E, porque Aveiro já tinha duas freguesias, duas confrarias
do Senhor dos Passos, duas músicas e dois clubes, porque não
ter também duas companhias de bombeiros?
Como se
pretende, da minha colaboração neste opúsculo comemorativo
do 75.º Aniversário, que se faça uma abordagem histórica da
Companhia, suponho vir a propósito, a transcrição das
achegas LXXVI e LXXVII que publiquei no “LITORAL”, em 1981,
que contam um facto que eu reputo de muito importante para a
época e que demonstra a dedicação do seu Corpo Activo e dos
seus dirigentes pelo interesse e o bom nome dos Bombeiros
Novos.
E... Como
já estava escrito...
ACHEGAS PARA
A HISTORIOGRAFIA AVEIRENSE
LXXVI. Em
1930, um grupo de Carolas dos "Bombeiros Novos", com o
intuito de obter receitas para aquela corporação, lembrou-se
de aproveitar o enorme entusiasmo que, nessa altura, havia
pelas corridas de motos, organizando em Aveiro uma
competição daquele género, convictos, como estavam, de
conseguirem bons resultados financeiros, pois, para verem as
corridas de motos, deslocavam-se, de longes terras,
multidões de pessoas.
Estudaram
qual seria o melhor local para a pista (em Aveiro ou nos
arredores) e concluíram, com a ajuda de corredores
profissionais que consultaram, que o triângulo formado pelas
estradas saídas da Ponte da Barra para o Farol, e para a
Costa Nova, pela marginal da Ria (linda estrada que os
temporais estragaram e as autoridades não repararam a tempo
e horas), até ao encontro da que, do Farol vai até à Costa
Nova, seria a pista ideal, visto ter um percurso de 5 Kms,
ser fácil de fechar ao trânsito (sem causar grande
transtorno ao público) e a brisa marítima refrescar os
motores das motos, mantendo-as em boa carburação. Além
disso, as areias que bordam as estradas serviam, não só para
os mirones observarem, sem perigo de maior, as provas, como,
ainda, para amortecer os choques de quaisquer trambolhões
que viessem a dar-se.
Houve
quem entendesse (há-os sempre!) ser atrevimento tal
organização e receasse o insucesso financeiro deste
empreendimento, não só pela pista ficar afastada da cidade,
como, também, por ser a sua área de difícil fiscalização,
quer ao longo da Ria, quer ao longo do mar.
Com o
entusiasmo dos organizadores e a boa vontade de todos os que
aceitaram colaborar com eles, incluindo todas as
autoridades, conseguiram levar a bom termo a tarefa a que se
propuseram e
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obter alguns resultados financeiros: foi uma boa
experiência.
A
Direcção das Estradas tomou ao seu encargo ter em boas
condições o piso da pista, de forma a que os concorrentes
não tivessem motivo para fazer reclamações. O Regimento de
Cavalaria destacou soldados a cavalo para vigiar a estrada
paralela ao mar; os Bombeiros encarregaram-se de vender os
bilhetes em bilheteiras montadas em Aveiro, à entrada da
Ponte da Barra e na estrada da Costa Nova; a Polícia de
Segurança Pública determinou o encerramento, com a devida
antecedência, do trânsito para a Costa Nova e para a Barra,
estabelecendo que, quem tivesse necessidade de ir para
aquela praia, se servisse da estrada de Ílhavo, devendo,
para a Barra, os peões seguirem pelo paredão; e a Polícia
também ajudou os Bombeiros nos problemas que surgiram com a
missão de que estes estavam encarregados.
A
organização – sem que ninguém, alguma vez, tivesse andado
metido mesmas andanças – teve de montar a parte técnica da
corrida: partidas e chegadas dos corredores; tempos gastos
por cada um dos concorrentes; velocidades médias de cada
volta; fiscalização da pista, etc., etc.
Disto se
encarregou o meu saudoso amigo José Duarte Simão que, dotado
de grande capacidade de organização e grande dinamismo,
formou várias equipas com as quais discutiu o plano que
idealizou e estudou e por quem distribuiu as missões que
entendeu serem indispensáveis para se atingirem os fins em
vista.
Para uma
dessas equipas, também eu fui caçado – eu, que era
todo dos "Bombeiros Velhos" –, não só pela amizade que havia
entre mim e o Simão, mas, também, e principalmente, pelo
facto de ter prática de cronometrar provas atléticas, e,
apesar de não termos a aparelhagem que hoje há para este
efeito, lá nos safámos, sem motivo para reclamações, daquela
missão que, de entrada, nos pareceu um bicho de sete
cabeças. E fomos ao pormenor de indicar os quintos de
segundo, e o Simão, a indicar, de imediato, o tempo gasto em
cada volta e a média horária a que este tempo correspondia.
E não
havia as calculadoras electrónicas para fazer essas
contas...
Continuarei.
________________
LXXVII. O
José Simão (e a sua gente) instalou-se numa tribuna que,
para aquele efeito, foi montada a meio da recta da estrada
que do Farol vai até à Costa; e, dali e através de
aparelhagem sonora, eram fornecidas ao público informações à
medida que a prova se ta desenrolando.
