O
Côjo, antes de se edificar nele o Mercado Manuel Firmino, cuja
construção durou por todo o ano de 1898 e que foi inaugurado no 1º de
Janeiro de 1899, e além dos edifícios construídos recentemente no
terreno que foi o Ilhote, a casa do Sr. Firmino de Vilhena, a nascente
da Avenida Bento de Moura e as casas ao fundo do quintal das senhoras
Mesquitas, era um largo irregular, para onde davam saída os quintais de
algumas casas da rua de Vila Nova, sem casa alguma de habitação, além da
que está entre as duas travessas, encostada às traseiras da Caixa
Económica, não havendo como agora há a Avenida Bento de Moura e a
travessa ainda sem nome, entre as casas de José Ferreira da Cunha e
Sousa e José António Marques, substituindo a antiga e estreitíssima
viela do Hospital, que ali havia e dava passagem da rua de Vila Nova
para o Côjo, sendo para esse fim demolida a casa que foi, nos princípios
do século passado, do capitão João Dionísio e que corria a par da mesma
viela.
Era só pela viela do Rolão e por esta viela que o Côjo se comunicava com
a rua de Vila Nova, hoje de Manuel Firmino, mas que me parece nunca
deveria perder aquele antigo nome, pelo qual se mostrava ter sido a
primeira que se abriu, quando a população começou a estender-se para o
norte das muralhas da antiga vila.
Sabido é que a vila de Aveiro era cercada de muralhas que o infante D.
Pedro, filho de el-rei D. João I, mandou construir ou reedificar;
compreendia, portanto, a vila somente a parte da cidade ao sul das
pontes, desde as portas da Ribeira, que aí eram, até à rua do Rato, que
ficava já de fora, pois que por esse lado a muralha ocupava o quarteirão
entre ela e a rua de Jesus.
Era isto. Crescendo a população e não cabendo já no recinto amuralhado,
foi na rua da Vera Cruz ou de Manuel Firmino que se fizeram as primeiras
edificações ao norte das pontes, e nem podia deixar de ser assim, porque
o Côjo, a Praça e Rossio eram nesse tempo lodaçais sem a necessária
consistência para firmeza de alicerces e segurança de prédios, não
havendo de mais a mais as cortinas do canal. Ainda hoje, em recentes
construções, tem sido reconhecido este defeito dos terrenos, atendendo-o
com grades de madeiras e outros trabalhos preventivos.
Com razão, pois, tomou esta rua o nome de Vila Nova, assim como foi dado
o de Cimo de Vila às do Espírito Santo, S. Sebastião, S. Martinho, etc.
O nome, pois, de Vila Nova, é o que esta rua devia conservar para
sempre; também lhe chamavam rua dos Ourives, porque só nela havia
ourivesarias, mas este não era o nome oficial, era como uma alcunha.
Crismaram-na, depois, há poucos anos, em rua da Vera Cruz, e ultimamente
em rua de Manuel Firmino. Pegará? Será o último? Nestes últimos tempos
tem havido uma febre vertiginosa em mudar os nomes das ruas, e em dar
assim às existentes como às abertas de novo, nomes de pessoas colocadas
em altas posições políticas, algumas das quais nenhum título possuem
pelo qual tenham jus à consideração desta cidade; pessoas até
desconhecidas da grande maioria de seus habitantes, ao passo que ninguém
se tem lembrado de prestar essa homenagem à memória de filhos de Aveiro,
dignos da veneração dos seus conterrâneos.
Podemos procurar, mas não encontraremos rua ou mesmo um beco com o nome,
por exemplo, de João Afonso de Aveiro, ou de Antónia Rodrigues. Será
porque estes já deram o que tinham a dar, enquanto dos que ainda vivem
alguma coisa se espera, se não para a cidade, ao menos para quem se
lembra de os adular por esta forma?
Ou para assim lhes agradecer serviços e favores puramente pessoais?
Dizem-me que a algumas ruas recentemente abertas alguns nomes de filhos
antigos e ilustres de Aveiro lhes têm sido dados. Ainda bem, e valha-nos
isso, embora persista em confessar que tal orientação tem sido pouco
seguida.
Nesta rua houve, em tempos remotos, um hospital de pescadores; era onde
hoje é a casa de José Ferreira da Cunha e Sousa, e contígua a ele havia
a capela da invocação de Nossa Senhora da Graça, se nisso me não engano,
a qual ainda existia, posto que velha e arruinada, no primeiro quartel
do século passado; tendo, porém, caído em ruínas, foi o terreno aforado
a Joana Gamelas, viúva de José Vinagre, que o reuniu à casa que já
possuía junto dele.
Muitas casas desta rua têm sido reedificadas, e algumas com muito melhor
aspecto, tendo as Câmaras perdido essas ocasiões de dar à rua um melhor
alinhamento, do qual tanto carece, assim como de serem retirados os
degraus para a entrada de portais que ainda mais a estreitam. A
estreiteza em alguns pontos desta rua, sendo tal que dificilmente pode
uma carruagem passar por outra que venha em direcção oposta, defeito
este mais sensível em uma rua que é estrada real de segunda classe,
obrigou a Direcção das Obras Públicas a propor ao Governo a abertura da
avenida para o Côjo, para o que, autorizada, se procedeu a essa obra que
foi concluída em 18...
Ao tempo em que isto se escreve, acha-se o Ilhote em parte aterrado e
unido à estrada, construindo-se nele os edifícios que lá se vêem. |