Fábrica Aleluia
HOMENAGEM
Após um certo período de prosperidade, a actividade
cerâmica de Aveiro, ao iniciar-se o século XX, via-se a braços com
dificuldades e acentuava-se a sua decadência. Contudo, um novo impulso
iria ser-lhe dado.
No dia 14 de Fevereiro de 1905, no cartório do notário
Manuel Cação Gaspar, foi lavrada a escritura da sociedade que entre si
constituíram João de Pinho das Neves Aleluia, Feliciano de Pinho das
Neves Aleluia, João Bernardo Júnior, António Lima e João Gonçalves, com
o objectivo de fabricar louça «de uso comum e utilidade imediata»,
ficando com a sede em Aveiro, com a designação de «Fábrica de Louça dos
Santos Mártires» e com a firma social de d. Alleluia & Companhia»; os
cinco intervenientes eram antigos operários cerâmicos e a fábrica, que
tomava aquele nome pelo local em que se situava, para lá do bairro do
Alboi, iniciaria a sua laboração em 4 de Junho seguinte.
Todavia, um ano depois dissolvia-se a sociedade, por
desentendimento entre os seus membros. Foi então que João Aleluia – que
além de operário era artista e pintor – assumiu, com sua esposa, o
activo e passivo da fábrica, ficando como único responsável do
recém-nascido empreendimento, enquanto os outros preferiram continuar
apenas como simples operários.
Em 1911, em face da estreiteza do espaço no largo dos
Santos Mártires, João Aleluia comprou, mediante um empréstimo, uma
quinta situada na Rua da Fonte Nova,
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em frente da fábrica do mesmo nome; entretanto, já a qualidade de
produção havia conquistado os mercados nacionais, nomeadamente a Beira
Alta. Até 1917 – data em que a fábrica foi transferida para o novo local
- a principal novidade foi a introdução de um moinho de vento. Para o
escoamento dos seus produtos, continuaria a servir-se do transporte por
barco, pois as novas instalações, tais como as primeiras, também estavam
junto de um dos canais da ria. No seu primeiro período de existência,
trabalhando cerca de vinte pessoas, embora a maior produção fosse de
louças domésticas, os dotes de João Aleluia desenvolviam-se em pratos
decorativos, jarras e painéis; a azulejaria ainda era reduzida.
De 1917 a 1935, verificou-se um novo período de
progresso, com a introdução de novos fornos, com o aproveitamento da
água das marés para moer o vidrado, reforçando a energia eólica, e,
posteriormente, com a instalação de um motor a gás de 10/12 cv.. Neste
período, entre as duas guerras mundiais, surgira uma tenaz concorrência,
com o aparecimento ou o ressurgimento de empresas. Os filhos de João
Aleluia – Gervásio e Carlos – concluídos os estudos preliminares,
fizeram renascer as louças decorativas e os painéis; em 1922, realizaram
a primeira de uma série de exposições, de assinalável êxito para o
relançamento da fábrica, que então se começou a chamar com o nome de
«Aleluia». O interesse dos filhos fez introduzir novas máquinas,
importadas de Limoges e da Alemanha, para dar à fábrica outra dimensão e
outra capacidade. Entretanto, em 1935, João Aleluia acabaria por
falecer, inesperadamente.
De 1936 a 1955, ressalta uma extraordinária acção social e cultural, que
testemunha uma situação de progresso económico; disso é índice o «Coral
Aleluia», que obteve justos aplausos pelo País e pelo estrangeiro.
Quanto à produção, esta não se afastou das linhas principais traçadas
pelo fundador. Mecanizada em sintonia com as melhores do ramo, foi a
azulejaria a grande aposta, ganhando neste sector o respeito pelos seus
mais directos concorrentes. Beneficiando de uma excelente oficina de
pintura, os seus painéis espalharam-se do norte ao sul de Portugal e
mesmo por diversas partes do mundo, especialmente pelo nosso Ultramar e
pelo Brasil. Ao completar os cinquenta anos de existência, em 1955, a
Fábrica Aleluia estava no auge da sua vida industrial e artística e
inseria-se perfeitamente na vida aveirense. Contava então cerca de
quatrocentos operários, entre os quais óptimos artistas cerâmicos.
Passaram por ela, entre outros, Francisco Pereira, Licínio Pinto,
Alfredo Mota e João Lavado.
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Em 1962 os Irmãos Aleluia compraram uma propriedade na
Quinta do Simão (Esgueira) e aí começaram por instalar uma pequena
fábrica. Algumas das secções existentes na Fábrica Aleluia, foram
encerrando; a primeira foi a de louça doméstica, à qual se seguiu a de
louça artística – secção de grande prestígio e de grandes valores
artísticos.
Em 1973 a família Aleluia vendeu a fábrica, passando esta
a ser propriedade de uma Sociedade Anónima.
Em 1984 dá-se a transição total da Fábrica para as
instalações da Quinta do Simão, onde actualmente se encontram. Com esta
mudança encerra-se mais uma secção, a de louça sanitária. Quanto às
velhas instalações, na Rua da Fonte Nova, estas foram sendo desactivadas
progressivamente, para serem demolidas em 1986.
Actualmente faz parte da sua produção o fabrico de
azulejo de série e a pintura artística de painéis que têm dado à fábrica
um lugar digno em termos de qualidade; recentemente esta abriu uma
secção artesanal.
A Fábrica Aleluia, porém, apesar de ter desaparecido do
panorama citadino de Aveiro por exigências urbanísticas, continua a ser
um símbolo expressivo das artes cerâmicas da nossa região.
J. G.
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