Documentos seleccionados do arquivo organizado por Aurélio Guerra.

129 Rua Augusto de Oliveira Guerra

Mestre vidreiro e empresário

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Este notável homem nasceu no lugar da Ordem em 1879 e faleceu na sua terra de adopção, Oliveira de Azeméis, em 1941.

Falar de Augusto de Oliveira Guerra não é tarefa fácil. Se o vulto se agigantou durante o seu percurso de vida deixando obrigatoriamente atrás de si um esplendoroso rasto de trabalho e de dádiva, obriga as gerações herdeiras desse passado ao agradável prazer de honrar quem provavelmente sem o querer acabou por ser diferente dos demais.

Este bom homem partiu da sua Marinha Grande no ano distante de 1902 ao encontro do seu destino, vinculado pelo prestígio quase impossível de alcançar por um jovem que queria ver mais longe, muito para além do seu pobre ofício de Ajudante na Real Fábrica de Vidro da Marinha Grande. Aqui coleccionou os grandes ensinamentos dos seus mestres vidreiros, único "sustento" que levava no seu alforge a caminho de Oliveira de Azeméis. Mas não quis ir sozinho na embalagem dessa aventura. Consigo foi o sobrinho, António Pereira Roldão, irreverente ajudante vidraceiro e seu camarada na fábrica «Rial». Ainda solteiro, acabou por juntar à sua vida o amor de uma jovem / 12 / Senhora, oriunda de uma das mais notáveis famílias de Oliveira de Azeméis.

D. Emília Maria Brandão, severamente censurada pela sua Família por querer namorar um "miserável" operário vidreiro, acabou por realizar o casamento aos 17 anos, ainda uma criança, vencendo todas as barreiras movidas por suas três Irmãs e a sua Mãe.

Por fatalidade do destino, todas as suas Irmãs acabaram por morrer praticamente na miséria, apesar da abastada vida que desfrutavam quando jovens, enquanto D. Emília Maria Brandão, já dona do apelido Guerra, terminou os seus dias com a mesma tranquilidade económica que tinha aprendido desde o berço, por obra da elevada capacidade do tal "miserável" operário vidreiro que tinha vindo da Marinha Grande.

Deste casamento tiveram três filhos, dois dos quais fazem parte da minha memória familiar, dadas as suas peculiaridades muito especiais: Aurélio Guerra e Manuel Guerra.

Aurélio de Oliveira Guerra, felizmente ainda entre nós, e que nos tem brindado com os seus profundos conhecimentos sobre a história da Indústria Vidreira em Oliveira de Azeméis, é autor de um notável trabalho publicado pelo Museu Santos Barosa, em Julho de 1997, sobre esse tema e um devotado apoiante da criação do Museu do Vidro da Marinha Grande.

O outro filho, que marcou indelevelmente a minha juventude, foi o inconstante, o poeta, o prosador apaixonado, o sonhador inventor de causas que não podia ganhar foi enfim, um homem da cultura, foi Manuel de Oliveira Guerra já infelizmente falecido.

Dois Irmãos e dois vultos que, embora nascidos em Oliveira de Azeméis, nunca tentaram cortar o "cordão umbilical" que os ligava à Marinha Grande mas, pelo contrário, cimentaram continuamente as correntes familiares ou simples amizade coberta de carinho para com a nossa terra.

Mas não cabe neste capítulo, embora obrigatoriamente longo, historiar a figura destas duas personalidades, mas sim dar à estampa a figura de seu Pai, Augusto de Oliveira Guerra. Ficarão as suas referências nos meus arquivos para, na devida altura, lhes prestar a homenagem que bem merecem, através da divulgação biográfica, da caracterização das suas personalidades e das suas obras, que desejo incluir num próximo trabalho, já referido noutro local.

Mas vamos voltar a Augusto de Oliveira Guerra para o definir como uma personalidade de fino trato, rara inteligência e sensibilidade, particularidades que estabeleceram a sua maneira de ser não só como simples mas também como grande artista vidreiro e activo empresário. A sua acção como industrial vidreiro marcou

profundamente o desenvolvimento económico e social de Oliveira de Azeméis como mais adiante se verá.

Em 31 de Março de 1917, funda a Fábrica de Vidros Progresso, Ld.ª, que instala numa antiga fábrica de gomas na freguesia de Santiago de Riba UI, adquirida por si para o efeito. Homem de mais acção do que palavra, realiza as obras de adaptação das velhas instalações num tempo recorde; e a 23 de Agosto seguinte, começa a produzir as primeiras peças de vidro. As questões menores foram tratadas mais tarde e por isso só a 9 de Outubro desse mesmo ano realiza a constituição da nova sociedade estabelecida com o capital de 16.500$00, sendo a sua participação de 6.500$00. Nomeado gerente da sociedade de imediato, Augusto Guerra acabava de criar a quinta fábrica de vidros do concelho de Oliveira de Azeméis.

Dono de uma grande vontade expansionista, adquire, entre 1919 e 1921, em nome da sua sociedade, as velhas instalações da antiga Fabrica de Vidros da Pereira.

