Acesso à hierarquia superior.

N.º 26/28

Publicação Semestral da Junta Distrital de Aveiro

1979/1980

Das Corporações de artes e ofícios. Taxas e Cartas de examinação (séc. XVIII) na Vila da Feira

Pelo Padre Aires de Amorim

De tradição romana, cedo notamos em Portugal a organização dos mesteres, palavra que engloba os ofícios mecânicos, o pequeno comércio, certos trabalhos rurais e a pesca.

Os mesteirais estavam ligados à sua bandeira, símbolo cívico da Corporação, inscritos numa Confraria que encabeçava os oficiais dum ofício e afins, sujeitos a um Regimento, agrupados nas cidades em arruamentos (Rua dos Caldeireiros, Rua da Bainharia...) com suas tendas, assistidos por seus hospitais.

Estas facetas da vida corporativa não nos aparecem simultaneamente. É a partir do século XII que se processa a regulamentação dos ofícios. Quanto às taxas dos ofícios mecânicos, as mais antigas são de 1145. No mesmo século, já se encontram os mestres arruados nas cidades e vilas importantes, sendo isso, em algumas partes, obrigatório. No século seguinte, notam-se as Confrarias dos mesteirais com sua vida religiosa. Quanto ao seu carácter político, económico e assistencial, documenta-se, a partir do século XIV.

Se é, pois, no século XII, que em Portugal começam a aparecer indícios das Corporações de ofícios, no século XIV, com a instituição da Casa dos Vinte e Quatro, crescem em importância, e nos séculos XV a XVII regulamentam-se os mesteres, procurando privilégios, para se isentarem de obrigações económicas ou militares.

Cada ofício tinha o seu regulamento ou Regimento, que pautava o exercício da profissão, «estabelecendo regras de trabalho e de recrutamento de mão-de-obra, tabelamento de preços e de salários, etc.», obrigando sob penalidades. Temos os ditos Regimentos, a partir do século XV. A maior parte, porém, é dos séculos XVII-XVIII e, embora raros, como o dos sombreireiros, também os há no século seguinte.

As Confrarias possuíam o seu compromisso, a que era estranho o poder civil, compelindo os do ofício (p. exemplo, os marinheiros de Miragaia, a pagarem para a sua Confraria de S. Pedro), doutro modo não gozariam dos privilégios da classe. Ordinariamente, o Compromisso está redigido com simplicidade. Há, porém, uma excepção. Creio não haver literatura deste género que tão pouco se pareça com o Memorial que antecede os Estatutos ou Compromisso da Confraria dos Ferradores e Alveitares, dirigido ao Senado do Porto, em 1737. Nele aparecem frases latinas, cita-se ou alude-se a Aristóteles, Santo Agostinho, Cepola, Isaías, Hércules, Santo Elói e S. Floro, Bártolo Baldo, Jasão, Redondo, Colunela, Catão, Varrão, Vegécio, Xenofontes, Virgílio, Hipócrates, Absirto, Teomnesto, Alexandre Magno, César...

As Confrarias dos mesteirais não tinham só finalidade religiosa, caritativa e assistencial, mas ainda profissional, corporativa. Um exemplo. No «Registo do Compromisso do Officio de Carpinteiro desta Cidade» do Porto, de 1785, a cuja Confraria de S. José e S. Braz, erecta no Convento de S. Francisco da mesma cidade, estavam agregados também os ofícios afins de enxamblador, torneiro, polieiro, escultor, entalhador e violeiro, fala-se nos juízes do ofício, a eleger em cada ano, que seriam confirmados pela Câmara; na correição feita pelos ditos juízes, almotacés e escrivão da Confraria, visitando as obras, multando os mestres e obrigando-os a desfazer os serviços mal executados e a tornar a fazê-los, à sua custa, impedindo que montem tenda mestres sem carta ou com eles trabalhem quaisquer oficiais; alude-se ainda à hierarquia dentro do ofício.

