José Estêvão

 
 
 

Discursos de José Estêvão

 

2 - Uma proposta de Dispensa ao Governo - 29/4/1838

 

 

PROPOSTA DO GOVERNO PARA SER DISPENSADO O SR.  FONTOURA, A FIM DE SER EMPREGADO NO ALGARVE

 

 

SESSÃO DE 29 DE ABRIL DE 1839

 

O ilustre deputado por Penafiel começou por demonstrar a necessidade de restabelecer a questão, e eu, depois de ter ouvido atentamente o seu discurso, que me pareceu dever encaminhar-se a este fim, não julgo ainda satisfeita aquela exigência. Sim, restabeleçamos a questão, repito eu, porque dois sentimentos diversos se têm empenhado em a tirar do lugar que deve ocupar - o desejo de lhe exagerar a importância e o interesse em lhe desfigurar as tendências.

Sr. presidente, foi o ilustre deputado o Sr. conde da Taipa, que, soçobrando com a proposta do governo, nos apresentou aqui ontem, como sua consequência, o quadro da corrupção parlamentar, carregado com as mais negras cores; o Sr. Gorjão, achando a obra de gosto, deu-lhe logo mais alguns traços; e agora acaba de a retocar o Sr. Seabra, cujo pincel eu não quisera ver abatido a trabalhar em obra alheia!... (Riso).

Sr. presidente, esta doutrina dos perigos da corrupção parlamentar, pelo direito que tem o governo de empregar deputados em casos urgentes, e com permissão da câmara; esta anomalia, esta alegada infracção do artigo constitucional, que inabilita os legisladores de receberem empregos durante suas funções, foi uma inspiração de terror, debaixo da qual aqueles nossos três colegas conceberam e executaram a sua melancólica produção.

Passemos sobre este quadro aterrador a esponja da análise, e suas desbotadas e grosseiras cores desaparecerão completamente, e desapareceriam ainda que sobre a obra tivessem corrido séculos. Como poderá o governo, por efeito de tal teoria, mudar a contextura de um parlamento? Virá ele pedir, para os empregar com mau propósito, deputados de sua maioria? Esta hipótese é absurda, e impossível, porque o governo não há-de querer diminuir a sua força, nem quintar as suas falanges. (Apoiados). Virá tirá-los à oposição? Então se eles aceitam as comissões do governo, pelo assenso da maioria, estamos no caso constitucional, porque se verificou a necessidade à qual a Constituição quer que seja subordinado o rigor dos princípios; (apoiados) se porém aceitam por considerações indecentes e ajustes anteriores, então eles, que se curvaram ao ministério para aceitar uma comissão, porque se não prostituiriam para votar com ele? (Muitos apoiados).

Finalmente, se algum resto de pudor embarga estas vendas descaradas, não poderá o governo insinuar aos oposicionistas convertidos, que ou enfermem, ou se dêem como cercados de negócios domésticos, ou simplesmente como importunados pelas saudades de suas esposas? Apresentados estes motivos, para os quais, segundo temos ouvido, a liberalidade dos ilustres deputados é ilimitada, as licenças serão concedidas sem reparo, e a representação nacional dizimada sem excitar o seu zelo e queixume.  (Apoiados). Assim esta teoria aterradora da corrupção parlamentar, de que nos falam há dois dias, reduz-se a hipóteses impossíveis, absurdas e fúteis, ou confunde-se com outra teoria, que os nossos novos publicistas do terror confessam, e cujas consequências aceitam: é lastima, pois, que esta miserável doutrina, que se não sustenta ao primeiro golpe de análise, tenha sido enunciada com tanta confiança por alguns talentos da câmara. (Sensação). Mas diz-se: «Nós vamos dar ao governo o direito de tirar da câmara os deputados que quiser.» Não; esse direito é dado à maioria da câmara, e o ilustre deputado por Penafiel, que por tanto tempo confiou em maiorias, parece-me que não tem razão para negar confiança a esta, quando a algumas menos decentes prodigalizou até respeitos! Sr. presidente, a moralidade política do parlamento fica debaixo da salvaguarda das maiorias, fica garantida pelo único penhor a que estão confiadas todas as questões constitucionais, e deste modo a teoria da força dos interesses sobre os deveres, que o ilustre deputado por Penafiel nos explicou com tino moralista e experimental, terá um valioso correctivo no poder constitucional, superior a esses interesses. O mesmo ilustre deputado, na análise que fez da Constituição, trabalhou em favor das nossas opiniões; porque, mostrando-nos a letra da lei, nos livrou da difícil doutrina das indispensabilidades, e nos tirou de um extremo indefinível para hipóteses mais compreensíveis, porque ninguém pode contestar que é mais fácil determinar quando o bem do estado exige o serviço de um homem - do que provar que esse homem é indispensável para tal serviço. O discurso do nobre deputado valeu de muito à proposta do governo.

