Em 8 de Março de 1514, D. Manuel I
concedeu foral ao Concelho de Ílhavo.
Embora pequeno, este concelho é um
dos mais evoluídos, de mais elevado nível de vida e de maior
densidade de população, do Distrito de Aveiro e encontra-se
devidamente electrificado e dotado de uma extensa rede de
distribuição de água, que atinge já todas as freguesias, bem como as
praias da Barra e Costa Nova do Prado, mercê de um projecto
apresentado pelo Município, o qual, em 1968 mereceu a aprovação e
uma avultada comparticipação do Ministério das Obras Públicas.
Tem à volta de trinta mil
habitantes, a maioria dos quais tem exercido a sua actividade nas
fainas do mar, nos trabalhos da lavoura e nas lides domésticas.
Hoje, porém, graças ao grande
desenvolvimento industrial, já muitos dos seus filhos encontram
ocupação, tanto na parte administrativa como na parte técnica das
muitas e variadas fábricas e oficinas, que têm sido construídas e
postas a funcionar, tanto na Zona Industrial como em outros locais
adequados.
Em todo o concelho nota-se também um
enorme incremento urbanístico, com lindas vivendas edificadas por
toda a parte, graças aos proventos auferidos pelos seus naturais,
que desempenham as suas arriscadas funções nas várias modalidades da
pesca, mas, principalmente, a bordo dos grandes arrastões, que vão
laborar para zonas longínquas, como a Terra Nova, a África do Sul, a
Noruega, a Mauritânia, etc., e ainda às remessas dos emigrantes,
que, geralmente também em actividades ligadas ao mar, trabalham
afincadamente, na América do Norte, no Canadá, na Alemanha, na
Holanda, e na França.
O concelho é composto por quatro
freguesias: Ílhavo, Gafanha da Nazaré, Gafanha da Encarnação e
Gafanha do Carmo.
A sua sede – Ílhavo – é uma ridente
vila, veleira e airosa, que fica situada a cinco quilómetros ao Sul
da Cidade de Aveiro.
Esta proximidade, ao mesmo tempo que
contribuiu para que, em tempos passados, os seus naturais estudassem
no Liceu, na Escola Técnica e na Escola do Magistério daquela
cidade, alcançando assim preparação para continuar os estudos, ou
para desempenhar cargos de responsabilidade, tanto na função
pública, como em actividades particulares, prejudicou-a, também,
consideravelmente, no que diz respeito ao desenvolvimento comercial.
A população, muito activa e
arrojada, pode dizer-se que é flutuante, uma vez que a maioria dos
seus homens exerce a sua actividade profissional, desempenhando as
funções de comandante, oficial ou marinheiro, nos vários navios que
sulcam as águas dos oceanos e, orgulhosamente, levam a bandeira de
Portugal aos portos de todo o mundo.
Assim, não é raro ouvir grupos de
marinheiros contar episódios passados, quer em Hamburgo, em Londres,
em Anvers, no Rio de Janeiro ou em Singapura, quer em S. João da
Terra Nova, na cidade do Cabo ou em Holsteinsborg, como se
estivessem a relatar casos ocorridos em terras vizinhas da sua.
As mulheres, particularmente as mais
jovens, apresentam-se galantes no porte e no trajar e, talvez pela
sua ascendência grega ou fenícia, são muito bonitas, alegres e
donairosas, dando imensa graça e encanto à terra onde nasceram.
As outras três freguesias, que, há
pouco de mais de um século, não passavam de areais estéreis, onde
nada se criava, mercê do esforço hercúleo dos seus laboriosos
habitantes – pé no barco, na apanha do moliço da Ria, pé em terra,
nos esforçados trabalhos da lavoura – transformaram-se em ricas
planícies aráveis, produtivas e muito férteis, onde abunda o milho,
o feijão, a ervilha, as pastagens e, principalmente a batata.
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Esta riqueza, juntamente com o ganho
dos que andam no mar ou estão emigrados, contribuiu para que todas
elas, particularmente a Gafanha da Nazaré, atingissem um progresso
extraordinário.
Nesta freguesia, que é hoje uma vila
em constante desenvolvimento e sede de importantes e valiosas
empresas de navegação e pesca, encontra-se situado o porto
bacalhoeiro, onde, no regresso das longas viagens, se encontram
ancorados dezenas de arrastões, que dão emprego a muitas centenas de
pescadores, não só de Ílhavo e das Gafanhas, mas também de muitas
outras terras do litoral.
