Os
movimentos subversistas nas províncias ultramarinas
portuguesas não surgiram simultaneamente, antes em anos
bastante diferentes.
Na
Guiné Portuguesa, datam de 1952, ano em que foi criado na
clandestinidade por Amílcar Cabral o Movimento para a
Independência da Guiné. Em Setembro de 1956, aquele
movimento transformou-se no PAIGC (Partido Africano para a
Independência da Guina e Cabo Verde), sob a direcção de
Rafael Paula Gomes Barbosa e Amílcar Lopes Cabral.
A
partir de 1958 foram-se formando outros movimentos, tais como
o MLG (Movimento para a Libertação da Guiné), a UPG (União
das Populações da Guiné), a UPGL (União Popular para a
Libertação da Guiné), o RDAG (Rassemblement Démocratique
African de la Guinée).
A
partir de 1964, apenas dois movimentos passaram a existir na
Guiné: a FLING (Frente de Luta para a Independência da Guiné).
Relativamente
à província de Moçambique, os diversos movimentos
subversivos foram surgindo a pouco e pouco, com a criação da
UNAMI (União Nacional de Moçambique Independente), criada em
1959 sob a designação de Associação Nacional Africana do
Moatize, com intuitos aparentemente culturais, visando
subverter o pessoal da região carbonífera do Moatize.
Em
1960, foi fundada na Tanzânia, por iniciativa das autoridades
deste país, a MANU (Mozambique African National Union),
organização que pretendia reunir os Macondes Moçambicanos
residentes nesse país.
No
mesmo ano surgiu a UDENAMO (União Democrática Nacional de Moçambique),
fundada na Rodésia por Adelino Gwambe.
Em
1962 apareceu a FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique).
Em fins de 1965 iniciou acções subversivas no Noroeste do
distrito de Tete
o
COREMO (Comité Revolucionário de Moçambique), acções
essas que se prolongaram por 1966 e 1967, altura em que entrou
em decadência.
Outros
partidos surgiram ainda em Moçambique, como o PAPOMO (Partido
Popular de Moçambique) e a UNAR (União Nacional da Rombézia),
este último pretendendo obter a independência da região
compreendida entre os rios Rovuma e Zambeze.
Foi
em Angola que o terrorismo eclodiu como uma onda desenfreada e
sem qualquer preparação ideológica, com armamento
rudimentar e com uma organização praticamente inexistente.
Eram
sete horas da manhã do dia 15 de Março de 1961. Nas povoações,
nativos e brancos esperavam que as casas comerciais onde
trabalhavam abrissem. Nas fazendas, durante a formatura
habitual da manhã, os trabalhadores nativos
apresentavam-se aos capatazes brancos, mestiços ou de cor. Subitamente,
a um sinal combinado, grupos de nativos, instigados por
estrangeiros cobiçosos das inúmeras riquezas do território,
atacam todos os brancos, assassinando homens, mulheres e crianças
sem dó nem piedade. A sua ira e selvajaria era de tal índole,
que não se limitaram a atacar os brancos, mas também inúmeros
nativos. A sua violência era tal, que esquartejavam homens e
crianças, mesmo recém-nascidos, chegando ao ponto de
arrancar bebés dos ventres maternos. Violentaram ainda mulheres
e raparigas, abandonando-as em seguida retalhadas de golpes,
com os seios cortados e as cabeças decepadas. Alguns brancos,
mestiços e negros chegaram a ser esfolados ainda com vida e
depois horrivelmente dilacerados, a ponto de ficarem, não
raras vezes, irreconhecíveis e reduzidos a um montão
disforme de carne humana.
Estava
assim iniciada a subversão nas províncias ultramarinas
portuguesas, à qual reagiram pronta e eficazmente todos
quantos se aperceberam do facto, bem
como o Governo Português, com o imediato envio de forças
militares para o
Ultramar.
