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        Ainda o mais solicitante tema de 
        conversa para José de Pinho é o seu Clube, que ajudou a nascer, que 
        ajudou a fazer, acompanhando a colectividade em todas as sortes da sua 
        evolução com o mais brioso sentido de presença, com integral devoção. 
        
        Bastou perguntar como nascera e porquê o 
        dissídio no seio do Recreio Artístico. 
        
        
        / 24 / — Havia um 
        desafio marcado entre dois ciclistas do Recreio, o João de Sousa Gomes, 
        o chapeleiro, e o Canha, para uma corrida da Barra a Aveiro. Nós, os dos Galitos, éramos mais pelo João Chapeleiro. Aquilo teve muitas 
        peripécias; às tantas o Canha não queria correr, depois não queria o 
        João. Finalmente correram e parece-me que ganhou o João. Foi daí que 
        nasceu a cisão. 
        
        — Mas que teve depois momentos mais 
        agudos. 
        
        — Pois. Vieram as eleições e nós 
        concorremos. Depois duma Assembleia em que até houve pancada. Foi isto: 
        o Máximo Henriques(1) tinha-se atirado aos «velhos» e um sócio disse que 
        queríamos acabar com o Recreio, que não éramos sérios! Dei-lhe logo uma 
        bofetada. Mas, voltando às eleições: nós quisemos consultar o caderno 
        dos sócios e a Direcção não o facultou, ainda nos dirigimos às 
        autoridades, julgo que era então Governador Civil o Conde de Águeda. 
        Pelo menos, a esse respeito, nos dirigimos a ele. Que não queria 
        meter-se nisso, que não queria influenciar... mas estava por eles. 
        
        E como é que eu soube que era preciso 
        consultar o caderno? Começo a ver uns velhotes da beira-mar que há 
        muitos anos não estavam inscritos como sócios, alto! Que eles andam a 
        arranjar votos. Mas nós fomos às eleições e podíamos ter ganho. Perdemos 
        por 35 votos. 
        
        E antes assim porque por isso é que se 
        fez os «Galitos». Foi então que saímos do Recreio. 
        
        — Já com intenção de formar novo Clube? 
        
        — Já resolvidos a formar novo Clube. 
        Ainda nos falaram para entrar no «Mário Duarte», mas nós éramos 
        bastantes para criar um Clube novo. 
        
        A primeira reunião foi por cima do 
        «Mário Duarte», no antigo prédio da Moagem, ali à Ponte das Almas. 
        
        Então se decidiu dar-lhe o nome e a 
        bandeira. O nome...  
        
        — Os Galitos... 
        
        — Sim. Nessa célebre assembleia do 
        Recreio Artístico tinham dito a nosso respeito: «onde há galos de fama 
        que vêm galitos cá fazer?» 
        
        Ai são galitos? Pois foi o nome que nós 
        escolhemos. 
        / 25 / 
        
          
        
        
        / 26 / E no 
        distintivo estão umas rolhas porque, também nessa assembleia, nós usámos 
        da palavra sem deixar falar os velhos — tínhamos combinado tudo antes — 
        e o Manuel Christo, de quem eu era muito amigo, até tinha andado a 
        aprender nas oficinas dele, disse: «é preciso meter-lhes uma rolha na 
        boca!" 
        
        Lá estão as rolhas na bandeira. 
        
        — Mas voltando à criação... 
        
        — Era então preciso uma casa. Sabe, onde 
        reunimos pela primeira vez foi num sótão. Não eram instalações capazes, 
        nem eram as que nós queríamos. E eram clubes de mais numa casa. 
        
        — Mas, nesse tempo, arranjar casa nesta 
        cidade não foi fácil. 
        
        — Não. Onde é que a íamos arranjar? Por 
        sorte, entretanto o Sr. Domingos Leite deixou a casa em que morava, 
        onde agora é o Ultramarino(2). Arrendou-se, mas ainda precisou de 
        muitas obras. Lá nos instalámos. 
        
        — Aí então começou verdadeiramente a 
        obra dos Galitos.  
        
        — É Verdade, a partir de então o Clube 
        cresceu muito. Tínhamos a simpatia da cidade, era um grito de liberdade. 
        
        No Clube chegou a haver uma lista negra 
        daqueles que mais se destacaram, contra nós, no Recreio Artístico. Mais 
        tarde, a alguns deu-se-lhes um traço e eles vieram para nós. 
        
        — Foi a maioridade do Clube... 
        
        — Foi e rapidamente alcançámos grandes 
        sucessos: os festejos a Santa Joana e depois com o Grupo Cénico. 
        Levámos à cena várias zarzuelas em anos seguintes. Foi isso que deu 
        grande nomeada ao Clube. 
        
        Desde que a bandeira do Clube foi içada 
        pela primeira vez, pelo José Bernardes da Cruz, ainda antes da 
        inauguração, muita volta deu o Mundo. 
        
          
        
        Deixamos José de Pinho a reviver uma 
        juventude cheia de entusiasmos, generosa, esforçada que tanto contribuiu 
        para o prestígio e grandeza do «Clube dos Galitos.» 
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        (1) - Máximo Henriques casou por volta de 
        1912/13 com Alice Henriques de Oliveira e faleceu em 1917, tendo deixado 
        um descendente, o Prof. Henrique de Oliveira. Marceneiro de profissão, 
        foi um dissidente do Recreio Artístico e um dos elementos que esteve na 
        origem do clube "Os Galitos". Dele tivemos conhecimento em 1985, por 
        altura do funeral de Henrique de Oliveira, altura em que foi oferecida 
        ao autor desta nota uma fotografia em que figura Máximo Henriques a 
        ajudar a fotografar o emblema dos Galitos, uma estatueta possivelmente 
        em gesso, representando um galo encristado e com as plumas levantadas, 
        apoiado numa pata e com a outra levantada, segurando ostensivamente uma 
        rolha de champanhe com que tapariam a boca dos mais velhos, que 
        insultaram os novos apodando-os de «galitos». Nota de HJCO 
        
        (2) - Este banco já 
        não existe na actualidade, sendo actualmente as instalações da Rota da 
        Luz.  |