É perfeitamente natural que esta
sucessão nos comandos políticos da Acção Nacional Popular num
distrito tão importante e discutido como o nosso tenha suscitado
certa expectativa.
Com efeito, sai um jovem, cheio de
talento, de intuição política, de experiência mesmo, inexoravelmente
fadado para os mais altos voos da vida nacional, que a sua vocação
jornalística levou para a capital.
Em contra partida, entra uma figura
sem passado político, que apenas aos 40 anos se deixou resvalar na
perigosa e difícil vida pública, com a única percentagem de culpa de
não ter sabido dizer não.
O distrito não lucrou, pois, com a
troca.
É certo que o famoso Valéry Giscard
d'Estaing é de opinião que a vida pública deve começar somente aos
40 anos.
Não obstante, ele foi, muito antes
dessa idade, o mais jovem e um dos mais talentosos ministros das
Finanças que algum dia a França teve...
De modo que no verso e reverso que
as coisas deste mundo sempre têm algo poderei oferecer num cargo
que, tal como o anterior, nunca desejei e muito menos solicitei.
Afadigado com uma profissão cada vez
mais espinhosa e menosprezada, senti, porém, ter chegado a altura de
imitar o exemplo de sacrifício, ainda que modestamente e a anos luz
de distância, do Professor Marcelo Caetano, em cuja honestidade,
talento, firmeza e patriotismo confio lucidamente.
Afastados os naturais chefes
políticos do distrito e meus ilustres antecessores, Drs. Manuel
Homem Ferreira e Manuel José Homem de Melo, por motivos imperiosos
de saúde e das suas actividades, criou-se, deste modo, um perigoso
vácuo, que não poderei desde já preencher sem o seu conselho avisado
e o do excelente Governador Civil que temos a sorte de ter à frente
do nosso distrito.
Aos três, que devem ter fornecido 10
das 11 varas da camisa em que me vejo metido, não lhes guardo
ressentimento, antes lhes louvo o engenho em descobrirem em mim
qualidades que não existem e a confiança nelas depositada.
Conto também com o precioso auxílio
da Comissão Executiva e em especial com o do seu talentoso e
dinâmico Presidente, Sr. Dr. Cota Dias, que me honrou sobremaneira
com a sua presença, e com a das comissões locais, verdadeiras
células de toda a engrenagem.
Conto, finalmente, com a
benevolência dos meus Colegas, com a generosidade das populações e
com a leal colaboração dos Senhores Presidentes das Câmaras e demais
autoridades.
E acima de tudo espero a ajuda de
Deus e o apoio moral de minha Mulher – a principal vítima desta nova
etapa da minha vida, sem esquecer a compreensão dos amigos de todos
os quadrantes, os mais diversos, que me orgulho de possuir, nem
aqueles convictos e honestos oposicionistas para quem a Pátria não é
palavra vã, e os imprescindíveis e operosos órgãos da informação,
que saúdo respeitosamente.
Com tudo isso conto, e não é pouco.
Mas o que poderei dar em troca?
Total devoção à causa que
defendemos, leal mas consciente colaboração com o governo,
magistralmente chefiado por Marcelo Caetano, com as comissões
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hierarquicamente situadas acima e abaixo e com as autoridades.
E bem precisamos todos desse dar e
receber generoso, leal e consciente.
Como já tive ocasião de salientar
publicamente, atravessamos a mais grave crise nacional e
internacional de todos os tempos.
Por um lado, nunca a nossa
sobrevivência como Nação livre e independente esteve tão ameaça da
mercê duma guerra que nos foi movida em todas as frentes, sem
excluir lastimáveis e repelentes traições no próprio Continente.
Por outro, uma explosão demográfica
mundial vertiginosa face a uma limitação de recursos por demais
evidente.
Toda a nossa política, portanto,
há-de estar centrada nestes dois pontos coincidentes e fundamentais:
a sobrevivência da Pátria e a das próprias populações.
Daí que a arte de governar os povos
nunca tenha tido tão premente necessidade da conjugação da ciência
com as humanidades, em que uma multiplique as potencialidades de
satisfação das carências e as outras dulcifiquem as arestas rígidas
da técnica e dignifiquem a pessoa, evitando que se perca na voragem
dos números e na alucinação fria dos computadores.
O Homem deverá continuar a ser, e
cada vez mais, o centro motor de toda a vida social e o seu
beneficiário – trabalho difícil neste plano perigosamente inclinado
do progresso técnico sem o paralelo progresso moral.
É que o homem inventou máquinas para
tudo, menos para o seu aperfeiçoamento ético.