A
subversão, que não é mais do que uma das múltiplas formas
de guerra, ao contrário do que seria de pensar, não é dos
nossos dias; pelo contrário, a guerra subversiva surge-nos
documentada praticamente ao longo de toda a história da
humanidade. Apenas para citar alguns exemplos bem conhecidos
de todos nós, lembremo-nos das célebres campanhas de Viriato
contra a ocupação romana da Península, continuadas após a
morte deste indómito guerreiro-pastor dos montes Hermínios
por Sertório, que se revoltara contra o poder de Roma.
Avançando
um pouco mais na história do nosso país, voltamos a
encontrar uma forma de guerra subversiva durante as campanhas
ibéricas contra as forças napoleónicas, donde resultou a
derrota consecutiva de três comandantes franceses — Junot,
Soult e Massena.
No
plano internacional, podemos apresentar como exemplos de
guerra subversiva a revolta irlandesa, a Resistência Francesa
às forças de ocupação alemãs durante a Segunda Grande
Guerra, a implantação do regime comunista na China e em
Cuba, etc.
—
O que é, pois, a guerra subversiva, quais as suas características
e qual o seu campo
de acção?
Podemos
definir GUERRA SUBVERSIVA como um tipo de luta conduzida no
interior de um determinado território por uma parte da população,
ajudada e
reforçada ou não do exterior, contra as autoridades
de direito ou de facto estabelecidas, com o objectivo de lhes
retirar o controle desse território ou de, pelo menos,
paralisar a sua acção.
As
principais características deste tipo de guerra
consistem no facto de se exercer uma acção ou influência na
população, uma influência do exterior e ainda de apresentar
uma grande complexidade.
O
campo de acção da subversão é a População, pois
é esta que se pretende conquistar, tornando-a igualmente num
dos meios utilizados. Efectivamente, a população é a condição
sine qua non para a existência da subversão, pelas razões
que vamos apontar:
—
em primeiro lugar, ela é indispensável para
justificar a finalidade da luta, pois, como é já sabido, o
Movimento é sempre apresentado como a força única e capaz
de ir ao encontro das ambições da população;
—
em segundo lugar, é ela que permite a vida dos agentes
subversivos, tais como: informadores, agitadores, angariadores
de fundos, terroristas, etc.
Dissemos
que uma das características da guerra subversiva residia no
facto de haver uma influência do exterior. Efectivamente,
este tipo de guerra não se circunscreve ao território onde
está em curso, uma vez que é sempre influenciada, fomentada,
dirigida e alimentada do exterior, em regra pelos países
adversos à política do país onde tal guerra se processa e
que nele vêem possíveis fontes de riqueza a explorar, uma
vez desalojados os ocupantes desse território.
A
complexidade da guerra subversiva, que apresentámos como
terceira característica resulta não apenas das já referidas
razões, mas ainda da diversidade de meios e processos
utilizados e de se tratar de uma guerra em superfície, isto
é, uma guerra global, na qual não existem frentes nem
retaguardas.
A
guerra subversiva apresenta uma série de fases diversas,
muito embora a sua acção se processe quase despercebidamente.
De uma maneira muito esquemática, podemos considerar cinco
fases distintas, que passamos a analisar:
—
a primeira fase ou fase preparatória é, como a
designação deixa ver, uma fase de preparação da subversão,
uma fase que se caracteriza pelo seu absoluto segredo, pois
que os factos se vão verificando sem que ninguém saiba porquê.
É
durante esta primeira fase que se opera uma pesquisa de
informações destinadas à recolha de temas para a propaganda
a difundir e que se começa a embrionar uma organização
político-administrativa que, mais tarde, deverá enquadrar
toda a população a subverter.
—
A segunda fase ou fase da agitação é também clandestina,
pois tudo se passa
igualmente sem ninguém saber. Nesta fase melhora-se a organização
formada, consolidam-se os sistemas de informação. ligação
e agitação, procura-se o apoio da população e começa propriamente
o dito terrorismo, levando a agitação às massas e
procurando dificultar a acção das autoridades.
