Dado o assinalável interesse de que
se revestem para a Região do Vouga, os assuntos tratados no
Colóquio, publicamos. na íntegra, as intervenções dos Srs.
Engenheiros-agrónomos José Gamelas Júnior e Cartas Manuel Ferreira
Maia e do Veterinário, Dr. Jaime Rodrigues Machado.
No próximo número, contamos inserir
as demais intervenções.
Distribuição de prémios
Engenheiro Agrónomo JOSÉ GAMELAS JÚNIOR
Os que nos visitam devem merecer a
nossa consideração e ser honrados em prioridade de atenções. Sede
bem-vindos a um colóquio onde se vão debater problemas importantes
da nossa casa. Para ele vos convidamos a intervir sempre que
queirais, porque é-nos cara e tida em grande conta a opinião dos
amigos, e tanto mais quanto é certo que para alguns o tema da
matéria em foco também interessa directa ou indirectamente.
Uma advertência quero aqui formular
logo no início desta minha intervenção. Falarei apenas e
exclusivamente na minha qualidade de Presidente da Junta Distrital
de Aveiro e, como tal, peço que seja entendido tudo quanto disser.
Três ordens de considerações,
ligadas ao tema do colóquio, desejaria aqui abordar muito rápida e
sinteticamente:
1) A agricultura, nas suas
incidências com a bacia do Vouga
É natural, e mesmo exigível, uma
palavra sobre a agricultura, na medida em que está hoje
particularmente em foco em Aveiro, num dos seus sectores que
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mais hipóteses oferece para um desenvolvimento técnico, económico e
social a nível europeu. E bem está esta chamada das atenções gerais,
que se desejaria perdurasse como nota de permanente alerta no
pensamento e nas preocupações de responsáveis e de interessados.
Torna-se cada vez mais evidente aos
olhos de toda a gente que a vida do nosso mundo rural se situa numa
fase crítica. Embora tardiamente, está a sentir os reflexos da
Revolução Industrial, que se manifestaram mais ou menos
convulsivamente por todo o universo. r: toda uma vasta e profunda
transformação social em curso, que agora é mais rápida, e, por isso,
muitas vezes dura, quando não mesmo agressiva; é um salto gigantesco
para novas e melhores fórmulas de vida, que não se alcançarão sem o
sacrifício de muitos que, infelizmente, ficam cilindrados pelo
caminho, a cujos escolhos e espinhos não conseguiram adaptar-se.
E estes são tais e tantos que
provocam uma ambiência de perturbação económica e social tanto maior
quanto mais faltar uma política adequada, amortecedora de choques e
simultaneamente orientadora e incentivadora de progresso por linhas
de rumo seguras.
Aparece, em primeiro lugar, o êxodo
agrícola, que atingiu a sua máxima expressão no fluxo emigratório e
no condicionalismo mais aliciante do sector secundário. E ainda o
próprio desenvolvimento da indústria, que se apoiou e ainda apoia na
agricultura, impelindo-a para uma evolução lenta e espasmódica, com
o abandono gradual do regime de auto-suficiência vergiliana e
adopção de métodos de economia de mercado, onde a preparação do
homem é fundamental para atacar de frente os problemas da tecnologia
da produção e da comercialização em contínua e célere marcha,
enxertados em estruturas anquilosadas que não oferecem condições de
rentabilidade aos capitais investidos.
Mas não nos demoremos mais na
citação dos factores que imprimem desorientação no viver da nossa
agricultura, que, todavia, paradoxalmente, se vai preparando para
voos que a personalizam, na conquista de um lugar ao sol a que tem
direito.
Visita à exposição documental da Junta Distrital de Aveiro pelo
então Secretário de Estado da Agricultura,
Eng.º Vasco Leónidas.
Propriamente no Distrito de Aveiro,
onde o arranque industrial se desencadeou para níveis de
desenvolvimento já muito apreciáveis, a agricultura, embora
evidentemente mais rígida nos processos de evolução, lá vai
singrando na sua escalada do Calvário. Tropeção aqui e além, sem
planeamento idóneo e seguro, negando a condição de ser um «modo de
morte» para continuar a ser antes um «modo de vida», certo é que,
armstada mesmo pela onda expansionista do sector secundário, a
agricultura, aqui, embora deprimida, virou-se para a e,conomia de
mercado em termos já de relevância, atingindo níveis mais elevados
de desenvolvimento que em muitas outras regiões.
Está em curso a formação de uma nova
mentalidade que a ajuda a adaptar-se a novos condicionalismos,
/ 47 /
onde a competição é factor comum e determinante; procura mais
ousadamente empresas dimensionadas, onde o fenómeno cooperativo
começa a ter expressão; participa nos mecanismos da vida económica,
repartindo o valor da produção agrícola pelos de outros sectores,
que lhe fornecem bens e serviços, cujos encargos figuram nos custos
de produção ou nos investimentos.
Luta constante esta, em que se joga
a todo o momento a sorte de muitos, com os seus problemas humanos
minimizados ou postergados pela frieza impiedosa de uma onda
materializadora da vida. Apesar de todos os desânimos e de um mar de
ilusões desfeitas, não há tréguas nem esmorece o afã posto na busca
do equilíbrio com os outros sectores. Ainda bem que assim é, porque
se a expansão industrial depende em alto grau da transformação das
estruturas e da técnica agrícola, na medida em que deste mecanismo
se proporciona o alargamento dos mercados de bens de equipamento e
de consumo, também qualquer atraso na agricultura, mercê de uma
política económica menos cuidadosa ou desajustada das realidades,
que não respeite uma intervenção prioritária, pode provocar um
bloqueamento que afectará toda a economia.
E é dentro desta panorâmica geral e
específica do sector primário, que o problema do Vouga tem de ser
visto a sério, como uma realidade que interessa efectivamente à
economia da região e do país.
Desfile do gado premiado e distribuição de prémios.
Estão aqui, bem perto de nós, cerca
de 11 000 hectares de óptimos terrenos de aluvião que há muito
esperam a atenção e cuidados dos homens, para que possam
desentranhar-se em riqueza. Está ali uma larga extensão de terrenos ubérrimos que evocam um passado rico e que o homem deixou perder, e
que diz mal e é um ferrete - porque é vergonha - no carácter
trabalhador, de conquista e de vanguarda do aveirense. É bem um
sinal – triste sinal – de evidente contraste de um povo todo atirado
para a frente, mas que teima em querer ter o pé atascado na terra
inundada e infecunda, que já nem é bucólica, porque é miséria
complacentemente consentida.
Os holandeses gastam rios de
dinheiro para conquistarem palmos de terra ao mar; nós, porém, temos
terrenos – e dos melhores – que, por incúria, deixamos perdê-los e
até parece que com indiferença. Regra geral, e já que as terras
permanentemente alagadas de água doce e salgada estão esquecidas e
não fazem mossa, só nos lembramos do caso nas épocas das inundações
e, então, apenas e através de um coro de lamentações inoperantes,
que vai perdendo força e quase se extinguiria se outros alargamentos
inoportunos não aparecessem a destruir colheitas e a empobrecer
ainda mais os que já são pobres.
Mas seremos nós um país tão rico que
nos permitamos dar ao luxo de desprezar a riqueza produtiva de 11
000 hectares de bons terrenos de aluvião? Como
/ 48 /
é possível a existência do contraste de querermos
louvavelmente aumentar o produto interno bruto, na mira de conseguir
acréscimos de riqueza para todos, e não darmos um passo, durante
anos sucessivos, para o aproveitamento adequado destes terrenos?