Ascender a mestre de tenda era ter percorrido anos na aprendizagem e no oficialato do respectivo ofício. O aprendiz devia ter o mínimo de 14 anos. Matriculava-se na oficina dum mestre e completava a aprendizagem, ao fim de dois (carpinteiro), cinco (bainheiro, cordoeiro), seis (caldeireiro), oito (cerieiro) anos... Após este tempo, o mestre participava o nome do aprendiz à respectiva Confraria, para ser inscrito como irmão. / 15 /

Seguia-se o oficialato, em mais ou menos anos, consoante as profissões, ao fim do qual se procedia a exame e, aprovado, obtinha-se a carta de profissão, podendo-se, então, abrir uma oficina.

O Senado das Câmaras Municipais velava pela boa ordem nas Corporações dos mesteres, nomeando juízes para os vários ofícios, defendendo o público da incompetência dos artistas e das suas exorbitâncias.

Ninguém podia exercer uma profissão, sem que a Câmara lhe passasse a respectiva licença ou «Carta de examinação». Para a obter, devia o oficial submeter-se a exame, perante o juiz do ofício – nos Regimentos descriminava-se, em pormenor, a parte teórica e prática do exame – e, aprovado, requerer à Câmara a dita carta, certificando-a das suas habilitações. Juntamente com ela, era-lhe passada uma tabela de preços, para sua regulamentação.

Sobre mesteres, tem a Câmara Municipal da Vila da Feira dois livros do século XVIII, de que vou passar a socorrer-me:

– «Livro de Acórdãos novos e de outros reformados dos antigos ordenados com a gente da Governança e povo desta Villa, Concelho e Couttos na Camera della – anno de 1713»,

– «Cartas dos officios, e seus dezistementos» começado em 1-3-1795.

Por eles temos conhecimento dos mesteres e seus juízes, de 1723 a 1831, no dito concelho:

Sombreireiro – João Álvares de Matos (1723), da Feira;

Pedreiro – Manuel Dias (1723), de Sanfins; – Sebastião Gonçalves (1723), da Feira; – António José Caitano (1829), da Vergada;

Canastreiro – André Pinto (1723), de Sanfins;   – José Francisco de Pinho Novo (1829), de Guisande;

Ferreiro – João Ferreira (1723), de Travanca, que ainda exercia em 1728;

Carpinteiro – António de Oliveira (1769), de Sanguedo; – Manuel Ferreira Coelho (1769), da Feira; – António Alves de Oliveira (1827), de Moselos; Cordoeiro – Francisco Pinto (1812), de Esmoriz;

Trolha – Joaquim Pereira dos Santos (1826), da Feira;

Alfaiate – Francisco Gomes da Costa (1829), da Feira;

Serralheiro – Domingos José de Araújo (1829);

Ferrador e Alveitar – Luís António Pereira (1829), da Feira;

Tamanqueiro – Manuel Nunes de Oliveira (1830), da Feira;

Cortador de carnes – Joaquim Pinto (1831), da Feira.

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*   *

Os «Rigimentos dos officios» tabelavam os artigos. As taxas «protegiam o consumidor e davam justo galardão aos oficiais mecânicos». Ou, por palavras do Corregedor Gonçalo Vasques Seirão, em 1412: «os que hussarem dalghuuns mesteres e oficeos ajam galardom e as outras partes ajam essas cousas que lhes mester fazem por iguall valya e nom sseiom em ello agravados».

As primeiras taxas que conhecemos são constantes das posturas camarárias de Coimbra, de 1145. Segue-se-lhes a lei de D. Afonso III de 26-XII-1253, referente às tabelas dos alfaiates e sapateiros de entre Douro e Minho. (Há quem opine que são extensivas a todo o país). Mais tarde, D. João lI, em 20-4-1487, em carta à Câmara do Porto, estatuiu que todos os anos se procedesse à sua elaboração (1):

«E vos escrepuerees aos lugares de vossa comarqua e almoxarifados e aos lugares chaaõs a que nos nom escrepuemos fazendo lhes tudo isto saber e rrequerendo lhes que façam as ditas taxas na dita maneira».

