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Uma revisão com currículo |
opinião de cruzado
Arsélio Martins
Da memória persistente ...
Em democracia, cada pessoa conhece a melhor
solução para cada problema e é, por isso, que raramente cada
pessoa se reconhece nas decisões que se tomam mesmo quando para
elas concorreram. À medida que a participação democrática se
aprofunda e influencia as decisões governativas, mais difícil se
torna que os pareceres de fundo científico apareçam como
determinantes exclusivos das decisões.
Em questões da educação, ainda é mais
problemática a influência de algum sector de opinião em
especial, já que o assunto interessa a toda a gente e
parece que todos sabem do assunto, tanto teórica como
praticamente.
A revisão curricular do ensino secundário foi,
com alguma propriedade, nomeada como revisão participada. O
Departamento do Ensino Secundário (ou seja, o Ministério da
Educação do Governo de Portugal) lançou a sua discussão na
segunda metade da década de 90 com vista a obter decisões
teóricas por volta do ano 2000 e aplicações ao sistema após
2002. Em todo o país e ao longo do tempo, foram realizados
encontros juntando escolas e restantes membros de comunidades
educativas, por iniciativa do DES. Não houve organização escolar
(pública ou privada) e comunidade educativa a quem não tivesse
sido reclamada participação e opinião. Foram também ouvidos os
parceiros sociais, em várias ocasiões e por diversas razões:
Associações de Professores, de Estudantes e de Pais, Sindicatos,
Federações e Confederações, Ordens, Associações e Sociedades
Científicas e Profissionais, Universidades, Institutos
Superiores Politécnicos, etc. Também se realizaram conferências
com especialistas portugueses e de vários países da Europa. Os
documentos foram saindo e não consta que se tenham levantado
entraves a reuniões de iniciativa independente do governo, que
se tenham desprezado em absoluto contribuições de eventuais
interessados, (...) Houve apoio a muitas iniciativas autónomas e
os resultados sempre estiveram ao alcance da vista desarmada.
Apesar disso tudo, muitos especialistas entendem
que não houve discussão suficiente, que os resultados ficaram
muito aquém do que se podia esperar, que não se resolveram os
problemas fundamentais do ensino, que uma revisão curricular é
outra coisa,
...à razão da memória volátil
Lembramos que não se trata agora de uma reforma
do sistema educativo, mas tão só de ajustamento dentro de uma
reforma iniciada nos anos 80, mas que a nível dos planos
curriculares só teve aplicações generalizadas a partir de 1993.
Lembramos ainda que já houve pequenos ajustamentos aos planos
curriculares previstos nessa reforma.
Feito isso, não nos apressamos a concordar com
todos os defeitos que são apontados às decisões sobre a revisão
curricular. Muitos dos participantes nas discussões, entre os
quais eu, mesmo sem querer pensam que a revisão curricular
deveria ser o que não é.
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Mas sabemos que, quando devíamos ter estudado e
dado opinião estávamos ocupados com outras coisas mais urgentes(?),
quando nos questionávamos sobre o modelo estávamos presos ao
modelo em vigor, quando uma novidade aparecia levantámos dúvidas
sobre a exequibilidade nesta organização escolar e com estes
professores, etc. O tempo e a habilidade que nos sobram para
discutir a decisão final faltaram-nos para ajudar na construção.
E sabemos que as decisões negociadas sobre educação levaram em
conta parceiros que só podem construir ou aceitar que se
construa sobre o modelo pré-existente, mesmo quando o criticam.
Não estamos a falar só de pais ou encarregados de educação.
Também os professores e as suas organizações, embora criticando
a actual situação, não aceitam naturalmente mudanças que os
obriguem a novas práticas, funções, formas e ritmos de trabalho.
E temos os diversos sectores de opinião científica e educacional
que raramente conseguem situar-se no campo do interesse geral e
se refugiam em campos estreitos, quer do ponto de vista
disciplinar quer do ponto de vista dos profissionais que pensam
representar. A decisão final modera esta diversidade de
interesses, tão dificilmente quanto é certo existirem interesses
contraditórios em jogo e haver contradição entre os parceiros
sociais e as próprias intenções do governo. A discussão pode ter
sido pobre e insuficiente. Se faltou riqueza essencial à
discussão, sobrou riqueza na diversidade de pobres contradições.
