A
nossa querida
TERRA ALENTEJANA
Pelo DR. MÁRIO MADEIRA
O Alentejo, a minha província.
Eu quero-lhe tanto que o último escrúpulo me
retinha, à beira do receio de só o meu grande amor ter criado em mim a
visão grandiosa da sua infinita beleza.
Porque eu tenho visto e sei, que há muitos
que sorriem ao ouvir-me falar da beleza do Alentejo.
Conheço e dou mesmo parcial desculpa ao seu
erro.
Definia-o bem, um meu querido amigo e colega
que, sendo do Norte, de uma das nossas províncias tidas como a mais
formosa, vive há longos anos na minha terra, que
hoje já considera como sua.
– Sucede com o Alentejo, dizia-me ele, o
mesmo que com o tabaco; se os primeiros cigarros nos amargam e provocam
tosse, depressa se transformam em forte e indispensável o prazer do seu
fumo.
Sim, a paisagem alentejana não é das que
prende à primeira vista, das que fascinam de longe e encantam de perto.
Debalde procuraremos nela, salvo alguns
raros e privilegiados recantos, a paisagem classicamente bela, esses
mimosos quadros, autênticos mostruários da natureza, cantados pelos
poetas e criados para a aguarela!
Não. A vista 9x12, formato postal, é difícil
encontrar no meu Alentejo.
Esses bocadinhos de terra onde a natureza
coloca um monte de sábias tonalidades a servir de fundo, uma mancha de
relva oportuna a dar a nota alegre, um riacho à esquerda, exactamente no
sítio onde melhor realça a linha graciosa de um renque de choupos
ladeando a estrada. onde não faltam à direita duas casas à medida e na
cor que mais convém ao conjunto, a vista tipo daquelas que os
«Guides-Bleus» assinalam como mais fotografáveis, essas não abundam no
Alentejo.
Se aqui e ali a Natureza se manteve feminina
e garrida, as terras que se disputam o título de Sintra do Alentejo,
Castelo de Vide, Estremoz, Vila Viçosa, Vidigueira e outras, não são o
padrão da beleza alentejana.
Porque a grandeza da nossa paisagem vive das
linhas fortes e não dos requintes mimosos de alambicada formosura.
O Alentejo não foi criado para os «Kodaks»!
A campina alentejana não dá instantâneos de
fácil beleza.
Mas os nossos olhos colhem nela preciosos
aspectos de conjunto, que na câmara escura da alma se revelam em
imponentes visões de incomparável grandeza.
No seu seio, de generosa fecundidade,
crescem a par o trigo e os homens.
Fortalecem-se as espigas e a personalidade.
A terra dá-nos simultaneamente a certeza da
sua força eterna e da nossa existência efémera mas real.
A beleza dos seus horizontes não nos prende
a vista, porque nos fala directamente a todos os sentidos, reflecte-se e
grava-se, no nódulo mais impressionável da nossa sensibilidade.
Sacode fortemente o conjunto da própria
personalidade. Não nos encanta a vista. Fala-nos à alma.
E é preciso debruçar-nos no fundo de nós
mesmos, para descobrimos a forte síntese de beleza que depositou em nós. |