O mesmo ilustre deputado disse: «Mas a Constituição de 22 reputava o negócio tão grave, que exigia para ele uma votação de duas terças partes.» Sr. presidente, essa exigência de duas terças partes funda-se em um princípio erróneo, pelo qual se subordinam as maiorias às minorias; esta doutrina foi rejeitada no Congresso Constituinte como absurda e anticonstitucional.

Também o ilustre deputado nos leccionou com igual facilidade e profundeza nas teorias da oposição e do ministerialismo. Como um homem que, depois de longa prisão, respira pela primeira vez o ar livre, e bebe com sôfrega avidez as doçuras de que estava privado, assim, solto das cadeias ministeriais, debaixo de cujo peso tem gemido por tanto tempo, o ilustre deputado, ao primeiro passo que dá nos campos da oposição, cinge sua cabeça com as coroas da popularidade mas não pode sustentar por muito tempo a sua nova e bela posição, porque a atmosfera, que o cerca, é demasiado forte para os seus débeis órgãos. Entretanto, neste intervalo oposicionista, deu um documento de sinceridade trazendo a questão ao seu verdadeiro ponto; porque ela é ministerial, e sempre o foi; todos a reconheceram por tal, e desfigurá-la, como se tem querido, uma astúcia miserável, pois ninguém tem poder para encobrir as tendências visíveis de uma questão parlamentar. (Vozes: É verdade.)

Sr. presidente, nós não negamos os princípios constitucionais, não negamos o direito de recusar ou conceder o que o governo pede, não negamos a faculdade de discutir, nem de votar. E para que se nos diz com a mais profunda ênfase, e como para afectar uma reivindicação: «Nós estamos no nosso direito, no nosso direito constitucional?» Não, senhores. o direito que invocais é mais do que constitucional, é o nosso direito natural, aquele que deriva da natureza das nossas funções, aquele que constitui a nossa posição política - o direito de manifestar nossas vontades por nossos discursos e votos. Mas confundir nesta questão o uso libérrimo destas faculdades com as determinações da Constituição, é ofender a lógica, e provocar uma suspeição de cobardia. Eis aqui o que vós tendes feito. A Constituição não responde à proposta do governo. Somos nós que o havemos de fazer.

Sr. presidente, tratarei agora de combater algumas asserções notáveis que têm sido proferidas durante esta discussão. Disse-se: «Se este oficial que é pedido vai coadjuvar outro militar que lá está, como é que se lhe manda este oficial sem se lhe pedir licença para isso?» O ilustre deputado, que proferiu esta opinião, já aqui apareceu com bigodes, (riso geral) e apesar de não serem os bigodes, hoje, distintivo da profissão militar, parece-me ter ouvido dizer que esse Sr. deputado tem feito nas armas, como curioso, uma carreira longa... e ilustre... E então atrevo-me a perguntar-lhe se já viu estabelecido em lei alguma militar, ou mesmo se lhe consta ser costume, quando se manda um militar em comissão para coadjuvar outro, pedir primeiro vénia para tomar esta deliberação? E ainda que isso fosse necessário, sabe o ilustre deputado se se pediu a licença que exige? Não pode sabê-lo: porque S. Sª. declara-se na oposição, e não creio que o governo fosse comunicar os seus procedimentos a um seu adversário. Diz-se que esta guerra não é feita por massas, e que seguramente não é à patente do Sr. Fontoura que convém o comando dos exércitos do Algarve. Mas essas massas, que por pequenas se não querem entregar a um coronel, regateiam-se para um brigadeiro?! Isto é curioso... «(Mas coadjuvar (diz-se) não é serviço importante...» Quantas vezes um coadjutor vale mais do que um pároco!

