Confiado, exclusivamente, na
força e na destreza (que a idade era de sonhos...), porque, dos segredos
da luta nada conhecia, subiu ao palco um tanto receoso e tomado de
natural timidez. Em breve, porém, readquiria a calma e era declarado
vencedor.
Após tão concludentes provas,
que não passaram despercebidas ao portuense Alexandre Cal, fácil foi
abrir-se-lhe o caminho doutro desporto para que dispunha de reais
condições. Despede-se, então, de Lisboa, e fixa-se na Invicta, onde
frequenta uma escola de pugilismo que funcionava na sede do F. C. do
Porto. E, depois de meia dúzia de treinos, Santa estreia-se no boxe,
entusiasmando a multidão desportiva portuense, que começou a ver nele,
se não um futuro campeão do mundo, pelo menos um valoroso intérprete da
«nobre arte». O campeão Benjamim Branco foi a vítima deste baptismo...
O segundo combate travou-o em
Lisboa, obrigando o seu adversário, o polaco Geo Morgan, a desistir ao
3.º assalto. Ainda em 1925, ano em que abraçou o desporto com que o Novo
Mundo delira, dominou o valente francês Mahieu, ao cabo de 10 assaltos
de movimentada e árdua luta.
Conquistada aura favorável para
uma viagem promissora de bons resultados financeiros e até desportivos,
Santa seguiu rumo à Alemanha, estabelecendo quartel numa das suas
principais cidades. Daqui, deslocou-se à Inglaterra, França, Itália e
Espanha, onde efectuou vários combates, inclusivamente os que contavam
para o campeonato da Europa. Com cartaz positivo, passou para terras de
Santa Cruz. Aqui, por razões estranhas, não conseguiu confirmar o valor
de que justamente ia precedido. Perdendo até um combate com Isla, um
desconhecido no boxe, a sua cotação sofreu ténue baixa, embora
efemeramente, porque na América, onde só os de reputado valor conseguem
vencer, Santa, mercê das suas invulgares qualidades, ascendeu de novo a
plano de relevo, a ponto de só o seu nome valer um apreciável cartaz.
Realizando dezenas de combates,
sentiu as «carícias» destruidoras dos punhos do campeão mundial Max Baer
(1932), a quem resistiu dez «rounds», do alemão Schmelling, outro
campeão do mundo, e do italiano Primo Carnera (só citamos estes por
serem os de maior nomeada). Mas Santa sabia «acariciar» de igual
maneira. Algumas das suas «sapatadas» fizeram muitos adversários beijar
a lona.
Enfim, o valente ovarense deu e
recebeu muitos socos (a máscara actual é bem significativa),
distribuídos por mais de uma centena de combates.
Natural de Ovar, onde nasceu a
25 de Dezembro de 1902, José Santa não foi positivamente um pugilista da
classe ou da subtileza dum Carpentier. Todavia, dispunha dum «punch» de
ferro e dum físico excepcional, que em nada perdia em confronto com o de
Primo Carnera, que o grande campeão Joe Louis definiu como «uma
cordilheira de carne e osso».
Mal orientado logo no começo da
carreira, que a pressa de explorar o negócio era grande, foi impedido de
se candidatar seriamente ao título mundial. E sempre mal amparado por
quem tinha obrigação de acautelar a forma e brio de José Santa, com
prejuízo evidente das suas faculdades, nunca lhe deram azo a que
aperfeiçoasse a maneira rudimentar como combatia. Mas apesar de todas as
deficiências de que enfermava, Santa foi mesmo assim o maior baluarte do
boxe nacional, a estrela que cintilou com raro fulgor no firmamento do
boxe.
Seria agradabilíssimo, na
realidade, que um nome português fulgisse entre o dos campeões mundiais
de todas as categorias, de permeio com os Sullivan, Corbett, Jeffries,
Johnson, Dempsey, Tunney, Schmelling, Joe Louis e uns tantos mais de
semelhante valia....
Com a saúde perigosamente
abalada e exausto, regressou a Portugal em 1934. Apesar disso, ainda
subiu ao ringue para defrontar Cláudio Vilar, sofrendo dura punição nos
nove assaltos que durou a inglória luta, desbobinada em Lisboa, no Campo
Pequeno. Este combate assinalou, de forma deplorável, o epílogo duma
carreira que teve momentos brilhantes.
Hoje, comerciante na sua terra,
revive ainda muito, e saudosamente, um «palmarés» que encheria de
orgulho qualquer desportista. |