Sem se menosprezarem ou discutirem
as diligências e os investimentos canalizados para um melhor
aproveitamento de terrenos com futuro duvidoso, porque não foram
paralelamente lembrados estes campos, que oferecem mais fácil
resposta, numa região onde há tradição no manejo da água, e se impõe
uma política de fixação das gentes rurais?
O centro e o norte do distrito de
Aveiro é hoje uma realidade industrial, que muito pesa na economia
da nação. Se já constitui um autêntico polo de desenvolvimento,
mercê do espírito de iniciativa e empresarial existente, tudo indica
que, vencida a fase de arranque, naturalmente se caminhe para uma
dominância económica e social que se projecte e influa em vastas
áreas subjacentes, arrastando nomeadamente a agricultura para novos
estádios evolutivos.
E é neste contexto que estes 11 000
hectares da bacia do Vouga não podem ficar esquecidos, porque serão
indispensáveis para fazer face às novas e sucessivas exigências que
os circunstancialismos económicos desta vivência industrial
progressiva determinarão em prazo curto. Para a busca do equilíbrio
que norteia o sector primário, seria crime se não se mobilizassem
todos os recursos no sentido de proporcionar à agricultura e à nação
o acréscimo de riqueza que esta área possibilita com segurança.
Seria arriscado e constituiria erro de primeira grandeza que um
plano de fomento não incluísse nos seus objectivos prioritários esta
realidade evidente.
É do conhecimento geral estar já na
última fase a elaboração do projecto que naturalmente precede a
anunciada construção da estrada-dique Aveiro-Murtosa, uma das
estruturas fundamentais para se distinguir a ansiada recuperação
destes terrenos.
Faltaria à justiça e afigura-se-me
que daria uma triste nota de ingratidão se, como aveirense, não
destacasse a acção pertinaz do Governador Civil de Aveiro, Dr.
Francisco do Vale Guimarães, porque a ele se deve – à sua
inteligência e espírito objectivo sempre presente e à frente na luta
pelas realidades candentes, e ao seu amor à causa e progresso do
Distrito a que inteiramente se votou – a prossecução efectiva e
interessada dos estudos e da próxima concretização de uma obra tão
complexa, de preparação necessariamente demorada e tão dispendiosa.
Outras obras, porém, também
indispensáveis, estão estudadas com vista à obtenção integral deste
objectivo, como seja a barragem em Ribeiradio, e outras iniciativas
complementares de defesa e regularização do leito
do rio Vouga. Para elas continuará a
ser indispensável o interesse e o entusiasmo do Governador Civil de
Aveiro, mas parece-me que à sua volta se devia aglutinar uma falange
representativa e operosa mais dilatada e mais viva, de todos quantos
sentem a utilidade e projecção deste grande empreendimento.
Mais desenvolvidamente, um dos
oradores que me segue, trará elementos que melhor ajuizarão da
importância desta obra, com valores específicos que traduzem a
realidade actual e perspectivam o futuro, dentro das potencialidades
que a região oferece.
2) A indústria, como fonte
dinamizadora de progresso e de arranque em áreas a desenvolver
Mercê das naturais condições do
Distrito de Aveiro, nomeadamente a sua localização, e as qualidades
assinaláveis de iniciativa e sentido empresarial das suas gentes,
desde há décadas que, principalmente a sua parte norte e centro, tem
sido palco do despertar e de um sucessivo e mesmo espantoso
desenvolvimento industrial, que se processa em variadíssimos ramos
com projecção nacional e internacional.
É inegável a força deste centro
industrial, facilmente comprovada nos elementos estatísticos que o
boletim da especialidade faculta; é indiscutível a mentalidade
empresarial que domina o meio e orienta os caminhos dos seus
sectores, sem esforço confirmada em qualquer encontro com os seus
responsáveis.
Está neles, no factor humano, o
principal segredo do êxito, dando vida às ideias, continuamente em
renovação para uma exigível e vital adaptação aos processos
tecnológicos da produção e condições de comercialização de um mundo
em marcha acelerada.
Quem pára, fica para trás, e não se
domina o presente e muito menos se conquista o futuro. Mas não é
andar de qualquer maneira. Interessa marchar em frente, dentro de
uma acção estudada e coordenada, que pressupõe, a alto nível, um
planeamento que trace as linhas mestras do desenvolvimento.
Estudar, planificar e executar: três
palavras simples e que avalanche de problemas não envolvem!... Tal
como as palavras no dicionário ou as tintas a monte na paleta são
letra morta ou borrões sem vida, até que o escritor as ordene para
um texto entendível ou o artista combine as cores em quadro que
toque os sentidos, também o planeamento, por mais perfeito que seja
teoricamente, arrisca-se a um estrondoso fracasso, se não tiver a
sustentá-lo a inteligência lúcida, a objectividade pronta e o
espírito empreendedor do homem que o interpreta e executa com
entusiasmo, porque encontra nele utilidade e resposta aos seus
anseios.
Mas, planificar, no conceito de
incentivar a actividade privada para rumos que mais se entenda
interessar
/ 49 / ao desenvolvimento económico,
não pode deixar de estar imbuído de um sentido de prioridades, e
como tal obriga a que seja realista na análise dos parâmetros
existentes e corajoso na determinação de objectividades.
Exposição Documental - Apreciação da maquete da Região do Vouga
elaborada pelos Serviços Técnicos de Fomento.
Em nosso critério, este princípio
cresce ainda de importância e abriga a opções sérias se
considerarmos a nossa próxima entrada no Mercado Comum. Que se façam
experiências ou se promova o fomento de regiões menos desenvolvidas,
está certo e é indispensável; mas que com essa medida não se coarte
a expansão e mesmo transformação que aquele ingresse determina, nas
regiões já embaladas por uma tradição e com espírito industrial,
porque deverá ser essencialmente na base delas que se firmará a
nossa posição económica europeia.
Nós, aqui, no Distrito de Aveiro,
somos uma realidade viva no campo da indústria; sem qualquer dúvida,
constituímos um pólo de desenvolvimento. Para além da força
económica, o sector tem já uma velocidade de expansão adquirida que
se impulsiona a si próprio para novos estádios evolutivos e é capaz
de arrastar na sua órbita outras áreas menos favorecidas.
E para o aproveitamento adequado
deste condicionalismo, temos também planos amadurecidos na
experiência, que se pretendem ver superiormente apoiados, para os
quais há a segurança da participação da actividade privada.
Ora, um deles consiste, exactamente,
na concretização das obras estruturais que interessam à recuperação
dos terrenos alagados ou de exploração agrícola contingente do rio
Vouga. Permitir-se-á, desta forma, além do aumento considerável da
produção agrícola nos seus 11 000 hectares, dar novos horizontes à
região pela possibilidade de instalação de novas unidades fabris.
Não é difícil nem arriscado prever o que se afirma, na medida em que
haverá natural tendência para aproveitar com este fim uma região que
tem uma localização e condições óptimas: mão-de-obra disponível de
uma agricultura que oferecerá hipóteses de montagem em termos
empresariais e acessos fáceis e magníficos para o abastecimento de
matéria prima e escoamento de produtos laborados, não só para os
grandes centros consumidores nacionais, como ainda para o
estrangeiro, através da estrada – de uma estrada de via larga que se
impõe virada a Espanha – e do porto de Aveiro que, apesar do
movimento crescente de mercadorias que regista, está muito longe
ainda de esgotar as suas enormes possibilidades.
Por seu turno, com a utilização da
estrada que se indica, novas perspectivas se abririam às regiões doe
interior, mais pobres, porque são predominantemente agrícolas e hoje
de estímulos muito limitados para o desenvolvimento do sector
secundário. Com mão-de-obra disponível e então com fácil acesso,
estas regiões do interior, em direcção a Viseu, melhor poderão vir a
ser dinamizadas com base no pólo de desenvolvimento de Aveiro, a
partir da instalação de indústrias de apoio,
/ 50 /
dentro de uma cadeia estratificada que vise uma melhor economia
global.
