A divisão administrativa é o
sistema segundo o qual se cinde o território do Estado em
fracções, em ordem a instituir-se em cada uma órgãos próprios da
Administração.
A cada uma das fracções do
território assim dividido chama-se CIRCUNSCRIÇÃO ADMINISTRATIVA.
As circunscrições administrativas
nalguns casos servem de base a uma autarquia, ou delimitam a
competência de um órgão local de administração geral, podendo a
mesma circunscrição desempenhar ambos os papéis.
Existem várias divisões do
território; o próprio Código Administrativo, independentemente da
divisão administrativa autárquica, de que nos vamos ocupar, insere
outras divisões: Para efeito do serviço de incêndios está o País
dividido em duas Zonas. Zona Norte (abrangendo os distritos de
Viana do Castelo, Braga, Bragança, Vila Real, Porto, A veiro,
Viseu, Guarda e Coimbra) e Zona Sul – (Distritos de Castelo
Branco, Leiria, Santarém, Lisboa, Setúbal, Portalegre, Évora, Beja
e Faro).
Também a área de jurisdição das
Auditorias Administrativas (alterada pelo artigo 5.º do
Decreto-Lei n.º 30571, de 14 de Outubro de 1941) nos dá outra
forma de divisão territorial.
Além da divisão fundamental, há
outras para fins especiais: divisão administrativa militar, a
marítima, a industrial, a agrícola, a florestal, a hidráulica,
etc.
Outra divisão ainda e mais recente
se vai enraizando lentamente; referimo-nos às Regiões de Turismo,
criadas para resolução dos problemas turísticos, em termo que,
transcendendo os interesses estritamente locais, não alcançam
todavia o plano nacional.
Interessa-nos, principalmente, a
divisão administrativa fundamental, isto é, aquela que dá origem
às autarquias locais.
Segundo determina o artigo 1.º do
Código Administrativo, o território do continente divide-se em
CONCELHOS que se formam de FREGUESIAS e se agrupam em
DISTRITOS.
Concelho, freguesia e distrito são
AUTARQUIAS
(1), «pessoas colectivas de
direito público, constituídas pelo agregado de cidadãos,
residentes em certa circunscrição do território do Estado, cujos
interesses comuns são prosseguidos por órgãos próprios, dotados de
autonomia dentro dos limites da Lei
(2)».
Convém não confundir a
circunscrição – simples parcela do território, «elemento espacial
da autarquia» com
/ 44 / a
própria autarquia – comunidade de indivíduos com seus interesses e
seus órgãos, formando uma pessoa colectiva.
Há uma nítida diferença entre
circunscrição administrativa e autarquia, embora ambas tenham um
elemento comum: a parcela de território. Mais: a autarquia tem a
individualizá-la os órgãos próprios para a prossecução dos
interesses comuns; a circunscrição administrativa simples, não tem
mais do que o elemento espacial.
A cidade de Aveiro, como um Bairro
Administrativo são circunscrições simples, que não autárquicas
pois faltam-lhes os órgãos próprios.
O artigo 13.º do Código, citado,
define a autarquia concelho: é o agregado de pessoas residentes na
circunscrição municipal, com interesses comuns prosseguidos por
órgãos próprios. Igualmente, o artigo 196.º preceitua que a
autarquia freguesia é o agregado de famílias que, dentro do
território municipal desenvolve uma acção social comum por
intermédio de órgãos próprios. Quanto à autarquia distrito, na
redacção actual do Código Administrativo, não se encontra qualquer
definição. O art.º 284.º limita-se tão-somente a conferir-lhe a
qualidade de pessoa moral de direito público, que, também, o mesmo
Diploma consigna relativamente às demais autarquias, não obstante,
quanto a estas, inserir a definição.
O mesmo artigo, o 284.º, antes da
alteração que lhe foi introduzida pelo Decreto-Lei n.º 42 536, de
28 de Setembro de 1959, preceituava: PROVÍNCIA é a associação de
concelhos com afinidades geográficas, económicas e sociais,
dotados de órgãos próprios para o prosseguimento de interesses
comuns.