É a partir de 1401 que a Câmara Municipal do Porto procura taxar certos artigos dos mesteirais; a derradeira notícia da sua intervenção neste Capítulo é de 7-7-1701.

Conhecem-se de 1723 os preçários de obra executada, ditos «Rigimentos dos officios» de sombreireiros, pedreiros, canastreiros e ferreiros, estabelecidos pelo Senado feirense e assinados pelos respectivos mestres. É de notar que, tendo examinado os de ferreiro de 1723, 1728 e 1779 e os de carpinteiro de 1769 e 1787, verificamos, não obstante uma dilação de tempo tão importante, no primeiro caso, e até no segundo, que os preços, protegidos pela cominação de uma multa (para os sombreireiros, pedreiros e ferreiros, de 2$000 e para os canastreiros, de 1$000 reis) se manteem sempre os mesmos.

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Vejamos, agora, os acórdãos camarários da Vila da Feira sobre os Regimentos. Devem ser todos de 6-2-1723, com excepção do último, que é de 13 do mesmo mês e ano.

 

«Acórdãos do Regimento

Em Câmara de seis de Fevereiro de mil setecentos e vinte e três anos em acto de vereação que faziam o Doutor Estêvão Tavares, Juiz de Fora com alçada nesta vila e seu território, e os vereadores António Vaz de / 16 / Aguiar e o Licenciado Constantino de Carvalho Pereira, presente o Procurador do Concelho Domingos Pedro de Bastos fizeram os Regimentos dos Ofícios na maneira seguinte:

Sombreireiro

De um chapéu que tinha um arrátel de lã de seis dedos de altura e sete palmos, digo, e sete palmos de aba, forrado de holandilha preta, levarão por ele seiscentos reis.

De um chapéu que tinha meio arrátel de lã que terá quatro dedos de altura e cinco dedos de aba, forrado de holandilha, levarão por ele quatrocentos reis.

De um chapéu que tinha três quartas de lã de seis dedos de altura e outros seis de aba, forrado de holandilha preta, levarão por ele quinhentos reis.

De um chapéu que tinha seis onças de lã de quatro dedos de altura e, digo, de três dedos de altura e quatro de aba, forrado de holandilha, levarão por ele trezentos reis.

E sendo pardos levarão o mesmo preço e serão forrados de holandilha. De tingir um chapéu fino levarão cento e cincoenta reis. De tingir um chapéu de lã ordinária levarão sessenta reis.

De um chapéu para frade bento ou lóio que tenha arrátel e quarta de lã levarão oitocentos reis, levando seu forro de carneira, como também sendo branco ou pardo para frade franciscano ou carmelita.

De tingir um chapéu ordinário e o forrar de holandilha fina, levará cento e vinte reis.

De tingir e forrar chapéu fino, sendo o forro de holandilha fina, levarão duzentos e quarenta reis.

E acordaram que todos os sombreireiros tenham este Regimento e se governem por ele, sob pena de dois mil reis para acusador, Concelho e terça de sua Magestade. E assinaram com o mestre examinador do dito ofício.

João Álvares de Matos, desta vila e se apregoou o dito Regimento e acórdão pelo porteiro Manuel Carvalho. Eu, João de Oliveira Magalhães, escrivão da Câmara o escre[vi]. Juiz de Fora. Tavares. De Bastos. Carvalho. João Álvares de Matos (2)».

«Pedreiro

De um portal de esquadria de oito palmos de altura e cinco de largo, dando o dono da obra as achegas, quatro mil reis.

De um portal de dez palmos de alto e de seis em vão de largo de boa (?) esquadria quatro mil e oitocentos reis, chegando o dono da obra a pedra e o mestre quebrá-la e lavrá-la e o assentar por conta do dono da obra.

De um portal para portas fronhas de carro ou liteira e o mais necessário de onze palmos de altura e de largo nove palmos em vão de boa (?) esquadria, dando o dono da obra as achegas e o mestre quebrá-la e lavrá-la, sete mil reis e o assentar por conta do dono da obra. E sendo o mesmo portal com quartões (?) e cruz e pirâmides catorze mil reis, dando seu dono as achegas e por sua conta o assentar e quebrá-la e lavrá-la o mestre.