Em 5 de Janeiro de 1921, é formada a Sociedade Anónima Companhia Vidreira Nacional, que viria a englobar e transformar numa maior empresa todas as sociedades já criadas na área da industria vidreira da região. Foi assim que esta nova sociedade adquire a mística e antiga Fábrica de Vidros a Boémia e, logo de seguida, negoceia do Augusto de Oliveira Guerra a inclusão da sua Fábrica de Vidros Progresso e seus bens no grupo. Realizada a operação em 4 de Janeiro de 1922, nesse mesmo dia a Companhia Vidreira Nacional procede a um aumento de capital e aí entra de novo na luta Augusto de Oliveira Guerra, adquirindo 357 acções da nova Sociedade, tomando uma importante parte no seu capital. Fica assim, a Companhia Vidreira Nacional, de posse da Ld.ª e / 13 / Fábrica de Vidros da Pereira. As duas primeiras fábricas estavam em plena laboração e o Vidreiro Marinhense faz um grande esforço e reforça o seu capital na Sociedade, passando para a sua posse 857 acções. A sua nova posição remeteu-o de imediato para o cargo de grande responsabilidade à frente da direcção técnica de todas as fábricas. Entretanto por razões estratégicas, a Fábrica Progresso, Ld.ª cessa a sua actividade em 1926 e passa toda a produção a ser concentrada na Boémia.

A indústria vidreira naquela região entra em nova transformação e criam-se condições para o estabelecimento de novas sociedades. Assim a 21 de Maio de 1926 é criado o actual Centro Vidreiro do Norte de Portugal, Ld.ª, com sede em La Salette, Oliveira de Azeméis, com o capital de 500 contos. Augusto de Oliveira Guerra, sempre por dentro de todos estes acontecimentos, participa na constituição desta sociedade com o capital de 237.500$00. Na sequência deste novo empreendimento, os sócios dirigem-se ao Banco Aliança, no Porto, onde estabelecem as escrituras de compra das três fábricas que constituíam o património da Companhia Vidreira Nacional, procedendo-se de imediato à sua extinção.

O Centro Vidreiro do Norte de Portugal sofreu, no decorrer do tempo, várias alterações que nem sempre foram consideradas de pacíficas. Augusto de Oliveira Guerra, já fatigado pelo trabalho e pelos anos que já pesavam, retira-se vendendo a sua posição. É o Senhor José Emílio Raposo de Magalhães, de Alcobaça, o novo sócio. Para substituir Augusto Guerra no cargo que exercia de Gerente-Técnico, vai para Oliveira de Azeméis, a seu convite, o Marinhense Alípio Morais Matias.

A participação de José Emílio Raposo de Magalhães no Centro Vidreiro do Norte de Portugal, foi de pouca duração. Tendo colocado na fábrica o seu filho bastardo António de Sousa Magalhães, de méritos muito modestos, vende a sua posição que passa de novo para as mãos de Augusto de Oliveira Guerra, a troco de mil e novecentos contos. Mas também foi fugaz esta transformação social pela precipitação dos acontecimentos.

O sócio António Braz morre subitamente e os seus quatro filhos não conseguem entender-se quanto à partilha da sua quota na sociedade. As polémicas foram muitas e Augusto de Oliveira Guerra desesperado por tantas contrariedades, vende definitivamente a sua posição na indústria vidreira de Oliveira de Azeméis em 14 de Maio de 1938 aos herdeiros de António Braz.

Augusto de Oliveira Guerra foi um dos mais notáveis marinhenses no difícil processo de desenvolvimento da indústria vidreira nacional. Num local tão tradicional historicamente, berço da mais velha de todas as Fábricas de Vidros do País, a Fábrica do Côvo, ele viveu, desenvolveu e difundiu o seu saber acabando por entregar aí, à terra, o seu corpo. Fica para a memória dos filhos da grande capital da Indústria Vidreira em Portugal, o dever de homenagear este homem grande na sua obra, artista no seu labor, mas modesto e apaixonado amante das suas origens.

No Museu do Vidro da Marinha Grande irá repousar para a eternidade uma das mais interessantes obras da arte vidreira produzidas em Oliveira de Azeméis por vidreiros Marinhenses e que lhe tinha sido oferecida em justa homenagem organizada pelos operários de então, em 1928. Trata-se de um belo serviço "doublé" vermelho que oferece à Marinha Grande o prazer de se poder admirar a destreza e arte dos operários vidreiros da nossa terra que trabalharam em Oliveira de Azeméis naqueles tempos.

Os vidros branco e vermelho foram compostos por Francisco Abreu e Sousa; as peças foram manufacturadas pelos oficiais vidreiros Teotónio Gil Júnior e Albano de Sá Serafim, todos naturais da Marinha Grande.

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NOTA – Infelizmente, Aurélio Guerra esqueceu-se de indicar a fonte de onde fotocopiou este texto e o nome do autor. Pelo aspecto, deduzimos que deverá tratar-se de um livro sobre toponímia de Oliveira de Azeméis, tanto mais que no documento que reproduzimos vem a seguir o n.º 130, referente à rua Clube Recreativo Amierinhense. (HJCO)


 

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16-12-2024