Do confronto da redacção anterior
com a actual, do preceito citado, parece concluir-se ter havido a
intenção de não fazer a adaptação da definição de província ao
distrito. Este, como aquela, é formado por concelhos, também
agora, como então, com certas afinidades geográficas, económicas e
sociais.
O Código Administrativo refere-se
à criação de novos concelhos e freguesias, enumerando as condições
a observar para o efeito. É, porém, omisso no que respeita à
criação de novos distritos, como já o era, anteriormente, quanto à
criação de novas províncias.
Não deriva, daqui, porém, que
esteja vedada a criação de novos distritos. É certo que a
respectiva criação tem de ser encarada com cuidada ponderação,
atendendo além do mais, aos pesados encargos que para o Estado
representa a manutenção dos serviços distritais: governo civil,
direcção de finanças, direcção de urbanização, direcção escolar,
delegação de saúde, etc.
Por outro lado, sendo hoje os
distritos uma realidade política e administrativa, e tendo-se
criado certas afinidades entre os concelhos que os constituem, com
as respectivas sedes a servir de ponto de convergência, é muito
melindroso o problema. Por este motivo é que data de há mais de um
século a criação do último Distrito (Setúbal).
A carta de lei de 25 de Abril de
1835 é o primeiro documento legislativo que fala da circunscrição
administrativa do Distrito.
Aí se diz:
«Haverá no Reino até dezassete
Distritos Administrativos.
/ 45 / Cada
distrito será administrado por um Magistrado de Nomeação n.º 23,
competiam às Juntas de Distrito Electiva que terá as mesmas
atribuições que, pelo Decreto de 16 de Maio de 1832, n.º 23,
competiam às juntas de Províncias. Os Distritos Administrativos
serão divididos em concelhos...».
O referido Decreto n.º 23, de 16
de Maio de 1832, – célebre diploma que motivou renhida discussão
em volta da divisão territorial que Mousinho da Silveira imaginara
–, não fala no distrito, mas coloca à frente de toda a
Administração Provincial o Prefeito, que é o Delegado de
Autoridade do Rei e para quanto é do bem estar e comodidade dos
Povos... etc., e, nestes mesmos termos, aproximadamente, se
referem os Códigos posteriores, do Governador Civil do Distrito
(3).
«No período, já centenário, de
duração da divisão distrital podem-se assinalar as seguintes
fases:
A 1.ª fase vai desde a sua criação
até 1878: o distrito tem um órgão administrativo (a junta geral)
que a partir de 1840 passou a ser eleito pelas câmaras e conselhos
municipais. A junta não era um órgão autárquico, tanto mais que
estava reservada ao governador civil a execução das suas
deliberações e que este presidia ao Conselho de Distrito, órgão
permanente de tutela e do contencioso. A posição do governador
civil era, pois, preponderante e, senão de direito, pelo menos de
facto, o distrito é simples circunscrição de administração do
Estado.
Inicia-se a 2.ª fase com o Código
de 1878. As juntas gerais recebem numerosas e importantes
atribuições de fomento e assistência, meios financeiros para as
exercer, a faculdade de executar as suas deliberações mediante
comissões executivas permanentes, por elas eleitas e independentes
do governador civil e do Conselho do Distrito. O distrito passa,
pois, a ser, de direito e de facto, autarquia local, e como tal se
mantém no Código de 1886.
A 3.ª fase vai de 1892 a 1913. O
distrito deixa de ter personalidade jurídica, desaparecem as
juntas gerais e ficam apenas existindo comissões distritais junto
do governador civil, que é a única autoridade na circunscrição e o
único representante dos respectivos interesses.
Uma 4.ª fase vai de 1913 a 1937,
em que o distrito volta a ser autarquia local, como na 2.ª fase.