De uma janela de esquadria de cinco palmos de altura do peitoril para cima e quatro palmos e meio de largo dois mil e quatrocentos reis, dando o dono da obra as achegas na forma acima.

De uma jenela de sacada de nove palmos de altura e de quatro palmos e meio de largo em vão oito mil reis, dando seu dono as achegas na forma acima.

De uma cantareira de esquadria com seu repartimento de três palmos de altura cada repartimento e de largo quatro palmos e meio levarão dois mil reis, tudo na forma acima.

De fazer uma escada de oito palmos de largo de boa (?) esquadria levarão por cada degrau trezentos reis e quanto ao corrimão levarão conforme a moda que o mandarem fazer.

De um cruzeiro de treze até quinze palmos de altura com três vias de degraus fora a peanha, de boa (?) esquadria, dando o dono da obra as achegas, na forma acima, levarão vinte mil reis. E terá a travessa sete palmos e, às vezes, menos, conforme pedir a altura.

De cruzes para Via-sacra de oito palmos de altura e a travessa de quatro palmos ou quatro palmos e meio, tendo só a peanha e não tenha degraus, dois mil e quinheitos reis, dando-se-lhe as achegas na forma acima.

E sendo de degraus de oito palmos em quadra o primeiro e o segundo de seis, dando-se-lhe as achegas levarão cinco mil reis.

E nas mais obras que toca ao dito ofício levarão conforme os apontamen[tos] com que se mandam fazer em razão ...   ...   ... levando mais lavores.

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Castelo da Feira

Alvenaria

De uma braça de parede de dez palmos de comprimento e outros dez de altura e de três palmos e meio de largo até o sobrado, levarão a seiscentos reis, e das traves para cima a oitocentos reis, dando o dono da obra a cal e saibro ou barro preparado e quem o acarrete à parede.

De braça de parede para casa térrea de três palmos em largura dando o dono da obra o barro ou cal e saibro posto na parede, levarão a quatrocentos e oitenta reis.

De jornal por dia e de comer, assim em obra de esquadria como de alvenaria, a cem reis; e sendo a seco, a duzentos reis.

De jornal por dia de quebrar pedra na pedreira, sendo a comer, cento e cinquenta reis: e sendo a seco, a duzentos e quarenta reis. / 17 /

E acordaram que todos os pedreiros tenham este Regimento e se governem por ele, pena de dois mil reis, aplicados para a terça de Sua Magestade e Concelho e acusador e mandaram apregoar e o foi pelo porteiro Manuel Carvalho e assinaram com os mestres Manuel Dias, de Picalhos, de Sanfins, e Sebastião Gonçalves, da Velha, desta Vila, mestres do dito ofício. Eu João de Oliveira Magalhães, escrivão da Câmara, o escre[vi]. Tavares. De + Sebastião Gonçalves. Aguiar. Carvalho. Bastos. De + Manuel Dias (3)».

«Canastreiros

De cada cesto para esterco sendo bem afouto, levarão sessenta reis. E não sendo tal, levarão cincoenta reis.

De uma cesta para estrume de dois aros afouta que leve alqueire e meio de milho, levarão sessenta reis.

De uma canastra para a eira que leve cinco alqueires de milho e de boas (?) latas (?) e bem afouta, levarão cento e cincoenta reis e terá um aro.

De canastras para jumentos abertas, levarão a cincoenta reis.

De canastras para cargas de bestas maiores, levarão a sessenta reis.

E sendo cobertas as dos jumentos, levarão a setenta reis.

E sendo as das bestas maiores cobertas, levarão a noventa reis.

De canastras grandes para carro de ?........ levarão a duzentos reis; e sendo cobertas, a duzentos e quarenta reis.

De uns cofinhos para bois, levarão a trinta reis. De canastras para curar meadas e para a roupa, levarão a sessenta reis.

Obra de correa (4) miúda

De um maço de canastras de correia miúda muito brochada, para fechar com cadeado e para incourar que são três canastras, e terá de levar a primeira seis alqueires de pão, levarão pelo dito maço novecentos reis e hão-de ser cobertas.

