Um pitoresco lago da Casa do Marinheiro,
em Avanca.
DOIS DEDOS DE PRÓLOGO
Nasceu este opúsculo do desejo de
colaborar no centenário do nascimento de Egas Moniz. Não valeria a
pena escrever sobre o caso, se Egas Moniz não tivesse sido preclara
figura do seu tempo. Precisamos de – num momento em que vai
predominando o homem-massa –, trazer ao de cima, e à ponderação
consciente de todos, as figuras excepcionais, paradigmáticas pelo
seu saber, pelo seu carácter, pela sua originalidade construtiva.
Sem minorias selectas, o povo fica
automaticamente diminuído. São as minorias selectas que criam a
ciência, a arte, a grande técnica. A ausência dos melhores, dos
aristocratas, no sentido helénico da palavra – que não no de «sangue
azul», credo! – dá
motivo a que as massas se
massifiquem ou plebeízem cada vez mais. Mal vai à civilização,
quando, no mundo, se instala e instaura a ditadura das massas!
Todos os fracassos da história
resultam do ódio à fina-flor, às minorias egrégias, aos imperativos
de selecção.
A maior parte das ideias deste
opúsculo, que nasceu do pedido de uma palestra em que o Clube de
Estarreja (Julho de 1974) quis honrar a memória de Egas Moniz, foi
escrita com o intuito de servir. Um homem, um regime, uma confraria?
Nem um homem, nem um regime, nem uma confraria, apenas um programa
de dignificação humana. Se acaso, conseguimos servir bem esse
programa, that is another story como diria Kipling.
Não há belfurinheiro que não gabe as
suas agulhas e alfinetes. Quero, porém, fazer excepção à regra. O
que aí vai foi o que se pôde arranjar. Leve o leitor em conta, e por
junto, a boa vontade do autor.
Prometemos dois dedos de prólogo.
Cumprimos. Passe o leitor adiante – se tanto lhe apetecer.
/ 20 /
A DITADURA DE JOÃO FRANCO
...Houve, então, quem pretendesse
fazer destrinça entre ditadura e administração em ditadura.
João Franco fazia essa destrinça,
mas era contraditório ao fazê-la, porquanto, nos seus tempos de
oposição ao governo constituído, se declarara abertamente contra
esse sistema de governar.
A verdade, porém, é que, tão
depressa subia ao poder, renegava tudo que, de véspera, dissera
(1). Apostasia? João Franco, como o pretor antigo, não curava de
coisas mínimas, e coisa mínima era, para ele, o dar o dito por não
dito, adorando no dia seguinte, o que, de véspera, anatematizava, e
anatematizando, agora, o que, no dia anterior, adorara...
Estranhou-se que o homem vindo dum
partido de rótulo liberal atirasse com a liberdade às urtigas, e
dissolvesse o Parlamento, sem que existisse conflito entre o
Parlamento e o Governo.
Essa dissolução foi considerada como
golpe de Estado. E logo se iniciou a guerra contra o ditador.
A lei de imprensa então saída quis
amordaçar todas as críticas desfavoráveis à ditadura. Meio mundo foi
julgado em tribunal, por ter infringido as disposições dessa
drástica lei. Foram uns punidos, foram outros absolvidos. Como quer
que fosse, a lei criou clima de manifesta hostilidade à ditadura.
Crepitaram por toda a parte os comícios de propaganda republicana.
Os dissidentes passaram a constituir chusma. Tudo deixava prever que
a monarquia estava por um triz. O Rei dava o seu beneplácito a João
Franco. Sem o saber (?), estava assinando a sua própria sentença de
morte, sentença que iria verificar-se a breve prazo.
A maioria do Conselho de Estado quis
expor a D. Carlos a necessidade urgente de se voltar ao respeito
pela Carta Constitucional. Não foi atendida. O Rei negou-se a
dar-lhe audiência. Seguiram-se os pares e os deputados e outro tanto
aconteceu. Tudo ia convergindo para o pior do pior. Tremendas as
profecias então feitas quanto à duração da monarquia e à sorte do
Rei. Do Rei que, em carta a Hintze Ribeiro, de 18 de Maio de 1906,
dissera, profeticamente: «O Governo só poderia conservar-se pelo
terror, e mal está para aqueles que só desta maneira se podem
sustentar.»
Pois D. Carlos, que tal dissera,
caía, transcorrido pouco mais de um ano, na imprudência de conceder
a João Franco poderes ditatoriais, que se traduziam numa suspensão
de garantias.
Uma das decisões da ditadura
franquista que maior celeuma levantou foi a lista civil da família
real, que iria ser aumentada para além dos 525 contos que figuravam
na lei. Fazia-se o confronto da situação do Rei com as dos
Presidentes da República em França, nos Estados Unidos, e na Suíça.
Em França, o Presidente recebia 216 contos, metade dos quais para
despesas de representação, viagens, etc. Nos Estados Unidos, o
Presidente recebia, por junto, 22 contos anuais. E na Suíça,
2700$00. Entendia o ditador que a família real recebendo aquela
maquia ainda recebia pouco. A Nação não pôde levar à paciência
aquela atitude perdulária e afrontosa para a precária situação das
classes trabalhadoras. Com 525 contos sustentavam-se decentemente –
assim se dizia – 1 000 famílias
(2).
O clima emocional criado pela
ditadura nós o entrevemos por certo artigo do jornal “O Dia”,
que assim terminava:
«Quer-se cavar um abismo profundo
entre as instituições e os que os defendem?
Quer-se arranjar para o campo
republicano milhares de regeneradores, de progressistas, de
dissidentes, e de outros cidadãos que não têm compromissos
partidários? Pois bem!
Façam-no!
Lembrem-se, porém, que para trás não
se volta! Agora resolvam!
Eis porque, nesta hora soleníssima e
de luto, daqui perguntamos aos altos poderes do Estado:
Quem vive?»
E a resposta que andava no ar era a
de que viveria o povo, disposto a dar o golpe de misericórdia na
monarquia.
O órgão oficioso da ditadura
escrevia:
«A situação do país é tudo quanto há
de mais tranquilo.»
João Franco mentia. A situação era a
pior. Tinha-se a impressão de que se estava sobre um vulcão prestes
a explodir.
Os jornais suspensos constituíam
chusma, todos incursos nos dois primeiros artigos da Lei de Imprensa
de 21 de Junho de 1907:
«Artigo 1.º – É proibida a
circulação, a exposição ou qualquer outra forma de publicidade, dos
escritos, desenhos ou impressos atentatórios da ordem pública.
«Artigo 2.º – Os governadores civis
deverão suspender a publicação dos periódicos que se acharem nas
disposições do artigo anterior».
(3)
A imprensa hostil à ditadura
afirmava não haver outra lei que não fosse a vontade do ditador.
Nenhumas garantias individuais. Opressão sistemática. O decreto de
21 de Junho pusera termo à liberdade de Imprensa.
Dizia-se: «Qualquer Governador
Civil, estúpido ou mau, pode suspender os jornais do seu distrito,
até 3 meses (§ único do art.º 2.º sem justificação alguma, e com o
risível recurso para o Governo, que há-de sempre aprovar o
procedimento do seu delegado de
/ 21 / confiança, que neste
caso não faz mais do que cumprir ordens superiores».
João Franco tinha a antipatia da
Nação, que se sentia vexada com os seus decretos ditatoriais. E a
antipatia que ele provocava tornava-se extensiva ao próprio Rei. O
Daily Express comentava: «A situação do Senhor João Franco
torna-se, neste momento, impossível. É preciso evitar que a própria
situação do Rei D. Carlos se agrave!». Comentário da imprensa hostil
à ditadura: «Não nos incomoda que a situação do Rei D. Carlos se
agrave. Desejamos até que ela se agrave tanto que o obrigue a ir
gozar para o exílio o produto dos adiantamentos ilegais por ele e
por sua família recebidos. Segundo o Sr. Presidente do Conselho
declarou, na câmara dos deputados em 12 de Novembro de 1906».
A data de 14 de Julho de 1907 era
aproveitada pela imprensa republicana para louvar a efeméride da
tomada da Bastilha e para se fazer o elogio da Revolução Francesa.
A Bastilha era o símbolo da
liberdade oprimida. E vá os jornais hostis à ditadura de escreverem:
«A Grande Revolução, cujo início teve lugar na data que hoje
celebramos, produziu um duplo efeito no mundo: entusiasmo nos povos
sedentos de liberdade, e nos espíritos superiores, como Kant, Fichte,
Schiller e Goethe, que compreendiam a justiça das suas
reivindicações; susto e indignação nos governos constituídos, que
nos progressos da Revolução viam a sua própria ruína.
|
Houve crueldades inúteis?
Derramou-se muito sangue inocente? De certo, não contestamos. Mas os
abalos sociais são como as tempestades que, ao passo que purificam a
atmosfera, derribam tanto as boas árvores como as más. Condenar ou
louvar é fácil; explicar a necessidade dum facto que, embora
manchado de sangue, trouxe ao mundo uma nova época civilizadora, só
a história de muitas centenas de séculos de tiranias o poderá
fazer».
Noticiavam os jornais em Julho de
1907 que o Governo para satisfazer as ordens do Rei, iria fazer
eleições em Novembro, para que as Cortes abrissem em 2 de Janeiro de
1908.
|
Inauguração do Monumento ao
Professor Doutor Egas Moniz, em Avanca. |
Os dissidentes não acreditavam que
as eleições fossem feitas com isenção. João Franco não merecia
sombra de confiança. Nessas eleições haveria, necessariamente,
fraude.
Não se levou a bem que o Supremo
Tribunal de Justiça reconhecesse como legais os decretos
ditatoriais. E, para mais, que os tivesse reconhecido por
unanimidade!
Lamentava-se que o Supremo Tribunal
de Justiça perdesse uma bela ocasião de prestar óptimo serviço ao
país, fazendo respeitar a sua Constituição.
A Associação dos Advogados de
Lisboa, a 17 de Junho de 1907, reunia para lhe ser apresentada uma
moção de protesto contra a atitude do Supremo Tribunal de Justiça. A
moção era assinada por José de Castro, José Maria Vilhena Barbosa de
Magalhães e António Macieira.
Por 14 votos contra 13 foi rejeitada
a proposta.
Comentavam os jornais simpatizantes
com a moção:
«O voto de desempate foi do sr.
conselheiro Beirão, o grande liberalão, que está fazendo bonita
figura, não há dúvida.
Os advogados franquistas fizeram o
maior obstrucionismo, o que conseguiram, pois que 4 dos que eram
favoráveis à discussão da proposta apresentada pelo Sr. Dr. António
Macieira retiraram antes de concluída a discussão, de que resultou a
vitória do Governo, devido ao Sr. Beirão, com cuja atitude os
defensores da proposta se enganaram.
Os treze sócios que votaram a favor
da proposta e os quatro que se tinham ausentado pediram a demissão
de sócios e vão publicar nos jornais protestos e explicações.
Procedem dignamente.»
Assim se pronunciava a imprensa
republicana que ao mesmo tempo dava conta de uma manifestação de
pública simpatia a Bernardino Machado, que simbolizava, aos olhos da
Nação republicana, o «grande ideal de Verdade e de Justiça – a
República».
O propósito era fazer um cortejo
cívico em honra de Bernardino Machado, mas o Governo, alerta,
proibiu o projectado cortejo.
A homenagem foi, pois, íntima.
Íntima, mas apoteótica. O 28 de Julho de 1907, em que essa homenagem
se fez, deu brado. Os jornais antiditatoriais comentavam:
«Quanto daria o Sr. João Franco para
que lhe fosse feita uma manifestação tão espontânea e tão sincera,
como a que recebeu o Dr. Bernardino Machado!
Quanto daria o próprio monarca para
que as manifestações espontâneas que lhe preparam, se parecessem
sequer com aquela que ao Chefe republicano fez o povo de Lisboa!
Nas manifestações a uns e outros há
grande diferença. É que o povo sabe fazer justiça. O rei e o
presidente do conselho representam a opressão, enquanto que o Dr.