A forma como decorreu o debate ao longo do tempo
contrastou com a surpresa perante a decisão. Algumas
intervenções feitas fizeram-nos suspeitar que muitos
intervenientes já se tinham esquecido de si mesmos.
As políticas em educação são sempre lentas, para
o longo prazo. Por um lado, demoram tempo a acertar-se no
concerto da quase totalidade dos interesses sociais (a educação
afecta tudo e todos e diz respeito a tudo e a todos). Demoram
tempo até terem uma aplicação generalizada ao conjunto ou ao
sector respectivo, sendo que uma aplicação de papel não é uma
aplicação ao nível das práticas. Muito mais tempo ainda
penaremos até saber se elas são certas ou erradas. É certo que
qualquer decisão política de vulto passa por vários ministros na
elaboração, concepção e aplicação e qualquer destes vai estar
reformado quando o processo iniciado der frutos (saborosos ou
não). Pior ainda: a aplicação prática vai sempre pedir
ajustamentos sucessivos que podem desfigurar o proposto e
permitir aos responsáveis sacudir os resultados apurados (quando
negativos) para políticas diferentes das inicialmente propostas.
Se pensarmos no processo do ponto de vista dos
estudantes, é seguro que os estudantes que participaram
activamente nas primeiras discussões desta revisão já serão
licenciados e os que vivem o momento da decisão dizem que não
foram ouvidos antes e pedem a suspensão da decisão política que
até é para ser aplicada a outros que ainda não se preocupam com
isso. Aliás, estes jovens que contestam as decisões para o
futuro nunca poderiam ter sido ouvidos sobre o sistema em que
eles mesmos se inserem e contestam (tanto na permanência como na
mudança).
Os estudantes só têm razão por não haver um
processo contínuo de informação que faça as pontes. Não têm
razão quando dizem em abstracto que os estudantes não foram
ouvidos ou quando não "fazem" a distância que os separa dos
outros que virão e serão diferentes (os professores podem ser
diferentes; os alunos podem ser diferentes) e presumem que o que
é hoje (do que querem e do que recusam) vai manter-se amanhã.
Mais tarde, podem vir a fazer o louvor do seu tempo lamentando
que a eternidade não tenha conservado os seus valores
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e o exemplo do seu tempo – não pensam na juventude dos outros,
só querem a sua de volta.
Da ninharia das grandezas....
Há quem diga que uma revisão curricular para o
ensino secundário só pode ser feita a partir de novas definições
claras: nova identidade feita com finalidades separadoras e
novos papéis, novas identidades feitas de competências em acção
para os actores (instituições e agentes) que vão representar os
papéis, ... Dificilmente se aceita que uma revisão não seja mais
do que a revisão de um segmento do sistema. O pensamento comum
estabelece que há uma dependência estreita entre todas as
questões e os executantes das acções, como se o sistema
existente estivesse construído de tal modo que as instituições e
os actores só para ele existissem e fossem incapazes de adequar
a sua acção a novas ideias e novas práticas. Os mais optimistas
aceitam algumas mudanças condicionadas a acções que as suportem,
desde novos esquemas de administração até sistemas de formação
prévios à aplicação das mudanças.
Sabemos que a revisão curricular é feita dentro
de um sistema que está mais em reparação que em mudança. Se
pensarmos na qualidade e quantidade das ideias feitas sobre
educação e escolas, no sistema de emprego (quase exclusivo para
licenciados em ensino e de recurso para todos os outros que não
encontram emprego compatível) em que o sistema público de ensino
se transformou (com quadros de afectação... a cada uma das
escolas) prevemos que tipo de transformações é possível realizar
sem uma revolução.
Todos os debates que antecederam a decisão sobre
a revisão curricular, desde os encontros regionais até à
conferência internacional de Évora, tiveram como pano de fundo
tais constrangimentos à decisão política.
