Em 21 de Maio de 1852, pela 1 hora
da tarde, entrava em Ovar Sua Alteza Real a Senhora Dona Maria II.
Descera da Ponte Nova para a Igreja
Matriz debaixo do pálio, acompanhada do seu numeroso séquito, clero,
nobreza, burgueses e a massa anónima do povo, que em grande número a
aclamava em delírio.
Como sempre, Ovar soube bem receber.
Consertaram-se as calçadas das ruas, caiaram-se as casas e correu-se
Seca e Meca para que nada faltasse a tão honrosa visita.
A Câmara viu-se em apuros e vai à
Vista Alegre comprar um serviço de louça fina por 26$500 réis; para
as roupas dos Vereadores adquiriu no Porto seis pares de meias de
seda, seis côvados e meio de gorgorão branco para os coletes e mais
longe não foi, porque não podia, pois alugou os chapéus de pluma
para os mesmos.
Vinte e quatro frangões, vinte
galinhas, peixe da Murtosa, morcelas de Arouca, 28 arráteis de
queijo, 13,5 de presunto cru, 6 presuntos de fiambre, cinco arráteis
de doce variado, 3 de doce de Aveiro e Pão de Ló de Ovar, num total
de 28 arráteis oferecidos pelas Prosódias, Caladas e Russos,
fabricantes vareiros desta ambrosia. Curioso que, passados 170 anos,
os sucessores de alguns destes pioneiros ainda continuam a fabricar
o nosso Pão de Ló.
Foi esta a ementa do banquete,
servido nos velhos Paços do Concelho, que Deus haja.
A Rainha muito apreciou a nossa
guloseima – o Pão de Ló – visto que até na doçura somos pródigos!
Poliram-se 18 castiçais, 10 salvas e
um jarro e bacia, tudo de fina prata.
Na Matriz, pomposamente ornamentada,
a Soberana assistiu a um solene Te-Deum cantado por 32 sacerdotes,
todos de Ovar, fazendo o elogio o celebrante da missa, Frei Luís
Santana Zagalo, nosso conterrâneo e pároco de Esmoriz. No coro, a
capela da nossa Música Velha, sob a regência do talentoso maestro
Valério. É de frisar que a Música Velha – A Banda Ovarense – conta
hoje cento e sessenta e dois anos.
Contratou-se a Banda de Infantaria
6, de Aveiro, por 12$000 réis e à Música Velha deram-se 5$000 réis.
Aos cabos de ordem, chefiados pelo
regedor António José da Silveira, deu-se pão e vinho.
As ruas por onde passou o séquito
real estavam juncadas de verdes, alçaram-se mastaréus e festões e
das janelas pendiam ricas colgaduras de bom damasco verde, azul e
vermelho e outras de brocado e matiz.
A Câmara gastou com isto tudo
2375$49,8 réis.
A soberana partiu no dia seguinte
para Aveiro, levando a mais viva saudade por este povo que tão
carinhosamente a recebeu.
O trajecto foi feito pela ria, em
oito barcos mercantéis, ornados em arco com festões e bandeiras. A
escolta da rainha foi feita sempre por 87 homens de artilharia e
cavalaria.
Daqui acompanharam o séquito os
vereadores em traje de gala, o vigário e as pessoas gradas da terra.
A gratidão da Rainha não se fez
tardar, extinguindo o julgado de Pereira Juzã e anexando a Ovar as
Freguesias de Pereira e Válega. Decreta ainda, e além de outros
benefícios, a criação da comarca de Ovar.
Com os benefícios concedidos Ovar
progrediu vertiginosamente e, mais tarde, com o alargamento do seu
concelho a Arada, Maceda, Cortegaça e Esmoriz, impôs-se
preponderantemente na balança e economia da Nação pela grandeza do
seu comércio e indústria.
É ainda uma das terras privilegiadas
pelas suas belezas naturais, pela índole do seu povo acolhedor,
hospitaleiro e franco.
Ovar, Junho de 1973. |