Bernardino Machado é o apóstolo da redenção por que todos ansiamos,
a libertação da pátria pela República».
As economias franquistas eram
ridicularizadas pelos adversários da ditadura. De 30 de Junho de
1906 a 31 de Julho de 1907, a dívida flutuante aumentava de 1868
contos. Os jornais hostis a João Franco escreviam: «De suborno tem
sido a política e a administração do franquismo que, apresentando-se
como
/ 23 / Messias Salvador das
finanças portuguesas, as está comprometendo gravemente com um
desenfreado aumento de despesas para arranjar clientela.
Apesar dos artigos de encomenda a
exaltar o governo na imprensa estrangeira, os fundos públicos
descem.
E é nisto que consta a tão reclamada
administração do franquismo.
Um verdadeiro charlatanismo.»
Em 15 de Julho de 1907, o Diário
de Notícias publicava o seguinte telegrama de Paris,
reproduzindo palavras de D. Carlos, numa entrevista concedida a
Galtier, redactor do jornal «Temps»:
«Poderá verificar, no decurso do seu
inquérito, que tudo está tranquilo, tanto em Lisboa, como em todo o
reino.
Só os políticos se agitam, o que se
lhes não pode levar a mal, debaixo do seu ponto de vista,
acrescentou o Rei sorrindo.
Discute-se muito e faz-se muito
barulho, talqualmente como nas câmaras, nos últimos tempos da
legislatura, situação que se tornava impossível e à qual, por isso,
era necessário pôr cobro, pois, de contrário, não sei o que de tal
confusão resultaria.
Dei, então, a João Franco, os meios
de governar.
Falou-se da ditadura; mas o que é
certo é que outros partidos, e que são os que mais gritam, me haviam
também pedido ditadura.
Eu exigia, porém, garantias de
carácter, e tinha necessidade de uma vontade sem fraqueza, para que
as minhas ideias fossem imediatamente postas em prática.
João Franco foi o homem que eu
desejava, e sobre o qual lançara já, há muito tempo, as minhas
vistas. Por isso o chamei no momento oportuno.
A sua força consiste em que tem fé
em si próprio e na sua estrela. É um auxiliar precioso e, nas horas
de crise, a sua inteligência iguala a sua vontade. É mesmo mais
inteligente do que muita gente julga.
Estamos plenamente de acordo;
trabalhamos juntos e, ao contrário das intenções que me atribuem,
quero mantê-lo, porque estou muito contente com ele.
Isto vai muito bem; e assim durará,
porque é preciso que dure, para interesse do país.
Faremos eleições no momento em que o
julgarmos conveniente (notre moment) sem obedecer a
intimações, nem a emprazamentos e, seguramente, teremos maioria,
porque o país aprovará a política de João Franco.
Restabeleceremos o equilíbrio
orçamental, e extinguiremos o deficit.
Em todos os países, para se fazer
uma revolução, é preciso dispor do exército.
Ora, o exército português, submisso
à Constituição, é fiel ao rei, e ficará lealmente a meu lado.
A maior parte dos oficiais são meus
camaradas; servi com eles, conhecem-me, e não tenho a menor dúvida
sobre a sua dedicação.
Tudo o que empreendo, ou faço, hoje,
é no interesse do país.
Por certo – ajuntou o monarca,
sorrindo de novo – gostaria que me deixassem sossegado; mas persisto
no meu posto.
Conheço bem, há já dezoito anos, o
meu tabuleiro eleitoral.
Portugal tem necessidade de sossego.
Trabalha e pede que a ordem e a paz
sejam garantidas.
Disso me asseguro, e vejo que, por
toda a parte, o meu povo é comigo e que, quando fizermos as
eleições, teremos forte maioria.
Então será restabelecida a
normalidade.
O remédio adoptado foi
extraordinário, porque a situação era extraordinária também.
Quando, porém, já não tiver razão de
ser a sua aplicação, nem por um instante esquecerei os meus deveres
para com a minha coroa e para com o meu país».
A opinião pública viu na atitude de
D. Carlos uma violação da Carta Constitucional que ele jurara e
manter e cumprir. Entendia a opinião que se entrara em pleno
absolutismo.
Tudo o que João Franco estava
fazendo como ditador tinha o beneplácito do rei.
O Rei falou em garantias de
carácter. Os outros partidos que lhe pediam a ditadura não lhe
ofereciam essas garantias. Se assim era, o rei incompatibilizava-se
com os partidos da rotação. Em campo ficava só João Franco. Esse e
só esse, ao que parece, lhe oferecia as tais «garantia; de
carácter»...
A Luta, jornal republicano
dava conta das despesas feitas nos palácios reais, desde 1903 a
1906, e, tudo especificado, e somadinho, atirava para a cifra dos
2:329:677$603 réis.
Vá de comentar: com essa soma (então
astronómica) quantas escolas em boas condições se não fariam? Pelo
menos 500.
A entrevista dada ao «Temps» pelo
rei provocou que monárquicos de alta categoria – Augusto José da
Cunha, Braamcamp Freire, Luís Ferreira dos Santos – se alistassem no
partido republicano. Absolutismo não o queriam, nem pintado!
A lei da imprensa em vigor era lei
de funil – larga para o franquismo, estreita para os da oposição. O
Diário Ilustrado (franquista) podia dizer o que lhe
aprouvesse. A imprensa da oposição nem sequer podia discutir a
entrevista concedida a Galtier.
/ 24 /
Vinha ao de cima a questão operária.
Proclamava-se que os operários tinham a sua palavra política a
dizer. Conspirava-se contra o excesso de funcionários públicos, que
absorvia a maior parte das receitas orçamentais. Esterilizavam-se as
melhores aptidões. Dizia-se:
«Não basta só que na escola primária
se ensine o ler: é preciso também que às novas gerações se ensine a
religião do trabalho, cujo culto, na Suíça, é tão venerado e
respeitado, que, de 2842102 habitantes da população, apenas 110841,
ou seja 3,9 % não tem ocupação, isto é, apenas não trabalham,
naquele país, as crianças, os velhos e os inválidos.
É por isso que essa República tem
uma educação pública completa, uma indústria muito florescente, uma
rede ferroviária como a das grandes nações».
Confiava-se em que a salvação de
Portugal estaria na República. Era preciso dar o «bota-fora!» à
Monarquia.
No Brasil, os jornais pertencentes à
colónia portuguesa aí residente faziam as piores referências à
ditadura. É ouvir:
«Pode a ditadura fazer quanto quiser
e lhe aprouver, mas o que nunca poderá é conseguir a confiança do
povo, que a há-de esmagar e esfacelar, como esmagar e esfacelar
há-de quem a deixa cometer tantos atropelos à Constituição.
Continuam a bulir no rastilho, e
vê-lo-ão explodir, quando menos o contarem, não lhes bastando depois
as mensagens congratulatórias de meia dúzia de estouvados e
ignorantes (as talassas), que aqui se querem impor com chefes da
colónia, que tem, toda ela, mais brio e dignidade nas plantas dos
pés, que esses chefes na cara».
EGAS MONIZ
CONTRA A DITADURA DE JOÃO FRANCO
No tempo de D. Carlos, os políticos
que governassem, em vez de se governarem, que servissem, em vez de
se servirem, eram mais raros que as esmeraldas azuis, e daí o
monarca dizer:
«Ah! se me fosse possível encontrar
o homem íntegro, e patriota capaz de preferir o interesse e a glória
de Portugal à sua própria fortuna e sobretudo à fortuna dos seus
correligionários políticos, com que reconhecimento, com que alegria
eu o apoiaria com todas as minhas forças e lhe daria todos os
poderes que me é lícito delegar-lhe para empreender as reformas que
ambicione, que deseje tanto como o povo português! Mas ainda não
encontrei esse homem!...»
Delegou em João Franco que abusou do
poder, aliás com a cumplicidade do rei. Resultado: foi este a
vítima.
Em 15 de Junho de 1908, discursara
Egas Moniz na Câmara dos Deputados.
(4) Esse discurso era bem
o de um homem liberal. Nele atacava a ditadura de João Franco que
primou por actos de uma revolução contra a ditadura, mas que poderia
atingir o regime.
«Eu por mim (dizia Egas Moniz)
entendia que, nesse momento, a sua queda era a única solução. E
desejei-a».
E acrescenta:
«Esgotados todos os meios legais, só
restava a revolução. Era um dever cívico a cumprir. Para que se
realizasse, empreguei, por minha parte, os meus melhores, embora
fracos, esforços, nessa causa legítima de defesa contra a violência
e contra a corrupção, resolvendo sacrificar de bom grado o meu bem
estar, a minha situação. social, que só ao trabalho devo, e até a
própria vida.
E nunca pratiquei acto algum que
mais satisfizesse e mais me levantasse no Tribunal íntimo da minha
consciência do que essa atitude revolucionária, que, como liberal e
como português, entendi dever tomar!».
Tudo. Egas Moniz fez para que a
ditadura de João Franco (e, afinal, do próprio Rei D. Carlos, que
lhe deu o seu apoio) pusesse termo às suas ilegalidades. Não o
conseguiu. E foi isso que o levou a bandear-se para a causa da
revolução.
Os monárquicos entendiam que D.
Carlos devia abdicar.
«Mas essa abdicação, como resultado
de uma revolução, única maneira de a conseguir, era inexequível.
Pelo menos – diz Egas Moniz – eu assim o julgava. É que, para mim,
os filhos dos Reis são tão honestos como os filhos do povo, e nunca
pude admitir que o Príncipe D. Luís Filipe, ou o actual Rei D.
Manuel (palavras de 15 de Junho de 1908), se
conformassem em deixar adaptar às
suas frontes juvenis a Coroa violentamente arrebatada à cabeça de
seu pai, quando ele seguisse, às ordens dos revolucionários, o
caminho do exílio.
Não. Essa hipótese nunca a aceitei,
porque repugnava aos meus sentimentos e ia de encontro à opinião que
formava desses rapazes: um que a morte violentamente roubou às
esperanças de muitos, e outro que a desgraça dos seus fez Rei de
Portugal.» (5)
São ainda do discurso de Egas Moniz
no Parlamento, na sessão de 15 de Junho de 1908, as considerações
seguintes:
«A noite de 28 de Janeiro de (1908)
fez abortar o movimento, que havia fatalmente de produzir-se, apesar
das prisões feitas, se um acontecimento inteiramente imprevisto não
viesse transformar, por completo, a vida política portuguesa.
Refiro-me ao atentado de 1 de
Fevereiro (de 1908).
/ 25 /
Com ele nada tem, nem poderia ter, o
movimento revolucionário.
Foi um fenómeno esporádico e
imprevisto que, mesmo no ardor da luta revolucionária, seria
condenável.
Basta recordar que o movimento
revolucionário se produziu na noite de 28 de Janeiro, em que dei
entrada no cárcere dos Loios, quando a Família Real estava longe de
Lisboa, e se dizia que só tarde regressaria a Portugal.
Como se produziu o atentado? Todos
sabem. Na noite de 31 de Janeiro, um ministro, escoltado pela força
armada, trazia para Lisboa a condenação à morte lenta dos presos
políticos, e no dia imediato o Presidente do Conselho atirava com a
Família Real para a rua, em carro descoberto, provocadoramente, com
o fim único de obter um novo argumento para poder demonstrar que a
opinião pública estava do seu lado e talvez pedir à sua sombra a
violência dos fuzilamentos, que, segundo se disse, chegaram a ser
discutidos em Conselho de Ministros.
A carruagem real apareceu assim
desprotegida e abandonada, ao contrário do trem do ditador, que
mereceu uma luzida escolta municipal. É que naquela iam vidas que
podiam jogar-se, e neste vinha o celebrado decreto de 31, que era
necessário salvar!
Foi assim que no Terreiro do Paço
dois populares praticaram, a tiros de carabina e de revólver, o
atentado de que resultou a morte do Rei e do Príncipe Real.