O papel activo nas negociações dos sindicatos
profissionais, das associações de pais e de estudantes, fez-se
representar com todos os medos perante as mudanças. Os
sindicatos vieram esclarecer que os professores e os
funcionários não docentes não podem assumir novos papéis sem os
aceitarem e não os aceitam enquanto não se reunirem condições de
formação. Mas vieram também trazer para a decisão todos os medos
e desconfianças perante a possibilidade das mudanças na
identidade do ensino secundário significarem discriminações dos
filhos das classes trabalhadoras no acesso ao ensino superior. E
nisto foram apoiados pelas intenções dos pais, dos estudantes e
de muitos estudiosos da questão social.
Uma das discussões básicas tem sempre a ver com a
diversificação dos fins do ensino secundário que não tem sido
mais do que a passagem entre o ensino básico e o ensino
superior. E é neste campo que se perdeu mais. O ensino
secundário continua a ter uma só finalidade teórica e continua a
ser a vida real a determinar as outras finalidades sem que o
ensino secundário possa participar na formação de jovens que
serão empurrados para a vida profissional activa, apesar de
todas as boas intenções que enchem este inferno secundário. Na
discussão, mantém-se uma desqualificação do ensino tecnológico
em geral em vez de uma tentativa séria de criar teoria e novas
práticas do sistema para enfrentar a realidade.
Neste campo, as organizações escolares (que são
ainda organizações de professores) farão o resto. Procurarão ler
o que já existe (e falhou) no novo articulado e defenderão os
cursos que lhes permitam fazer durante mais tempo a mesma coisa.
E farão com que, no fundamental, tudo seja a mesma coisa sob
novos nomes.
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As tentativas sérias para uma nova definição do
ensino secundário ficam ainda pelas declarações. O ensino
secundário continuará a ser a generalista porta do abstracto
ensino superior e tudo o que é ensino profissional ou artístico
continuará com perspectivas de uma vidinha à parte com mais
propaganda que vida vivida.
Mas há mudanças, ainda que mitigadas, neste campo
da identidade, que podem e devem ser aproveitadas para começar a
sair da actual situação e criar condições para que as futuras
melhores decisões sejam consentidas pelo conjunto da sociedade.
Tudo foi assim, sempre foi assim, mas pode ser diferente.
Outra forma de ver o ensino e a escola tem de ser
mostrada e demonstrada para as gerações que nunca conheceram
outra forma de ser escola.
As declarações de mudança sobre os cursos gerais
e os cursos tecnológicos mostram à evidência que há, no actual
sistema, falhas que é preciso corrigir. Algumas delas terão a
ver com total desadequação dos cursos para os fins sociais à
vista.
As declarações sobre a necessidade de criar
módulos de remediação para obviar as dificuldades na transição
do básico para o secundário, denunciam que há problemas e é
necessário encontrar novas formas para o 10.º ano e para o
conjunto do ensino secundário.
A necessidade estabelecida de falar de estudo
acompanhado e em diminuir as cargas lectivas revela que se
compreende que há uma fraqueza fundamental no sistema de base em
aulas e nas actuais relações pedagógicas ou que estas, por si
só, não cumprem o papel que da escola se espera. Os professores
têm novos graus de liberdade para a sua acção e podem viver
novos papéis fora da sala de aula.
A necessidade consentida de falar de disciplinas
de projecto (atribuídas a um ou mais professores) revela que a
"área escola", integradora de saberes, falhou ou que os
professores do ensino secundário estão longe de saber trabalhar
em projectos fora do ambiente da sala de aula e da sua
disciplina e estão longe de saber trabalhar em equipa.
A necessidade consentida de procurar novas vias
para o ensino de Português e a necessidade de diversificar a
Matemática que se ensina vem denunciar que a situação de igual
ensino para todos talvez tenha sido um molde para a
desigualdade, uma forma de discriminação disfarçada sob o manto
igualitário.
Ainda não se sabe qual a profundidade das medidas
consequentes a essas constatações. Mas sabe-se que tais
constatações não podem deixar de se converter em mudanças nos
novos programas de ensino.
É verdade que muitas destas desejadas mudanças só
têm sentido se forem apropriadas pelos professores.