E o Porto de Aveiro, termo ocidental
dessa estrada, terá que continuar a ser preparado e equipado para
responder às permanentes e crescentes solicitações de que é alvo.
Com a saturação hoje verificada do porto de Leixões, não vemos outra
solução mais económica e eficiente do que na sua complementarização
a partir do seu vizinho porto do Vouga. As suas condições naturais
facultam-lhe essa tarefa e não se negará a servir as exigências do
crescente desenvolvimento industrial do distrito, nem tão pouco
deixará de abrir as suas portas às imanadas um dia do interior,
mesmo mais distante que se queira conceber. Não lhe faltam recursos
para isso. Apenas se pretende que os investimentos a mobilizar pelo
Estado se apliquem tendo em linha de conta todas as efectivas
possibilidades que oferece, sem que com isto queiramos prejudicar ou
minimizar empreendimentos similares, para quem, aliás, desejamos
vivamente tratamento idêntico.
3) Consciência Distrital
Parece-me, finalmente, pertinente um
apelo ao revigoramento de uma consciência distrital. Sinto que, ao
fazê-lo, cumpro o meu dever, pelas funções que modestamente exerço e
como aveirense de que me orgulho de ser.
Apelo para uma consciência
distrital. Esta expressão, só por si, pressupõe que esta não existe
agora, ou, se existe, tem e abre continuamente brechas que em muito
a comprometem.
Para alguns, poder-se-á admitir que
não concordam com este apelo, porque até entendem que há
efectivamente consciência distrital. Não discutirei com eles, uma
vez que também julgo que, em alguns aspectos, poderá haver coisa que
satisfaça. E faço esta afirmação com propriedade, na medida em que,
ainda não há muito tempo, a detectei bastante viva num sector onde
supunha fosse bastante frouxa. Mas pedir-Ihes-ei desculpa por teimar
no meu apelo, porque sinto que, em termos globais, ela é muito
fraquinha.
Tenho conhecimento de que
ultimamente se diligencia no sentido de formar uma associação
industrial ao nível do Distrito de Aveiro. Bem hajam os promotores e
os que apoiam tal iniciativa. Que a chama do entusiasmo não se
apague e que tenham sorte na concretização dos seus propósitos.
Mas não vejo consciência distrital
no meio agrícola. Nem vestígios. E muito importava que existisse,
para com mais frequência se agitarem, se debaterem e se tentarem
soluções para os problemas que afectam a lavoura distrital, com
seria agora o caso da recuperação dos terrenos do rio Vouga.
Se constituímos uma força distrital,
temos que pensar e falar em termos de Distrito, porque só assim
marcaremos a nossa personalidade. Ninguém poderá tomar a mal este
anseio, porque não é, nem mais nem menos, que uma consequência da
nessa maturidade, que se criou na base de uma individualização de
caracteres.
Não é que eu seja partidário de
capelas e capelinhas, mas afigura-se-me serem por demais evidentes
as vantagens da existência de uma consciência geográfica
efectivamente imanizadora, que agrupe indivíduos motivados por
ideais específicos e comuns, quiçá diferentes de outras regiões. Não
está, neste contexto, todo o ideário de pátria?
Unidos e de acordo nos fundamentos
de uma unidade distritaI, somos uma força em todos os aspectos.
Ponhamo-nos assim em marcha para um futuro que é difícil e que
espera por nós. Este é o meu veemente apelo.
Tenho dito.
*
*
*
Eng. Agrónomo CARLOS MANUEL FERREIRA
MAlA
I – O APROVEITAMENTO DA BACIA DO
VOUGA; SUA IMPORTÂNCIA NA ESTRATÉGIA DO DESENVOLVIMENTO DA ZONA
INTEGRADA DO VOUGA
A existência, no eixo Aveiro-Viseu,
de uma «zona integrada», isto é, de «uma área potencial de regadio
com possibilidades de justificarem a instalação de indústrias
transformadoras de produtos agro-silvo-pecuários, permitindo a
prática de uma agricultura intensiva modernizada», enquadra-se na
óptica de um racional ordenamento do território, que visa a melhor
repartição dos factores produtivos, em função dos recursos
efectivamente utilizáveis, possibilitando a penetração, para o
interior, do processo de crescimento económico que tem como motor o
dinâmico parque industrial centrado no distrito de Aveiro e se apoia
numa infra-estrutura básica para a drenagem de todos os seus
produtos: o Porto de Aveiro.
Esta área – escusado seria referi-lo
– é a bacia do Vouga ou Terras do Vouga, tema central deste colóquio
integrado na 1.ª Feira Exposição Agro-Pecuária de Aveiro.
A bacia hidrográfica do Vouga
estende-se, das vertentes da Serra da Lapa, até à extensa planura
aluvional compreendida entre a Ria de Aveiro e a linha de declives
das terras mais antigas, abrangendo cerca de 365 000 ha de terrenos
cujo aptidão cultural varia, predominantemente, em razão da sua
natureza geológica
/ 51 / e situação topográfica. Assim e
de acordo com os dados fornecidos pelo S. R. O. A., 65 % a 70 %
destes terrenos, na sua maior parte situados na bacia superior do
Vouga, evidenciam, unicamente, capacidade de uso florestal, embora a
arborização não abranja, presentemente, mais do que 50 % da
superfície total disponível. Daí, a necessidade de promover, no
curso superior do Vouga, o alargamento da superfície florestal, a
partir da reconversão dos terrenos agrícolas marginais – 20 000 ha –
e da arborização das áreas incultas – 35 000 ha de baldios e de
propriedade privada.
Colóquio – O Inspector-Chefe Coordenador da Região Centro de
Secretaria de Estado da Agricultura, no uso da palavra.
Em relação à superfície agrícola
útil disponível – 1/3 da superfície total – impõe-se a sua
intensificação cultural e a racionalização das técnicas de cultivo,
de forma a garantir o aproveitamento integral das suas potencial
idades produtivas, em função da aptidão dos solos e das condições
climatéricas locais.
Integrando-se nesta área, a extensa
mancha de terrenos do Moderno e do Pliocénico que se estende ao
longo do curso inferior do Vouga e dos seus afluentes (Caima, Águeda
e Cértima) vê, desde sempre, o seu aproveitamento agrícola
condicionado pelas deficientes condições de enxugo e defesa contra
as cheias, que impedem o seu cultivo durante o período
outono-invernal.
A montante da foz do Caima e em todo
o seu curso superior, o Vouga comporta-se como um rio de planalto e
montanha, pelo que o seu aproveitamento se reveste de interesse
essencialmente hidro-eléctrico.
Em contrapartida, em relação ao seu
curso inferior, onde os problemas de defesa e enxugo vêm assumindo
crescente acuidade, por insuficiências do sistema hidráulico que o
serve, já o interesse do aproveitamento hidro-agrícola da sua bacia,
numa extensão de 1 370 km2, a partir da foz do Caima, se
apresenta com maior relevância.
Conta a bacia do curso inferior do
Vouga com extensos campos marginais, fundos e férteis de natureza
aluvional e elevadas potencialidades forrageiras, como o comprovam a
composição florística do seu coberto vegetal espontâneo e os
encabeçamentos que permite, ao longo do período de exploração
primaveril-estival, em que é utilizada para pastagem do gado bovino
e produção de fenos. Essa superfície forrageira disponível, que se
computa em cerca de 11 000 ha, encontra-se presentemente sujeita a
incidências desfavoráveis, resultantes do sobre-pascigo e excessivo
encharcamento, a par da falta de adequada protecção contra as cheias
e invasão das águas salgadas.
