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N.º 4

Publicação Semestral da Junta Distrital de Aveiro

Dezembro de 1967 

 

A aclamação de D. Miguel I em terras dos Distrito de Aveiro

Pelo Dr. Serafim Gabriel Soares da Graça

 

A recente trasladação dos restos mortais do rei D. Miguel I e da rainha sua esposa e dedicada companheira de exílio para o Panteão da Real Casa de Bragança e que, sob o impulso de um alto pensamento o Governo da Nação promoveu, veio trazer-nos à lembrança a recordação de narrativas, ainda que muito vagas, que se ouviam contar a pessoas de avançada idade sobre as lutas que na primeira metade do século passado se travaram entre aquele monarca e seu irmão D. Pedro IV.

Pelo que toca a terras nossas, são muito escassas as notícias que chegaram até nós a tal respeito; e quanto a fontes documentais propriamente ditas, as coisas também não vão muito além. Com a mudança dos arquivos pertencentes às câmaras das antigas vilas, dispersou-se e levou descaminho a maior parte dos livros das actas, que eram abundantes repositórios de elementos históricos que com a maior vantagem se podiam aproveitar para fazer uma narração completa e desapaixonada dos acontecimentos verificados nesse período agitado da vida portuguesa. Seriam estas as principais fontes de que se poderia lançar mão para tal efeito, pois não se pode contar muito, neste caso, com a tradição oral ou documentos particulares, por acontecer que muitas vezes no seio de algumas das famílias mais preponderantes militavam partidários apaixonados das duas facções políticas opostas, e que, por decoro familiar, ocultavam certos factos sucedidos, ainda que os tomassem como reprováveis.

O que se passou então em terras nossas nesses conturbados e já tão distantes tempos? Desejo cingir-me, por agora e tão somente, a algumas das povoações que, tendo sido sedes de município, se acham incorporadas no território de que é formado hoje o concelho de Águeda – designadamente Assequins, Recardães e Ois da Ribeira.

Pelo que respeita à primeira, socorro-me do que no seu precioso livro «ÁGUEDA» diz o ilustre escritor Dr. Adolfo Portela sobre o que se passou em terras de Águeda, no período que precedeu a subida de D. Miguel ao trono e um pouco mais adiante. A câmara de Assequins reunia em 1820, para prestar juramento à Junta Provisional; mas passados três anos já as forças miguelistas batiam no Marnel, junto ao Vouga o exército liberal que, fugindo para o Porto, foi refugiar-se na Galiza.

Afirma o Dr. A. Portela não ter encontrado as actas da câmara da antiga Vila de Assequins respeitantes ao período que decorre de 1827 a 1830, pelo que não é possível historiar o que se passou por ocasião da aclamação de D. Miguel; entretanto, do manifesto que ele dirigiu ao país foi dado solene conhecimento em sessão de 22 de Abril de 1832, perante as autoridades e povo. No mesmo livro publica o Dr. A. Portela uma lista de indivíduos de terras de Águeda que se achavam presos nas cadeias de Aveiro em 1831. Deve ter sido este o acontecimento de maior monta entre os sucessos verificados por essa ocasião nas terras já referidas. De maiores atropelos, lutas ou vinganças não chegaram notícias precisas até nós, o que, com justificada satisfação o afirmamos – nos leva a concluir que entre as gentes desta parte do Distrito não se cometeriam grandes excessos... Sessões várias de câmara, TE DEUMS, luminárias e foguetes, umas vezes por D. Miguel outras vezes por D. Pedro – «os homens da nossa terra iam cumprindo oficialmente o seu dever de cidadãos portugueses» – como tão ajustadamente diz o citado escritor (...).

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E de Recardães que notícias chegaram até nossos dias? Ainda menos se sabe. Estava ali instalada, calma, sossegadamente, em 1822, uma câmara liberal, que, segundo um apontamento que tirei dum memorial particular da época, era assim constituída:

Substituto do Juiz, o Dr. Joaquim Gabriel Soares da Graça, natural do lugar da Borralha, que então pertencia ao Julgado de Fora de Recardães. Presidente, António Pinto Ferreira de Vasconcelos, de Ancas, terra bairradina até onde se estendia a jurisdição do mesmo Julgado. Vereadores: o Dr. António Joaquim Freire, de Paradela, freguesia de Espinhel e Francisco Rodrigues da Costa Simões, também do mencionado lugar da Borralha. / 26 /

Substitutos dos vereadores; Manuel Francisco Estima, de Recardães, António Nogueira, do Crasto, desta mesma freguesia e José Ferreira Carapito, da Vila de Recardães também. Dos partidários de D. Miguel, não se alcança passo algum por ali.

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Resta-nos falar de Ois da Ribeira, antiga Vila também. Se não fosse um velho livro que contém algumas actas da sua câmara, era um desconhecimento completo do que se passou por estas terras e se relaciona com os principais acontecimentos da época a que nos vimos referindo. É justamente da acta que respeita à aclamação do rei D. Miguel em terras de Ois, que vou transcrever o respectivo auto, que é datado de 1 de Maio de 1828, e com ele remato estes breves apontamentos.