Mas é verdade que, apesar dos actuais horários
lectivos, os professores aparecem cansados e desmotivados para
as actuais práticas docentes e mais ainda para as pequenas
experiências. O que aconteceu com as propostas de actividades
para as interrupções lectivas nas escolas é disso prova
bastante. Esta escola cansa. Quem sabe se uma mudança nas
práticas escolares não alteraria este estado de enfado cansado
dos professores? O que será preciso mudar no sistema e nas
organizações escolares? O que será preciso mudar na imagem das
escolas? O que será preciso mudar na sociedade? É só a escola
que está cansada de ser o que é?
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… À grandeza das ninharias
É verdade que não encontramos as grandes
alterações de política nas grandes declarações. Mas elas
existem, com certeza. Se elas não existissem, como explicar as
grandes manifestações contra as mudanças?
Quase podemos dizer que são as pequenas ninharias
que carregam a grandeza das verdadeiras mudanças.
Os pés pelas mãos
Em teoria todos concordam que o actual formato
das aulas a uma só voz é mais gerador de ruído que de criação e
troca de saberes. E todos concordam que essa situação tem de ser
alterada. Todas as conversas nos corredores da pedagogia
concordam na necessidade de fazer dos estudantes participantes
activos na construção do saber.
A um professor de pé (ou sentado a uma secretária
elevada até ser púlpito) que baseia a sua autoridade na matéria
da parte da sabedoria ou que domina e impõe o que se chama
disciplina, resistindo à passividade de ouvintes sentados, os
estudantes opõem e impõem a matéria de que são feitos os sonhos
e a que se chama indisciplina. Já não é o professor o único
veículo da sabedoria que apregoa nas aulas e já não é seguro que
ela seja um bem apetecível. E é verdade que as escolas são
habitadas por uma massa de estudantes longe do saber escolar por
falta de expectativas sobre a sua utilidade ou por afastamentos
ainda mais radicais. Já não há respeito – é o que dizem. E é
verdade, só que é duplamente verdade. Os estudantes já não
nutrem qualquer respeito temeroso perante professores que não os
respeitam e lhes dão menos instrumentos de compreensão e
transformação do real actual e mais descrições do que aconteceu
ontem com recurso a meios desadequados e obsoletos.
Todos concordam que é preciso passar o estudo
para um novo formato e, principalmente, fazer passar os
estudantes para o lado da disciplina – como cons–tru–to–res
ou fazedores de saber, como seres que tanto precisam de sermões
como de tentativas de compreender, errar e acertar, de fazer
experiências, de debater, de... Os estudantes precisam mais da
companhia de professores do que dantes, mas estes não podem
substituí-los em toda a procura e recolha de informação, nem
podem obrigá-las a fazer essa procura e a trabalhar na
construção do saber com a tecnologia que se usava e já não é
mais do que uma entre milhares de novas e mais potentes
tecnologias presentes em todos os aspectos da vida quotidiana.
Todos se queixam que a duração das aulas actuais
não permite o trabalho autónomo dos estudantes em ambiente de
sala de aula, muito menos permite que seja facultado aos
estudantes o uso de tecnologias (computadores, por exemplo), a
realização e a apresentação de trabalhos sérios, etc. E se é
verdade que todos – estudantes, professores e pais – se queixam
do mesmo, não é menos verdade que se criam movimentos contra a
alteração da duração dos tempos lectivos.
À proposta de aulas de 90 minutos todos se opõem
porque não vislumbram ou não querem vislumbrar qualquer
alteração das práticas, antes insistem em ver o dobro da
desgraça actual.
Esta medida está conjugada com alterações das
práticas previstas nos programas. Sem aulas com duração superior
à actual, todos os programas de ensino que falem de iniciativas
de trabalho autónomo para os estudantes ou de
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introdução de novas tecnologias em ambiente de sala de aula
estão condenados a não serem cumpridos no essencial das práticas
que preconizam.
Defende-se aqui que as aulas de 90 minutos (podia
mesmo ser mais tempo) constituem uma primeira possibilidade para
obrigar a romper com o velho círculo da "seca" para os alunos e
“tensão" esgotante para os professores, criando novos ambientes
de trabalho cooperativo do lado mais luminoso da vida escolar –
como participantes construtores de cada disciplina organizadora
de saberes.