E pode então apreciar-se o que valem
as dedicações dos validos dos Reis, que se servem da Coroa como
instrumento das suas ambições.»
Nessa altura do seu discurso,
perguntava Egas Moniz:
«Julgam que ali acorreram a mitigar
a dor e a auxiliar a Rainha D. Amélia, naquele dolorosíssimo transe,
os ministros que fizeram a política funesta da sua imensa desgraça?
Não. O chefe da ditadura ainda
surgiu, a medo, das bandas do Arsenal; os outros quedaram-se a dois
passos, resguardando-se nos seus ministérios. Sua Majestade a Rainha
deve ter aprendido muito nos longos e dolorosos minutos que ficou a
sós, ou quase a sós, no mais terrível lance da sua vida! Deve ter
feito justiça a esses que pareciam estar sempre prontos a morrer
pela causa monárquica e que, apesar de todos os seus protestos, não
se arriscaram sequer a cumprir um dever de humanidade, sem perigo e
sem sacrifício». (6)
Custa a acreditar, mas um jornal
espanhol disse que João Franco, antes da tragédia do Terreiro do
Paço, teria telegrafado ao Governo espanhol, a pedir-lhe que
mandasse tropas para a fronteira, de maneira a que o Governo
português pudesse tirar partido de atemorizar o povo com o fantasma
de uma intervenção estrangeira, no caso de haver alguma revolta em
Portugal.
Isto o disseram os jornais da época,
e deles é também a informação seguinte:
Depois da tragédia do Terreiro do
Paço, João Franco ainda pensou em continuar à frente do Governo.
Mesmo depois de demitido, por D.
Manuel, o ministério ditatorial, João Franco (tal o amor do poder!)
ainda persistia em fazer parte do novo gabinete. Foi repelido. Mas,
após isto, ainda ofereceu um correligionário, que foi igualmente
rejeitado.
*
* *
Proclamava-se, entretanto, a
República, e logo no seguimento do 5 de Outubro, publicado pelo
Governo Provisório o direito à greve, se cria um clima de
reivindicações em tudo semelhante ao que se tem vivido na sequência
imediata do 25 de Abril de 1974.
Os jornais republicanos escrevem
então:
«As greves das diferentes classes
operárias têm surgido por toda a parte como uma epidemia,
embaraçando a acção do Governo Provisório da República, assoberbado
com trabalhos importantes, como sucede sempre depois de uma
revolução».
E os mesmos jornais, deitando água
fria no clima emocional criado pelas greves, escrevem:
«Todos devemos contribuir para a
realização das justas aspirações do operariado.
Para a conquista dos seus direitos,
para melhorar a sua situação, mas sem precipitações que, a maior
parte das vezes, prejudicam as causas mais justas».
A história repete-se.
Volvem os anos da primeira República
– uma República tumultuosa.
Demos um salto ao ano de 1918, ano
do armistício da Primeira Guerra Mundial.
EGAS MONIZ DA O
RETRATO DE SIDÓNIO PAIS
Textualmente, disse Egas Moniz, no
Preâmbulo do seu livro Um Ano de Política: «Transitei durante
um ano exacto pela diplomacia portuguesa. Em 16 de Março de 1918
entreguei em Madrid, como Ministro Plenipotenciário, as minhas
credenciais a S. M. o Rei Alfonso XIII. Em 16 de Março de 1919
abandonei a Presidência da Delegação portuguesa à Conferência da
Paz».
/ 26 /
No referido Preâmbulo diz impender
sobre ele o dever de dizer aos seus conterrâneos a forma como usou
das demonstrações de confiança que lhe deram os governos do seu País
no desempenho de tão altos cargos. Assevera não o fazer por
exibicionismo, por não lhe pesar o defeito das exteriorizações
excessivas, «quase sempre ridículas, quando não são prejudiciais».
E acrescenta: «A política portuguesa
marcou uma étape bem diferenciada com a revolução de 5 de
Dezembro de 1918 e com a acção política do Dr. Sidónio Pais. Nela
influí, nela tive intervenção. Quero as responsabilidades que me
cabem, mas não desejo que me atribuam propósitos que não tive».
Egas Moniz serviu, politicamente,
com Sidónio Pais; mas nunca (por nunca!) perante este tomou atitudes
de acatamento incondicional.
(7) Reconheceu em Sidónio Pais
qualidades, mas dele discordou, muitas vezes, o que motivou algumas
discussões, nas quais essas discordâncias foram bem marcadas –
designadamente as relativas ao sistema presidencialista, que Sidónio
Pais quis concretizar na sua pessoa, enquanto esteve à frente do
Governo do País.
Seja Egas Moniz a depor sobre as
divergências que teve com Sidónio Pais e a acentuar, a par disso, as
qualidades que nele julgava descobrir:
«O Dr. Sidónio Pais era uma alta
individualidade. Digo-o com o maior desassombro.
Nem sempre estive de acordo com o
Chefe da revolução de Dezembro (1918). Em breve se verá em que
assentavam a nossa divergência e as discussões, por vezes quase
violentas, que com ele tive. Fui, entre aqueles que o seguiram, um
dos raros que ousavam discordar da sua orientação e fui, com
certeza, aquele que mais decididamente se manteve no seu posto, não
transigindo.
Mas, por isso mesmo, sobra-me
autoridade para dizer que o Sr. Dr. Sidónio Pais era um estadista no
verdadeiro sentido da palavra.
Até a sua figura o favorecia.
Tinha linha, como se dizia por toda
a parte. Sabia atrair com sobriedade de maneiras. E ao mesmo tempo
cultivava a mise-en-scene da sua situação. Até talvez a
exagerasse! Pelo menos assim o penso. Mas tinha nobreza de
sentimentos, tinha carácter, tinha decisão, tinha bondade!
Todas estas qualidades lhe têm sido
injustamente negadas; mas há uma que nunca lhe puseram em dúvida: a
sua valentia.
Nem os seus piores adversários lha
contestaram. Dentro do seu cérebro havia estigmas da Idade Média.
Tinha a ousadia cavalheiresca doutros tempos. Onde via o risco é que
se sentia bem.
Nunca recuou perante a ameaça.
Por isso o assassinaram, sem que ele
se desviasse do caminho onde lhe anunciavam o perigo.
Era alguém. Talvez em excesso
afectado; mas sempre correcto e delicado, atencioso. Porventura
muito protocolar; mas não esquecendo nenhum detalhe, prevendo as
coisas mais insignificantes, ligando o maior cuidado aos pequenos
nadas sociais com que, por vezes, se conquistam os homens difíceis.
(...) No fundo, embora o não
dissesse, julgava-se imprescindível, eivou-se mesmo daquele
messianismo de que têm enfermado muitos homens públicos portugueses.
(...) A sua obra não é grande no
campo da administração pública. Pecou, como pecam todos os nossos
estadistas, em abusar da ditadura e encher as colunas do Diário do
Governo de leis que, em geral, não eram boas, porque sobre elas não
recaía a crítica que é indispensável à melhoria da obra de um homem.
Mas a sua acção foi notável no campo
da ordem. À parte violências excessivas em prisões, por vezes não
justificadas e, o que é pior, muito prolongadas, contra o que sempre
protestei, e que não foram da sua responsabilidade directa, pois no
Porto chegou a soltar presos que eram maltratados, a sua acção em
defesa do princípio da autoridade foi verdadeiramente salutar. E sem
a defesa desse princípio não há governo que mereça o nome».
(8)
CARTA DE EGAS MONIZ A SIDÓNIO PAIS,
ADVERTINDO-O DOS PERIGOS DO PRESIDENCIALISMO
Em carta de 9 de Agosto de 1918,
Egas Moniz dizia a Sidónio Pais, aferrado ao seu presidencialismo de
feição ditatorial:
«Tenho a impressão, Senhor
Presidente, de que ou conseguimos uma vigorosa agremiação partidária
que sirva de base ao actual sistema político, ou a situação baqueará
a breve trecho. Não há prestígio que resista à desorganização das
forças amigas e estas, sem a acção disciplinada dum partido, não
passam do platonismo dos aplausos que mesmo assim irão pouco a pouco
diminuindo.
(...) Soou a hora de procurar
competências que auxiliem a obra tão brilhante iniciada em 5 de
Dezembro.
O Senhor Presidente e o Parlamento
têm, para obter esse fim, de caminhar de completo acordo. São dois
poderes autónomos, mas que, sobretudo entre nós, carecem de seguir
unidos e ligados nas mesmas intenções e propósitos.
Desculpe-me esta longa carta que, em
muitos dos seus aspectos, tenho exposto verbalmente a V. Ex.ª. Vivem
muitas vezes os Chefes de Estado separados
/ 27 / da verdadeira opinião
pública e a lisonja dos que os servem e um pouco a natural separação
das multidões que só observam de grande altura não deixam ver claro.
Não quero eu apresentar-me nem como impertinente, nem como querendo
alcançar foros de mais amigo. Sou-o sinceramente e como não tenho
ambições que vão além da minha cadeira de deputado, ouso vir fazer
estas considerações, a que V. Ex.ª dará o valor que entender».
(9)
Sidónio Pais teimava no seu
presidencialismo, que fazia equação com isolacionismo. Queria
monólogo. Monólogo e não diálogo, quando, afinal, quem governa
precisa de ser, essencialmente, um homem de diálogo. Há-de falar, e
deve escutar. De contrário dará a impressão de ditador enamorado da
sua pessoa, a coberto de todas as críticas, e supondo-se infalível
senhor de todas as soluções.
Sidónio Pais não respondeu à carta
de Egas Moniz.
As férias de Egas Moniz, em Portugal
decorreram sem acidente de maior, a não ser o de que começava a ser
atacado pelos jornais monárquicos, com o pretexto de que ele queria
uma aproximação com as esquerdas, o que lhe merece o comentário
seguinte:
«Afinal tudo se resumia em eu
desejar colocar os partidos radicais em condições de poderem
ascender ao poder, sem ser por meio de uma revolução.
Era o que eu preconizava então, e
hoje, se me ouvissem, diria às esquerdas que colocassem as direitas
em condições de poderem amanhã substituí-las na governação do País.
E se assim penso é porque julgo que se torna indispensável acabar
com o espírito de sectarismo que hoje (1919) continua a exibir-se da
mesma maneira.
|
|
Nunca tive o propósito de me unir
aos partidos extremistas e radicais pela razão simples de que penso
de maneira oposta. É que estou convencido de que em Portugal só uma
política moderada pode criar raízes fundas.
Mas sem nada prejudicar o meu ponto
de vista, eu queria que os partidos de oposição fossem considerados
como força a atender e tratados como adversários com quem não se
deseja transacções, mas a quem damos, no campo de actividade em que
agimos, um lugar de combatentes, de sorte a poderem, por processos
regulares, ascender ao poder. Foi esta a política que então defendi
com desassombro e de que não tenho que arrepender-me.
(...) Mal irá o País, se as crises
ministeriais hão-de ser sempre resolvidas a tiro».
(10)
Egas Moniz – atrás o dissemos –
discordava do presidencialismo de Sidónio Pais, e repetidas vezes
lho disse:
«O seu mau sestro fez dele um
fanático do sistema presidencialista. Fazia voltejar toda a política
interna portuguesa em torno da votação desse sistema. Desvanecia-o o
mando que previa mais forte adentro dessa fórmula governativa.
Agradava-lhe a chefia efectiva das forças de terra e mar, designação
que deixou em muitos decretos. Por vaidade? Talvez um pouco; mas
principalmente porque, ao tempo, só tinha confiança em si. As
aclamações, as palavras dos que o cercavam e o meio amigo que
encontrava por toda a parte, radicaram-lhe no espírito a convicção
de um messianismo que os argumentos já não conseguiam dominar.
As manifestações tinham uma grande
influência nas suas decisões.
– V. não as tem visto, não as tem
sentido, dizia-me muitas vezes. Queria que as verificasse pelos seus
olhos. É o apoio da minha obra, à minha orientação política.
