Acerca da revista "Turismo" e sua reconversão

Se hoje podemos dispor desta interessante e valiosa colecção dedicada ao distrito de Aveiro e publicada entre Janeiro e Fevereiro de 1943, devemo-lo ao colaborador deste espaço comunitário, Rui Teixeira, e muito especialmente a um seu antepassado, o seu avô, de nome Abílio João Pinto. Segundo Rui Teixeira, o seu avô, que ele não teve o prazer de ter conhecido, foi tipógrafo na Minerva e Gráfica Aveirense, tendo arquivado várias publicações do seu tempo e tido o cuidado de encadernar esta colecção de revistas.

Este volume encadernado tem o mérito de nos fornecer uma panorâmica bastante completa acerca do distrito de Aveiro, mostrando-nos aspectos de uma realidade actualmente inexistente. Haverá ainda alguém, neste século XXI, que saiba que, outrora, em Anadia, existiam diferentes tipos de minas? Alguém actualmente consegue imaginar as nossas povoações, cidades e vilas, com uma reduzida circulação de veículos puxados por juntas de bois? 

Publicada num período conturbado da História deste planeta em que vivemos, porque se estava em plena II Guerra Mundial, a revista "Turismo" dá-nos a conhecer um Portugal do qual, no nosso caso pessoal, guardámos uma pequena mas forte lembrança, já que nascemos em 1945, por altura do Natal, quando esta II Grande Guerra tinha chegado ao fim, pelo menos nesta parte do planeta, mas ainda activa, durante mais algum tempo, na região do Pacífico, após o ataque japonês à base americana de Pearl Harbor. Este período bélico do nosso planeta só terminou pouco tempo depois, após a primeira utilização da energia atómica como fonte de destruição sobre duas cidades do Japão, Hiroshima e Nagasaqui.

Dissemos, no parágrafo anterior, que guardámos deste período após 1945 uma pequena mas forte lembrança, porque a minha infância foi vivida entre Espinho e Aveiro. E ao folhearmos esta revista, ainda antes de a termos reconvertido para o formato HTML, uma breve passagem dos olhos por diversas páginas da revista, mesmo as de índole publicitária, tiveram o condão de nos fazer despoletar memórias que há muito julgávamos apagadas. E, talvez por isso, a leitura e o trabalho de reconversão foi para nós como que uma analepse, que nos fez reviver momentos de uma vida passada. Não foi por acaso que tivemos a trabalheira de criar um índice onomástico, para além dos índices tradicionais, como são o alfabético de conteúdos e de autores. Alguns daqueles nomes voltaram à minha memória. Lembrei-me de os ter ouvido pronunciar por outras pessoas, durante a minha estadia de cerca de 16 anos em Espinho. Por exemplo, o nome do presidente da Câmara Municipal, mesmo após a sua passagem pela edilidade espinhense, lembro-me que era, vários anos volvidos, ainda considerado com elevado respeito e admiração por muitos espinhenses. Lembremo-nos que, naquela época, ser presidente de uma câmara não era como hoje um «tacho», do qual os nossos actuais políticos se aproveitam para incluir familiares e amigos a mamar à custa do Zé Povinho. Ser presidente de um município era um cargo não remunerado, para o qual só iam aqueles que verdadeiramente queriam servir a «coisa pública».

Mas não falemos de coisas tristes e deixemos de ser «má língua». Vejamos antes o que outros pensam acerca deste período. Na falta de um historiador isento e capaz de analisar os tempos passados de modo sério e rigoroso, vejamos, enquanto outras não nos chegarem, a opinião do nosso colaborador mais recente do espaço «Aveiro e Cultura».

«Quanto ao percurso do exemplar concreto passámos a transcrever uma informação do actual herdeiro desta colecção encadernada o  que dizer? Os miúdos são curiosos. Eu e o meu irmão não fomos excepção. Essa volumosa encadernação despertou a nossa "cobiça". Estava arrumadinha mas não inacessível. Folheámos, lemos algumas coisas, rasgámos outras. Atempadamente arrumada pelos adultos lá de casa, sobreviveu. A minha avó e a minha mãe sempre a procuraram estimar, em conjunto com outras recordações do meu avô, Abílio João Pinto. Falecido precocemente, não o conheci. Sei que foi tipógrafo (Minerva e Gráfica Aveirense, salvo erro), arquivou algumas coisas que o tempo tornou interessantes. A encadernação demonstra a estima que teve pela publicação. Também gostava muito de cinema e foi dedicado pescador lúdico. Pelas fotografias, parece ter sido pessoa convivial e bem disposta. Mas a chamada "angina de peito" impôs-se em 1963. Tinha 54 anos de idade. E nada mais sei.»