Descansam mais os estudantes que, não tendo que
fazer enormes esforços de concentração para ouvir exposições,
podem verdadeiramente trabalhar e mais concentrados, porque em
menos temas cada dia. Descansam mais os professores, que
preparam aulas de trabalho para os outros com pequenas
exposições e não esse trabalho inglório de exposição contínua (à
recusa do público que os devia ouvir).
Dois ou três?
Uma outra medida desta revisão curricular que
deve ser apoiada vivamente tem a ver com a divisão, para todos
os efeitos, do ano escolar em dois períodos (semestres?). É uma
medida que vai diminuir muita da pressão feita sobre os
professores. As classificações propostas pelos professores das
disciplinas assumem uma grande importância para a generalidade
dos estudantes e particularmente para as famílias dos estudantes
que pretendem prosseguir estudos superiores.
Sob vigilância apertada de pais e encarregados de
educação (quase sempre incapazes de questionar os métodos de
ensino e o ensinado, quase sempre capazes de questionar notas)
os professores e os estudantes perdem de vista a avaliação como
auxiliar do ensino e da aprendizagem e trocam-na por um conjunto
de provas produtoras de seriação de alunos.
As indicações dos programas sobre o papel da
avaliação e a diversidade dos instrumentos de avaliação não têm
sido outra coisa do que indicações de papel.
A necessidade de produzir classificações
numéricas para estudantes e pais num prazo de dois a 3 meses tem
prejudicado claramente as intenções dos professores, que
pretendem criar relações com os estudantes na base de uma grande
diversidade de actividades a serem devidamente apreciadas e
consideradas na avaliação e classificação.
Há pouca pressão para a concretização do trabalho
de ensino e aprendizagem (em que a avaliação se inclui). Há
muita pressão para obter dados sobre o desempenho e localização
na escala (0 a 20), isto é, para a realização de provas que só
podem ser constituídas por perguntas (a maior parte de baixo
nível).
A mudança para dois períodos vai permitir uma
respiração pausada no que à avaliação respeita e é possível que
os professores possam propor e apreciar os diversos tipos de
trabalho (mais ou menos complexos, com diversas durações de
execução) e não só contar (as certas e as erradas) respostas
curtas a perguntas curtíssimas.
Mais tempo para cada aula e mais tempo para viver
o ensino são condições fundamentais de uma mudança para melhor.
São as duas ninharias que podem constituir as duas primeiras
grandes alterações a um sistema de escolas organizadas para as
aulas expositivas e para os testes selectivos (ao nível mais
baixo). Esta organização escolar foi feita para a educação
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de elites e manteve-se, sem alterações, para o ensino de massas.
Há quem pense que estas duas pequenas medidas
constituem a alteração mais radical que já se fez ao nível da
escola, obrigando a mudanças nas práticas docentes ao mesmo
tempo que obriga a mudanças das próprias escolas.
As mãos com dedos de pés
Mas já havia disciplinas práticas com aulas de
duração superior aos 50 minutos. O que é que há então de novo?
Não eram as disciplinas práticas que sofriam do
mal das aulas expositivas. A alteração está em que a totalidade
das disciplinas passa a ter aulas de 90 minutos, especialmente
aquelas que nunca foram abordadas com aulas práticas. Aliás,
sendo as práticas experimentais integradas, muitas disciplinas
práticas (que se foram transformando em teóricas desdobradas ou
em prática sem teoria) vão deixar de existir. Muitas dessas
disciplinas que nasceram por obra das mais puras intenções não
foram outra coisa senão "mãos com dedos de pés".
Há ainda outras deformadas intenções, outras
"mãos com dedos de pés": área-escola, mal praticada;
desenvolvimento pessoal e social (?) impraticável; educação
sexual (?); educação moral e religiosa de várias confissões;
etc.
Outras propostas importantes vão no sentido de
prevenir deformações e influenciam mudanças nas organizações
escolares e nas práticas dos professores. Assim venham a ser
decisões devidamente transformadas em aspectos da vida prática.