De uma canastra fechada de correia mais grossa que leve cinco alqueires de pão, levarão a duzentos reis.

De uma canastra fechada de correia mais grossa que leve cinco alqueires de pão, levarão a duzentos reis.

De uma canastra da mesma sorte que leve três alqueires, levarão cento e vinte reis.

De um maço de cestos redondos de correia miúda que são três cestos metidos uns nos outros e o primeiro há-de levar alqueire e meio de milho, levarão pelo primeiro cem reis e pelo segundo oitenta reis e pelo terceiro sessenta reis.

De um canistrel que leve um alqueire de corra mais grossa, levarão cincoenta reis e de meio alqueire, levarão trinta reis e de quarta, vinte reis. De um berço de meninos de correia miúda, levarão duzentos e quarenta reis; e sendo de correia grossa, levarão a cento e vinte reis.

Balaios de mesa de correia grossa de meio alqueire, a vinte reis cada um. / 18 /

E acordaram que todos os canastreiros tirassem carta de examinação e este Regimento e se governassem por ele, pena de dois mil reis, aplicados para a terça de Sua Magestade que Deus Guarde e para o Concelho e acusador, digo, pena de dois mil reis, digo, de mil reis, aplicados na forma dita e assinaram com o Mestre do dito ofício, André Pinto, de Sanfins, do termo desta Vila, e mandaram apregoá-lo, que o foi pelo porteiro Manuel Carvalho. Eu, João de Oliveira Magalhães, escrivão da Câmara, o escre[vi]. Aguiar. Carvalho, Bastos. Tavares. André Pinto (5)».

Ferreiro

«De fazer uma enxada nova de cinco arráteis de ferro calçada de aço, quinhentos reis ... ... 500

De temperar uma enxada, vinte reis... ... ... 020

De a calçar, sento e vinte reis... ... ... ... ... 120

De chapear uma enxada e calçá-Ia, trezentos reis 300

E sendo meia chapa e calçada, duzentos reis ... 200 E sendo meias enxadas na forma acima, duzentos e cinquenta reis ... ... ... ... ... ... 250

De um machado novo de cinco arráteis bem calçado, quinhentos reis ... ... ... ... ... ... 500

E tendo seis arráteis, seiscentos... ... ... ... ... 600

De uma fouce roçadoura bem calçada, duzentos e quarenta reis ... ... ... ... ... ... ... ... 240

E sendo de poda, cento e sessenta reis... ... ... 160

E sendo de cortar de devesas, quatrocentos e oitenta reis ... ... ... ...  480

De uma poda bem feita e calçada, cento e oitenta reis ... ... ... ... 180

De um sacho por calçar, sessenta reis... ... ... ... 060

E sendo calçado, oitenta reis ... ... ... ... 080

De um arado de seis arráteis, quatrocentos reis para charrua ... ... ... ... 400

De um arado de mão, sendo bom, duzentos reis... 200

De um assuco, cento e sessenta reis... ... ... ... 160

De uma certã de doze arráteis, novecentos e sessenta reis ... ... ... ... 960

E sendo de metade do dito peso, quatrocentos e oitenta reis ... ... ... ... 480

De um espeto de quatro arráteis, trezentos reis ... ... ... ... 300

E sendo de mais ou de menos, a respeito do peso acima declarado, assim levará.