Enquadrando-se no pré-ordenamento
cultural já esboçado pelos Serviços Regionais da Secretaria de
Estado da Agricultura, para a zona em causa, as actividades
agro-pecuárias ligadas à bovinicultura poderão aqui assumir grande
incremento, assegurada como se encontra a sua integração horizontal
e vertical, a partir das infra-estruturas já estabelecidos ao nível
da região, para apoio deste sector.
A concentração, no Distrito de
Aveiro, da maior
/ 52 / parte das unidades industriais
que no nosso país se dedicam à produção de lacticínios e a
existência de um moderno complexo agro-industrial, que funcionará na
exclusiva titularidade de uma organização da lavoura, irão
possibilitar a perfeita integração de todas as actividades
pecuárias, estabeleci das ao nível das explorações agrícolas
regionais, garantindo-lhes a maior viabilidade económica.
Como se afirmava na lei de Meios
para 1970, «a agricultura tem todo o interesse em afastar-se da
simples posição de fornecedora de matérias-primas, para tornar-se
produtora de géneros prontos a consumir, beneficiando da mais valia
resultante da transformação».
De acordo com esta orientação,
definida pelo Governo, foram criadas já, ao nível distrital, algumas
infra-estruturas indispensáveis à integração horizontal e vertical
de algumas especulações pecuárias, designadamente, no sector da
bovinicultura: produção leiteira e recria e engorda de bovinos.
Este movimento, iniciado pelas
Organizações da lavoura, com apoio técnico e financeiro do Estado,
visa o fomento da exploração pecuária, em módulos de produção
económica convenientemente dimensionados, que permitam optimizar a
relação capital investido/mão de obra utilizada, consentindo um
racional maneio dos efectivos em exploração.
Um dos pólos integradores destas
actividades é constituído pela União de Cooperativas Agrícolas do
Noroeste Português, cujas instalações industriais e serviços
inerentes, pretendem assegurar a integração das actividades das
Cooperativas a ela associadas, dentro do esquema previsto no seu
organigrama.
De acordo com este organigrama,
projectam-se estabelecer, na região, centros de recria e engorda de
bovinos, a cargo das cooperativas associadas, ou de agrupamentos de
produtores (algumas encontram-se já em funcionamento), destinados a
complementar os estábulos leiteiros existentes e a estruturar, na
sua área social.
Esta organização já tem em pleno
funcionamento uma moderna fábrica de rações com a capacidade de
10-12 toneladas/hora. Para complementar este pólo integrador das
actividades pecuárias dispõe a organização, em fase avançada de
montagem, de um centro de abate de bovinos, suínos e aves, com
fábrica de industrialização de carnes e uma cozinha industrial que,
no conjunto, ficará a constituir uma das mais modernas unidades no
género, existentes na Europa.
Sabendo-se que a bacia leiteira da
Beira litoral detém a maior percentagem da produção nacional – só o
distrito de Aveiro produziu, em 1970, 67 000 000 litros, cerca de 30
% do leite entregue no País –, torna-se evidente o flagrante
interesse económico e social de que se revestem todos os
empreendimentos que visam a reconversão cultural dos campos
marginais do Vouga, de acordo com o esquema de aproveitamento que se
propõe.
A existência, na região, de unidades
integradoras, susceptíveis de efectuarem a transformação dos
produtos de natureza animal, que aqui se poderão produzir, através
do racional encabeçamento da superfície forrageira disponível,
constituem seguro aval de todos os investimentos a realizar na
defesa, enxugo e recuperação destes terrenos.
Estes problemas envolvem, contudo,
aspectos distintos que não podem ser encarados separadamente, sob a
pena de as soluções encontradas assumirem carácter precário, de
eficácia duvidosa.
Referem-se estes aspectos:
1 – Ao domínio das cheias;
2 – À defesa contra a invasão das
águas salgadas dos terrenos vizinhos da Ria de Aveiro – Baixo Vouga
lagunar.
3 – À regularização do leito
inferior do Vouga.
4 – À melhoria das actuais condições
de rega e enxugo dos campos.
1 – Em relação ao primeiro problema,
os estudos efectuados, em 1961, pela Hidro-Eléctrica Portuguesa,
sobre o aproveitamento hidro-eléctrico dos rios Paiva e Vouga
permitem concluir que a projectada barragem de Ribeiradio – a cuja
albufeira, de 330 x 106 m3 de capacidade, afluem 90 % da
bacia do Vouga – garante um caudal de cheia regularizada não
superior a 60 m2, em cerca de 90 % dos anos, valor este
que representa uma pequena fracção do caudal de cheia natural.
Acresce que a barragem de Ribeiradio poderá contribuir para o
desassoreamento do leito do Vouga, a partir da retenção dos
materiais sólidos carreados pelo rio, com evidentes benefícios para
a própria barra do Porto de Aveiro. Esta barragem permitiria ainda
garantir um elevado caudal de estiagem no Vouga e portanto:
– a produção de energia eléctrica,
através da turbinação dos caudais transferidos para juzante;
– a intensificação e o alargamento
dos regadios existentes;
– a eliminação das dificuldades de
abastecimento de água às populações e às indústrias ribeirinhas;
– minorar os efeitos perniciosos dos
afluentes industriais lançados no rio, a partir da sua diluição em
proporções mais convenientes.
2 – A defesa e possível beneficiação
dos terrenos do Baixo Vouga lagunar, sob influência das águas
salgadas, encontra-se também dependente da correcção do regime das
cheias e da regularização do leito do Vouga
/ 53 /
e das restantes linhas de água que desaguam na Ria de Aveiro, já que
a manutenção de caudais médios, durante o período de estiagem,
determinará a redução do teor salino das águas, junto das terras de
cultivo.
Com vista a garantir a indispensável
defesa de toda a área do Baixo Vouga lagunar contra a invasão das
águas salgadas e a permitir, simultaneamente, através de obras de
arte complementares, um perfeito domínio das condições de rega e
enxugo dos terrenos beneficiados, foi elaborado recentemente, por um
qualificado gabinete técnico um ante-projecto da estrada-dique
Aveiro-Murtosa, que mereceu a aprovação superior e se encontra
incluído dentro das obras a realizar, no âmbito do III Plano de
Fomento. A referida obra, destinada em princípio a assegurar a mais
curta ligação rodoviária entre os concelhos de Aveiro e Murtosa, irá
permitir, para além dos benefícios de índole agrícola já citados, e
do seu marcado interesse turístico, o fácil escoamento de toda a
produção oriunda do parque industrial localizado a norte de
Estarreja, através do Porto de Aveiro.
Dispensamo-nos de referir, por
agora, as características da obra, que constam do estudo apresentado
à consideração superior e cujo traçado se encontra indicado na
maqueta aqui exposta.
3 – Limitado o movimento das marés
para montante, pelo traçado da estrada-dique, torna-se indispensável
assegurar a defesa dos campos do Baixo Vouga contra as cheias, de
forma a permitir o seu integral aproveitamento, durante todo o ano,
através da regularização do leito maior do Vouga para um caudal de
cheia de 1 700 m3/s, cuja frequência é de 1, de quatro em
quatro anos, mas que passará à frequência de 1 em 100 anos, quando
for construída a barragem em Ribeiradio. Dentro desta orientação,
prevê-se a regularização do leito do Vouga, entre a estrada-dique
Aveiro-Murtosa e a foz do Águeda, em duas fases: a primeira, a
realizar com carácter prioritário, no troço do rio compreendido
entre o dique-estrada e a Ponte de Angeja, permitirá a beneficiação
integral de 3500 ha dos campos do Baixo Vouga lagunar, incluindo os
campos de Fermelã, Canelas e Salreu.
