Prof.: —
Lemos o conto uma meia dúzia de vezes, ou mais. Aquele menino era estranho e o
avô um ser humano excepcional. Só tínhamos dúvidas. Mas o desafio era claro:
— como trabalhar aquele conto com alunos em tudo alheios a formas de dizer e de pensar civilizacionais
um tanto ou quanto estranhas?
No momento, a
nossa primeira preocupação foi a motivação visual para um tipo de leitura
recreativa. Por outro lado, a sugestão de trabalho foi pensada em termos de
alunos não amantes de ler, numa
turma de 10º-11º anos.
Motivação
|
Imagem dum
negrinho sorridente acompanhada pela banda sonora que introduzia a
telenovela da rede Globo “A Padroeira”. (Alguns segundos de observação
e audição.).
Clicando na imagem obterá
a sua ampliação em formato A4, que poderá descarregar para o seu
computador.
Para obtenção da faixa
sonora, clique em descarregar
e indique a pasta local onde a pretende guardar. |
De seguida o professor
fala com os alunos após lhes ter fornecido cópias do conto em epígrafe:
Prof.: —
Apresentei-vos a foto de um negrinho que parece feliz e um trecho musical com
frases de tristeza. Talvez o menino do conto não tenha razões para sorrir: no
seu país (Moçambique) há guerra, há fome, há granadas que explodem sob o chão
e semeiam a tragédia. Esta é, e/ou foi, a realidade recente do povo moçambicano
e angolano, assim como a de outros povos do mundo. E há meninos que não têm
razão para sorrir e o trecho musical apresentado traduz, de alguma forma, essa
melancolia. O autor do conto é natural de Moçambique e, enquanto tal, fala da
sua vivência e da do seu povo.
Convido-vos à primeira
leitura do conto que será individual e silenciosa.
Questões a formular:
—
Vamos agora tentar responder às perguntas
seguintes:
— Que personagens vos
surgiram ao longo da narrativa?
— Qual é, para cada
um de vós, a mais importante e porquê?
— Ao nível da
sintaxe e do léxico como é
que nos apercebemos que o conto não foi escrito
por um autor português? Apresentai exemplos de expressões e / ou de palavras
que vos pareçam mais significativas.
—
Tal facto constituiu barreira para não percebermos
trechos do conto? Sim? / Não?
Qualquer que tenha sido
a resposta, convido-vos a uma segunda leitura.
Convidam-se os alunos a
uma leitura seguida e outras em diagonal, quando necessárias, para responder ao
questionário que segue:
— O negrinho sente um
desejo estranho e, ao confessá-lo, vai afligir a mãe e, posteriormente,
aborrecer o pai. Identifiquemo-lo.
— Ele dá à mãe e,
em seguida, ao pai, uma justificação para sentir como sente. Em que divergem
essas explicações? Pede-se as justificações das respostas, pondo em relevo
expressões
do texto.
— O menino
vai recorrer à vivência e disponibilidade do avô.
Perante o problema do
neto como reage o avô? Da mesma forma que os pais? Em que diferem as várias
reacções?
— Avô e neto fizeram
aparentemente um acordo. Em que consistiu?
— O menino achou-o
exequível? E nós?
Se não, exponhamos as
nossas razões.
Convite a uma nova
leitura do conto, podendo esta ser, agora, já feita em voz alta por um dos
alunos que, normalmente, o saiba fazer com propriedade, focando sobretudo o
momento em que avô e neto vivem a vida em pleno.
— Em que medida a
atitude do menino mudou no contacto íntimo e frequente com o avô?
— Que aprendeu ele e
que, até aí, não tinha aprendido?
— O avô desloca-se a
casa dos filhos e tem com estes uma longa conversa. Qual a expressão do texto
que contém o essencial dessa conversa?
— Por que foi que o avô
terá mandado o menino sair da sala?
— O velho confessa-se
cansado, mas não do cansaço de que os filhos suspeitam —
é um outro tipo de cansaço. Em que expressão do texto esse cansaço é
definido pelo velho negro?
— Sentado frente ao
rio, que simbolizará a vida que se escoa, o correr do tempo, o passar pelo
mundo, mas também a renovação permanente da vida, de muitas vidas, de todas,
de repente algo acontece, algo que o menino, lá longe, em casa dos pais, também
pressente. O que nos parece que tenha sido?
—
Então por que é que o velho confessa ao ouvido do filho que diga ao
neto que ele, avô, lhe terá feito uma promessa não cumprida?
— O
conto é narrado sempre na terceira pessoa. Porém, o último parágrafo,
o que faz a ligação com o título: “O rio das quatro luzes”, surge na
primeira pessoa. Poderemos inferir algo desse pormenor, ou não
lhe atribuir significado algum?
— Reparemos na adaptação
do provérbio que parece funcionar como um subtítulo do conto. Como poderá ser
interpretado, ligando-o, evidentemente, ao assunto da narrativa?
— Será uma narrativa
aberta ou fechada? A justificação da nossa opinião deve estar
de acordo com o que nos pareceu ser o desenlace da mesma.
— O texto é rico em
expressões de discurso semi-directo
ou indirecto livre. Porque terá o autor recorrido tão frequentemente a este
processo estilístico?
— Surgem lindas metáforas
na conversa entre avô e neto. Seria interessante explicar o valor conotativo de
três ou quatro, à escolha.
—
Pede-se a explicação das comparações: “nu como um búzio”; “leve como
lua além da nuvem”; “levinho como ave penugenta”.
—
Por que razão, a seguir a “requereria” nos surge “mui
respeitosamente”?
—
Tentemos interpretar as afirmações: (…) “ criancice é com amor; não
se desempenha sozinha. Faltava aos pais serem filhos, juntarem-se miúdos com miúdos.”
—
As “quatro luzências” que surgem
no rio são símbolos de vida e/ou de morte? Expor todas as hipóteses não
esquecendo, porém, que o povo afirma que “os olhos são o espelho da alma”.
E alma é vida.
Tarefa para casa:
*(…) o menino visitava o avô com ansiedade de
capuchinho vermelho.”
— Explicação do sentido da expressão supra e contar a história do
Capuchinho Vermelho ao contrário, colocando o Lobo no papel de vítima, fazendo
uso dos discursos directo, indirecto— livre
e, evidentemente, indirecto, ao
longo da narrativa.
Aproveitamento do conto para trabalhos complementares:
1
- Recolha de informações sobre a vida e obra do escritor Mia Couto e sobre Moçambique.
2
- Leitura expressiva do conto, após um trabalho prévio de dicção, leitura
que poderia ser dramatizada e apresentada numa sessão com os pais, quiçá até
com a participação de familiares mais disponíveis.
3
- Na sala de aula, treino para uma leitura em voz alta, seguida, de imediato, da
competente ficha de correcção em que todos os alunos participassem como intérpretes
e críticos.
4
- Apresentar de novo o conto, porém, agora, com um trecho intruso, para testar
se os alunos reconheciam o estilo de Mia Couto.
5
- Fazer recolha de outros contos, ou lendas populares, que apresentassem relações
privilegiadas entre um/a avô/avó e neto/netos.
6
- Inventar um outro final para o conto, caso este não tenha agradado.
Proposta
de M.ª Helena Marques da Silva -
Novembro de 2002 (8º B)
|