—
A terceira fase ou fase do terrorismo e da guerrilha ou
da violência é a fase é
a fase da consolidação
da organização subversiva. É durante esta que se
intensificam as acções violentas e que o terrorismo atinge o
seu máximo.
Surgem, senão
guerrilheiros, pelo menos bandos armados, que semeiam a morte
e o pânico por onde quer que passem, como onda de enfurecida
devastação. Quer no interior do próprio território, quer
nos países vizinhos, surgem bases de preparação e irradiação
de terroristas em locais de difícil acesso.
É
esta terceira fase a decisiva, pois é nela que se pode vir a
processar o desequilíbrio da população em favor da subversão.
—
Na quarta fase, também designada fase do estado subversivo, o
número de bases no interior do território aumenta consideravelmente,
aparecendo forças pseudo-regulares a actuar contra os
elementos da ordem, com o fim de flagelar não só estes
últimos, como também de convencer a população da força da
subversão, fazendo crer na opinião pública internacional,
mediante comunicados de guerra e noticiários, que a subversão
é já uma força constituída e dominante em certas áreas do
território.
—
A quinta e última fase ou fase de insurreição geral
é a generalização da subversão ou, pelo menos, a sua transformação
numa guerra clássica. Atingida
esta fase, podemos considerar como consolidada a subversão,
tendo sido possível constituir um exército rebelde.
Verifica-se,
ao longo das cinco fases descritas, que cada uma delas não
é mais do que um prolongamento e desenvolvimento da
anterior, caracterizando-se cada uma pelo aparecimento
de algo de novo, de diferente.
Por
tudo o que temos vindo a dizer, facilmente se conclui da eleva
da importância que a população apresenta dentro do tipo de
guerra subversiva, tornando-se, como já afirmámos, a
condição sine qua non da sua existência.
Na
verdade, é precisamente sobre a População que a guerra subversiva
exerce a sua acção, tornando-a simultaneamente o objectivo a
conquistar e o meio de acção. Além do mais, é ela
indispensável para justificar a finalidade da
luta, ao mesmo tempo que permite a sobrevivência dos diversos
agentes subversivos.
Uma
das armas utilizadas pela subversão é nada mais nada menos
do que o boato, para o qual vai contribuir a natural
receptividade da população, ouvindo-o e difundindo-o, até
se espalhar como poeira levada pelo vento.
Utilizando
o inimigo a população para nela fomentar a discórdia e a
indisciplina, levando-a à subversão, as melhores armas que
poderemos usar para combater este tipo de guerra são
precisamente a desconfiança perante o boato, a busca do
esclarecimento junto de fontes autorizadas e fidedignas e o
auxílio à população por parte das nossas tropas, a fim de
lhe conquistar a confiança e a simpatia, contribuindo para
uma melhoria de vida dos habitantes. Só assim teremos a firme
certeza de dar uma resposta segura à subversão.
Palestra
proferida na Biblioteca do Regimento de Infantaria n.º 15 de
Tomar aos oficiais e sargentos em 22 de Junho de 1972 por Henrique
José Coelho de Oliveira, Aspirante
a Oficial Miliciano.
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BIBLIOGRAFIA:
"Soldado",
n.ºs 2, 4 e 19.
Instrução
de Acção Psicológica na Escola de Recrutas,
Estado-Maior do Exército, 2ª Repartição, Lisboa, p. 1968,
ficha I.
Cadernos
Militares n.ºs 5, 6 e 7 do Estado-Maior do Exército
Caracterização
da guerra subversiva: sua comparação com a guerra clássica;
sua importância como vector da estratégia mundial. Separata
do "Boletim de Informação", n.º 44, Ministério
do Exército (Estado-Maior do Exército), 2ª Repartição.
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