Acesso à hierarquia superior.

Fábrica Bóia & Irmão, L.da – Aveiro

Necrologia

Manuel Bóia

Sem espaço a semana passada para uma notícia desenvolvida, dedicamos hoje mais algumas linhas à memória do activo e estimado industrial, que, depois de tantos sacrifícios, uma doença grave fez baquear.

Manuel Maria Pereira Bóia era o seu nome completo; nascera em Paramos, concelho de Ovar, contando agora 45 anos. Filho de modestos empregados da C.P., veio muito novo para Aveiro, assim como seus irmãos – Domingos, Paulo, Carlos e Maria.

Devido à situação económica dos seus progenitores, teve muito cedo que aprender a arte de serralharia e só mais tarde é que conseguiu matricular-se numa escola primária nocturna que aqui funcionou e de que era professor o falecido João Maria Pereira Campos.

Foi, depois, nas oficinas de serralharia civil, que existiam na Rua Tenente Resende, pertencentes a Manuel Ferreira, também já falecido, que Manuel Bóia começou a mostrar as suas aptidões e a sua grande vontade de saber. Relacionou-se logo com os primeiros operários dessa indústria e foi com eles trabalhar para as minas de Ervedosa (Trás-os-Montes) de onde regressou passados anos com bastantes conhecimentos adquiridos. Começou então a fazer reparações, quer em casa dos clientes, quer em modestíssimas oficinas como as que estiveram instaladas nas ruas do Americano e da Sé.

Mais tarde, associado a seu irmão Domingos, estabeleceu-se na Rua das Barcas com oficina de reparação de automóveis e motores, bem como a de montagem de máquinas de todas as espécies, comprando então, com o auxílio de pessoas amigas, que lhe reconheceram qualidades de trabalho e honradez, umas maquinetas e algumas ferramentas. Tentou ainda, associado a outro amigo que lhe forneceu os fundos e os créditos necessários, o negócio de automóveis novos, mas foi infeliz nesta empresa e para pagar os prejuízos esteve tentado a ir até África. Foi dissuadido por esse amigo que, além de esperar pelo dinheiro, o encorajou a desenvolver a sua oficina. Dedicou-se, por isso, com mais afinco, ao fabrico de máquinas de mármores e montagem de apetrechos de navios, conseguindo, mercê de uma boa orientação, clientela de todos os pontos do país.

De uma grande actividade e visão e com um feitio especial para encarar as dificuldades financeiras, que a todo o momento surgiam, conseguiu, ao cabo de uma luta titânica, uma situação desafogada, que lhe permitia desfrutar no meio industrial de Aveiro de certo prestígio. E assim, com a colaboração de seus irmãos, conseguiu elevar as suas modestas oficinas ao nível em que actualmente se encontram, honrando a nossa terra pelos trabalhos executados e pelas máquinas que fabrica, espalhadas não só pelo país, como pelas Áfricas e até pelo Brasil.

Uma grande parte das serrações e carpintarias mecânicas, montadas durante e depois da guerra, estão a trabalhar com máquinas saídas das oficinas da firma Bóia & Irmão, rivalizando com as que eram dantes importadas. Também muitas serrações de mármores e granito estão equipadas com máquinas daquelas oficinas, assim como muitos dos navios das frotas bacalhoeiras e da marinha mercante.

Depois de tantos esforços e de tantas energias despendidas para conseguir ver a sua indústria com o material indispensável, fim que conseguiu atingir com a colaboração de seu irmão Carlos, veio a doença, que abalou primeiro o seu organismo, e depois a morte, que o atirou para a sepultura.

O enterro constituiu uma verdadeira manifestação de pesar, tal o avultado número de pessoas que nele se incorporaram e que formava, com as duas corporações de bombeiros, extenso cortejo. Da chave da urna era portador o Sr. desembargador Melo Freitas e muitas foram as coroas e bouquets oferecidos, alguns com sentidas dedicatórias.

O activo industrial deixou viúva, com três filhos menores, a Sr.ª D. Adelina da Silva Bóia, para quem vão as nossas condolências, extensivas aos Irmãos e demais família enlutada.

(“O DEMOCRATA” – 7 de Agosto de 1948)

 

Colaboração

Fátima Bóia

Página anterior Índice de conteúdos Página seguinte

25-07-2024