– Desculpe-me, replicava-lhe, mas eu
não ligo importância a essas palmas. Os anos começam a pesar sobre
mim e com eles a experiência da vida política. Quando eu era rapaz,
vivia com intimidade com o Dr. José Luciano de Castro, que foi um
político de rara perspicácia e bom senso. Sorria-se sempre dos que
se
/ 28 / apoiavam nas
aclamações da rua. São os mesmos que hão-de insultá-lo, amanhã,
comentava.
Através dos vinte anos que tenho
andado na vida pública portuguesa, tenho verificado quanto era justa
a apreciação do inteligente político dos reinados de D. Luís, D.
Carlos e D. Manuel.
Mas não havia possibilidade de
demovê-lo! Queria o presidencialismo. Só dele podia vir a felicidade
para o País».
E Egas Moniz continua a sua crítico:
«As nossas conversas
encaminhavam-se, finalmente para uma conciliação. Chegámos a
cedências mútuas. Não havia inconveniente em atribuir ao Presidente
da República a chefia das forças da terra e mar, desde que o sistema
adoptado fosse o parlamentarista».
(11)
Egas Moniz queria que «o Ministério
derivasse do Parlamento, caindo, sempre que não tivesse a maioria».
Mas era isso que «Sidónio Pais teimava em não querer».
E Egas Moniz acrescenta que no final
das discussões com Sidónio Pais, «algumas das quais foram até às
cinco horas da manhã», acabava cada um no seu posto: ele, Egas
Moniz, parlamentarista, e Sidónio Pais presidencialista.
Egas Moniz queria que todo os
republicanos colaborassem na República. Sidónio Pais teimava em ser
ele e só ele a governar.
Trágicas consequências previa Egas
Moniz para o governo presidencialista de Sidónio Pais. E discordando
do presidencialismo, pediu a sua demissão de Ministro dos Negócios
Estrangeiros, teimando em voltar ao Parlamento. Confessa que «nunca
tivera desejo de sobraçar uma pasta ministerial e sempre tivera pelo
Parlamento uma irresistível atracção. Se o abandonei uma vez –
continua Egas Moniz –, foi porque se tornou intolerante e eu não
podia colaborar com ele. Vindo o presidencialismo, nele ficaria como
legislador, deixando a outros a missão de executar».
(12)
Egas Moniz fora convidado – apesar
de ter pedido a sua demissão de Ministro – a manter-se no Ministério
e a chefiar a delegação portuguesa à Conferência da Paz, em Londres,
para onde partiria a 5 de Dezembro de 1918.
O presidencialismo absorvente seria
a perda de Sidónio.
Este, embora «avisado diariamente de
que se premeditava um crime contra a sua vida, descria». E como Egas
Moniz lhe pedisse prudência, ei-lo que respondia:
– «Nada receio. De cada dez
atentados apenas um vinga. E há-de tremer a mão do que me queira
matar!» (13)
Egas Moniz ia seguir para o
estrangeiro, e consigo levava a preocupação de que o Presidente,
expondo-se como se expunha, poderia sofrer uma agressão mortal.
Egas Moniz chegava a Madrid em 6 de
Dezembro. E aí, da parte do Secretário Particular de Afonso XIII,
teve a notícia, dada por incumbência do Rei, de que Sidónio Pais
fora alvo de um atentado que, por acaso, saíra frustrado.
A profecia de Egas Moniz batia
certinha! Sidónio Pais nunca quis ouvir as palavras de Egas Moniz.
Resultado: se o primeiro atentado se frustrou, não se frustrou o da
noite de 13 de Dezembro de 1918.
(14) Uma bala lhe punha
termo à vida.
Era vítima do seu sistema
presidencialista, a puxar à ditadura.
O homem enamorado do poder goza, a
fundo, com o barulho da multidão que o aplaude. Na tepidez desse
banho, sente-se como que embriagado. Sente-se ao nível de um deus.
Julga-se num altar. Carece de auto-crítica, porque, se a tivesse – e
tomasse a lição da história ao pé da letra –, bem saberia que todos
aqueles que, de momento, lhe gritam o ave Caesar!, serão os
mesmos que, no dia seguinte, lhe darão o «morra !», o «morra!» sem
apelo nem agravo. Se não estivesse sob a acção da droga do
«poleiro», saberia que a adesão maciça dos «sim», na hora que passa,
se transformaria, no dia seguinte, numa intransponível muralha de
«nãos» sem direito nem avesso, amassados em ódio, em ameaçadores
gestos de vingança.
Desconfiem os políticos dos gritos
de aplauso da multidão. Mil vezes provado que esta é a própria
inconstância. Hoje passadeira de veludo aos pés do ídolo. Amanhã
guilhotina afiada para lhe desaparafusar a cabeça do pescoço!
O nosso Infante D. Pedro quem dizia:
No amo ni punto el amor popular,
ny lo quien mucho en el se confia...
O que, em português de agora, quer
dizer: Não amo nem apeteço o amor popular / nem
louvo quem nele muito confia...
Ao povo amor devem os que governam.
Com ele devem praticar – falando à grega e à fina – a demofilia. Não
confiem, porém, na gritaria que o povo venha fazer para a rua, em
seu louvor. Esse mesmo povo que, hoje, os coloca num altar, os
apedrejará, amanhã. É da história.
Demofilia, sim. Mas desinteressada.
Sem nada pedir ao povo, nem sequer o aplauso gritado nas ruas e nas
praças.
Sidónio Pais foi vítima da
ingenuidade com que tomou a sério os aplausos da multidão.
EGAS MONIZ
CONTRA O PARTIDO ÚNICO
Egas Moniz, a avaliar pela
condenação que fez do sistema presidencialista de Sidónio Pais,
repudiava
/ 29 / que, no País, houvesse
apenas um partido político. No partido único via ele a imagem do
governo totalitário e, portanto, da opinião única, o que é
manifestamente contrário ao clima de liberdade em que se deve
processar toda a vida nacional. Claro que, advogando o clima de
liberdade, entendia que o uso da liberdade será sempre feito em
favor da dignificação do homem.
Não chega a ser afirmativa paradoxal
a de que o homem absolutamente livre é, afinal, volens nolens,
um homem absolutamente dependente.
– Dependente de quê? Escravo de quê
e de quem?
– Dependente e escravo das suas
paixões, sobre as quais não possui domínio, indo para onde elas o
empurram.
Toda a liberdade tem de ser
necessariamente condicionada. É forçoso que o homem se norteie por
um paradigma de integral perfeição, que faça rumo ao homo
humanior. Se, a si próprio der integral carta de alforria,
sem autolimitações de qualquer espécie, sabidinho que é homem ao
mar. Tão certo como estarmos a dizê-lo!
O Homem que, à sombra de que é
inteiramente livre, se deixa levar sem auto-resistências, é
candidato a troglodita: em vez de animado por um «excelsior!»,
deixa-se ir, arrastado pelo instinto da caverna. Fica abaixo da
besta, porquanto esta, deixando-se levar pela natureza que lhe é
própria, não exorbita da justa medida, aquela que aproveita à sua
conservação, o que não acontece com o homem naturalmente inclinado a
exorbitar do equilíbrio, tocando os extremos daquilo que lhe dá
prazer – um prazer que, porém, acaba por transformá-lo em farrapo de
si mesmo, esterqueira de levar a mão ao nariz.
EGAS MONIZ
NOSSO MINISTRO EM MADRID
Egas Moniz foi nosso ministro em
Madrid, durante um ano. Ele o diz no Preâmbulo de Um ano de
Política: «Em 15 de Março de 1918 entreguei em Madrid, como
Ministro Plenipotenciário, as minhas cartas credenciais a S. M. o
Rei Afonso XIII. Em 16 de Março de 1919 abandonei a Presidência da
Delegação Portuguesa à Conferência da Paz».
No ano de 1918 – período morto para
a actividade diplomática – Egas Moniz resolveu vir passar as férias
a Portugal.
Estava nostálgico da sua terra, e
ele o diz com muita beleza literária, nas palavras seguintes:
«Eu carecia de ares pátrios. Depois
do meu País é a Espanha, de todos os que tenho visitado, aquele em
que melhor me sinto.
Tem sol, tem céu vasto e azul e tem
arte em cada recanto de ermida e em cada pedra caboucada que serve
de asilo a uma fonte ou de abrigo a um santo. Nos seus museus e nas
suas igrejas falam as telas dos Mestres com quem sabe conversar com
elas!
Num recanto de Toledo, na sacristia
do Escurial, ou no templo sagrado que, adentro do museu do Prado,
alberga a alma do maior pintor de todos os tempos, Velazquez, há a
vida dum passado histórico de requintada sensibilidade.
Pois mesmo a Espanha que tem para
mim tantos encantos e atractivos, passa a ser intolerável ao fim de
três meses.
Carecia de vir sorver o ar
português, deleitar a vista na paisagem modesta dos nossos campos,
ouvir por toda a parte a língua com que me criei e até experimentar
a doce tristeza da nossa raça na contemplação dos melancólicos
crepúsculos da nossa Beira-Mar.
E como não fazia diferença ao
serviço abandonar Madrid, preferi a minha aldeia às delícias das
praias dos Pirinéus».
(15)
*
* *
Quando Egas Moniz chegou a Lisboa, a
política emaranhava-se. A maioria parlamentar elegera Egas Moniz seu
leader, mas logo no Parlamento começaram a patentear-se os
primeiros sinais de uma desagregação – que muito havia de concorrer
(diz Egas Moniz) para o desnorteamento que se seguiu ao assassínio
do Dr. Sidónio Pais.
Vieram entretanto as férias
parlamentares, e «a política tomava o aspecto de uma preparação para
o combate que havia de vir a produzir-se entre presidencialistas e
parlamentaristas». (16)
E Egas Moniz informa-nos de que o
Presidente Sidónio Pais se mantinha irredutível. Chamou-o a Belém e
apresentou-lhe um projecto que desejava ver aprovado – o de um
«sistema presidencialista com dissolução».
Em presença disto, Egas Moniz fez
declarações peremptórias, dizendo que tão inadmissível era o
parlamentarismo sem dissolução, porque passa a ser a ditadura de
muitos, como incompreensível era o sistema presidencialista com
dissolução, pois passava a ser o poder pessoal. E quem como eu
contra ele arriscara a vida na ditadura franquista, não comete a
defecção de o votar hoje sob uma forma ainda mais odiosa».
(17)
Assim falava Egas Moniz a Sidónio
Pais. Continuaram discutindo o caso, mas cada qual ficou na sua
posição. Egas Moniz confessa: «Mas eu não podia aceitar o princípio
(do sistema presidencialista com dissolução).
/ 30 / Acrescentei mesmo que
só o parlamentarismo poderia fazer a harmonia da família portuguesa»
(18)
EGAS MONIZ
MINISTRO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS E NOSSO DELEGADO À CONFERÊNCIA DA
PAZ, EM PARIS
Depois das suas funções diplomáticas
em Madrid, durante um ano, Egas Moniz foi convidado, por Sidónio
Pais, para sobraçar a pasta dos Estrangeiros. Como reagiu o
convidado? Ele o diz:
«Esquivei-me. Em primeiro lugar,
porque no número das minhas ambições nunca me lisonjeou o ser
ministro e tanto que, convidado repetidas vezes, nunca aceitei o
encargo. Além disso eu sentia que fazia falta no Parlamento, onde
não havia, fora do Governo, pessoa que pudesse dirigir uma maioria
tão heterogénea e insubmissa como a que tínhamos.
Acrescia ainda que, até essa época,
eu estivera tão pouco tempo em Madrid que a minha saída poderia
parecer quase um acto de descortesia.
Com estes e outros argumentos
consegui a desistência do pedido que me foi feito.»
(19)
Todavia voltando Sidónio Pais a
insistir, dizendo a Egas Moniz que este o abandonava numa hora de
perigo, e dizendo-lhe ainda que, dentro de três dias, faria uma
revolução democrática, o convidado rendeu-se. Era, pois, Ministro
dos Negócios Estrangeiros.