Esta
primeira corrida (denominada I CIRCUITO DO CENTRO DE
PORTUGAL) foi realizada em 31 de Agosto de 1930, patrocinada
pela Comissão Desportiva do Moto Clube de Portugal e constou
de 40 voltas ao triângulo, ou seja 200 Kms, nela tomando
parte motos de 500 C.c. e de 350 C.C., com os seguintes
corredores: Manuel Machado em Triumph;
Augusto Reis em Monet
Gayon; Ângelo Bastos em New Hudson;
Mário Teixeira em Rudg
Withon; Rodrigues da Silva em New Hudson;
Enrique Emiliano
em Monet Gayon; Fernando Sousa em B.S.A.; e J. M. S. em New
Hudson.
A melhor
média obtida foi a de 81,874 Kms, por Mário Teixeira,
seguindo-se-lhe a de 79,426, por Ângelo Bastos e a de
76,120, por Fernando de Sousa.
Os
prémios distribuídos foram: 300$00 (trezentos escudos) em
dinheiro, oferecidos pela Comissão Municipal de Turismo, uma
taça de prata, oferta dos "Bombeiros Novos" e, ainda,
medalhas de ouro e diversos objectos artísticos oferecidos
por várias firmas da cidade.
Houve,
apenas, um desastre, por choque, logo à primeira volta, com
ferimentos sem muita gravidade, que foram tratados no
Hospital.
Esta
corrida trouxe a Aveiro – como se esperava – enorme multidão
de entusiastas e o seu êxito foi tal que entusiasmou os
"Bombeiros Novos"
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a organizar, no ano seguinte, propriamente em 30 de Agosto,
nova corrida (II CIRCUITO DO CENTRO DE PORTUGAL), esta já
com o concurso da Comissão Desportiva do Moto Clube de
Portugal, tendo a Comissão Organizadora ido a Vila do Conde
– onde havia corridas deste género – ver uma prova e
observar a organização da mesma.
Nesta
segunda corrida já houve um Júri da Prova, composto pelo
Presidente da Comissão Desportiva do Moto Clube de Portugal
e pelos senhores Dr. Alberto Souto e
Alberto Ruela. Vieram
do Porto quatro cronomestristas oficiais; houve um Director
de Corrida, o Engenheiro José Bernardes (das Obras Públicas)
e foram Comissários Desportivos
Manuel dos Santos Ivo,
José
Teles de Meneses, Humberto
Trindade, António Osório e
Herculano Graça.
Nova
corrida se realizou (III CIRCUITO) em 28 de Agosto de 1932
e, nela, tomaram parte – e foram classificados – dois
amadores aveirenses: José da Costa Canal, marujo do Centro
de Aviação Naval, que correu em B.S.A. de 350 c.c. na
categoria de "sport" (100 Kms) e
Armando Pereira Campos, em Paroleia de 500 c.c., também na categoria de "sport" (125
Kms), os quais competiram, o primeiro, com
António de
Figueiredo, em New Imperial, e o segundo com Ângelo Bastos
em Rudg e Jaime Correia Campos em Royal Enfield.
Na
categoria de corridas (150 Kms) tomaram parte:
Alexandre Black, Ângelo Bastos e
Inocêncio Pinto, em Rudg; Mário
Teixeira, em Norton e Ernesto Von Haff, em D K W.
Passou o
grande entusiasmo das corridas de motos e aos carolas dos
“Bombeiros Novos" passou também o interesse de repetir a
prova que, para ser organizada, exigia muito trabalho,
dispêndio de energias e de tempo e, ainda, a colaboração de
pessoas estranhas aos Bombeiros.
Tenho
pena de não prestar a minha homenagem a muitos dos que
colaboraram nestas provas (que trouxeram a Aveiro muita
gente e que deram origem a que, por todo o País, o nome da
nossa terra fosse falado) trazendo para estas achegas os
seus nomes.
Porém – e
apesar de toda a minha boa vontade e das diligências que fiz
–, não tive possibilidade de chegar até aos arquivos dos
"Bombeiros Novos" porque estes – segundo me informaram devem
estar para o sótão, juntamente com outra papelada, devido à
falta de espaço – se é que lá estão.
Não
estranhei este facto porque, na altura em que os "Bombeiros
Velhos” fizeram cinquenta anos, foi resolvido editar um
número comemorativo – que se fez, e a que chamamos
HUMANITÁRIA –, e o ilustre aveirense Dr. Alberto Souto,
então Presidente da Assembleia Geral, tentou consultar o
artigo para elaborar uma monografia, e nada encontrou.
Ele e eu
procedemos a averiguações e soubemos que o referido artigo
foi, pelos comandantes Isaías e Firmino, ou queimado, ou
vendido à farrapeira, por estar a ocupar espaço!
O mesmo
aconteceu – soubemo-lo depois aos das duas Confrarias do
Senhor dos Passos, em que ambos pontificavam!
Há quem –
mesmo hoje – tenha a fobia dos papéis! |