Por esta ocasião ouvi uma expressão nesta câmara, que eu quero rectificar. Sempre que um partido político toma qualquer grau de ascendência, inventa uma legenda para a sua bandeira, legenda de honra e de prestígio, e outra parte a bandeira dos seus contrários; de infâmia e de mofa! Antigamente houve os pedreiros livres, depois tivemos os malhados, e agora tudo são inimigos do exército! (Riso geral.) Já não é preciso declarar o Sr. Fontoura indispensável, porque o ilustre deputado por Penafiel nos livrou desse embaraço; basta decidir que o bem do Estado exige o seu serviço - e esta declaração não envolve uma injúria ao exército, porque ele tem sem dúvida muitos oficiais aptos para todos os serviços, mas desses há alguns, que, segundo as circunstâncias, têm um préstimo especial, que às vezes até não depende do seu merecimento. Isto acontece em todos os ramos de serviço público. Eu, Sr. presidente, sou o maior amigo do exército, porque sou amigo do país. Em o país morrendo, o exército não lhe sobrevive; poderá arrastar alguns dias de miserável existência, para ser escarnecido, e coberto de vitupérios e injúrias. E depois de os terem conduzido, por meio de enganos, a fins desastrosos, os pobres militares, que são sempre fáceis em acreditar em lisonjas, acabariam vítimas dos seus maiores aduladores... (Sensação.)

Sr. presidente, quando se discutiu a resposta ao discurso do trono, ouvi o ilustre deputado, o Sr. Leonel, emprazar o Sr. ministro da guerra pelo cumprimento da promessa, que lhe tinha feito, de acabar com a guerra do Algarve num determinado tempo; este enunciado foi recebido com o maior desfavor pelo lado direito da câmara. Agora uma igual proposição é repetida daquele lado! Igual?! Há diferença para mais! Então exigiu-se um prazo de meses; agora exige-se um de dias! Então exigiu-se isso como condição para suspender as garantias; hoje exige-se para conceder um oficial para um comando! o ilustre deputado, que tem notado tantas contradições, há-de inscrever esta nos fastos da direita. (Sensação.)

Sr. presidente, eu reputo esta questão muito simples: o governo, preenchendo a formalidade da Constituição, pede um deputado para o empregar em uma comissão importante; nada mais há da nossa parte do que dizer - nego ou concedo. Já eu votei numa questão semelhante contra um governo, e para tirar aos ilustres deputados o trabalho de folhearem as actas do Congresso Constituinte, e roubar-lhes o prazer de me acharem em uma aparente contradição, vou contar-lhes essa pequena história. O Sr. Passos (Manuel) pediu ao Congresso Constituinte que concedesse a diversos deputados o permanecerem nas comissões que antes tinham; a Constituição exigia que o ministro declarasse indispensáveis para o serviço as pessoas a respeito de quem fizesse este pedido; insisti com s. Ex.ª por que me declarasse a indispensabilidade; ele negou-se a isto, e eu votei contra: a formalidade da Constituição não estava preenchida.

Sr. presidente, no meio desta discussão anunciou-se-nos uma grande maravilha: a gloriosa ressurreição do centro - outrora tão mesquinho e fraco, hoje tão crescido e poderoso! O ilustre deputado que no-lo tinha pintado como um ideologismo, e que nos anunciou com jactância a sua nulidade política, é hoje o mesmo que abate a sua voz de poderoso e brilhante orador a invocar uma minoria, a rogar um fantasma para quebrar as maiorias parlamentares, e decidir dos destinos do país! (Risadas e apoiados.) Esse centro, que ainda há pouco se não enxergava; esse centro, a que não pode dar vulto a agregação do Sr. Rodrigo da Fonseca, que só a olhos muito míopes pode escapar; (risadas) esse centro, enfim, que ainda há pouco foi objecto de desdenhosas alusões, é agora cortejado e coberto de encómios pelo mesmo ilustre deputado que tão desabridamente o tratou! (Atenção.) Arrebatado de entusiasmo, o ilustre deputado, esquecido do que dissera e ansiando de aflição, bradou-lhe: «Valei-nos... Valei-nos!!!» (Risadas em toda a câmara.) Sr. presidente, mais uma contradição para o catálogo dessas em que caem os homens da oposição ou governo... Esta, que a escreva o Sr. deputado nos fastos da sua própria vida!

O ilustre deputado disse que nós tínhamos ligações indecentes com o poder, e logo depois afirmou que não podia esperar que a maioria continuasse a apoiar o governo, porque nós só lhe dávamos um apoio hipotético: aguardávamos, para nos dirigirmos, os seus futuros actos.  Quem exige, Sr. presidente, os procedimentos dum ministério para lhe dar o seu apoio, não tem ligações indecentes com esse ministério, (apoiados do lado esquerdo) e o ilustre deputado, instado ao mesmo tempo pelo desejo de tratar com menos consideração este lado da câmara, e pela necessidade política de atenuar o valor da maioria do governo, sacrificou uma pretensão à outra, e juntou a provas de pouca sagacidade sinais bem claros dum ânimo ofensivo e injusto. (Sensação.) A maioria que o governo tiver nesta questão, creio que a há-de ter em todas as outras, em que se apresente com igual política.