Tomada a posse, Egas Moniz enviava
telegramas de despedida para Madrid. Entre as respostas recebidas,
uma delas, de Afonso XIII, era do tear seguinte:
«Egas Moniz, Ministro dos Negócios
Estrangeiros, Lisboa. De San Sebastian.
Agradeço sinceramente o amável
telegrama que me enviou ao ser nomeado Ministro dos Negócios
Estrangeiros e de todo o coração o felicito pelo novo cargo, ainda
que lamente a sua ausência em Madrid, onde deixou tão gratas
recordações, ficando-lhe eu particularmente reconhecido pelo seu
eficaz trabalho para estreitar os vínculos de amizade sincera entre
Portugal e Espanha. A Rainha agradece vivamente a sua saudação, que
comigo devolvo, extensiva a sua Senhora, desejando-lhe, no seu novo
e importante posto, as maiores felicidades».
O Ministério de que Egas Moniz fazia
parte estava organizado a 9 de Outubro de 1918.
De 13 para 14, explodia um movimento
revolucionário que não vingou.
O armistício da Grande Guerra era
assinado a 11 de Novembro. «Desde esse momento – diz Egas Moniz – a
gerência da pasta dos estrangeiros tornou-se pesada e cheia de
preocupações. Havia que pensar nos trabalhos para a Conferência da
Paz, escolher os delegados, reunir elementos, e como tudo tinha de
ser feito com o Presidente da República, passei a ir a Belém
diariamente». (21)
Em 20 de Novembro era nomeada uma
Delegação que acompanharia Egas Moniz à Conferência da Paz.
A posse foi-lhe conferida em Belém
pelo Presidente da República.
No dia 5 de Dezembro a Delegação
seguia para Londres.
Entretanto, é assassinado Sidónio
Pais (14 de Dezembro), como, já atrás, dissemos.
Agora novo Presidente da República –
o Almirante Canto e Castro. Egas Moniz pede a sua demissão de
Ministro das Negócios Estrangeiros.
Em resposta ao seu pedido de
demissão, Egas Moniz recebe, em 16 de Dezembro, telegrama
comunicando-lhe que os delegados à Conferência da Paz deviam
manter-se no seu lugar. Ficou, pois, no seu posto. Sentia que «não
tinha o direito de abandonar a missão diplomática de que fora
incumbido num momento decisivo para o País» – diz Egas Moniz
(22).
A 20, partia com a Delegação para a
capital francesa.
Assassinado Sidónio Pais, começa uma
terrível campanha contra o que fora o seu governo. Bernardino
Machado dizia o pior do pior, no Temps (20 de Dezembro).
Afonso Costa, por sua vez, no Matin (a 19) dava uma
entrevista no mesmo estilo.
«Tudo isto – refere Egas Moniz – se
dizia e publica nas vésperas da Conferência da Paz, onde iam
jogar-se os destinos do País. E estavam em França os delegados à
Conferência da Paz que, embora não fossem amigos dos signatários
desses artigos, iam
defender os interesses de todos os
Portugueses, com o desassombro e tenacidade de que deram provas
sobejas.
Era nesse momento que surgia essa
campanha violenta contra a situação política portuguesa que nos
mantinha nos elevados cargos de representantes de Portugal à
Conferência da Paz! E ousavam assiná-la um antigo Presidente da
República e um antigo Presidente do Ministério que, ao tempo, ainda
era Chefe de um antigo partido político português!»
(23)
Insistiram com Egas Moniz para que
se mantivesse no seu pasto. E por amor aos interesses do País aí se
manteve, apesar de, em Portugal, tudo ir de mal a pior. A 16 de
Janeiro de 1919 rebentava um movimento revolucionário, em Santarém,
que não vingou. A 20 do mesmo mês era proclamada a Monarquia no
Porto, Braga e Viana, num movimento dirigido por Paiva Couceiro.
Comenta Egas Moniz: «Não havia
maneira de nos deixarem tratar, com tranquilidade, dos interesses do
/ 31 / País, numa Conferência
que, já por si, se não mostrava muito favorável a Portugal!
Primeiro, o assassinato do
Presidente Dr. Sidónio Pais, em seguida o movimento de Santarém,
depois a revolução monárquica!»
(24)
Teimavam, todavia, em manter Egas
Moniz na pasta dos Estrangeiros.
Não daremos, aqui, conta do que
foram os trabalhos da Delegação portuguesa à Conferência da Paz, no
respeitante às nossas reclamações financeiras, ao problema colonial,
e à marinha mercante de guerra. Tudo isso consta largamente no livro
de Egas Moniz – Um ano de Política. A Delegação não nos
colocou mal. Muito pelo contrário.
Começava, entretanto, a rumorejar
que a Delegação ia ser substituída. Os Delegados não queriam
acreditar, tanto mais que nunca o Governo discordara da sua
orientação na Conferência, e por mais de uma vez tinha instado para
que Egas Moniz permanecesse no seu posto, apesar das repetidas
crises ministeriais.
«Pessoalmente – dizia Egas Moniz –
era-me agradável, embora estivesse pronto a sacrificar com
satisfação, o meu bem-estar, ao desejo de servir, até com sacrifício
da saúde, o meu País».
(25)
O Governo, porém, decidiu que fosse
Afonso Costa com outros Delegados a assumir o lugar de Egas Moniz e
dos Delegados que o acompanhavam.
E quem dava a demissão a Egas Moniz
era o Ministro Interino dos Estrangeiros!
Comentário de Egas Moniz:
«Era o meu substituto no Ministério
dos Estrangeiros que me dava a demissão em nome do Governo, apesar
de ser eu o Presidente da Delegação Portuguesa à Conferência da Paz,
na qualidade de Ministro dos Estrangeiros!
Um Ministro efectivo ser demitido
pelo seu substituto é acontecimento que, até hoje, se não deu, nem
sei se voltará a dar-se na história política da nossa terra!».
(26)
Egas Moniz considerou-se demitido,
apesar de terem insistido para que ficasse na pasta dos
Estrangeiros.
Honra lhe seja que, por nada deste
mundo, quis ficar.
Ainda manteve 10 dias em Paris – de
16 a 26 – para qualquer esclarecimento que houvessem de pedir-lhe.
Em princípios de Abril estava de
regresso a Lisboa. Dele as palavras seguintes: «Assim terminou a
minha missão diplomática junto da Conferência da Paz, onde trabalhei
com a máxima boa vontade. Foi uma tortura que passou e cuja
importância moral só pude devidamente apreciar quando me libertaram
do encargo que, durante meses, pesou sobre meus ombros».
(27)
Era Talleyrand quem assim
estabelecia o paralelo entre o diplomata e a mulher: «Se o diplomata
diz sim, quer com isso dizer talvez, e o talvez,
na sua boca, significa não; e se disser não, logo
deixa de ser diplomata. Se a mulher diz não, este não
deve entender-se por talvez; se responde talvez, deve
entender-se como sim; e se disser sim, logo deixa de
ser senhora.»
Supomos que Egas Moniz, como
diplomata, seria o que foi como investigador científico – o natural
amigo da verdade: disse não, onde a observação e a
experiência lhe mandavam negar; disse sim, onde essa mesma
observação e experiência lhe mandavam afirmar; e sempre talvez,
onde motivos não tinha para ser categórico.
Mirandinamente, foi homem de um só
rosto e de uma só fé. Não podia ser diplomata no sentido cheio de
reservas de um Talleyrand, o tal que disse que a palavra foi
concedida ao homem para ocultar o seu pensamento.
EGAS MONIZ
POLÍTICO LIBERAL
Egas Moniz foi político liberal,
adepto e servidor da democracia liberal. Democracia
liberal, dizemos, e não (credo!) democracia de massas. A
diferença que vai da primeira à segunda é abissal. A primeira é uma
forma de convivência inteligente, não dispensa o diálogo, promove-o,
considera-o essencial, para esclarecimento das ideias. Não presume
ter feito monopólio da verdade. Não dá o seu ideário como nec
plus ultra. Admite a oposição inteligente. Requer essa oposição,
como obra de contrastaria, como cadinho onde possa depurar as suas
ideias. Julgar-se-ia diminuída, na sua probidade, se não tivesse de
coloquiar, em atitude crítica, com quem dela divergisse., Quer ter
razão, não à força, mas com base em razões que lhe oponham
lealmente. Para ter razão quer apresentar razões que possam ser
cotejadas com outras razões. Tudo vai de que a discussão ocorra a
nível de fair play, como quem diz jogo limpo de
alçapões sofísticos.
A democracia liberal sentir-se-ia
minimizada, se não tivesse, a passá-la pelo crivo da serena
controvérsia, uma oposição bem organizada. A democracia de massas
pelo contrário, não admite oposição. E tanto basta para que não
mereça a nossa simpatia. O homem-massa julga ter sempre razão. A
quem se lhe opõe, com argumentos lógicos, responde com sete pedras
na mão. O homem multitudinário não quer convivência – mas apenas
total anuência aos seus pontos de vista, impregnados das mais
odiosas paixões contra aqueles que se permitam contraditá-lo.
/ 32 /
Na democracia liberal, as minorias
têm lugar. São ouvidas e protegidas. Delas se espera um ponto de
vista que mereça ponderação.
Na democracia de massas, as minorias
são sumariamente abafadas. Representam um desmancha-prazeres para
quem se julga, a fundo e infalivelmente, na posse de uma verdade
política sem direito nem avesso, verdade monolítica, a coberto de
qualquer crítica.
A democracia liberal coteja
argumentos seus com argumentos alheios. É aristodemocrática. Discute
com cortesia. É civilizada. Convivente. Abomina a barbárie.
A democracia de massas, ao contrário
da democracia liberal, é contundente, dogmática e dogmatizante. É
hermética ao confronte das ideias alheias. É incapaz de idear. Toma
partido por certas ideias, não porque as tenha pensado em
profundidade, mas apenas porque lhas comunicaram em clima emocional.
Na carência de capacidade polémica, a democracia de massas apela
para a força, não como ultima ratio, mas como primeira,
como única razão, porque de facto, quem argumentos racionais não
tem, só sabe usar dos argumentos da violência, ou esta se traduza no
insulto de fazer corar um macaco, ou se exprima no bacamarte prestes
a disparar.
Os homens da democracia liberal não
fizeram voto de perfeição integral. Aceitam a polémica da oposição,
e a ela se dobram, se a verdade está da outra banda. Não sofrem de
narcisite aguda.
Em compensação, ao homem da
democracia da massa nem sequer lhe passa pela cabeça que possa
errar. Não duvida da sua plenitude. Sentir-se-ia diminuído, se
houvesse de comparar-se. Garante, a priori, as suas certezas
graníticas. É impermeável a críticas. Sentou praça – e
vitaliciamente o fez – numa ideologia à prova de fogo. É vulgar, e
julga-se com o inapelável direito de impor a sua vulgaridade. Tapa
os ouvidos a todas as demonstrações pelas quais se lhe prove que
está em erro. Não procura ajustar-se à verdade, mas antes,
arbitrariamente, tudo procura ajustar à sua verdade. Não se tem por
perfectível. É, sem contradita possível, a própria perfeição.
Com efeito, o homem-massa não tem
exigências de perfeição para si próprio. Tê-las, porquê, e para quê,
se ele encarna a própria perfeição?
Só o homem de selecção é homem
permanentemente insatisfeito consigo. Se Deus lhe desse, com a sua
mão direita a perfeição já acabada, e com a mão esquerda, a
possibilidade de, com o seu próprio esforço, ser, hoje, mais
perfeito, do que ontem, e, amanhã, mais perfeito, do que hoje, pela
segunda dádiva ele optaria.
O homem-massa não visa
transcender-se, ultrapassar-se. Julga ter atingido a meta
definitiva. Nega a nobreza, no alto sentido desta palavra,
como quem diz o estado de alma que exige para si mais deveres do que
direitos. Se o plebeu – e plebeu é o homem-massa – é todo pelas
facilidades de mão-beijada, o autêntico nobre é pelas vitórias em
que dele se exija disciplina, autodomínio, risco em vencer o perigo.
