do núcleo sofrem, pois, repetidos choques e quando estes se produzem no sentido centrífugo, pode acontecer que algumas delas sejam expulsas do núcleo. Quanto mais alto for o lugar do elemento na classificação periódica de Mendelejeff, isto é, quanto maior for o seu peso atómico, maior é o número de partículas em movimento e, portanto, maior é a probabilidade de perda dum desses corpúsculos do núcleo.

Por exemplo, no rádio (núcleo com 88 protões e 138 neutrões) e no urânio (núcleo com 92 protões e 146 neutrões) a emissão espontânea de radiações nucleares é frequente, e, consideradas no conjunto das emissões de todos os átomos duma porção de elemento, ficamos em presença da radioactividade.



Desintegração dos elementos radioactivos

Vejamos o que se passa quando se produz a desintegração do núcleo instável dum elemento radioactivo pela emissão de partículas α, β ou y

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a) – Emissão de uma partícula α.

Dois protões e dois neutrões têm uma grande tendência a associar-se para formar uma partícula α. Um elemento radioactivo, ao perder uma partícula a, transforma-se num elemento diferente, com o número de massa diminuído de 4 unidades (2 protões + 2 neutrões) e número atómico inferior em duas unidades (2 electrões).

Pela emissão duma partícula α o átomo ficaria com um excesso de dois electrões planetários, mas estes soltam-se para que o novo átomo resultante fique com o número atómico que lhe compete.

Exemplo: Consideremos o caso do urânio (número de massa 238, número atómico 92), que ao emitir uma partícula α se transforma noutro elemento radioactivo, o tório (número de massa 234, número atómico 90).

(238 = 254 + 4 e 92 = 90 + 2 )

Isto é o exemplo de uma reacção nuclear.


b) – Uma partícula β (um electrão) pode deixar o núcleo.

Mas como pode haver emissão de electrões do núcleo se, como vimos até aqui, existem neste somente protões e neutrões?

Admite-se que cada neutrão, partícula sem carga eléctrica, é constituído pela associação de um protão com um electrão.

Então, quando do expulsão de um electrão do núcleo, este último não muda praticamente de massa, mas a sua carga nuclear é acrescida de uma unidade.

Exemplo: O tório ao expulsar um electrão do núcleo, transforma-se noutro elemento radioactivo, o protactínio


c) – Emissão de radiações electromagnéticas (radiações γ).

/ 37 / Simultaneamente às expulsões do núcleo, quantidades enormes de energia podem ser libertadas.

Segundo uma lei geral da Natureza, o estado mais estável de um sistema é aquele que corresponde a um conteúdo de energia mínimo. Se o núcleo de um átomo está no estado excitado, ele tende o passar ao seu estado fundamental ou de energia mínima, emitindo o excesso de energia sob a forma de raios electromagnéticos de comprimento de onda muito curto (raios γ).

Os raios α, β e γ exercem sobre os organismos vivos uma influência destruidora, devido ao seu grande conteúdo energético e por isso as substâncias radioactivas são encerradas em câmaras de chumbo e betão.

 

Famílias Radioactivas

Um elemento radioactivo ao desintegrar-se dá origem a um novo elemento, que pode ser estável (e portanto não radioactivo) ou ser ainda radioactivo. Neste caso desintegrar-se-á de novo e tantas vezes sucessivas até chegar a um elemento estável. A este conjunto de desintegrações dá-se o nome de família radioactiva.

Conhecem-se três famílias radioactivas: família do urânio (ou do rádio), família do tório e família do actínio.

Por exemplo, a família do urânio sofre uma série de desintegrações por emissão de partículas α, β e γ até obter um elemento que possui o núcleo estável, o chumbo:

Porém, os núcleos instáveis decompõem-se continuamente e, por isso, seria de supor que actualmente já não existissem elementos radioactivos sobre a terra.

Tal não acontece, pois que certos destes elementos, como o têm uma decomposição muito lenta. Chama-se período de semi-desintegração de um radioelemento o tempo ao fim do qual a sua massa se reduz a metade.

Exemplos: O tem um período de 4.600 milhões de anos; o tem um período de 1 milionésimo de segundo.

/ 38 / É graças à existência de radioelementos de muito longo período que existem ainda hoje os outros radioelementos. Se o rádio não estivesse a ser continuamente produzido pelo urânio, ele já há muito teria desaparecido, porquanto o seu período (1.590 anos) é muito pequeno comparado com a idade da terra.

A radioactividade é uma libertação espontânea de energia atómica. Um corpo radioactivo é composto de átomos cujo núcleo se transforma espontaneamente, emitindo energia sob a forma de radiações.

A energia atómica libertada no decorrer desta transformação corresponde a uma diminuição de massa do elemento.

As partículas α e β emitidas pelos elementos radioactivos são afinal fragmentos de átomos e por isso somos levados a considerá-los como divisíveis e portanto complexos.

A descoberta da radioactividade fez, assim, progredir extraordinariamente as teorias concernentes à estrutura do núcleo dos átomos.

Analisando os esquemas das famílias radioactivas, constatamos que os radioelementos, ao desintegrarem-se por emissão de partículas α, β ou γ dão origem a novos átomos, que nascem e morrem, conforme o seu período de semi-desintegração. Isto constitui a descoberta capital da radioactividade.

O conhecimento da radioactividade modificou todas as noções do químico clássico, pois que, pela primeira vez, um corpo químico puro, por exemplo, o rádio, se transformava, dando origem a outro corpo puro, o hélio.

A este fenómeno dá-se o nome de transmutação: o átomo de um elemento radioactivo transforma-se no átomo de um elemento diferente. Assim, pela primeira vez, aparecia a possibilidade da transmutação da matéria, velho sonho dos alquimistas.

A transmutação artificial de um elemento foi obtida pela primeira vez por Rutherford, em 1919. A radioactividade artificial, processo de obter artificialmente elementos radioactivos, foi descoberta em 1934 por Irene Curie (irmã de Madame Curie) e seu marido Frédéric Joliot.

A descoberta da radioactividade artificial teve enorme importância nos vários domínios da Ciência e a ela nos referiremos no próximo artigo.

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