No
dia 26 de Junho de 1988, entraram pelo meu escritório dentro, em S. Pedro
do Sul, a Maria Isabel Estrela Esteves e a Isabel Curado Correia, que
traziam na ponta da língua um desafio que logo ali me lançaram: «em
nome do CETA, estavam a convidar-me para eu escrever o texto do seu próximo
espectáculo.»
Porque
nunca soube resistir aos “desafios”, imediatamente lhes disse que sim.
Só que, passados alguns minutos, cheguei à conclusão de que me havia
precipitado.
Na
verdade que sabia eu de Aveiro? Que tinha a Ria, que tinha os “ovos
moles” e... pouco mais! Ah! sabia que tinha sido berço de Estêvão de
Magalhães, que fora a terra onde Mário Sacramento vivera e onde se
fizeram os Congressos da Oposição Democrática. E pronto!
Era
muito pouco para fazer uma peça de Teatro.
Por
isso, botei, rapidamente, mãos à obra. Pedi textos. Comprei livros, fiz
consultas e conversei, longamente, com João Sarabando (que é a história
viva de Aveiro).
Assim,
no dia 15 de Agosto, a peça estava escrita.
Só
que, como estava de férias e longe de S. Pedro do Sul, teve de aguardar
por Setembro para ser dactilografada.
Em
meados de Setembro, depois de uma leitura colectiva para a direcção do
CETA, Grupo de Actores e Encenador, depositei-a na mão deles para que
fizessem um Grande Espectáculo.
Na
verdade, o meu texto é uma parábola que se desenvolve sobre um grande
painel, que se estende ao longo de quase duzentos e cinquenta anos de história
de Aveiro.
Como
em todas as parábolas, no meu texto há uma história explícita e várias
histórias implícitas.
A
história explícita é a história do lodo, da lama, da dor, da miséria,
da morte que cercaram Aveiro em consequência do fecho da barra, em 1575
e, também, a história da longa luta das gentes de Aveiro para que a
barra fosse aberta.
As
histórias implícitas têm a ver com o oportunismo que sempre se mete em
todos os processos de luta; têm a ver com a demagogia dos poderes
centrais, face às necessidades das regiões periféricas; têm a ver com
o salto qualificativo de uma nova mentalidade (Luís Gomes de Carvalho) em
choque com o peso do passado que o cerca por todos os lados; têm a ver
com aqueles que estão “antes do tempo” e são submersos pela tragédia
da mesquinhez, representada por uma certa “clic” bem falante, atrás
da qual se perfilam os grandes interesses que trazem, sempre, acorrentada,
muita gente enganada, que lhes dá vivas e lhes batem palmas...
Enfim:
na história explícita do passado há muitas histórias implícitas do
presente. Há, pois, que estar atento e procurar descobri-Ias.
Espero
que a grandeza e complexidade da luta, as pequenas e grandes cobardias, as
injustiças e ingratidões que surgem com toda a força, no Espectáculo,
nesta “Longa Marcha Para o Esquecimento”, sejam um soco, também, na
nossa histórica indiferença para com aqueles que, no Passado, tudo deram
para que o Futuro fosse melhor.
Jaime Gralheiro |