Já
não era muito confortável a cadeira com velhas almofadas de chita.
Não era a cadeira, mas a idade. Ali, passara dias e noites em longos
serões, tricotando as camisolas dos pescadores para sustento dos
cinco filhos que o seu "ManeI" lhe deixara.
Agora, ponto a ponto, sonho a sonho, a lã cor de rosa ia tomando a
forma de um xaile. Uma bisneta!!!... Quando a sua Maria lhe disse
naquela voz gritada de pregão – "Mãe! A mulher do seu neto, do
"Tone", vai ter uma menina. – nem queria acreditar... Uma
bisneta!....
Só a imensa alegria da notícia a faria arrastar-se até à loja da
Sr.ª Rosa. «Aquela é mais bonita», dizia, apontando os novelos de
cor de rosa que sobressaíam no meio daquele mundo de lãs. E ponto a
ponto, sonho a sonho, a lã cor de rosa ia tomando a forma de um
xaile.
Chegou, finalmente, o dia do baptizado. Ia ver a menina. Vieram
buscá-la. A casa do neto estava cheia de gente: amigos lá de França,
onde ele estivera e fizera fortuna.
Que bonita! Tinha os olhos azuis do bisavô Manuel e as faces, as
faces eram da cor do xaile.
Entregou o embrulho modesto. Era para a menina! A confusão estava
instalada. Entre risos e ruído de conversas, a menina chorava e a
mãe correu a dar-lhe de mamar. «Quanto mais tempo estivesse sem
comer, na hora do baptizado, melhor – dizia a bisavó – para ter mais
fôlego e não morrer afogada». Os homens riram-se e as mulheres
olharam-na com um olhar misto de dúvida e complacência.
Finalmente, aprontaram-se. Por momentos, a menina passou-lhe pelo
colo. Era um novelinho de rendas e fitas.
– E o xaile? A menina não leva o xaile?
– Com este calor, mãe? Você tem cada uma. Com este calor, um
xaile!...
Foi levada pela onda de festa até à igreja. Quando a tiraram do
carro, meia atordoada, vislumbrou a bisneta, a sua menina, no colo
da mãe, toda risonha. E o xaile?
Num recanto tranquilo do quarto, agora vazio e silencioso, repousava
o xaile cor de rosa, ponto a ponto, sonho a sonho.
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