Notam-se na acta algumas palavras corroídas pela tinta, sendo outras de impossível leitura, ainda que poucas.

Quanto ao mais faz-se fiel transcrição do documento:

«Auto da Camara extraordinário a que deu lugar a aclamação do Serenissimo Senhor D. Miguel primeiro Rei Absoluto de Portugal, Algarve e seus Domínios.

Ano de Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos e vinte e oito anos ao primeiro dia do mes de Maio do dito ano nesta Vila de Ois da Ribeira e Casas dos Paços da Camara onde eu escrivão vim com Joaquim Francisco Alves Veriador mais [falta uma palavra que deve ser velho] servindo de presidente no impedimento do actual Doutor Juiz de Fóra da Vila de Eixo de quem esta é anexa, João Tavares da Silva Veriador imediato, João Teodoro, Veriador mais novo, José Batista Marques Procurador do Concelho da Camara desta Vila e seu termo por S. M. F. que Deus guarde etc., onde igualmente se achavam reunidas as pessoas do Clero, Nobreza e povo abaixo assinadas todos do concelho da mesma Vila por todos foi unanimemente dito que não podendo conter dentro em seus corações os sentimentos de prazer regosijo com que veem estar à testa do Governo destes reinos o serenissimo Infante o Senhor Dom Miguel, julgam de seu dever manifesta-los e faze-los patentes a todo o mundo e para haver um testemunho mais decisivo do seu amor e fidelidade que já há muito consagram ao mesmo Serenissimo Senhor e dos sinceros e ardentes desejos que tem de serem por ele governados em seu nome pois que estão bem convencidos de que nele concorrem aquelas excelentes virtudes e brilhantes qualidades que o fazem um Monarca Digno deste nome e do Amor de seus Vassalos é por isso que eles tomam a firme resolução de aclamar como desde já aclamam ao Sereníssimo Senhor Infante D. Miguel como Rei Absoluto destes Reinos e desde já lhe juram e protestam uma perfeita obediência, amor e fidelidade como seus verdadeiros subditos e liais vassalos. Em ocasião de tão justa como cordial (?) resolução ............... de prazer e alegria ............... pelo assinalado benefício de lhes haver dado e restituido um Príncipe Real que imitando as reais virtudes de seus ............... fará a glória e felicidade da Nação Portuguesa como é de esperar. Viva a nossa Santa Religião unica Católica Apostólica Romana. Viva o Serenissimo Senhor Infante D. Miguel primeiro, Rei Absoluto de Portugal. Viva a Nossa Imperatriz Rainha. Viva a Dinastia da Real Casa de Bragança. Vivam os fieis e verdadeiros Portugueses. E para constar se lavrou este auto onde assinam os oficiais da Camara, Clero, Nobreza, e povo e eu Joaquim Pires Soares escrivão da Camara que o escrevi e assinei.

O Veriador mais velho, Presidente – Joaquim Francisco Alves – O Veriador imediato – João Tavares da Silva – O Veriador mais novo – João Teodoro – O Procurador do Concelho – José Batista Marques – O escrivão da Camara – Joaquim Pires Soares, António José da Mota, Prior d'Ois da Ribeira – O Padre Cura António Lemos (?) de Almeida – O Padre Cura de Espinhel Agostinho de Almeida Tavares – O Padre Jacinto Caetano dos Reis – O Padre João Alves Ferreira – O Padre Bernardino Francisco dos Reis – O Padre Manuel Pedro dos Reis – O Padre Manuel Pires Soares – O Padre Tomaz Batista Marques – O Padre José Ferreira Carvalhal – O Padre Jacinto Ribeiro da Silva.

José Pinto Guedes de Almeida Sotto Maior, Capitão Mór do Distrito de Ois da Ribeira e anexas – Bacharel Manuel Ferreira Coelho – O Alferes de Milicias reformado Jacinto Francisco dos Reis – O Alferes de Milicias António Pires Soares – ............... João Francisco dos Reis – ............... Mór António Joaquim Dias Reis – O escrivão das Cisas – José Pires Soares – O Professor de Primeiras Letras, Manuel Soares de Freitas – Manuel Carvalhal dos Reis, José Baptista – José Joaquim de Almeida – Manuel Simões Neto – Manuel Alves Marques – José Duarte Ferreira (?) Francisco dos Reis – José Francisco dos Reis – José Ferreira Baeta – João Lourenço Dias, Manuel Francisco Claro – José Ferreira Baeta – João Lourenço Dias – José Alves Morais – José Rodrigues de Almeida – José Francisco Estima – Manuel Francisco Estima – Manuel Fernandes Framegas – Tomaz Dias – José Tavares da Silva – Francisco Alves Estima – Manuel Francisco Claro o novo José Simões Alves – Joaquim Morgado (?).»

 

páginas 25 e 26

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