A fim de trabalhar nas secas do
bacalhau, deslocaram-se dos concelhos mais pobres do Nordeste
Transmontano, do Alto Douro e das Beiras centenas de famílias, que
aqui se radicaram, melhorando bastante o seu nível de vida e
contribuindo para que a população aumentasse de uma forma
considerável.
DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL
Além da antiga e aristocrática
fábrica da Vista Alegre, conhecida em todo o país e até no
estrangeiro, pela sua magnífica louça de porcelana e pelas finas e
belas peças artísticas, tão admiradas e cobiçadas por toda a gente e
que, na maior parte das vezes, são escolhidas para presentear as
figuras gradas e representativas, que visitam a Nação Portuguesa, um
grande surto industrial se tem feito sentir, desde há uns dez ou
quinze anos.
A cerâmica – principalmente a
fabricação de azulejos e mosaicos – a preparação de barros, a
indústria química e os plásticos, a serração e carpintaria, a
metalurgia, a pesca, a secagem do bacalhau, as conservas de peixe, a
refrigeração e conservação do pescado e de outros produtos, além da
construção naval, são algumas das principais indústrias do Concelho
de Ílhavo, as quais empregam para cima de treze mil operários.
Praia da Barra (Ílhavo) – Trecho da Ria.
MEIO RURAL – EXPLORAÇÃO ÁGRO-PECUÁRIA
Além das férteis planícies, que já
citei, da Nazaré, da Encarnação e do Carmo, também as Gafanhas
d'Aquém e da Boavista, da freguesia de Ílhavo, são bastante
produtivas, pois todo o seu solo, que é ubérrimo, se encontra muito
bem aproveitado, não ficando nada a dever aos restantes lugares do
interior da mesma freguesia, tanto a Norte como a Sul e a Nascente,
onde se produz uma exploração agrícola intensiva, em regime de
pequena propriedade.
Não é pois de admirar que deste
concelho se exportem, todos os anos, avultadas quantidades de
batata, de feijão e de ervilha, para os grandes centros de consumo e
que, devido às boas pastagens, muito do leite aqui produzido, se
destine ao abastecimento da capital.
INSTRUÇÃO E CULTURA
Na sede do concelho, praticamente
não existem analfabetos, uma vez que o seu número é bastante
reduzido e contam-se às centenas os indivíduos habilitado
/ 43 / com cursos médios,
superiores e universitários, podendo mesmo afirmar-se que Ílhavo é a
freguesia do País com maior percentagem de pessoas habilitadas com
cursos superiores.
De resto, todo o concelho está
coberto com uma rede de Escolas Primárias – oitenta salas de aula –
onde recebem ensino elementar cerca de três mil crianças, possuindo
também duas Escolas Preparatórias e um Posto de Telescola e ainda
duas Escolas Secundárias, as quais, actualmente, vão satisfazendo as
necessidades.
Do mesmo modo, a Educação
Pré-Escolar, embora não abranja ainda todas as freguesias, é já
ministrada em cinco Infantários e Jardins Escolas e ainda em três
centros da A. T. L. – Actividades dos tempos livres – estando nesta
altura, em construção, mais dois grandes imóveis destinados ao mesmo
fim, sendo um deles para a educação de deficientes.
Ílhavo – Trecho da ria em frente à fábrica da Vista Alegre.
ASSISTÊNCIA À INFÂNCIA E À TERCEIRA IDADE
Além dos infantários, que já
mencionei, duas outras fundações se ocupam da assistência à Infância
e à Terceira Idade, em regime de Internato.
São elas a Casa da Criança, onde
estão albergadas, sem que nada lhes falte, muitas dezenas de meninas
e meninos e o Lar de S. José, um belo edifício rodeado de jardins,
construído propositadamente para o apoio aos idosos e que tem
capacidade para o internamento de sessenta pessoas.
TURISMO
Podemos afirmar, sem exagero, que
Deus dotou de beleza invulgar a região, onde se encontra situado o
concelho de Ílhavo.
Formando uma espécie de península,
confina a Norte e a Nascente com o concelho de Aveiro e a Sul com o
de Vagos, do qual está separado pela ponte de Água-Fria, que
atravessa o rio Boco e de onde se pode desfrutar um panorama
deslumbrante.
A parte ocidental do concelho é
cortado por diversos braços da Ria de Aveiro, com os seus bucólicos
e sedutores canais e esteiros, sendo necessárias sete pontes para
passar de uns locais para outros, o que, como é sabido, lhe favorece
extraordinariamente os atractivos turísticos.