À aparente diminuição (concentração) das cargas
lectivas opõe-se o acréscimo em actividades obrigatórias (?)
fora da sala de aula. As actividades de estudo acompanhado
obrigarão às escolas a procurar nova organização dos espaços
para actividades diferentes das aulas. Começa a perceber-se que
não basta ensinar, que não basta dar os livros, que não basta
propor trabalhos – é preciso ensinar e aprender a estudar, a
procurar a informação e a tratá-la, é preciso seleccionar de
entre o todo disponível o que é preciso para cada situação....
Para as escolas e para os professores há uma nova
oportunidade de dar a conhecer as outras escolas que a escola
pode ser.
E estes espaços de novas intervenções são
vulneráveis à acção da comunidade educativa. Nas escolas de
hoje, com todos os espaços preenchidos por actividades bem
espartilhadas por programas a cumprir, não há espaços nem tempos
para a acção formativa da comunidade de pais e encarregados de
educação. Novos espaços para novos tipos de funções – novas
possibilidades para motivar interacções com a comunidade, de
mobilizar para a acção em ambiente escolar as competências dos
pais e encarregados de educação ou outros interessados no
processo educativo dos jovens.
O "estudo acompanhado" pode motivar o trabalho de
colectivos de professores da escola. Uma das grandes
dificuldades dos professores reside na incapacidade de trabalho
em projecto e de trabalho em equipa.
A disciplina de Projecto vai no sentido da
integração de saberes e do trabalho em equipa. Algumas decisões
sobre a Educação Sexual (que resiste a ser um par
"disciplina/professor") também parecem apontar para a formação
na
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base de intenções diversificadas e não na especialização (sempre
redutora para assuntos que não podem ser reduzidos a qualquer
das suas dimensões).
A revisão como forma de vida
Procurámos levantar algumas questões relacionadas
com a revisão curricular participada, ao mesmo tempo que
consentimos as suas limitações como ajustamento fundamental e
tendencialmente reparador ou regenerador do ensino secundário.
Não quisemos fazer um estudo neutro da decisão
sobre a revisão curricular. Exprimimos uma opinião pessoal e
defendemos veementemente as medidas que consideramos boas e
potenciadoras de verdadeiras mudanças com sentido positivo.
Viver na perspectiva da revisão não exige
preparação para enfrentar e vencer novos desafios. Trata-se
simplesmente de estar vivo num mundo em mudança e saber que o
nosso currículo (de sobrevivência) tem de ser adequado à vida
num país desenvolvido em que novos conhecimentos e novas
técnicas surgem no dia a dia e em que as tecnologias de
informação e comunicação ocupam todas as esquinas do nosso
mundo. Trata-se de viver o nosso tempo no nosso tempo.
Arsélio Martins
Referências:
Os documentos publicados pelo Departamento do
Ensino Secundário, que acompanharam e fizeram parte do processo,
definem e esclarecem o âmbito da decisão política na matéria,
reflectindo as dificuldades e limitações mas também as virtudes
desta importante revisão em marcha. Para melhor enquadramento,
juntem-se programas de governo, documentos orientadores de
política do Ministério da Educação e respectivos pareceres do
Conselho Nacional de Educação. Sobre os movimentos e a
contestação, leiam-se os jornais diários e semanários de 2000.
Aqui ficam apontados os documentos principais do Departamento do
Ensino Secundário.
DES(1998). O Ensino secundário em debate:
Reflexões de Escolas e de Professores. Lisboa: ME/DES.
DES(1998). O Ensino secundário em debate:
Análise das consultas aos Parceiros Educativos. Lisboa: ME/DES.
DES(1998). Ensino secundário: Ajustar para
consolidar. Lisboa: ME/DES.
DES(1999). O Ensino secundário em debate:
Ciclo de Conferências. Comunicações. Lisboa: ME/DES.
DES(1999). O Ensino secundário em debate:
Projectar o futuro – Políticas, Currículos e Práticas.
Lisboa: ME/DES
DES(2000). Revisão Curricular no Ensino
Secundário: Cursos Gerais e Cursos Tecnológicos. Lisboa: ME/DES
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