Sr. presidente, o discurso do ilustre deputado, o Sr. Garrett, talvez o mais importante que ele tem pronunciado desde que se senta no parlamento, denuncia com timidez um princípio de diversão no centro, e procura com delicadeza sanar este desastre, e restringir-lhe as consequências: é a voz de debandada a granadeiros titubeantes, com um ponto de próxima reunião. A sorte favoreça o general, e a manobra!... Há, porém, neste discurso uma equivocação de princípios constitucionais, que primeiro que tudo é mister destruir. O ilustre deputado disse que esta questão nunca devia vir ao parlamento, porque entendeu sempre, e ainda hoje entendia, que na Constituição se devera ter decretado somente que, quando algum deputado aceitasse emprego do governo, perdesse a sua cadeira. Com efeito, esta doutrina, que a nossa Constituição rejeitou, por pouco rigorosa, não é aplicável ao caso presente. Não se trata aqui duma promoção, duma mercê, dum emprego; é uma comissão de interesse público, é uma necessidade do serviço. Em todas as Constituições, onde se acha consignada a doutrina em que o ilustre deputado falou, também há este artigo, que exige a dispensa dos corpos legislativos para empregar os seus respectivos membros; e ele seria ocioso se não atendesse às hipóteses, que o devem regular. «Mas (diz o nobre deputado) nós não conhecemos, nem o governo nos tem ainda apresentado a sua opinião sobre a nossa única questão, a questão do censo.» Também eu tenho a minha opinião sobre esta questão do censo, que não será partilhada pelos meus amigos políticos. Sr. presidente, se o censo se propõe como meio de evitar as irregularidades das operações eleitorais, se o censo se estabelece como um correctivo contra as fraudes dos recenseamentos, se ele é considerado como um princípio protector do direito eleitoral, admito o censo, e voto por ele; mas se se pretende (e isso é o que realmente se pretende, sem haver a coragem de o dizer) privar do uso dos direitos políticos muitos cidadãos portugueses, cujo tirocínio eleitoral é sumamente esperançoso, monopolizar a faculdade electiva, e tornar a urna inacessível às influências do progresso, eu voto contra o censo, e lutarei desesperadamente contra ele, porque o considero como um meio solapado de destruir o sistema representativo no nosso país. E será curial exigir que o governo apresente agora a sua opinião a respeito do censo? !... Se o inimigo estivesse batendo às portas da capital e o ministério viesse pedir ao parlamento um general para se pôr à testa duma força, havia o parlamento de dizer-lhe: «Dai-me a vossa opinião sobre o censo, e depois vos darei o oficial que pedis!?...»

Sr. presidente, eu sou homem de princípios; reputo em muito valor este meu brasão: nele se cifra todo o meu orgulho. Para os homens de princípios há uma grande vantagem: neles a ambição não é um vício, mas um pensamento; não é um frenesi pessoal, mas é o desejo sensato de os ver triunfar. Eu sou homem de princípios, repito; mas reconheço que todos os princípios estão sujeitos às conveniências públicas, e que todo o homem, que tem princípios, deve entender que é do interesse deles submeter-se prudentemente às circunstâncias, sem deslustre da sua posição. Por virtude destas considerações, eu entrego a minha virgindade oposicionista ao Sr. barão da Ribeira de Sabrosa; poucas esperanças podia ele ter de triunfar do meu pudor, porque, olhando para a nossa vida passada, deve recordar-se que me encontrou sempre mais como adversário que como amante.

