Hoje, ao ler um jornal semanário, precisamente o Expresso de 4 de
Abril de 1992, encontrei um artigo escrito por um leitor do Monte da
Caparica, o Senhor João M. S. Gaiolas, que reflectia precisamente acerca
de um problema que já várias vezes abordei nas minhas aulas. De facto,
frequentemente, e apesar de tentar contrariar tal costume, encontro
alunos que não sabem registar uma data de acordo com as normas
portugueses. Dizem eles que é a nova maneira de escrever a data, à
maneira da C.E.E. Ora esse leitor, numa carta bem redigida publicada
pelo jornal, refere precisamente este problema, explicando por A mais B
que não há data à moda da C.E.E. Mas, melhor que as minhas palavras,
será aqui efectuar a transcrição dessa carta, tal como foi publicada
pelo citado jornal. Talvez que, apresentando as palavras de outros em
vez das minhas, os alunos se convençam daquilo que habitualmente lhes
digo e deixem de fazer a asneira habitual. Não é por acaso que o "Zé"
criou o ditado popular «santos da casa não fazem milagres». Talvez que
outras palavras, que não as habituais do professor, produzam um melhor
efeito. Deixemo-nos de mais considerandos, e vamos lá à transcrição da
tal cartinha do leitor, do Senhor João M. S. Gaiolas:
NÃO EXISTE qualquer norma europeia para escrever datas, ao contrário do
que pode deduzir-se de uma «Nota da Redacção» publicada com a carta de
um leitor [EXPRESSO, 22/2/92: «Ambicionaria tornar a nascer»]: a questão
do formato das datas numéricas é muito curiosa e permite abordagens
múltiplas, nomeadamente na história recente da evolução que teve no
nosso país.
A Norma Portuguesa 950, de 1984, aplica-se exclusivamente à forma de
representação inteiramente numérica das datas, correspondendo ao que
está estabelecido, desde 1976, em norma da ISO (International Standards
Organization, organismo de normalização internacional, com sede em
Genebra, portanto fora da CE, de âmbito mundial).
De acordo com essa Norma, a representação de uma data sob a forma
inteiramente numérica deve ser constituída do seguinte modo:
a) 4 algarismos para o ano. A representação deve reduzir-se a 2
algarismos quando a omissão do século não for susceptível de criar
confusão; contudo, devem utilizar-se 4 algarismos, em particular na
correspondência e para fins de documentação;
b) 2 algarismos para o mês;
c) 2 algarismos para o dia.
Curiosamente, difundiu-se em Portugal a ideia de que «a nova maneira de
escrever datas» era uma orientação comunitária ─ o que é inteiramente
falso, mas ajudou à aceitação do respectivo uso, dado o significativo
acolhimento verificado aos ideais da integração europeia.
Nos outros países comunitários a sua aceitação e a sua divulgação são
muito limitadas e sempre em sectores muito específicos, ligados à
informática. A própria Comissão da Comunidade codifica a sua legislação
escrevendo as datas na forma «dia, mês, ano».
A grande vantagem da nova representação exclusivamente numérica de datas
estava efectivamente relacionada com o tratamento automático da
informação, que esteve na origem desta normalização, mas que deixou já
de ser importante dado que a maior parte do moderno «software» para
computadores admite e converte os diversos formatos de data.
Uma outra utilidade poderá ser a indexação de arquivos em microfilme,
para busca automática, mas de qualquer modo mantém-se o carácter
específico de aplicação, como se de um código se tratasse.
[...] Será que não conseguimos refrear esta nossa tendência para
considerar que o que vem de fora é que é bom?
Como se vê, o leitor e autor desta carta enviada à redacção do
«Expresso» conclui com uma boa pergunta: ─ Será que o portuguesinho não
é capaz de refrear a tendência para considerar como bom só o que vem de
fora? Curiosamente, este não é um mal dos nossos dias. Não diz o velho
ditado que «a galinha da vizinha é sempre melhor que a minha»?
H.J.C.O., Registos da minha pena, Aveiro, 5 de Abril de 1992 |