Autonomia
Autonomia, o que é? A prática do auto-governo por parte
das escolas, através da transferência de competências dos organismos
centrais e regionais para as comunidades educativas. Mas também... O
exercício das competências próprias de cada um dos actores do processo
educativo, sejam eles alunos, professores e restante parte do
funcionalismo, sejam a comunidade envolvente (famílias, autarquias,
empresas, ...).
A autonomia em relação à tutela é sempre relativa – ao
Estado, nos diversos subsistemas do ensino público caberá sempre a
definição dos para o ensino público. Às escolas caberá criar os
mecanismos necessários à concretização dos objectivos definidos
superiormente, mas também a definição de objectivos próprios.
A autonomia deve ser contratualizada, por isso mesmo
entende-se que deve haver diferentes graus de autonomia nas diferentes
escolas secundárias do país. O contrato obriga cada escola, mas também
exige da parte da tutela um constante acompanhamento que deve ser, acima
de tudo, construtivo.
A autonomia é uma construção progressiva – entende-se não
haver lugar para uma autonomia decretada, até porque a ordenação
jurídico-política foi criando modelos de autonomia sem adequação com a
realidade. A autonomia é sempre um ideal a atingir. E nesta perspectiva
ela nunca estará completa, porque estaria, então, cristalizada.
A autonomia depende também do sistema de gestão que vier
a ser implementado, passada que estiver esta fase de indefinição É
conveniente que um novo modelo de gestão, que forçosamente vier a tomar
o lugar dos dois actualmente em vigor, seja suficientemente flexível
para se adaptar a realidades diferentes. Esse novo modelo de gestão deve
possibilitar o reforço da capacidade dos órgãos de cúpula, para lhes
permitir exercer uma autonomia diferenciada consoante os casos, mas deve
sobretudo reforçar as lideranças intermédias, principalmente no caso dos
directores de turma. A sua posição deve ser sobrevalorizada, devendo-se
caminhar para director de turma e alunos terem uma hora comum no
respectivo semanário-horário.
A autonomia passa também pela formação de melhores
gestores, quer ao nível das direcções das escolas, quer ao nível
intermédio. Reconhece-se que, particularmente ao nível da direcção, se
possa passar por um certo constrangimento da gestão democrática, isto é,
pode passar pela possibilidade de restringir o direito de candidatura à
existência de certos requisitos. Ao nível das lideranças intermédias
supõe-se a existência de mais e melhor oferta de formação nestas áreas.
Finalmente, nestes considerandos iniciais, reconhece-se a
necessidade de caminhar a passos largos para uma certa cultura de
escola. Sendo um conceito proveniente do universo empresarial, a
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escolares pode não ser fácil. Mas temos que reconhecer que,
implicitamente, as escolas têm vindo a adquirir uma cultura própria que
as diferencia e que as põe, por vezes, em competição. O que nem sempre é
positivo.
Uma cultura de escola deve ter um rosto, uma imagem para
o exterior, o seu projecto educativo. Este, cuja construção não é fácil
mas deve ser urgentemente assumida, tem vários aspectos a considerar:
– em primeiro lugar, é um projecto a médio prazo que deve
envolver a comunidade local e deve obrigar a um novo conceito de escola:
a escola como comunidade educativa;
– em segundo lugar, deve estabelecer uma filosofia de
escola, estabelecendo estratégias para atingir objectivos propostos;
– em terceiro lugar, deve suportar todos os pequenos
projectos de que se faz uma escola.
Por último, nunca esquecer que o projecto educativo deve
criar as condições para o sucesso e será sempre o modo adequado para o
exercício de uma verdadeira autonomia: a autonomia construída.
Vejamos agora como se têm (ou não) exercido diferentes
aspectos da autonomia das escolas. E deve salientar-se que já há espaços
para o exercício da autonomia.
autonomia administrativa
– Pondo em relação a escola com os serviços centrais do Ministério e com
as direcções regionais, ela será sempre mitigada. Há, no entanto,
possibilidades de desburocratizar procedimentos e nem sempre estar a
perguntar para Lisboa ou Coimbra como agir.
autonomia financeira
– Verdadeiro óbice para o exercício das autonomias pelo espartilho a que
as escolas estão submetidas. Urge transferir competências ao nível da
gestão orçamental; possibilitar gerar e gerir receitas próprias;
possibilitar, em certos aspectos, a gestão autónoma do seu património.
autonomia cultural
– Este será um dos níveis em que escolas têm, de facto, gerido as
franjas de autonomia que a lei lhes confere. Mas também este é um dos
níveis de actuação em que a (falta de) autonomia financeira limita a
acção das escolas.
autonomia a nível dos "currículos"
– Pensamos que a nível das formações geral e específica não há grandes
razões para promover a autonomia. As escolas, através dos seus
departamentos ou dos seus grupos disciplinares, já têm autonomia
suficiente a nível da execução programática. É desejável, por outro
lado, que na formação técnica e na área escola haja uma crescente
autonomia das escolas.
autonomia a nível dos recursos humanos
– Pensamos que urge desburocratizar a contratação
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pertencente aos quadros, para atender a necessidades transitórias de
recursos humanos parcerias com o exterior. Verificam-se a este nível
grandes dificuldades de relacionamento com o mundo do trabalho, com
efeitos nefastos a todos os níveis, mas com efeitos devastadores a nível
dos cursos tecnológicos. A abertura a este nível não é fácil. Mais uma
vez o projecto educativo, envolvendo toda a comunidade, pode ser uma das
maneiras mais frutuosas de trazer as empresas à escola e de levar a
escola lá para fora. Mais fáceis de criar têm sido as parcerias na área
educativa e científica. Os protocolos com as universidades ou mesmo com
outras escolas secundárias devem ser convenientemente estimulados, ainda
que uma vez mais o espartilho financeiro não dê muita margem de manobra.
achegas finais
Podendo ser muito, tudo o que se disse até agora pode ser
nada, caso não haja uma verdadeira mudança das mentalidades a nível de
todos e de cada um dos actores do processo educativo. Essa mudança das
mentalidades deve levar à melhoria das competências de todos os
intervenientes no processo.
Sendo causa necessária para a melhor ia das nossas
escolas secundárias, ela será contudo insuficiente se as escolas não
forem dotadas de melhores meios humanos e materiais; se a diminuição do
número de alunos, quer por turma quer por escola, não for um facto; se a
escola não for capaz de competir com o meio envolvente relativamente à
ocupação dos tempos mortos no horário do aluno.
Por todas estas razões há que concordar que a autonomia
sendo importante estará longe de ser a panaceia que todos os males
resolve. E caso não seja bem aplicada, pode mesmo vir a ser um dos
cancros do próprio sistema de ensino.
(Alcino Carvalho, moderador/relator)
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