Em parágrafo de um outro texto resultante da minha troca de e-mails com Rui Teixeira, eis o que ele nos diz acerca desta revista: «...Segundo os "especialistas", os temas que apresenta são recorrentes, reforçando o conceito de regionalismo, aliado ao de identidade nacional, em consonância com o espírito da época (turistização do território, propaganda, etc.). O acervo de colaborações é impressionante, bem como o escopo da ambiciosa divulgação da região

Diz-nos Rui Teixeira que «O acervo de colaborações é impressionante». De facto, muitos dos nomes que assinam alguns artigos eram já nossos conhecidos, desde há algum tempo. Se consultarmos o índice alfabético de autores e os restantes índices de outras publicações actualmente existentes no espaço «Aveiro e Cultura», poderemos verificar que eram habituais colaboradores de outras revistas, tais como, por exemplo, "Aveiro e o seu Distrito" e o "Arquivo do Distrito de Aveiro".

Pondo de parte questões de índole histórica e memórias avivadas, pelo menos aos leitores da geração de 40 (1940), façamos uma breve apreciação desta versão interactiva da revista "Turismo" de 1943.

Ao dizermos «versão interactiva», estes dois vocábulos são desde logo um poderoso significante, pelo menos para aqueles que estão mais familiarizados com as novas tecnologias de carácter informático. Aliás, vamos até um pouco mais longe. Haverá, quase chegados a metade da segunda década do século XXI, alguém que ainda não saiba o que significa o vocábulo «interactividade»? Haverá, no mundo ocidental, ainda quem não saiba o que é um telemóvel, uma tablete ou um computador? Pelo menos, telemóveis quase toda a gente, nos dias de hoje, utiliza com mais frequência do que uma caneta para escrever.  Dentro de algum tempo, não me admirará nada se tivermos de fazer acompanhar um jovem que passeia na rua por um guia para o desviar dos obstáculos, porque o pessoal de agora, jovens ou menos jovens, vai de tal modo absorvido a olhar para o pequeno ecrã do telemóvel ou a clicar nas teclas que tem na extremidade dos dedos que, frequentemente, temos de nos desviar nos passeios, para que eles não choquem connosco.

Para aqueles menos familiarizados com as novas tecnologias, atrevemo-nos a dizer que esta característica das páginas da revista electrónica consiste no facto de a maior parte dos objectos colocados à frente dos olhos reagirem à passagem do cursor do rato sobre eles. Significa isto que, além dos botões de navegação colocados no final das páginas, que nos permitem folhear a revista tal como se a estivéssemos a consultar em formato impresso, o cabeçalho e a maior parte das fotografias permitem, ao clicarmos sobre eles, ir para outras páginas ou observar as imagens de forma ampliada e com a qualidade razoavelmente melhorada em relação aos originais. E a qualidade seria ainda melhor, se pudéssemos ter acesso às fotografias originais. Mas haverá alguém que ainda hoje as detenha e esteja na disposição de as emprestar por breves momentos, para uma digitalização em alta resolução? Se isto por ventura vier a acontecer em tempo útil em que ainda por cá andemos, elas serão melhoradas. Mas, como dizia um antigo mestre de Linguística da Universidade de Coimbra: «o óptimo é inimigo do bom!»

Para aqueles que não gostam de ler, mas habitualmente se deixam fascinar pelas imagens, aconselhamos a consulta do «Índice da Galeria de imagens». Com um reduzido esforço, ficarão com uma ideia dos conteúdos e, quem sabe, talvez com vontade de folhear os fascículos da revista e ler os respectivos conteúdos.

Por aqui nos ficamos. Para melhor aquilatarem das vantagens da «interactividade», folheiem as páginas digitais e façam uma viagem ao nosso passado, prestando atenção às mudanças do cursor do rato, quando ele passa sobre os objectos: imagens e hiperligações eventualmente disponibilizadas ao longo do texto. Todavia, antes de darmos por concluído este texto, não podemos deixar de aqui registar o nosso agradecimento a CIEMar, Centro de Investigação e Empreendedorismo, na dependência do Museu de Ílhavo, pela ajuda prestada, o que permitiu, através do nosso colaborador, completar esta colecção de revistas com as páginas que estavam em falta.

Aveiro, 6 de Novembro de 2022

Henrique J. C. de Oliveira

 

 

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06-11-2022