Como a personagem
de Corneille, dirá: à vaincre sans péril, on triomphe sans gloire.
O homem de espírito nobre não quer favores inconfessáveis, dispensa-os.
Só vão bem à sua verticalidade moral os privilégios que conquistou
com indiscutível honradez.
Se, acaso, é herdeiro de um nome
fidalgo, faz tudo por prestigiá-lo. Vê, nessa herança, não um
privilégio que o dispense de obrigações, mas um vivo estímulo para o
honrar com o seu esforço. Sente que noblesse oblige. A
herança fidalga não é, para ele, o fofo colchão em que se deite a
dormir, mas um incentivo para, com insofismáveis méritos, exceder os
seus antepassados.
O perfeito nobre não o é porque os
seus antepassados o foram. Antes, à maneira chinesa, os seus
antepassados ganham nobreza com a nobreza dele próprio. Como diz
José Ortega y Gasset: «Os antepassados [chineses] vivem do homem
actual, cuja nobreza é efectiva, actuante; em suma: é; não foi.»
Não conhecemos a genealogia de Egas
Moniz. O que podemos afirmar é que ele, com a sua vida e obra,
distinguiu nobreza sobre os seus antepassados. Não foi homem-massa,
mas homem de selecção. Não poderia nunca (por nunca!) votar por uma
democracia de massas, mas por uma democracia liberal, por uma
democracia aristocrática, se tomarmos esta palavra no sentido
helénico, e sentido de fina flor, nata, elite, escol.
Egas Moniz foi um intelectual puro
ao serviço da política, no sentido majorativo desta palavra.
Queremos o intelectual atento à
política, como homem que não deve abdicar da sua cidadania, no alto
sentido desta palavra. Não o queremos, porém, (abrenúncio!),
ancilosado na mentalidade política, tomada esta no sentido
pejorativo.
Com efeito, diferença existe, e
profunda, entre a mentalidade de filósofo ou de sábio, e a habitual,
ou tradicional, mentalidade política. Se aquela se norteia pelo dito
comteano de saber para prever, e prever para prover: science,
d'où prévoyance, prévoyance, d'où action, a outra se norteia
pela ambição do poder, este transformado em tema e... teima,
utilizando, por sistema, a máxima maquiavélica de que os fins
justificam os meios.
O político, no sentido desacreditado
desta palavra, é o grosseiro pragmatista. Em seu pensar, é verdade o
que se traduz em utilidade para os seus sofísticos propósitos de se
manter no poder, e é falsidade
/ 33 / tudo o que daí o
afaste. A sua epistemologia assenta na fraude e num subjectivismo
arbitrário.
Bom será, porém, que a mentalidade
política se corrija desse vício – o da obsessão do poder pelo poder,
do mando pelo mando, do penacho pelo penacho.
O programa do político deverá ser
governar e servir. Politica ancilla populi. Fora deste
perímetro constitui fraude. E dessa fraude foi incapaz Egas Moniz,
homem de servir, jamais de servir-se, atreito a reivindicar deveres
no exercício da função pública, jamais a reclamar, para si, à sombra
da função governativa, qualquer direito inconfessável. Foi homem
nobre, que media a sua nobreza moral na proporção das suas
obrigações demófilas, repudiando o plebeísmo de aproveitar a função
pública para se governar.
Egas Moniz – se formos ao fundo das
suas atitudes políticas – foi o adepto flagrante de uma
aristodemocracia, aquela que promove o aproveitamento sistemático de
todos os valores prometedores.
A autêntica democracia não rasoira
valores: procura-os, e faculta-lhes todos os meios para que possam
concretizar-se no máximo das suas virtualidades. Não é inimiga das
aristocracias naturais. Antes as promove. O que ela repele são as
aristocracias alicerçadas em pergaminhos sem a cobertura de valores
bem actuais, e insofismáveis. Não entra no seu programa eliminar
escóis, antes lhes propicia o aparecimento.
Segundo a Declaração
dos Direitos de 89, «tous les citoyens sont également
admissibles à toutes dignités, places et emplois publics, selon leur
capacité, et sans autre distinction que celle de leurs vertus et de
leurs talents.»
Não se concede, pois, de mão
beijada, o acesso aos lugares responsáveis, mas em função de
capacidades meridianamente provadas.
A democracia aristocrática
(acasalemos afoitamente estes dois termos) não rasoira valores: dá a
cada qual a oportunidade de se desenvolver ao máximo, para, depois,
o situar onde mais útil possa vir a ser à colectividade.
A democracia aristocrática –
precisamente porque se adjectiva de aristocrática – não abafa
personalidades, antes tudo faz para que elas surjam em toda a sua
plenitude.
A democracia liberal – para honrar
este adjectivo – será tal que liberte o homem da miséria material,
da miséria intelectual, da miséria moral. Será tal que dignifique
cada vez mais o homem, libertando-o da abusiva opressão dos
governantes, que nele crie o agudo sentido das responsabilidades
pessoais e cívicas, que dele faça um homem que conheça e possua cada
vez mais, para se qualificar integralmente a si próprio, e ajudar os
outros a qualificar-se ao mesmo nível. Democracia liberal ou é
humanismo que conduza à promoção do humanus a humanior,
ou não passa de simples «sopro de voz», expressão vazia de sentido,
simples rótulo que muito promete e, afinal, nos traz uma das mãos
cheia de nada, outra cheia de coisa nenhuma...
EGAS MONIZ
SIMPATIZANTE COM O SOCIALISMO
Egas Moniz advogou, como político, a
melhoria da classe operária. Se hoje fosse vivo teriam nele os
operários um dos seus defensores mais calorosos. Parecem de agora, e
no entanto foram proferidas numa conferência de há 57 anos, as
palavras seguintes:
«...Temos de atender, com cuidado,
ao movimento operário e trabalhista, que carece de ser atendido nas
suas reclamações. Um Governo, que se preza de bem servir o País, tem
de olhar de frente esse grave problema. É indispensável que o
operário tenha o bastante para si e para os seus. Por outro lado
deve estar ao abrigo de leis protectoras que não só o amparem nos
desastres, mas também, o socorram na doença, na invalidez, na falta
de trabalho e na velhice.
É preciso que os seus filhos sejam
protegidos pelas maternidades e lactários e pela difusão de creches,
das cantinas e dos dispensários; é necessário que a sociedade
auxilie a educação dessas crianças na escola primária e,
particularmente, nas escolas profissionais e técnicas, cuja
divulgação se deve introduzir e espalhar pelas nossas cidades e
províncias. Urge fixar-lhes um salário mínimo e facilitar-lhes casas
baratas, água abundante, banhos públicos gratuitos, transportes a
preços mínimos e criar a instituição tão simpática como justa do
homestead. Deve regularizar-se, com efectividade, o trabalho das
mulheres e crianças a dentro das fábricas, atendendo à higiene das
instalações fabris, do atelier, da habitação dos
empregados comerciais e de todos os serviços em geral.
Ao terminar esta rápida enumeração
do que julgo serem justas reivindicações do mundo Operário, é
possível que me tomem por socialista
(28).
Sob este aspecto, não repudio a
tendência, que o político moderno deve possuir. No advento desta
nova era, todos temos de ceder no campo económico do mundo que mais
trabalha, isto é, das classes operárias.
Na hora presente, temos de ir ao
encontro das aspirações das forças produtoras. Seria estultícia
propormo-nos dar-lhes inglório combate. Trabalho e capital poderão,
assim, fazer uma aliança honrada e vantajosa ao progresso social. Na
América do Norte, raríssimas vezes há uma greve e pela razão simples
de que os patrões e operários se entendem por maneira
/ 34 / que estes não chegam a
ter necessidade de formular reclamações».
(29)
Egas Moniz, trabalhador intelectual,
investigador que, depois das palavras transcritas, veio a ser
galardoado com o Prémio Nobel foi – acabamos de o ver – ardoroso
advogado da manifesta melhoria da dignidade humana do trabalhador
manual, repugnando-lhe que fossem uns a viver na opulência
afrontosa, e outros a viver – ou a vegetar – em aflitiva situação
económica. (30) Egas Moniz não foi comunista, mas simpatizou
com o socialismo.
Casa do Marinheiro – Avanca
Que pensava Egas Moniz, em matéria
de educação e de instrução?
São de 1916, as palavras seguintes,
com as quais responde à nossa pergunta:
«Mais do que a instrução é preciso
difundir as bases duma educação diversa daquela que tem feito a
orientação do nosso povo. É indispensável educar e instruir, mas de
maneira diferente da seguida até agora. Não é ensinando, e mal, a
ler e escrever, que se podem valorizar homens para a luta da vida.
(31) Mesmo nas classes que se não destinam a fazer grandes e
profundos estudos, é necessário que alguns mais se façam sob uma
orientação acentuadamente técnica, base do progresso dos grandes
povos, do levantamento das grandes nacionalidades.
[...] A educação de todas as classes
sociais deve ser realizada adentro das escolas com cursos seguidos,
divulgada em conferências às classes operárias, difundida pela
imprensa e pelo livro.
[...] Até a correcção de maneiras
não é indiferente na vida social.
A educação tende a cultivar os bons
sentimentos, que devemos fazer prosperar e hipertrofiar,
sublimando-os. Só assim se conseguirá obter caracteres, só assim se
divulgará a honestidade de processos, só assim se transformará a
sociedade intolerante, provocadora e petulante de hoje, na sociedade
serena e reflectida de amanhã.»
(32)
Se hoje vivesse, não teria Egas
Moniz que alterar muito as palavras que aí ficam. Ainda não perderam
a sua actualidade.
Acima de tudo, o que ele queria era
a formação de homens de carácter, maneira de saberem usar com
eficiência criadora os conhecimentos que adquirissem.
Referindo-se à mulher em geral,
escreveu Egas Moniz: «A educação é talvez mais precisa à mulher do
que ao homem. E muito particularmente à mulher do operário.
Se o capital se reproduz pelo juro,
o operário amortiza-se pelo filho, e este será tanto mais garantido
quanto a sua educação for mais cuidada. E esta depende mais da acção
da mãe do que do pai. Ela deve ter não só uma certa educação que
faça da sua individualidade um ser moral completo, mas carece, além
disso, de saber educar, de saber dirigir os seus filhos nos
primeiros anos da vida, quase sempre os mais importantes para a sua
existência». (33)
Egas Moniz refere-se à mulher do
operário, na assistência aos filhos nos primeiros anos. Mas a
presença da mãe é indispensável junto dos filhos pequenos, em todos
os níveis sociais da mulher.
Já alguém chamou à ternura «vitamina
psicológica». Metáfora? O que quiserem. O certo é que a ternura
/ 35 / ajuda a criança a
crescer, não apenas fisicamente, mas, sobretudo, no respeitante à
sensibilidade.
A criança que não recebe essa
vitamina fica minimizada, para todo o sempre.
Não basta que os pais dêem filhos ao
mundo. É preciso que, para além de os alimentarem de corpo, os
alimentem, também, com a sua afectividade. E se há ternura que pese
no crescimento e aperfeiçoamento psíquico duma criança, essa ternura
é a do amor materno. A criança precisa de ouvir a voz carinhosa da
mãe, precisa de receber as carícias do seu olhar, o afago das suas
mãos. As crianças privadas da vitamina psicológica, que é a ternura
da mãe, ficam roubadas numa riqueza inefável que nenhuma outra
riqueza deste mundo poderá compensar.