Nos termos da Constituição de
1933, a Lei n.º 1940, base XXI, e o Código de 1936 consagraram o
regime da 3.ª fase, mais acentuado, reduzindo o distrito a círculo
de administração geral despido de todo o carácter autárquico.
Pela reforma sofrida pelo Código
Administrativo em 1959 (Decreto-Lei n.º 42 536, de 26 de Setembro)
inicia-se a 6.ª fase, de regime semelhante às 2.ª e 4.ª.
A administração distrital tem
oscilado entre os dois sistemas:
/ 46 /
– a administração de interesses
gerais entregue a um magistrado, delegado do Governo, aconselhado e
assistido, ou não, por uma comissão local (1835 a 1878),1892 a 1913,
1937 a 1959);
– a administração de interesses
gerais, a cargo do governador civil, de par com a administração de
interesses distritais sob a forma autárquica por meio de um órgão
próprio e eleito, dotado dos poderes de deliberação e execução (1878
a 1892,1913 a 1937 e desde 1960)».
É sabido que a divisão
administrativa do Estado é uma criação do legislador. Para Orlando
(4) as circunscrições territoriais apresentam-se com
carácter natural, quando encaradas sob o ponto de vista abstracto e
são uma criação artificial sob o ponto de vista do direito positivo.
Afirma o mesmo Administrativista «que os acidentes geográficos
determinam nos habitantes diversidade de usos, de desenvolvimento
intelectual, moral e económico e outros caracteres próprios que
provocam uma autonomia natural. É o ponto de vista abstracto. Sob o
ponto de vista do direito positivo, não sofre dúvida que as
circunscrições territoriais devem a sua existência jurídica ao
reconhecimento por parte do Estado; mas a questão do fundamento
natural deve guiar o legislador. Neste sentido, Orlando considera
excelentes as circunscrições que se harmonizam inteiramente com as
condições naturais e históricas do território do Estado e péssimas
as que prescindem destes elementos»
(5).
Comentando aquela opinião, o Ex.mo
Sr. Dr. António Pedrosa Pires de Lima, diz o seguinte: «Supomos que
a questão deve pôr-se com mais realidade nos seguintes termos: As
circunscrições territoriais são criadas pelo legislador. Mas o
legislador não cria arbitrariamente. As leis não se impõem apenas
pela ameaça de sanções, mas também em consciência. O Estado, sob
pena de se trair a si próprio, tem de considerar os factores
naturais, que se lhe impõe, como a qualquer outra entidade. Assim,
quando divide o território em circunscrições, não pode o Estado
abstrair dos factores naturais que, sem dúvida, imprimem certo
carácter. Mas ao Estado compete conjugar estes factores, mais ou
menos imprecisos, com as conveniências da administração, que devem
prevalecer sobre considerações de qualquer outra ordem.
É necessário não perder de vista que
a divisão administrativa – aquela que interessa a este estudo – se
destina a conceder autonomia às fracções do território e que, para
gozo dessa autonomia administrativa, não basta ter em vista factores
naturais; impõe-se também, e antes de tudo, que as circunscrições
tenham capacidade económica e administrativa, para que os seus
órgãos próprios possam desempenhar-se das funções que a lei lhes
atribui e que são – insistimos – a sua razão de ser. Por outro lado,
não admitimos que a diversidade dos factores geográficos implique
necessariamente diversidade e usos, de desenvolvimento intelectual,
moral e económico e, menos ainda, que essa diversidade, por mais
evidente que
/ 47 / seja,
dê origem, só por si, à capacidade económica e administrativa
necessária à autarquia. O que é natural não se altera facilmente; ao
passo que as condições económicas e administrativas, de que depende,
principalmente, a concessão da autonomia, embora recebam influência
dos factores naturais, dependem também das circunstâncias gerais, de
outros factores, estranhos ao meio local, e encontram-se, por isso,
sujeitas a evolução que nem sempre é lenta. Como observa o Prof.