Distribuição de prémios.
A segunda, entre a Ponte de Angeja e
S. João de Loure, permitirá beneficiar 6540 ha da bacia inferior do
Vouga, incluindo os campos do Cértima e do Águeda, uma vez que a
regularização do curso inferior do Vouga influenciará,
favoravelmente, todo o complexo sistema hidrográfico constituído
pelas ligações Cértima-Águeda e Águeda-Vouga.
4 – Interessa referir ainda a
necessidade de realização de obras complementares, destinadas à
melhoria das actuais condições de rega e enxugo dos campos, visando
o aproveitamento integral das suas potencialidades agrícolas.
/ 54 /
Nesta conformidade, impõe-se o
melhoramento dos regadios existentes, a partir da multiplicação e
renovação das suas actuais redes de rega e enxugo e a constituição
de Cooperativas de Rega, ou de outras adequadas formas de
Agricultura de Grupo, destinadas a tirar o melhor partido das obras
a realizar.
II – CARACTERÍSTICAS DOS SOLOS E
REVESTIMENTO VEGETAL DAS ZONAS AGRÍCOLAS A BENEFICIAR; SUA
RECONVERSÃO CULTURAL FACE AS POTENCIALlDADES EDAFOCLlMÁTICAS
O aproveitamento agrícola das zonas
em estudo, como referimos atrás, depende fundamentalmente da
natureza dos solos e das condições de drenagem e defesa contra as
cheias. Na área beneficiada podemos distinguir, em princípio, 3
manchas distintas:
1 – Sapais;
2 – Terras altas – até à cata de
20,00 m – predominantemente de origem xistosa ou xisto-gresosa;
3 – Aluviões do Moderno e
Pliocénico.
Os sapais são constituídos por solos
hidromórficos, parcialmente sujeitos à invasão das águas salgadas,
com um pH baixo (4 a 5), que produzem «castanhó», «junco», «canízia»
e outras espécies espontâneas, utilizadas em camas para gado, a que
se dá a designação genérica de «estrumes».
Estendem-se, a montante do traçado
da estrada Aveiro-Murtosa, por entre os braços e esteiros da Ria de
Aveiro, numa área aproximada de 1 050 ha. De acordo com o esquema de
reconversão cultural previsto, torna-se indispensável, depois da sua
conveniente defesa e drenagem, garantir o fornecimento de caudais de
rega abundantes, necessários ao dessalgamento e lavagem dos
horizontes superficiais do solo, de modo a possibilitar o seu
aproveitamento agrícola, a partir de culturas forrageiras adequadas.
A eventual constituição, na Laranja,
de uma bacia de recepção de águas doces, conduzidas através das
linhas de água que ali afluem, irá permitir dispor de caudais de
rega apropriados para o efeito.
As terras altas incluem-se na zona
de transição que se estende desde a linha que define o antigo golfo
marinho, até às primeiras formações do Arcaico e Câmbrico, que
constituem o sopé da Meseta Ibérica. Trata-se de uma zona plana, de
constituição geológica diversa, predominantemente de origem xistosa
ou xisto-gresosa. Os solos são geralmente de cor avermelhada e grão
fino, com boa capacidade de retenção para a água, de textura média (areno-argilosa
e argilo-arenosa). O seu aproveitamento agrícola é feito à base da
sucessão cultural intercalar X sachada.
Em relação a estes terrenos, a
melhoria das actuais condições de rega é factor decisivo da sua
intensificação cultural, a partir da introdução ou generalização da
cultura de milho híbrido para forragem.
As restantes classes de terrenos são
representadas pela extensa planura de terrenos do Moderno e
Pliocénico, situados na área do antigo golfo marinho, nele se
incluindo a designação regional de «Marinha».
O aproveitamento agrícola destes
terrenos é condicionado pelas possibilidades de enxugo que
apresentam, na época primaveril-estival, após as últimas cheias de
inverno. Assim, nos campos mais baixos, de difícil drenagem, faz-se
a cultura orizícola – que aqui assume um carácter fatalista – ou
deixa-se o terreno inculto para a produção de ervas espontâneas
(estrumes»). Os campos de cota superior e de mais fácil enxugo são
submetidos a uma única cultura, milho-grão, geralmente consociada
com feijão e abóbora, ou milharada, podendo eventualmente levar
azevém, quando o regime das cheias o permite. Muitos destes terrenos
são, contudo, aproveitados para a produção de pasta espontâneo para
o gado («cerradas» ou «gramoais»).
Exposição documental
A composição florística destes
prados naturais evidencia a existência de espécies de grande
interesse forrageiro, das quais figuram, entre as gramíneas:
Dactylis glomerata, Festuca
arundinacea e Lolium perene; e entre as leguminosas: Trifolium
repens, Trifolium resupinatum, Lotus corniculatus, Lotus uliginosus,
etc.
O esquema de reconversão destes
terrenos assenta, fundamentalmente, na sua defesa contra as cheias e
enxugo.
Asseguradas estas condições,
torna-se viável a generalização, a estes terrenos, do aproveitamento
do seu coberto vegetal espontâneo ou a introdução de pastagens
melhoradas, com base nas espécies com representação local.
Esquematicamente, os esquemas de
reconversão a adaptar, em relação a cada uma destas classes de
terreno, podem resumir-se, da seguinte forma:
1 – Sapal + defesa + dessalgamento +
enxugo – > Capacidade de uso agrícola (Culturas forrageiras);
2 – Terras altas + rega – >
Intensificação cultural (Milho forragem X Ferrejo);
3 – Aluviões + defesa + enxugo – >
Racionalização dos esquemas de cultivo (prados permanentes e
pastagem natural).
/ 55 /
III – INVESTIMENTOS A REALIZAR NA
BACIA DO VOUGA; SUA INCIDÊNCIA SOBRE OS NÍVEIS DO PRODUTO E DO
EMPREGO, NO SECTOR AGRÍCOLA
Em face destes condicionalismos, que
tão gravemente afectam a economia regional e uma vez que as acções
de reconversão cultural preconizadas se enquadram entre os
objectivos fundamentais fixados no III Plano de Fomento – entre os
quais se conta a progressiva especialização da Agricultura regional,
de acordo com as aptidões dos solos e as influências climáticas,
numa óptica de concentração do investimento, foram já incluídas,
entre as propostas a submeter a apreciação do Governo pela Comissão
de Planeamento da Região Centro, no âmbito dos estudos preparatórios
do IV Plano de Fomento, os seguintes empreendimentos a realizar na
bacia do Vouga:
ZONA 1 – Campos do Baixo Vouga
lagunar, compreendidos entre a estrada-dique Aveiro-Murtosa e a
Ponte de Angeja.
Beneficiação de 3500 ha dos campos
do Baixo Vouga lagunar – incluindo os campos de Fermelã, Canelas e
Salreu – através da execução de obras complementares do
dique-estrada Aveiro-Murtosa, com regularização do leito do Vouga
(entre a estrada-dique e a Ponte de Angeja) para um caudal de cheia
de 1 700 m3/s.
Investimentos previstos:
Obras complementares da
estrada-dique .... 75 500 contos
Melhoramentos fundiários ...
... ... ...
... ... ... ...
7 800 contos
----------------------
Total... ...
...
83 300 contos
Acréscimo do Produto bruto ... ...
...
... ... ...
70 850 contos
N.º de empregos criados
... ... ... ... ... ...
... ... ... . 500
ZONA II – Bacia inferior do Vouga
desde a Fonte de Angeja até à foz do Caima.