De um alvião calçado, levará o arrátel a cem reis 100

De uma foucinha sendo calçada, a sessenta reis ... ... ... ... 060

De umas trempes, levarão pelo arrátel a oitenta reis 080

De um cento de pregos caibrares, duzentos e quarentas reis ... ... ... ... 240

De um cento de pregos tabuares, a cento e cincoenta reis ... ... ... ... 150

De um cento de pregos ripares, a cem reis ... ... ... ... 100

De um cento de taxas de cabeça, a sessenta reis do forro ... ... ... ... 060

E sendo de arquitrave, a oitenta reis ... ... ... ... 080

De engonços para caixas, a vinte reis ... ... ... ... 020

De colheres de ferro, a setenta reis cada arrátel que pesar ... ... ... ... 070

De testos de ferro, o arrátel a setenta reis ... ... ... ... 070

De um gancho (?), a oitenta reis o arrátel ... ... ... ... 080

De uma sega, a setenta reis o arrátel ... ... ... ... 070

Acordaram com o mestre juiz do ofício, João Ferreira, morador em Travanca, que todos os ferreiros tivessem este Regimento e se governassem por ele, pena de dois mil reis, aplicados para a terça e Concelho e acusador e o mandaram apregoar e o apregoou o porteiro Manuel Carvalho e assinaram. Eu, João de Oliveira Magalhães, escrivão da Câmara, o escr[evi]. Bastos. [assinatura ilegível]. Tavares. Teixeira. João Ferreira (6)»

Cartas de examinação

Denunciando o alto apreço em que, então, eram tidos todos os ofícios, vejamos o estilo pomposo, solene, em que se redigiam as cartas de qualquer humilde mesteiral.

Carta de carpinteiro (1769):

«O Doutor Diogo Soares Tangil, Juiz de Fora do Geral nesta Vila da Feira por sua Altesa Real, e na mesma e seu termo, com alçada por Sua Magestade Fidelíssima que Deus guarde; e os Vereadores do Senado da Câmara abaixo assinados, etc. A todos os senhores Doutores Corregedores, Provedores, Ouvidores, Julgadores, Juízes, Justiças, Oficiais e mais pessoas dela deste Reino e Senhorios de Portugal, àqueles a quem adonde e perante quem ela apresentada e o verdadeiro conhecimento dela com direito direitamente deva e haja de pertencer, por qualquer via, modo, forma, maneira ou razão que seja, etc. Fazemos-lhes a saber em como nesta vila, em acto de Câmara, nos foi apresentada uma certidão passada pelo juiz do ofício de carpinteiro F. pela qual constava que ele tinha examinado e aprovado do mesmo ofício a F....

Carta de ferrador (1739):

«Manuel Pinto Leitão, examinador dos professores de ferrar neste Reino por Sua Magestade e privilégio a mim concedido. Pela presente concedo licença para poder usar da dita arte em qualquer parte deste Reino

a F....... porque, sendo por mim examinado, foi achado com toda a capacidade necessária para exercitar a dita arte na qual se haverá com o zelo e satisfação do bem público, por este ser de grande utilidade ao Reino... (7)». / 19 /

Carta de ferrador e alveitar (1750):

«João Gonçalves do Câmara Coutinho, Comendador das Comendas de S. Miguel de Bobedela, Santiago de Ronfe, S. Salvador de Maiorca, Almotacé-Mór do Reino e Senhorios de Portugal, etc. Faço saber a todos os Corregedores, Provedores... que eu mandei examinar do ofício de ferrador e alveitar o F... (8)».

Carta de parteira (1762):

«António Soares Brandão, Cavaleiro Professo na Ordem de Cristo, Fidalgo da Casa de Sua Magestade, cirurgião de Sua Câmara Real dos seus exércitos e cirurgião-mór do Reino e suas conquistas pelo dito Senhor, etc. Faço saber a todos os Corregedores... que eu dou licença a F... para que ela possa usar do ofício de parteira, o que comumente chamam comadre... (9)».

E, já agora, a título de curiosidade, mais alguns extractos de cartas de surgião, algebista e sangrador.

Carta de surgião (1742):

«O Doutor Francisco Xavier Leitão, médico... Dou licença a F.... para que ele possa curar de feridas, digo, curar de surgia nos casos de feridas simples, chagas e apostemas leves, e nos penetrantes fará a primeira cura (10)».

Havia carta de surgia e de meia surgia, consoante o âmbito da licença concedida.

Carta de algebista (1753):

«O Licenciado António da Costa Falcão, Cavaleiro Professo na Ordem de Cristo, médico da Câmara de Sua Magestade e surgião-mor de seus Reinos e Senhorios de Portugal, faço saber a todos os Corregedores, Provedores... que eu dou licença a F..... para que ele possa curar de algebista deslocações e fracturas... (11)».