A presença da mãe junto dos filhos,
nas primeiras idades, (presença traduzida na palavra doce, no olhar
de suaves ressonâncias, na mão que ampara, no gesto que tranquiliza,
na companhia que vacina contra o medo, na discreta ajuda em
dificuldades, no diálogo silencioso dos olhares que se trocam)
constitui um tónico moral insubstituível. A mãe não pode passar
procuração, seja a quem for, para que a substituam junto dos seus
filhos pequeninos. A mãe é mais mulher, se tiver a companhia dos
seus filhos pequeninos. A mãe é mais mulher, se tiver a companhia
dos seus meninos. E estes, por sua vez, virão a ser mais homens, se
tiverem recebido as calorias que só a ternura materna pode
comunicar. (34)
A ausência da mãe, relativamente ao
seu filho pequenino, gera neste um estado de profunda angústia – a
angústia do abandono que o poderá acompanhar por toda a vida. E aqui
nos lembra a poetisa galega Rosalía de Castro que, durante toda a
sua existência, sentiu, agudamente, o espinho da ausência da mãe, na
sua meninice. Filha de amores irregulares, Rosalía foi confiada a
uma ama.
A mãe afastou-se, para,
aparentemente, tapar as bocas do mundo.
Em boa verdade, com essa ausência
sofreu a mãe e sofreu a filha. Bem exacto o que diz o Dr. Bowlby: «A
criança tem necessidade de sentir que é alvo de prazer e orgulho
para a mãe, e esta precisa de sentir um enriquecimento da sua
personalidade através da do filho; ambos carecem de se considerar
intimamente identificados. A função de mãe não pode de modo algum
ser exercida por procuração. Existem relações humanas e vivas que
modificam o carácter da mãe como o do filho. Um regime apropriado
exige algo mais que calorias – a alimentação, para se tornar
plenamente aproveitável, deve ser ingerida com prazer. Analogamente
a função da mãe não se deve calcular em horas de presença – a única
medida válida consiste na alegria que a mãe e o filho experimentam
em estar juntos». (35)
A carência afectiva precoce, a
carência de cuidados maternos, traumatizou, para sempre, a formação
da personalidade da criança.
Mas, claro, ao falarmos da
influência benéfica da mãe sobre o filho na primeira e segunda
infâncias, importa salientar que de mães normais estamos falando.
Se as mães fugirem ao paradigma da
normalidade – se forem mães hostis, ansiosas, instáveis, captativas
ou superprotectoras – logo a criança se ressentirá, ficando aquém do
que seria lícito esperar dela. Com mães ou pais insuficientes, não
haverá ambiente afectivo propiciador à personalização construtiva da
criança. (36)
EGAS MONIZ
POLÍTICO INDEPENDENTE
No mundo da política, Egas Moniz
primou sempre pelo espírito de independência, isenção e
objectividade, tal como o fez no respeitante à investigação
científica, onde mostrou soberana indiferença por todos aqueles que,
através de críticas, mais ou menos discretas, pretendiam fazer
acreditar que, das suas pesquisas – aquelas que, afinal, lhe deram o
Prémio Nobel – nada proviria de original, nem de útil.
O medíocres latiram, mas ele fez
seguir a sua caravana.
Egas Moniz conhecia muito bem a
psicologia dos medíocres de carreira, uns sujeitos que, não lhes
sendo possível elevar-se por méritos próprios, procuram subir (e
muitas vezes o conseguem!) pelos processos da subserviência e da
humilhação rastejante, perante aqueles que, estando em lugares altos
da política, gostam de ser lisonjeados.
Algures na Câmara dos Deputados, em
1909, evocando a memória de José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães,
dizia Egas Moniz:
«O homem medíocre fala sempre de
méritos que não tem, lança em face serviços que não presta, apregoa
sacrifícios que não sofreu e tem sempre a mão espalmada para receber
a paga da sua obra em honrarias ou benesses. E porque é mole como a
cera, agrada aos que, mercê do nosso modo de ser político, são os
árbitros do poder, acomodando-se a todas as situações, sem uma
reclamação que possa ser ouvida, sem um ronronar que possa
pressentir-se, sem um atrito que possa exteriorizar-se!
Não tem ideias nem precisa tê-las.
Pensa pela cabeça do seu dono. Defende por sistema. Ataca por
obrigação. Satisfaz vaidades e avigora ódios. É serviçal.
/ 36 / É submisso. Mas a paga
também é certa, segura e remuneradora».
(37)
Barbosa de Magalhães, homem que
primou pela verticalidade, homem a quem sobrou personalidade de
antes quebrar que torcer, nunca abdicou da sua independência. Disse
sempre o que tinha a dizer, fosse a quem fosse. E por isso mesmo foi
posto de lado. Nunca se curvou perante imposições dogmáticas de
chefes omnipotentes.
Também Egas Moniz, no respeitante à
política, como, aliás, em todos os sectores da sua actividade,
timbrou, invariavelmente, por ser ele próprio, não se dobrando
diante do mais pintado.
Egas Moniz foi homem sui
generis e sui juris. Personalidade bem
marcada. Sigla inconfundível. Orientado pela divisa do iI faut
être soi. Homem inarrebanhável. Foi-se atrás dos seus
imperativos de consciência. Não macaqueou o mais pintado.
Como o poeta, poderia ele dizer:
Inútil seguir vizinhos.
Querer ser depois ou ser antes.
Cada um é seus caminhos.
CULTURA HUMANÍSTICA DE EGAS MONIZ
Egas Moniz quem disse: «Ramón y
Cajal, o grande sábio espanhol, Prémio Nobel de Medicina e glória da
histologia de todo o mundo, escreveu, algures, que muito lhe pesava
a desproporção entre o avanço, cada vez mais acelerado, dos nossos
conhecimentos científicos nos diversos sectores do saber humano e o
nosso desenvolvimento do cérebro, tão ronceiro e preguiçoso, que, de
forma alguma, pode abranger o progresso das ciências no seu complexo
conjunto. O sonho dos enciclopedistas de há muito se desmoronou!».
Egas Moniz não presumiu,
evidentemente, de possuir cultura enciclopédica. Só poderia presumir
de tudo saber, se fosse tolo. Mas soube, todavia, muito mais do que
a sua estrita medicina, porque se apenas medicina soubesse, nem
medicina saberia, segundo a frase, aparentemente paradoxal, que por
aí corre.
Soube da sua medicina, foi original
na sua medicina, ao ponto de lhe caber o Prémio Nobel, mas não se
ficou por aí. Soube meter a sua especialização num contexto de
cultura humanística, com laivos de universal, e daí só tirava
benefícios como professor, como homem e como cidadão.
Obedeceu, talvez sem dar por isso,
ao famoso preceito de Vítor Duruy, enunciado há mais de um século:
Il faut être universel, au profit de Ia spécialité.
A universalidade – a relativa
universalidade da sua cultura – aproveitou à sua especialidade.
Estamos em dizer que talvez não fosse Prémio Nobel de Medicina, se,
por detrás, ou subjacente à sua preparação científica, não tivesse
uma larga cultura humanística.
Diz-se que um homem completamente
culto é mais raro que as esmeraldas azuis. Não há, aí, ninguém que
tudo possa conhecer, e conhecer a fundo.
Certo, certíssimo. Mas será que
poderíamos considerar culto o homem que soubesse este mundo e a
cabeça do outro?
A cultura não está no muito que se
sabe, mas num certo quid que se deve sobrepor ao saber
– seja este geral, seja especializado.
Aquilo que deve impregnar o saber –
sob pena de este pouco nos adiantar – será uma profunda dose de
humanismo.
Sem o saber posto ao serviço da
promoção integral do homem, nada feito ou tudo mal feito. Não se
pede que deitemos o corpo às ortigas, que descuidemos o bem-estar
económico. Mas tudo culminará na espiritualização do homem, fazendo
que este seja uma criatura essencialmente fraterna a nível
ecuménico.
Ciência que divide os homens, não é
cultura, no alto sentido desta palavra.
O saber estritamente profissional,
e, para mais, em especialização apertada, encurta vistas, isola. O
saber deve ser humanista. Há-de traduzir-se (para que o consideremos
culto) em dons de fraternidade humana.
A falta de cultura humanística, a
estrita preparação científica, leva os homens a tudo considerar
more geometrico.
Roberval, depois de assistir à
representação de uma peça de Racine, não se teve, e perguntou:
«Qu’est ce que cela
prouve?»
Nem tudo se prova matematicamente,
laboratorialmente.
Bem sabemos que il
ny a science que du mesurable.
Mas há ramos do saber que não cabem
nas provas estritamente matemáticas.
Mal vai aquele que procura na lógica
matemática o esquema das relações entre os homens. Essas relações
têm, por vezes, muito de inefável. E o inefável (ai de nós!) é
rebelde a senos e cossenos e coisas que tais.
Só a cultura de feição humanística
pode fornecer – e aguçar – um sexto sentido para certa inefabilidade
das relações entre os homens e para uma larga cosmovisão
psicológica.
Essa cultura a possuía Egas Moniz,
sem, todavia, lhe faltar a óptima cultura científica. Conciliou as
duas. E não consta que, mutuamente, se tenham prejudicado. Antes,
reciprocamente, se auxiliaram.
Egas Moniz não foi o estrito
investigador científico. Para além de professor universitário,
sentiu-se também no dever de ser cidadão atento à política do seu
país, e não apenas na qualidade de espectador. Quis ser
/ 37 / e foi, político
intervencionista. A sua educação de cariz humanista – não dizemos
enciclopedista – Ievava-o a exorbitar do estrito magistério e da
clínica, para dar o seu contributo de inteligência e de civismo às
coisas da governação pública. Não quis ser o técnico puro, de quem
talvez pensasse: techinus purus, asinus purus.
Com efeito, a simples técnica, nada
mais vendo do que a cabeça do alfinete da sua especialização, acaba
por ganhar uma certa miopia e paralisia para as perspectivas de
conjunto. Egas Moniz não se quis ficar na apropriada especialização.
A par da sua cultura científica, esforçou-se por ganhar cultura que
lhe propiciasse larga mundividência. Essa mundividência não lhe
faltou e foi mercê dela que se intrometeu na política. Fez
magistério, sim. Clínica também. Não esqueceu a investigação
científica. Mas entendeu que, sendo embora, professor, clínico e
investigador, não deveria desinteressar-se da sua cidadania activa.
Egas Moniz não foi, não quis ser, o
técnico puro.
O técnico puro, pela falta de
mundividência filosófica, que o mesmo é dizer: mundividência
humanística, é, nas mãos do político, um instrumento de
escravização. O nosso homem, dentro da sua especialização
respeitante a uma cabeça de alfinete, só vê valores grosseiramente
pragmáticos. Não alcança os inefáveis valores do espírito à escala
do grande, do contexto ecuménico da Humanidade.
Egas Moniz não foi filósofo de
profissão. Todavia, possuiu a filosofia bastante para se libertar
das estreitezas do estrito profissionalismo.
Egas Moniz foi o tipo de homem
selecto, a negação do homem vulgar, porque, se este se contenta com
uma cultura estática (e esta mesmo a nível de confrangedora
penúria), aquele procura permanentemente transcender-se, tendo, como
ninguém, o sentido agudo da problemática, para esta escogitando
soluções inéditas, ou renovadas.
Fosse Egas Moniz um simples espírito
erudito, atafulhado do saber dos outros, sem outra ambição que a de
deslumbrar pelo muito do que recebeu de fora, e não teria dado um
passo à frente, no campo da medicina. Não foi, porém, o tipo do
homem erudito, do citador, recitador e... trescitador do saber
alheio. Quis – e admiravelmente o conseguiu! – transcender aquilo
que já encontrou feito. Pretendeu atirar a seta da originalidade
para além do statu quo. Meteu-se pelo caminho de
investigações inéditas, ou apenas esboçadas por outros,
interrompidas a meio caminho. Homem de nobre estirpe intelectual, e
não homem-massa (o simples repetidor ou passivo eco alheio),
entendeu ser seu dever trazer, mercê do seu esforço, da sua dinâmica
criadora, um novo contributo à ciência que, como professar
universitário, leccionava.