Não é, pois, de estranhar que os
antigos tenham posto a algumas das suas povoações nomes tão
sugestivos como «Lugar da Vista Alegre» e «Gafanha da Boavista» e à
parte mais elevada da Costa Nova do Prado a designação de
«Belavista», por dali se poder observar um dos trechos mais
fascinantes da extensa laguna.
Esta bacia – espécie de estuário do
Canal de Mira – é limitada a Poente, pela marginal da praia, com as
suas típicas e encantadoras casinhas, pintadas às riscas de várias
cores – os palheiros – e, a Nascente, por extensas zonas de verdura,
no meio das quais se divisam as torres de três igrejas, várias
vivendas e outras edificações muito branquinhas, tendo por fundo uma
frondosa floresta de altos pinheiros, por cima dos quais se avistam,
ao longe, os contrafortes da serra, cobertos de luxuriante
vegetação.
Em horas de preia-mar, nas suas
águas profundas e muito verdes, onde, por vezes, se realizam
animadas regatas ou renhidos concursos de natação, podem ver-se
airosas e possantes lanchas e características bateiras de pesca,
bastante coloridas, devido às pinturas alegres dos cascos e às
garridas bóias das suas redes e também interessantes barquinhos e
pranchas de recreio «windsurf», cujas velas, de várias cores, lhes
emprestam um fascínio extraordinário.
Na parte Oeste, entre o casario e o
oceano, encontra-se um extenso e largo areal, onde cabem à vontade
muitos milhares de pessoas e cuja areia, muito branca e fina,
convida ao repouso e aos salutares banhes de sol.
Para evitar que o mar continuasse a
invadir e a comer esse atraente areal, há cerca de doze anos foram
executadas as necessárias obras de defesa da costa.
Entre os vários esporões surgiram,
então, diversas praias, pouco profundas, de águas límpidas e
transparentes, onde quebram ondas, não muito altas, nas quais
apetece mergulhar e praticar o excitante desporto do deslizar sobre
pranchas (surf).
Esta praia, a Costa Nova do Prado,
onde, presentemente, tanto na marginal como na duna, estão a ser
executadas obras de grande vulto, mediante um bem delineado plano de
urbanização, está, por assim dizer, ligada à Praia da Barra e para
elas se dirigem todos os dias, durante a época balnear, algumas
centenas de banhistas, através de uma alta, comprida e bem lançada
ponte, que atravessa a Ria e serve também de miradouro aos muitos
turistas nacionais e estrangeiros, que procuram a região de Aveiro
para seu devaneio.
Depois que, em 1968, a Câmara
Municipal de Ílhavo mandou construir, numa zona bastante arborizada,
um belo parque dotado dos requisitos necessários à prática do
campismo, a Praia da Barra experimentou um incremento fora do
vulgar, mercê da iniciativa de uma empresa que, submetendo-se a um
Plano de Urbanização adequado, fornecido pelo Município, começou por
abrir e asfaltar alguns quilómetros de estradas e ruas.
Nessas ruas, principalmente nas que
cercam o referido parque de campismo e na que margina a Ria,
surgiram, então, como cogumelos, muitas dezenas de belas
/ 44 / e confortáveis
vivendas, mandadas edificar por pessoas que ali foram atraídas, não
apenas pela beleza da zona, mas ainda pelas suas praias, mansinhas e
arenosas, e também pelos altos e compridos paredões da entrada do
porto, onde, em agradáveis passeios, as pessoas podem assistir à
entrada e saída de traineiras, arrastões e navios mercantes,
nacionais e estrangeiros, bem como às caprichosas evoluções das
velozes lanchinhas de recreio, o que regala os olhos e delicia o
espírito.
De cima desses paredões, que,
durante a noite são iluminados pela luz forte e intensa do altaneiro
Farol, dezenas de pescadores entretêm-se no aliciante desporto da
pesca à linha, apanhando, por vezes, belos exemplares de robalos, de
solhas, de safios e até de corvinas.
Estes atractivos têm favorecido o
constante e rápido engrandecimento da Barra, onde se rasgaram largas
avenidas, que se estão a encher de prédios de vários andares, os
quais servem para alojar, durante todo o ano, muitas famílias, cujos
membros exercem a sua actividade profissional em Aveiro ou nos
concelhos limítrofes.
Outra zona de grande interesse
turístico, pela sua situação privilegiada, em frente a uma grande
bacia, onde foi implantado o triângulo regulador das águas da Ria e
do mar, e de onde partem as lanchas de passagem para S. Jacinto, é a
povoação do Forte.