Carta de sangrador (1742):

«O Doutor Francisco Teixeira Torres, médico da Câmara de Sua Magestade e dos Sereníssimos Senhores Infantes D. António, D. Manuel, do Excelentíssimo Cardeal Patriarca da Inquisição e do Senado da Câmara desta cidade de Lisboa e surgião-mór nestes Reinos e Senhorios de Portugal, etc. Faço saber a todos os Corregedores, Provedores, Ouvidores, Juízes e Justiças, oficiais e pessoas dos ditos Reinos e Senhorios a quem esta minha carta for mostrada e o conhecimento dela com direito pertencer, que eu dou licença a F..... para que ele possa sangrar, sarrafar, lançar ventosas, sanguessugas, o que poderá exercitar em todos estes Reinos e Senhorios de Portugal, porquanto foi examinado pelo (sic) meu (sic) comissão F... (12)».

*

*   *

Eclodiram as leis do Liberalismo na Europa e o nosso país não pode furtar-se à sua influência revolucionária. A engrenagem das Corporações, com sua orientação humanista e cristã, pugnando por uma hierarquia de competências, dominando os limites do lucro, vigiando a execução do trabalho, recebeu, em nome da Liberté, o seu golpe mortal com a lei de 7-V-1834, em vez de, a bem dos assalariados e dos mestres, ser actualizada e reestruturada.

Dentro de algum tempo, os operários, vítimas do Liberalismo económico, passariam a ser explorados, a ter salários e condições de vida miseráveis e o trabalho sofreria em qualidade, mas tinha-se dobrado mais uma página da História.

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NOTAS

(1) – Já nas Cortes começadas em Évora em 1481, tinha mandado o Rei que, uma vez por ano, ou mais, se necessário, fossem taxados os preços das cousas em todo o país.

(2) – Arq. da Câmara Municip. da Feira – «Livro de Acórdãos nouos e de outros reformados dos antigos ordenados com a gente da Governança e povo desta Vila, Concelho, e Couttos na Camera della – Anno de 1713», fls. 74 v.-75.

(3) – Id., fls. 75 v.-77.

(4)Correa, o mesmo que corra, vocábulos que, ambos, aparecem no texto.

(5) – Id., fls. 77-78.

(6) – Id., fls. 78 e segs.

(7) – Arq. da C. M. da Feira – «Registo de Provisões – 1750-1754», fls. 162.

(8) – Id., fls.. 34.

(9) – ld., fls. 221.

(10) – Id., fls. 208 v.-209.

(11) – Id., fls. 138 v.

(12) – Id., fls. 33-33 v.

Na transcrição dos Regimentos e cartas de examinação, actualizei a ortografia e pontuação, para melhor leitura.

 

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:

– Carvalho, A. L. de – «Os mesteres de Guimarães». I voI., 1939.

– Carvalho, J. M. Teixeira de – «Taxas dos ofícios mecânicos da cidade de Coimbra no ano de MDLXXIII», Coimbra, 1922.

– Cruz, António. – «Os mesteres do Porto no século XV – Aspectos da sua actividade e taxas de ofícios mecânicos» (Separata do «Boletim Cultural da Câmara Municipal do Porto», voI. III, fase I), Porto, 1940.

– Idem. – «Da organização dos Mesteres do Porto», edição do Gabinete de Divulgação da Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho, s/d.

– Idem. – «Os Mesteres do Porto – Subsídios para a história das antigas corporações dos ofícios mecânicos», voI. I. Edição do Subsecretariado de Estado das Corporações e Previdência Social, Porto, 1943.

– Dicionário de História de Portugal, dirigido por Joel Serrão, S. V. Aprendiz.

– Ferreira, J. A. Pinto. – «Os mesteirais na administração pública em Portugal» (Subsídio para o estudo desta classe. Compromisso e estatuto da Confraria dos Alfaiates do Porto). Edições Marânus, Porto, 1951.

 

páginas 14 a 19

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