Daí que se assistam a fenómenos de
macro e microcefalia verdadeiramente confrangedores.
Certos homens ou grupos, incapazes
de viverem dignamente, constroem hábeis e sedutoras teorias
sócio-políticas e morais, em que os seus vícios pessoais são
proclamados como regras de conduta.
Se têm tendência para o latrocínio
ou para o incumprimento das suas obrigações, preconizam a abolição
da propriedade privada, mas depois serão os primeiros a defraudar a
colectiva.
Se têm tendência para o erotismo
desregrado, abatem o casamento e a família ao efectivo das
instituições veneráveis, mas é a esta que acabam por se acolher.
Se incapazes de trabalhar com método
e garra, idolatrizam a anarquia e combatem a autoridade, mas são
exigentes no gozo das comodidades resultantes do trabalho.
Se não conseguem dialogar e
convencer, veneram o expedito e fácil despotismo, mas pedem
compreensão e tolerância na hora da queda.
Se não têm fé, ridicularizam e
perseguem a Igreja, a cujo seio tantas vezes tardiamente se
entregam.
Portanto, a crise está em que os
homens perderam o sentido do respeito pela Lei e pela Moral,
resvalando para um existencialismo negativo e egocêntrico, que se
choca permanentemente com o dos outros, sem repararem que até no
aspecto puramente materialista há vantagem na disciplina, na
obediência à Lei, no respeito pela Moral, na medida em que, ao
confinarmo-nos dentro dos limites dos nossos direitos estamos a
fazê-los respeitar e a motivar que não sejam perturbados.
Assim é que, em 20 séculos de
Cristianismo, por culpa exclusiva dos homens, que não dos
princípios, ainda não conseguimos construir uma sociedade
verdadeiramente cristã.
A própria Juventude, em especial a
intelectualmente mais válida, se debate numa angustiosa perturbação,
mais por culpa dos pais, que perderam a tradicional e indispensável
autoridade com os seus detestáveis exemplos, do que por efeito da
sua generosa combatividade.
Mas será definitivo este panorama
carregado de trevas?
Tenho fundadas esperanças de que
não.
É para mim ponto assente que ele se
insere numa das muitas crises cíclicas da história da Humanidade.
Com a diferença preocupante de que
nunca teve tal acuidade, não só face à impressionante e irreversível
explosão demográfica como aos temíveis meios de destruição postos à
disposição dos homens.
Há, pois, todo um trabalho de
Reforma de Mentalidades numa linha de conduta política em que o
social e o respeito pelos direitos fundamentais da pessoa humana
sejam o indicativo.
Num mundo limitado em que a
população cresce em progressão geométrica e as disponibilidades em
progressão aritmética, a distribuição da riqueza carece de novas
regras de maior equidade, sem esquecer que a iniciativa privada é um
poderoso elemento incentivador do aumento da própria riqueza.
Ora uma sociedade bem estruturada em
ordem a uma tal finalidade terá que assentar no primado da Lei e da
Moral. /
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Daí a necessidade cada vez maior de
dignificar o Poder Judicial e o Ensino, de acatar a Autoridade e de
respeitar a Igreja.
Daí a necessidade também de
incrementar a Tecnocracia, mas humanizando-a com o Poder Político.
Daí, consequentemente, a utilidade
instante da nossa actuação pessoal e associativa, movendo guerra
aberta à intolerância, ao preconceito acéfalo, ao egoísmo, à
prepotência, à corrupção, ao analfabetismo, à doença, à fome, à
burocracite e principalmente a um mal endémico de todas as
ideologias políticas: aos oportunistas sem credo, que flutuam sempre
ao sabor dos seus interesses.
E sobretudo teremos que dar conteúdo
prático à teoria política, mentalizar as massas para uma
participação efectiva na gestão dos interesses nacionais,
consciencializar o País da gesta que vivemos no Ultramar, empenhar a
Juventude intelectual na reconstrução material e espiritual da
Pátria, dar sentido, força e dignidade à associação cívica que
servimos.
Ter-se-á promovido verdadeira
União Nacional para, subsequentemente, podermos fazer eficiente
Acção Nacional Popular?
Eis a dúvida que carece de ser
desfeita com acções válidas, dentro dum clima de perfeita
estruturação de métodos de trabalho, de independência de opinião, de
disciplina de execução, numa harmonia sinfónica que é dada
simultaneamente pela Diversidade e pela Unidade.
Alguém disse que do passado devemos
aproveitar as chamas e abandonar as cinzas.
Eu diria antes que do passado é
imperioso aproveitar a chama e respeitar as cinzas, que deram origem
àquela, para honra e glória de Portugal Eterno! |