Esta designação é devida ao facto de
ali, nessa ilha, existir uma antiga fortaleza, assente na água, de
cima da qual, em tempos recuados, por meio de bandeiras, se
transmitiam os sinais indicadores da barra, aos navios que, de velas
enfunadas, demandavam o Porto de Aveiro.
Perto desta fortaleza, encontra-se
um enorme e deleitoso jardim, ladeado de palmeiras e banhado pelas
mansas águas da Cambeia e do Canal de Oudinot, no qual, pela
amenidade do clima, muitos forasteiros se deliciam, descansando das
fadigas, apreciando a bonita paisagem ou saboreando apetitosos
farnéis, em recintos apropriados para esse fim.
Mas, além das praias, do parque de
campismo e de todas as belezas paisagísticas, que acabo de
mencionar, Ílhavo ainda se orgulha de possuir dois belos e
magníficos museus: – O MUSEU MARÍTIMO E REGIONAL DE Ílhavo – e o –
MUSEU HISTÓRICO DA VISTA ALEGRE – e também algumas Igrejas e Capelas
dignas de serem visitadas, das quais destaco a de Nossa Senhora da
Penha de França, por ser considerada Monumento Nacional.
Ílhavo – Capela da Vista Alegre (Monumento Nacional).
No MUSEU MARÍTIMO E REGIONAL DE
Ílhavo, que, presentemente, se encontra instalado num majestoso
edifício dotado dos mais modernos requisitos museológicos, além de
interessantes pinturas, gravuras e esculturas alusivas ao mar, o
visitante poderá admirar um conjunto de modelos de embarcações de
todos os tipos e latitudes, as quais documentam, à maravilha, a
história das navegações de todos os tempos e ainda alguns valiosos e
raros instrumentos de navegação náutica orientada,
/ 45 / como o astrolábio, a
cábria e o sextante, bem como a melhor colecção de bússolas e
agulhas de marear, existentes em Portugal.
Numa sala apropriada para exposição
da flora e da fauna marítima, encontrará, como principal centro de
interesse, uma valiosa colecção de conchas marinhas, devidamente
classificadas, as quais, pela sua beleza, causam a admiração de toda
a gente.
E, embora não pretenda descrever
todo o magnífico recheio do Museu, não posso deixar de falar nas
actividades da Ria, que foram ou ainda são exercidas por homens
deste concelho e nos barcos, a bordo dos quais, os ílhavos, com
destemor e galhardia, tentaram vencer os oceanos e onde muitos
ficaram sepultados.
Das actividades da Ria, saliento as
marinhas de sal, com todas as alfaias, as armações e saltadoiros de
tainhas e as miniaturas de todos os tipos de embarcações, desde o
saleiro e o mercantel até à bateira e à caçadeira, com realce
especial para o elegante barco moliceiro.
Nos trabalhos do mar, a atenção do
visitante é atraída para os bonitos modelos de embarcações de pesca,
que vão desde o famoso barco do mar, em forma de meia-lua, das artes
da xávega, até ao mais moderno e sofisticado arrastão, passando
pelos airosos lugres bacalhoeiros, aparelhados na perfeição, com
todo o seu massa me e majestoso velame.
No convés destes lindos veleiros
podem ver-se rimas de dóris, alguns deles equipados com toda a
palamenta (1) e, dentro
dos quais, os arrojados e destemidos pescadores – cada um no seu –
passavam dias inteiros, trabalhando na árdua e perigosa faina da
pesca, nesses longínquos, brumosos e gelados mares do fim do mundo.
No que respeita ao – MUSEU HISTÓRICO
DA VISTA ALEGRE – apenas direi que é um repositório de arte e beleza
que encanta todas as pessoas que o visitam.
Ali se encontram expostas, em ricas
vitrinas, muitas e variadas peças decorativas de uso doméstico, bem
como maravilhosas obras de escultura e modelação, algumas delas
exemplares únicos, de valor incalculável, as quais foram executadas
durante o período que vai desde a fundação da fábrica, em 1824,
quando ainda se produziam objectos em vidro, até aos nossos dias.
A arte e elegância das peças
expostas, tão finas, tão bonitas e com pinturas tão delicadas, faz
com que os visitantes – geralmente individualidades de elevada
posição social – permanecem longo tempo a contemplá-las e saiam dali
extasiados.
E assim, em traços gerais, foram
focadas as principais características do concelho de Ílhavo, cujo
povo, de índole pacífica, é generoso, trabalhador e ordeiro.
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(1) – Palamenta: apetrechos de
bordo. |