Sr. presidente, o ministério não é da esquerda: olhe-se para estes bancos (os da esquerda). O ministério não é da direita: olhe-se para os bancos da direita. Então a quem pertencerão estes ministros, que não acham família que os agasalhe, pais que os adoptem? (Riso.) Oh! Sr. presidente, pois o centro esquiva-se aos encargos, que esta solene ocasião lhe impõe, e aparece com crenças separadas no momento em que se decide da vida ou morte de um filho seu?!... Sim, senhores, ninguém relativamente à actual administração tem mais títulos de paternidade que o centro da câmara; e, se assim não é, não posso avaliar que extensão tem a sua prerrogativa, nem quando ele se dignará dizer-nos: «Estão preenchidas as minhas soberanas vontades, (riso) e satisfeitos todos os direitos constitucionais, que me dizem respeito !...» Sr. presidente, se eu me sentasse no centro, envergonhava-me de que um deputado do lado esquerdo se tivesse adiantado a tirar-me o posto de honra de defender o ministério, sendo mais filho desse centro, que do lado esquerdo. Nós, os membros deste lado da câmara, éramos acusados de anarquistas, de inimigos de todos os principais orgânicos, de incapazes de executar ou sustentar um sistema governativo; e agora, todavia, somos nós que aceitamos resignados a escolha da coroa, fomos nós os primeiros a prestar-lhe o nosso apoio; e se o país ficar hoje livre de uma crise ministerial deve-o à nossa dedicação! Oh! Sr. presidente! Depois do longo ensaio de organização, durante o qual a imoralidade não chegou ao trono, como se disse, porque a Constituição o isenta dela, mas em cuja quadra a intriga e a ambição teceram o ridículo drama, que todos presenciámos, queremos nós trazer à cena uma nova farsa, que há-de ser mil vezes mais indecorosa que aquela que felizmente acabou? (Sensação.) Sr. presidente, o centro está dividido... (Sinais de desaprovação no centro). Não digam bem: as consciências do centro não se ajustam hoje bem.. (Riso.) O sistema das coalizões já não é novo entre nós, já se experimentou, e eu tenho a desgraça ou a fortuna de haver associado o meu nome aos trabalhos, que nesse intuito se começaram. Se o fantasma de um ministério do centro e direita, que primeiro apareceu em uma sala de conferências, e que logo foi saudado por parte da imprensa, pretende outra vez levantar-se do meio das combinações políticas, se é ele que anda hoje pulando por entre as nossas cadeiras, e soprando todas estas inspirações oposicionistas, porque se não apresenta a nossos olhos, porque não se denuncia, e confessa os seus fins? (Silêncio e grande atenção:) As coalizões, repito, não são novas no nosso país, elas já têm precedentes, já têm arquivos, já têm história, e tudo isto eu ofereço com ufania à recente coalizão para se instruir e moralizar.

Sr. presidente, eu acabo de tratar o assumpto como uma questão de poder. Como tal a considero, e sempre a considerei; e admiro que um dos nossos colegas, que tratou com tanta franqueza uma questão semelhante, agora se empenhasse tanto em encobrir as tendências desta. Disse um ilustre deputado: «Esta proposta do ministério dá ideia de que se querem mudar empregados.» E que temos nós com isso? E que há de incurial em tal medida? As oposições devem combater os sistemas dos ministros, mas sem ofender os princípios governativos; porque fora absurdo tornar o poder impossível, para obviar aos seus erros. (Apoiados.) Todo o governo tem direito de demitir livremente os empregados de confiança que lha não merecem, e nomear outros que lha mereçam. Se estivessem sentados naquelas cadeiras quatro ministros miguelistas, se eles começassem a empregar nos lugares de confiança a gente do seu partido, eu havia de fazer-lhes oposição constitucional, e dizer-lhes: «Vós estais no vosso direito, mas não deveis estar nesse lugar.»

Voto pela proposta do governo: as minhas opiniões estão interinamente modificadas pelas exigências do país e da nossa posição política: persistirei na defesa do ministério se ele se não puser em hostilidade aberta com os meus princípios. Entendo que o ministério não é capaz de abusar da força que com este apoio lhe ministramos; porque eu confio ainda nesta máxima garantia, em presença da qual todos são débeis, e que é a consciência da moralidade com que todo o homem deve usar do poder, que por qualquer modo lhe foi à mão. Desejo que o ministério governe o país, fazendo executar severamente as leis sobre todos os homens, de todos os partidos, e dando a todos os partidos a maior liberdade política, (muitos apoiados) a qual não é um favor que lhe peçamos, mas um direito, de que nos não pode desapossar. Se se desviar desta carreira, então todos nos levantaremos contra ele; porque é preciso acostumarmo-nos à reivindicação dos direitos dos nossos próprios adversários: as injúrias que a eles forem feitas, se as presenciarmos silenciosos, amanhã passarão para nós. (Apoiados.)

 

Biografia      Baptismo e morte      1º Centenário do nascimento

1º Centenário da morte      Iconografia      Discursos

 

HJCO

Página anterior     Índice     Página seguinte

Dez.2000