Beneficiação de 6540 ha de terrenos
da bacia inferior do Vouga com regularização do leito do rio (entre
as pontes de Angeja e S. João de Loure) para um caudal de cheia de 1
700 m3/s.
Investimento (40 contos/ha)
... ... ... ... ... ... ...
261 600 contos
Acréscimo do Produto Bruto
... ... ... ... ...
133 500 contos
N.º de empregos criados
... ... ... ... ... ... ... ...
800
ZONA III – Bacia superior do Vouga,
a montante da foz do Caima.
1 – Florestação de 15 000 hectares
de terrenos incultos à cadência de 2 500 ha por ano.
Investimento
... ... ... ... ... ... ...
... ... ... ... ...
82 500 contos
Acréscimo do Produto Bruto
... ... ... ... ... ...
13 500 contos
N.º de empregos criados
... ... ... ... ... ... ...
...
150
/ 56 /
2 – Criação de um estabelecimento de
truticultura no curso do Alto Vouga.
Investimento
... ... ... ... ... ... ...
... ... ... ... ... ...
2 000 contos
Acréscimo do Produto Bruto
... ... ... ... ... ... ...
1 600 contos
N.º de empregos criados
... ... ... ... ... ... ...
... ...
5
3 – Construção de uma barragem em
Ribeiradio, criando uma albufeira de 330 X 106 m3
de capacidade.
Investimento
... ... ... ... ... ... ...
... ...
150 000 contos
Acréscimo do Produto Bruto
... ... ... ...
(a)
N.º de empregos criados
... ... ... ... ...
(b)
(a) O acréscimo do produto será
obtido através da valorização das ZONAS I e II – uma vez realizada
toda a beneficiação hidro-agrícola – mais o resultado de outros
aproveitamentos (produção de energia eléctrica, abastecimento de
água às populações, etc.).
(b) Dependente das utilizações da
barragem e das águas da albufeira.
Em resumo, teremos:
Investimento global a realizar em
toda a área beneficiada (Zonas I, II e III)
...
579 400 contos
Acréscimo do Produto Bruto
... ... ... ... ... ... ...
... ... ... ...
219 450 contos
N.º de empregos criados
... ... ... ... ... ... ...
... ... ... ... ...
1 455
Coeficiente Capital-Produto (Valor
acrescentado bruto) ...
2,64
Isto é, para cada unidade do valor
acrescentado ao Produto Bruto é necessário investir 2,64 unidades de
capital.
São estas as perspectivas favoráveis
que se abrem ao desenvolvimento económico das Terras do Vouga, UMA
ZONA INTEGRADA QUE SE IMPÕE.
*
* *
DR. JAIME RODRIGUES MACHADO
IMPORTÂNCIA DA BOVINICULTURA NO
DISTRITO DE AVEIRO
A zona centrada pelo distrito de
Aveiro, entre o Douro e o Mondego é, no campo da bovinicultura, o
mais representativo do Continente.
Ao longo dos anos, mercê de
condicionalismos geoclimáticos, os bovinos outrora existentes foram
definindo as suas aptidões e fixando-se de acordo com as condições
fisiográficas encontradas.
Deste modo, não é de estranhar que o
armentio bovino actual se afaste das descrições feitas pelos vários
autores dos fins do século passado, não só no que respeita à sua
área de dispersão mas também no que toca à evidenciação das suas
características morfológicas e funcionais.
Desde sempre, a exploração da
espécie bovina proporcionou nesta região três produções principais a
saber: carne, leite e trabalho. Assim e porque durante muitos anos
não existia preferência especial por qualquer das vocações a
explorar, havia mais aceitação para os animais de tipo misto que a
par da carne e de algum leite pudessem ser igualmente utilizados
como máquina animal.
Dentro as raças bovinas autóctones
que povoavam a região no século passado e o princípio deste,
predominavam duas: na serra a raça arouquesa, no litoral o armentio
apelidado de marinhão descendente dos bovinos mirandeses que se
espalhavam então por todo o norte do país em mais ou menos mistura
com sangue de várias origens. Mais tarde começaram a aparecer os
bovinos do tronco Frísia, conhecidos por «turinos» e que tiveram de
começo o mesmo trato que as raças indígenas.
Com o rodar dos tempos, após o
primeiro quartel deste século, a pecuração bovina regional distingue
nitidamente três raças: a arouquesa, a marinhoa e a turina ou
holandesa, que entretanto se foi impondo por toda a região, ocupando
posição de grande realce em relação às outras.
RAÇA AROUQUESA
Os efectivos actuais, embora menos
numerosos e corpulentos que os bovinos outrora assinalados, são
ainda hoje suficientemente credenciados nas nossas regiões
montanhosas.
A invasão da sua área de dispersão
pelo gado turino alterou grandemente a sua distribuição na zona
serrana do distrito de Aveiro. Assim é que um grande número de
freguesias dos concelhos de Arouca (S. Miguel Cambra (Castelões,
Codal, Vila Chã, Vila Cova de Perrinho e parte de Macieira), Sever
do Vouga (Pessegueiro e Sever), e Fira (Vale e Louredo), e Oliveira
de Azeméis (Palmaz Ossela, Carregosa e Feijões), regiões onde
abundava o gado arouquês, este deu lugar aos animais de origem
holandesa.
Presentemente, o interesse pela
exploração arouquesa limita-se às regiões de mais forte relevo nos
concelhos serranos de Castelo de Paiva, Arouca, Vale de Cambra e
Sever do Vouga.
O mais novo exemplar da exposição de gado.
Os bovinos arouqueses foram, a pouco
e pouco, desalojados dos vales e dos terrenos com melhores
possibilidades pascigosas e ficaram quase que exclusivamente
/ 57 /
nas zonas mais agrestes e alcantiladas, onde a sua
rusticidade, facilidade de assimilação e robusticidade conseguem
vencer a frugalidade dum meio hostil para raças mais exigentes. Isto
a par da forma como a vaca arouquesa é explorada – utilizada nos
trabalhos mais rudes e esgotada na produção intensiva do leite –,
factores certamente nada favoráveis ao desenvolvimento destes
animais e à evidenciação dos seus melhores atributos.
Temos presente que a exploração
destes bovinos para carne teve outrora grandes tradições no solar da
raça. Bernardo Lima apontava bois arouqueses com 800 a 1 000 kg de
peso vivo na exposição do Porto e vacas semi-gordas com 360 a 500 kg
com rendimentos de 55 % que seguiam para exportação e para o
abastecimento do matadouro de Lisboa.
A verdade é que, apesar das
possibilidades creatóforas destes animais, não se cria hoje no seu
solar gado de carne. Esta vocação surge-nos como subsidiária das
restantes, pois as reses só depois de intensamente utilizadas na
produção de leite e trabalho são entregues ao açougue.
Por outro lado, cerca de 70 % das
fêmeas do efectivo total são exploradas na função leiteira,
contribuindo com cerca de 3 milhões de litros de leite de
proveniência arouquesa destinados a fins industriais.
Não deixando de reconhecer a
importância económica de que se reveste a exploração deste armentio,
há que reconhecer que num meio serrano agricolamente pobre o regime
alimentar nos seus aspectos qualitativo e quantitativo é
manifestamente insuficiente para animais explorados na função
leiteira.
Assim, qualquer tentativa séria que
se pretenda pôr em prática no sentido de valorizar o gado arouquês
na sua capacidade lactígena há que atender em primeiro lugar às
possibilidades do meio.
Os fracos recursos forrageiros
existentes, por deficiência de produção quantitativa em solos
graníticos, aliada ao regime minifundista da propriedade, são
factores, limitativos para a valorização de animais especializados
na produção leiteira.
