Fragata do século passado vai voltar a navegar

In: "Litoral", 19/08/1994

A última nau da Índia, a fragata "D. Fernando e Glória" está em Aveiro a sofrer obras de restauro. O custo de tal empreendimento está previsto atingir os 900 mil contos.

Os trabalhos de reconstrução da fragata "D. Fernando e Glória" estão a decorrer em Aveiro, nos estaleiros Ria-Marine, há já alguns meses. Trata-se de recuperar a última embarcação que viajou para a Índia, numa operação difícil e dispendiosa que vai ser comparticipada pelo Estado português em cerca de 50%. A restante verba terá que ser conseguida com a boa vontade de quem quiser participar. Prevê-se a finalização deste empreendimento lá para o ano de 1997, segundo um dos responsáveis pelos trabalhos, o almirante Andrade Silva. Após a finalização dos trabalhos, o navio vai atracar no Tejo, passando a desempenhar o papel de navio-museu integrado no património do Museu da Marinha.

Os trabalhos a decorrer em Aveiro prendem-se apenas com o corpo do navio, seguindo, depois de concluído, para Lisboa, onde especialistas vão terminar a obra, dando-lhe o aspecto e dotando-a de todo o material que transportava quando navegava, imponente, para os mares da Índia.

Durante o ano de 1994 vão ser construídos os canhões e berços, trabalho que segue os desenhos e os estudos efectuados para o efeito pelo coronel Nunes dos Santos, um especialista em artilharia naval. Por outro lado, é a Gulbenkian, através da Manuela Soares Mota, que está a proceder aos estudos para apetrechamento dos seus interiores, estando por seu lado o comandante Reis a tratar dos instrumentos de navegação.

Em construção estão já várias peças oferecidas por uma empresa da especialidade.

A reconstrução da "D. Fernando e Glória" tem sido possível graças também aos apoios de várias entidades, uma delas a Associação Nacional das Farmácias, que se encontra, juntamente com especialistas em medicina antiga, a reconstruir a botica e o camarote do médico.

Para ver na Expo/98

Depois de concluídos os trabalhos, o navio-museu vai fazer as delícias dos visitantes da Expo'98, assinalando assim as comemorações dos 500 anos da descoberta do caminho marítimo para a Índia.

Quando terminar esta exposição internacional, a "D. Fernando e Glória" fica atracada em Belém, onde pode depois ser visitada como peça de museu.

Esta embarcação foi a última construída pela Marinha Portuguesa e conta com a bonita idade de 152 anos, tendo, durante 32 anos, feito viagens entre Portugal e a Índia com passagem por Angola e Moçambique.

Foi construída em Damão Grande (Índia) pelo mestre português Gil José da Conceição e pelo mestre mouro Yeodó Semogi, por ordem do então governador da Índia, Francisco Xavier da Silva Pereira. A última função que desempenhou foi a de servir de sede à "Obra Social da Fragata D. Fernando", no início deste século e onde os jovens de poucos recursos financeiros recebiam instrução escolar e marítima.

Em 1963 foi destruída por um incêndio e, desde essa altura, esteve submersa no Rio Tejo até que, já na década de 1990, foi retirada do local e trazida para Aveiro, onde está a ser restaurada, ou melhor, reconstruída, pelo mestre Alberto Costa.

O seu restauro vai utilizar vários tipos de madeiras, num total de 1200 toneladas, mantendo-se alguma da madeira original, mas muito pouca.

Depois de concluída, a embarcação fica em condições de voltar a navegar, mas isso deverá acontecer muito poucas vezes, unicamente pelos gastos que acarreta.

De facto, esta fragata, para poder navegar, necessita de uma guarnição permanente de 60 homens, o que se torna demasiado dispendioso para poder fazer viagens regulares.

Entretanto, e para conseguir apoios financeiros, a comissão de restauro está a desenvolver esforços junto de diversas entidades, oficiais e privadas, e também das comunidades portuguesas radicadas nos Estados Unidos, Canadá, Califórnia e Hawai.

Macedo Pita


 

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