Teve, contra si, a surda hostilidade
dos rotineiros, dos homens vulgares (que também os há – se há! – na
Universidade), mas lançou-lhes um olhar de desdém, persistiu, apesar
de tudo, e contra tudo, e meteu a sua lança nas áfricas da
originalidade. O Prémio Nobel não lhe foi atribuído, de mão-beijada,
mas em função do valiosíssimo contributo que trouxe a fisiologia do
cérebro.
Como professor de alta estirpe
intelectual, sentiu-se no dever de se suplantar. Existe uma nobreza
moral. Existe, outrossim, uma nobreza intelectual. Se a nobreza
moral consistiu em transcender-se, diariamente, no respeitante a
qualidades afirmativas de carácter, a nobreza intelectual, a nobreza
de um magistério universitário digno do nome, consiste em comunicar
aos seus alunos para além do espólio científico em circulação, o
resultado de investigações originais de conta própria.
QUE PENSARIA EGAS MONIZ, SE ASSISTISSE AO 25 DE ABRIL?
Que pensaria Egas Moniz, se
assistisse ao 25 de Abril de 1974?
Talvez repetisse muitas das palavras
que proferiu, ao traçar o Programa do Partido Centrista, de que fez
parte. (38) Esse programa foi publicado em 20 de Outubro de
1917, e dele extraímos os passos seguintes:
«Não somos radicais, porque
nem todas as raízes se cortam; mas não somos tão pouco
conservadores, no sentido de retrógrados ou
reaccionários, porque não excluímos dos nossos propósitos o
espírito de reforma e de evolução. Somos moderados no radicalismo da
nossa projectada acção: preferimos conservar melhorando, as energias
nacionais, olhos postos nos ideais de reforma social cujas
reivindicações justas reconhecemos. Entendemos, porém, que dentro da
fórmula republicana que corresponde ao Estado actual da nossa
sociedade, afirmando ser liberais, definimos, consequentemente, a
nossa reprovação a toda a tirania e a toda a violência, porque
também são possíveis no regime, quando ele permite a degenerescência
demagógica e anárquica que tudo destrói e tudo esteriliza».
(39)
Esse programa ainda agora teria
actualidade nacional, em muitos pontos. No citado livro pode o
leitor encontrá-lo na íntegra.
Sobre esse programa, faria Egas
Moniz, depois, uma conferência no Porto. Muito haveria que
transcrever aqui dessa conferência. Reproduzimos apenas o final.
«Procuremos que nos governem homens
honrados, desinteressados e sabedores, que não conheçam o
/ 38 / facciosismo, que sejam
justos nas suas decisões e enérgicos nos seus propósitos, e que não
esqueçam que a bondade, essa grande e ignorada força, vale mais do
que as medidas violentas, que geralmente atingem mais os seus
autores do que as suas vítimas».
(40)
De facto, Egas Moniz foi sempre
contra os regimes de violência e opressão, Ditaduras de pulso
cabeludo e de trabuco sempre aperrado, nunca tiveram, não podiam
ter, a sua simpatia.
Com efeito, Egas Moniz, sempre que
se referiu às ditaduras portuguesas, fê-lo como político liberal, e,
portanto, em linguagem de repúdio. Falando da ditadura de João
Franco, chama-lhe obra de «demência», filha de um «governo odiado».
Diz ter atacado essa ditadura, que
originou o atentado de 1 de Fevereiro (de 1908), com a vivacidade e
com o calor que nos dá a convicção de bem proceder.
(41)
Falou das «infâmias do governo da ditadura», das «violências da
ditadura». (42)
Portanto, Egas Moniz foi contra toda
a espécie de despotismo. E quem o não é?
Henrique Heine quem dizia que «a
Inglaterra foi o único país que cometeu o ridículo de vencer
Napoleão».
Não cometeu ridículo nenhum, não
senhores! Napoleão quis eliminar a liberdade onde quer que ela
existisse. Quis ser o tirano não só na França, mas em toda a Europa!
Ora, despotismos nem pintados!
Se Egas Moniz agora vivesse, nesta
nossa era de contestação sem freio, será que lhe daria o seu inteiro
aplauso?
Sim, e não. Sim, no protesto
contra muitos conformismos que ainda aproveitam as pequenas
minorias, mas que atiram para a miséria espantosas maiorias. Não,
na tempestade de reivindicações que para aí vai de «direitos», que
são apenas fáceis e egoístas comodidades. De certo ele gostaria de
ver os Portugueses desencadear também uma tempestade em que
reivindicassem obrigações. Toda a gente aí se julga a coberto de
críticas, fazendo, aliás, de juiz infalível na crítica ao seu
semelhante.
Era Augusto Comte quem dizia: «o
homem só tem um direito – o de cumprir o seu dever».
Os Portugueses do nosso tempo –
muitíssimos deles – trocam o dito comteano, e é como se afirmassem:
«o homem só tem um dever – o de reivindicar direitos, atirando com
os deveres às ortigas».
Egas Moniz foi político liberal.
Advogado de qualquer liberdade? De uma só: aquela que subisse o
homem a mais homem, que o promovesse, de humanus, a
humanior.
Não poderia, jamais, dar o seu
beneplácito a governantes que só a querem para eles, e de todo a
negam aos cidadãos.
_________________________________
NOTAS
(1)
– Com efeito, em 8 de Julho de 1906, João Franco, em reunião com os
seus partidários, no Porto, prometera, se viesse a ser Governo, não
se afastar, um milímetro, da Carta. Aí declarava que não faria
ditadura. Jurava a Deus que só com o Parlamento faria as leis
necessárias para a execução do seu programa governativo.
(2)
– D. Manuel, uma vez feito rei, escreveu a seguinte carta ao
Presidente do Conselho, publicada no Diário do Governo:
«Meu presidente do Conselho:
Devendo as cortes, nos termos do
artigo 80.º o da Carta Constitucional, fixar, no começo de cada
reinado, a dotação do Rei, e desejando eu que o Parlamento esteja
inteiramente livre de toda a indicação para resolver sobre o
assunto, é meu firme propósito que a fazenda da Casa Real não
utilize recursos que não tenham a sanção parlamentar.
Creia-me sempre seu muito amigo
Manuel.»
Errata àquilo que a ditadura
decretava... D. Pedro V cedera a favor do país a quarta parte da sua
dotação, 91 250$000 réis anuais.
(3)
– D. Manuel viria a revogar, em 7 de Fevereiro de 1908, a lei da
imprensa de 20 de Junho de 1907. O decreto é assinado pelo rei, por
Francisco Ferreira do Amaral e Artur Alberto de Campos Henriques.
(4)
– Deputado em várias legislaturas, de 1903 a 1917, foi ministro de
Portugal em Madrid, em 1917, ascendendo a Ministro dos Negócios
Estrangeiros (8-X-1918 a 4-XII-1918). Na qualidade de Ministro dos
Negócios Estrangeiros, presidiu à primeira Delegação Portuguesa à
Conferência da Paz, em Paris, 1918, conservando a pasta dos Negócios
Estrangeiros, mas substituído no seu exercício por Canto e Castro
(15-XII-1918 a 23-XII-1918, Azevedo Neves (23-XII-1918 a 27-1-1919)
e Couceiro da Costa (27-1-1919 a 30-III-1919).
Em 30 de Junho de 1961, dirigentes
das forças republicanas e socialistas solicitaram de Egas Moniz a
sua anuência para ser proposto como candidato à Presidência da
República. Recusou-se, alegando a sua falta de saúde, e tomando
partido pelo candidato almirante Quintão Meireles.
(5)
– Um ano de Política, pág. 18, Lisboa, 1919.
(6)
– Op. cit., págs. 18-20.
(7)
– Sidónio Pais assumiu a chefia de um movimento revolucionário
contra o governo democrático (5-XII-1917), que acabou por triunfar.
Deposto Bernardino Machado, Sidónio Pais tomou a chefia do País,
inaugurando então a «República Nova» com as características de
presidencialista.
Em 9 de Maio de 1918 realizou-se a
eleição presidencial, e Sidónio foi eleito por meio milhão de votos.
Os partidos políticos negaram-lhe o sufrágio.
Passaram, depois, a conspirar contra
ele. Malograda a tentativa do movimento de 15-VI-1918.
(8)
– Um ano de Política, págs. 84-86, Lisboa, 1919.
(9)
– Op. cit., págs. 145-147.
/ 39 /
(10)
– Op. cit., págs. 149-150.
(11)
– Op. cit., págs. 156-158.
(12)
– Op. cit., págs. 159-160.
(13)
– Op. cit., pág. 162.
(14)
– Quando embarcava, em Lisboa, na estação do Rossio, com destino ao
Porto, foi assassinado por um fanático, José Júlio da Costa, que
veio a morrer no manicómio.
(15)
– Op. cit., págs. 141-143.
(16)
– Op. cit., pág. 143.
(17)
– Op. cit., pág. 143.
(18)
– Op. cit., pág. 146-144.
(19)
– Op. cit., pág. 141.
(21)
– Op. cit., pág. 155.
(22)
– Op. cit., pág. 190.
(23)
– Op. cit., pág. 201.
(24)
– Op. cit., pág. 259.
(25)
– Op. cit.. pág. 385.
(26)
– Op. cit., pág. 398.
(27)
– Op. cit., pág. 407.
(28)
– Mao Tsetung quem disse: «O sistema socialista acabará por
substituir o sistema capitalista; essa é uma lei objectiva,
independente da vontade do homem. Por muito que os reaccionários
tentem impedir o avanço da roda da história, tarde ou cedo se fará e
conquistará inevitavelmente a vitória.» (Citações do Presidente Mao
Tsetung, págs. 25-26, Lisboa, 1974). A nota é nossa.
(29)
– Um Ano de Política, págs. 73-75, Lisboa, 1919.
(30)
– Já Aristófanes, na Assembleia das mulheres, punha as
seguintes palavras na boca de Proxágora (paródia do nome de
Pitágoras): «Direi, desde já, que todos os bens devem ser postos em
comum, e cada qual deve ter a sua parte, para viver. Não faz sentido
que um seja rico e outro miserável».
(31)
– Há quem não goste da expressão segundo a qual a escola deve
preparar a mocidade para as lutas da vida.
Acham a metáfora demasiadamente
belicosa, e quereriam, em vez de uma escola feita para a sociedade,
uma sociedade feita para a escola.
Divida-se a conta ao meio: que a
escola se faça para melhorar a vida social, e que esta se viva para
melhorar a escola. (A nota é nossa).
(32)
– Um Ano de Política, págs. 76-77, Lisboa, 1919.
(33)
– Um Ano de Política, pág. 78, Lisboa, 1919.
(34)
– O «leite da ternura humana», de que fala Shakespeare não é simples
metáfora. Ai da criança que o não «bebeu» a seu tempo!
(35)
– Citado em Madeleine Rambert, A mulher só e os seus problemas
afectivos, págs. 25-26, Lisboa (1971).
(36)
– A propósito, leia Manuel Breda Simões, em Espiral, n.º duplo 8-9,
pág. 25, Lisboa, 1965.
(37)
– Dr. Barbosa de Magalhães, Parlamentar e Político,
págs. 19-20, Aveiro, 1955.
(38)
– O Centrismo foi movimento político iniciado por Egas Moniz,
de acordo com os dissidentes do partido evolucionista que tinham
assento na Câmara, Vasconcelos e Sá, Limas Machado, Malva do Vale,
Tamagnini Barbosa, O Programa do Centrismo foi publicado em
20-X-1917. No Porto, a propaganda do Centrismo foi iniciada
oficialmente por uma conferência de Egas Moniz, no Ateneu, que deu
lugar a opostas manifestações ruidosas. Por sugestão de Sidónio
Pais, após a revolução de 5-XII-1917, o partido centrista viria a
ser dissolvido. Os seus elementos viriam a juntar-se aos sidonistas,
para formarem o Partido Nacional Republicano.
(39)
– Um Ano de Política, pág. 56, Lisboa, 1919.
(40)
– Op. cit., pág. 79.
(41)
– Op. cit., págs., 12-13.
(42)
– Op. cit., págs. 13-14. |