De resto, a produção unitária de
leite da vaca arouquesa, nestas condições, é bastante baixo – cerca
de 800 kg de leite com 4.5 % de teor butiroso – e dificilmente se
compreende esta forma de exploração em detrimento da aptidão para
carne.
O modo como este tipo bovino vem
sendo explorado nesta região não é de molde a proporcionar-lhe
valorização morfológica compatível, ao contrário do que sucede fora
do seu solar, nomeadamente nos concelhos de Amarante, Sanfins e
Castro Daire, onde hoje se encontram os melhores exemplares, porque
aqui, a sua presença não sofre os efeitos da especulação leiteira
nem os da concorrência do gado holandês em tão alta escala.
Importa agora perguntar:
Nas condições que vimos referindo
nas zonas montanhosas da região tem interesse o gado arouquês?
/ 58 /
Salvo melhor opinião, a resposta nem
é difícil. O gado arouquês por alguma razão tem aqui o seu solar. É
ainda o tipo bovino que melhor consegue valorizar a frugalidade
pascigosa da serra. E estamos convencidos que se voltar às zonas
menos agrestes donde foi precipitadamente desalojado, pode ser
encarada com certo optimismo a sua valorização. E não nos iludamos:
o povoamento bovino nas nossas zonas montanhosas terá que ser
resolvido com os animais que possuímos, por já ambientados, com os
recursos de que dispomos, no nosso enquadramento geoclimático,
ajustado aos «facies» regional e na conversão que haverá a fazer.
GADO MARINHÃO
Os animais deste tipo, ultimamente
em regressão numérica, ocupam ainda hoje uma vasta zona de
exploração em torno da foz do Vouga, nos concelhos da Murtosa,
Estarreja, Aveiro, Ílhavo e Vagos, e estende-se à parte ocidental de
Águeda e Albergaria-a-Velha.
A sua zona de criação compreende
quase exclusivamente a região da Marinha, centrada nos concelhos
ligados à Ria de Aveiro.
O Gado Marinhão não é mais que a
evolução sofrida pela raça Mirandesa, na Zona da Marinha.
Região de formação recente, de
origem sedimentar, preferiu ao tempo o bovino que melhores condições
oferecia de adaptação.
Por sua vez, os bovinos mirandeses
modificados por condições ecológicas, possivelmente cruzados com
alguns animais de origem minhota e arouquesa, vieram através de
sucessivas gerações a evoluir no gado marinhão. No entanto, a sua
selecção foi sempre orientada no sentido do sangue Mirandês.
A sistemática utilização do bovino
da Marinha como motor animal poderia levar-nos a pensar na
inutilidade de qualquer medida de fomento a seu favor já que, mais
tarde ou mais cedo, a maquinaria agrícola virá substituí-lo com
vantagens. A ser assim, recomendaríamos, pura e simplesmente, a sua
substituição pelo bovino holandês, tanto mais que vive e compete com
este na mesma zona de criação e em desvantagem na valorização das
forragens ali produzidas.
No entanto, muito embora a
maquinaria agrícola possa substituir o trabalho animal nos serviços
mais pesados, julgamos que a estrutura agrária da região não pode
dispensar, por enquanto, o recurso ao bovino de trabalho. E depois,
por quantos anos ainda se manterá a actual estrutura?
Parece pois mais aconselhável
transigir com a presença do gado marinhão e aguardar que a estrutura
fundiária de toda esta longa faixa do litoral permita outra
planificação. De qualquer modo urge enquadrá-lo num plano de
fomento, podendo utilizar-se a vaca marinhôa em cruzamentos de tipo
industrial – Marinhão X Charolês – com o fim de obter produtos para
carne.
Concretizando:
– A presença do gado marinhão ainda
se justifica como motor animal;
– Não pode competir, na mesma zona,
com os efectivos leiteiros.
Deste modo, parece aconselhável:
a) Que a sua criação em raça pura se
limite às necessidades da renovação dos efectivos imprescindíveis
aos trabalhos agrícolas que ainda prestam;
b) Que as suas disponibilidades
devem ser encaminhadas no sentido da produção de F, provenientes do
cruzamento Marinhão X Charolês, destinados ao açougue.
De resto a evolução quanto a este
tipo bovino parece já processar-se neste sentido.
Com efeito o cruzamento Marinhão X
Charolês vem sendo já praticado desde 1962, com o seguinte
movimento:
|
1962 |
–– |
4 |
vacas |
I. |
A. |
com |
Charolês |
1963 |
–– |
19 |
« |
« |
« |
« |
« |
1964 |
–– |
46 |
« |
« |
« |
« |
« |
1965 |
–– |
89 |
« |
« |
« |
« |
« |
1966 |
–– |
107 |
« |
« |
« |
« |
« |
1967 |
–– |
200 |
« |
« |
« |
« |
« |
1968 |
–– |
295 |
« |
« |
« |
« |
« |
1969 |
–– |
335 |
« |
« |
« |
« |
« |
1970 |
–– |
780 |
« |
« |
« |
« |
« |
1971 |
–– |
1473 |
« |
« |
« |
« |
« |
|
|
RAÇA HOLANDESA
A raça com vocação leiteira
(holandesa, turina e produtos derivados) domina a pecuração bovina
regional e é hoje o símbolo mais representativo da actividade
agro-pecuária do Baixo-Vouga.
O bovino leiteiro que povoa esta
região é o mesmo agrupamento étnico que se encontra por todo o país.
Mas aqui, encontra o ambiente mais
favorável para a sua consolidação e desfruta duma hegemonia que não
é demais enaltecer como zona de criação.
É um animal oriundo dos Países
Baixos, na Frísia, que teve extraordinária adaptação na Dinamarca e
na Alemanha Ocidental, passando à Inglaterra e América. Encontram-se
praticamente em toda a Europa Ocidental
/ 59 /
e goza duma vocação leiteira de grande prestígio.
Em Portugal, os primeiros bovinos
holandeses foram assinalados no recenseamento de 1870. Foi
principalmente depois que se deixou de exportar gado de corte nos
começos deste século, que os bovinos desta raça, apelidados de
turinos, começaram a sua expansão.
A pouco e pouco, o núcleo turino,
que se acantonava nos arredores de Lisboa, invadiu o norte do país,
fixando-se muito especialmente junto ao litoral e nos subúrbios dos
centros populacionais.
No distrito de Aveiro a sua
aceitação foi grandemente influenciada pela indústria de
lacticínios, ao tempo já existente na região.
A falta de exportação de carne,
outrora de grandes tradições na região e o aparecimento de uma nova
raça, com vocação leiteira bem determinada, levaram ao
desenvolvimento da indústria de lacticínios, até aí confinada à zona
serrana e na dependência da vaca arouquesa.
Os membros da Comissão da Exposição-Feira, falando para a imprensa.
Com o rodar dos tempos é a indústria
que por sua vez fomenta os efectivos de tipo leiteiro devido à
procura da matéria-prima.
Desta maneira os efectivos
multiplicam-se rapidamente e a indústria de lacticínios passa por
grandes transformações acompanhando a vaca turina por toda a região.
Assegurada a colocação do produto, a
vaca leiteira passa a ter posição destacada na economia da casa
agrícola, embora assumindo características especiais.
Na verdade, o grau de parcelamento
da propriedade e as suas diminutas dimensões cerceiam a sua
exploração em termos do seu melhor aproveitamento, sendo a produção
do leite da vaca turina um complemento da recria e engorda e em
muitos casos do próprio trabalho animal.
