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Boletim n.º 9 - Ano V - 1987

Fábrica Aleluia

 

HOMENAGEM

 

Após um certo período de prosperidade, a actividade cerâmica de Aveiro, ao iniciar-se o século XX, via-se a braços com dificuldades e acentuava-se a sua decadência. Contudo, um novo impulso iria ser-lhe dado.

No dia 14 de Fevereiro de 1905, no cartório do notário Manuel Cação Gaspar, foi lavrada a escritura da sociedade que entre si constituíram João de Pinho das Neves Aleluia, Feliciano de Pinho das Neves Aleluia, João Bernardo Júnior, António Lima e João Gonçalves, com o objectivo de fabricar louça «de uso comum e utilidade imediata», ficando com a sede em Aveiro, com a designação de «Fábrica de Louça dos Santos Mártires» e com a firma social de d. Alleluia & Companhia»; os cinco intervenientes eram antigos operários cerâmicos e a fábrica, que tomava aquele nome pelo local em que se situava, para lá do bairro do Alboi, iniciaria a sua laboração em 4 de Junho seguinte.

Todavia, um ano depois dissolvia-se a sociedade, por desentendimento entre os seus membros. Foi então que João Aleluia – que além de operário era artista e pintor – assumiu, com sua esposa, o activo e passivo da fábrica, ficando como único responsável do recém-nascido empreendimento, enquanto os outros preferiram continuar apenas como simples operários.

Em 1911, em face da estreiteza do espaço no largo dos Santos Mártires, João Aleluia comprou, mediante um empréstimo, uma quinta situada na Rua da Fonte Nova, / 34 / em frente da fábrica do mesmo nome; entretanto, já a qualidade de produção havia conquistado os mercados nacionais, nomeadamente a Beira Alta. Até 1917 – data em que a fábrica foi transferida para o novo local - a principal novidade foi a introdução de um moinho de vento. Para o escoamento dos seus produtos, continuaria a servir-se do transporte por barco, pois as novas instalações, tais como as primeiras, também estavam junto de um dos canais da ria. No seu primeiro período de existência, trabalhando cerca de vinte pessoas, embora a maior produção fosse de louças domésticas, os dotes de João Aleluia desenvolviam-se em pratos decorativos, jarras e painéis; a azulejaria ainda era reduzida.

De 1917 a 1935, verificou-se um novo período de progresso, com a introdução de novos fornos, com o aproveitamento da água das marés para moer o vidrado, reforçando a energia eólica, e, posteriormente, com a instalação de um motor a gás de 10/12 cv.. Neste período, entre as duas guerras mundiais, surgira uma tenaz concorrência, com o aparecimento ou o ressurgimento de empresas. Os filhos de João Aleluia – Gervásio e Carlos – concluídos os estudos preliminares, fizeram renascer as louças decorativas e os painéis; em 1922, realizaram a primeira de uma série de exposições, de assinalável êxito para o relançamento da fábrica, que então se começou a chamar com o nome de «Aleluia». O interesse dos filhos fez introduzir novas máquinas, importadas de Limoges e da Alemanha, para dar à fábrica outra dimensão e outra capacidade. Entretanto, em 1935, João Aleluia acabaria por falecer, inesperadamente.

De 1936 a 1955, ressalta uma extraordinária acção social e cultural, que testemunha uma situação de progresso económico; disso é índice o «Coral Aleluia», que obteve justos aplausos pelo País e pelo estrangeiro. Quanto à produção, esta não se afastou das linhas principais traçadas pelo fundador. Mecanizada em sintonia com as melhores do ramo, foi a azulejaria a grande aposta, ganhando neste sector o respeito pelos seus mais directos concorrentes. Beneficiando de uma excelente oficina de pintura, os seus painéis espalharam-se do norte ao sul de Portugal e mesmo por diversas partes do mundo, especialmente pelo nosso Ultramar e pelo Brasil. Ao completar os cinquenta anos de existência, em 1955, a Fábrica Aleluia estava no auge da sua vida industrial e artística e inseria-se perfeitamente na vida aveirense. Contava então cerca de quatrocentos operários, entre os quais óptimos artistas cerâmicos. Passaram por ela, entre outros, Francisco Pereira, Licínio Pinto, Alfredo Mota e João Lavado. / 35 /

Em 1962 os Irmãos Aleluia compraram uma propriedade na Quinta do Simão (Esgueira) e aí começaram por instalar uma pequena fábrica. Algumas das secções existentes na Fábrica Aleluia, foram encerrando; a primeira foi a de louça doméstica, à qual se seguiu a de louça artística – secção de grande prestígio e de grandes valores artísticos.

Em 1973 a família Aleluia vendeu a fábrica, passando esta a ser propriedade de uma Sociedade Anónima.

Em 1984 dá-se a transição total da Fábrica para as instalações da Quinta do Simão, onde actualmente se encontram. Com esta mudança encerra-se mais uma secção, a de louça sanitária. Quanto às velhas instalações, na Rua da Fonte Nova, estas foram sendo desactivadas progressivamente, para serem demolidas em 1986.

Actualmente faz parte da sua produção o fabrico de azulejo de série e a pintura artística de painéis que têm dado à fábrica um lugar digno em termos de qualidade; recentemente esta abriu uma secção artesanal.

A Fábrica Aleluia, porém, apesar de ter desaparecido do panorama citadino de Aveiro por exigências urbanísticas, continua a ser um símbolo expressivo das artes cerâmicas da nossa região.

J. G.

 

 

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