Daqui a raça não ter tido, a maior
parte das vezes, o tratamento adequado e a sua dispersão aparecer no
distrito um tanto indiscriminadamente.
Por toda a parte se procurava um
bovino de função mista que desse um pouco de tudo, incluindo leite.
À medida que a sua principal vocação
foi amparada, por intervenção dos Serviços Oficiais, foi-se
definindo melhor a sua área de dispersão e os animais de melhor
valia funcional fixaram-se principalmente na zonas do litoral, nas
mais favoráveis à bovinicultura, dando-se uma regressão dos
efectivos nas zonas serranas mais agrestes.
Regra geral, quanto maior for a área
geográfica duma raça melhor se adapta a outras regiões. No entanto
há necessidade de distinguir entre a adaptação dos animais
importados e a adaptação da raça. Sucede, por exemplo, que os
bovinos da raça holandesa importados se ambientam relativamente bem,
em regiões menos propícias, dando, quando convenientemente tratados,
produções análogas às do País de origem. Porém as sucessivas
gerações vão degenerando gradualmente
/ 60 /
perdendo a sua especialização até manifestarem as mesmas
deficiências que as raças locais. É o que acontece nas nossas zonas
serranas, e tememos que venha a acontecer nas zonas quentes e secas
do País, onde haverá necessidade de recorrer a importações
periódicas para impedir o definhamento da raça.
Deveremos ter bem presente que a
raça é, em grande parte, um produto do ambiente, e que, transportada
a outras regiões sofre necessariamente um processo lento e profundo
de adaptação. A importação periódica atrasa o processo degenerativo,
ou pode modificá-lo com a introdução de padreadores de elevado
potencial genético, mas não impedi-lo. Uma raça só se considera bem
aclimatada quando, depois de várias gerações, os animais importados
muito embora tenham necessariamente perdido ou modificado algumas
características, conservam outras de tal importância que nos
habilitem a considerá-los económicos em relação aos tipos locais que
substituíram.
É o que pode suceder em algumas
regiões do país. O caso das nossas regiões montanhosas, que não
devem ser consideradas como favoráveis à exploração da vaca turina,
contrariamente a opiniões estabelecidas. O desenvolvimento da
indústria leiteira nalgumas destas regiões criou algumas ilusões a
este respeito. Na montanha a exploração dos prados naturais é o
único meio económico de utilizar o solo. Como a densidade de
população humana é bastante menor que nas zonas de planície e do
litoral dispõe-se por via disso dum excedente de produtos lácteos
que se usa como moeda, mas nem por isso a produção unitária da vaca
leiteira deixa de ser bastante fraca.
Sabe-se que a secreção láctea é
desfavoravelmente influenciada pelo calor e por uma atmosfera seca.
De certo modo pode remediar-se esta situação numa estabulação
permanente adequada, mas necessariamente cara, tendo em atenção que
um pouco de exercício é necessário para que os animais mantenham o
seu equilíbrio fisiológico.
Sendo a vaca leiteira um animal de
muito alimento, a sua exploração requer uma agricultura rica, que
lhe forneça uma alimentação abundante e regular durante todo o ano.
Não se devem admitir períodos de relativa dieta, já que não serão
compensados pelos períodos de abundância, que provocam sensíveis
baixas no seu rendimento. Por estas razões a produção leiteira é
particularmente favorecida nas regiões de bons prados, onde a
atmosfera se mantém suficientemente húmida mesmo durante o verão,
possibilitando reservas forrageiras abundantes para o inverno,
completadas conforme as necessidades pelos alimentos concentrados.
Das considerações produzidas podemos
afirmar que a nossa vaca leiteira encontra nesta região e, muito em
especial, nos campo do Baixo Vouga excelentes condições para se
impor, cada vez mais, como animal de grande reputação, na condição
de se lhe dedicar os cuidados de trato necessários e de
aproveitarmos os imensos recursos forrageiros que a bacia do Vouga
oferece.
Presentemente, os nossos bovinos
leiteiros têm já uma razoável aptidão lacto-poiética a par duma
conformação que os aproxima do tronco holandês que lhes deu origem e
constituem o principal alfobre abastecedor dos efectivos do País.
A sua valorização no campo genético,
vem sendo assegurada com a presença de reprodutores Holstein-Frísia,
ultimamente utilizados em inseminação artificial em cerca de 2/3 dos
efectivos totais, documentada nos seguintes números:
|
Datas |
|
Totais de vacas
inseminadas |
1956 |
––––––––––– |
53 |
1957 |
––––––––––– |
90 |
1958 |
––––––––––– |
347 |
1959 |
––––––––––– |
599 |
1960 |
––––––––––– |
656 |
1961 |
––––––––––– |
201 |
1962 |
––––––––––– |
3 368 |
1963 |
––––––––––– |
3 527 |
1964 |
––––––––––– |
5 270 |
1965 |
––––––––––– |
7 856 |
1966 |
––––––––––– |
7 930 |
1967 |
––––––––––– |
12 773 |
1968 |
––––––––––– |
17 104 |
1969 |
––––––––––– |
23 626 |
1970 |
––––––––––– |
25 614 |
1971 |
––––––––––– |
24 016 |
|
|
A produção média da vaca regional,
em toda a zona de produção, calculada de acordo com os efectivos
registados, no leite entregue à indústria e no destinado a consumo
directo – não atinge os 3 000 kg de leite em 300 dias de lactação.
No entanto, na áreas de melhor
aptidão leiteira, onde se fazem já sentir os benefícios dos
empreendimentos dos organismos e associações da lavoura e onde as
forças sãs adaptam a tempo o dispositivo agrário, as produções
atingiram a média unitária de 3 460 kg de leite, com 3,4 % de
gordura em 305 dias de lactação.
Referimo-nos às salas de ordenha
colectivas onde tem sido possível montar um sistema de serviços de
mungição mecânica, comum a vários proprietários, que estão
revolucionando o panorama e as estruturas minifundiárias do
empresário agrícola produtor de leite.
Em pleno funcionamento cerca de 140
salas de ordenha, em toda a faixa litoral Entre Douro e Mondego, 90
das quais estão localizadas nos concelhos de Oliveira de Azeméis,
Aveiro, Vagos e Ílhavo.
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Distribuição de prémios
Mas importa não parar. O mourejo da
produção animal, a nossa pecuária do futuro, exige conhecimentos e
técnica que, se não forem respeitados, não deixarão aflorar todo o
manancial de possibilidades que o meio oferece.
A improvisação e o amadorismo terão
que dar lugar à planificação criteriosa, ajustada às nossas
necessidades, e à habilitação profissional.
Mas a planificação não pode ficar no
papel. Urge pô-la em prática.
O estudo do aproveitamento da bacia
do Vouga ajusta-se aos anseios da lavoura e demonstra a urgente
necessidade da execução do plano proposto.
No campo pecuário antevemos os seus
grandes benefícios. Como técnico agrário não tenho dúvidas em
afirmar que as potencialidades forrageiras resultantes dum melhor
aproveitamento da Bacia do Vouga irão permitir a exploração racional
de mais 15 000 vacas leiteiras em lactação, ou seja um aumento de 50
% dos efectivos hoje existentes no Distrito de Aveiro.
E se esses novos efectivos forem
devidamente enquadrados nas estruturas que se vislumbram teremos
anualmente mais 60 000 000 litros de leite de que o País tanto
carece.
São comuns alusões à rotina como se
trabalha no país, à pobreza das nossas pecurações, por isso importa
aqui frisar que o aproveitamento da bacia do Vouga não é um devaneio
utópico dos técnicos que nele se debruçaram mas a necessidade duma
região que deseja conservar e aproveitar uma das suas melhores
fontes de produção e riqueza. |