Marcello Caetano «o homem não é produto fatal do meio geográfico:
reage, por milagre da sua razão, sobre ele, adapta-se, transforma e
modifica as condições naturais», o que faz com que «a economia tome
o passo à geografia», o mesmo sucedendo com os laços sociais e
espirituais». Já se vê, pois, que não podemos concordar que a
excelência da divisão administrativa consista na sua harmonia
perfeita com as condições naturais e históricas do território. Se a
existência das circunscrições administrativas não se funda apenas,
nem mesmo principalmente, em factores naturais, importa concluir que
as respectivas populações não podem arrogar-se o direito da sua
existência.
Só ao Estado pertence apreciar os
factores que influem na divisão administrativa e decidir sobre a
criação, alteração ou extinção das autarquias locais».
(6)
Justificam-se, assim, as mutações
operadas quanto ao distrito, filho legítimo da Tradição Portuguesa
ou de origem espúria.
No Parecer sobre o projecto de lei
n.º 73, que autorizava o Governo a publicar um Código
Administrativo, consta, com referência ao distrito: «Já sabemos que
o distrito perdeu, por força da Constituição, a categoria de
Autarquia local, para conservar, apenas, a sua natureza de
circunscrição administrativa, não autárquica. A seu respeito,
limita-se a proposta (base XII) a dizer que «em cada distrito haverá
um Magistrado Administrativo, imediato representante do Governo, com
a designação de Governador. A proposta, mantendo à frente do
distrito um Magistrado Administrativo e dando-lhe o nome de
Governador Civil, conservou-se fiel à tradição, quer da Monarquia
quer da República».
A coexistência das duas divisões
administrativas – Província e Distrito – não foi recebida
pacificamente por todos.
Já no citado parecer da Câmara
Corporativa se insinuava ao tratar-se da Província: «Grave seria
para esta Câmara condenar a sua existência como grave seria ainda
condenar a morte do Distrito como autarquia».
A Revista de Administração Pública
emitiu a autorizada opinião do seu Director sobre o assunto, nos
seguintes termos: «Quanto a nós, se mantemos com sincera convicção o
critério de que não devem coexistir as duas divisões, não hesitamos
também em afirmar que não quebramos hoje lanças por uma ou por
outra». Preferem-se os distritos? Tudo se passará mais ou menos como
dantes.
Continuariam a existir os Governos
Civis, tendo a seu lado um corpo colectivo
/ 48 /
distrital – como é da tradição portuguesa – e, naturalmente, em
pouco ou nada se alteraria o seu número.
E todos – ou quase todos – ficariam
contentes.
Preferem-se as Províncias?
«Nada nos repugna aceitar hoje uma
divisão administrativa em que as suas circunscrições de grau
superior abranjam uma área territorial de maior extensão».
Ao Professor Doutor Marcello
Caetano, mereceu a nova divisão administrativa o comentário
seguinte:
«A situação resultante do Código
Administrativo não nos parece que seja a do distrito agonizante a
assistir às auroras provinciais.
O que existia até aqui era uma
circunscrição distrital onde o Governador Civil tudo mandava e a
junta geral nada fazia (salvo raras excepções).
Agora deixou-se no distrito o
Governador Civil e reduziu-se o número das juntas gerais,
modificando-se a organização destas e alterando-se a sua função, de
modo a torná-las órgãos coordenadores da acção municipal.
O distrito guardou a sua
importância.
A província é convidada a prestar as
suas provas. Saberá dá-las?».
(7)
A resposta consta da Acta da Câmara
Corporativa, a seguir transcrita. (Parecer N.º 10/VII, de 10 de
Abril de 1959).
«Tendo-se criado, quanto à
instauração da província como circunscrição administrativa e como
autarquia, um paralelismo de opiniões e de sentimentos entre as duas
correntes do pensamento político nacional mais divergentes, não é de
estranhar que cedo se inscrevesse no programa de realizações
administrativas do Estado Novo o regresso à divisão provincial. Se,
na verdade, o ideário republicano histórico fazia parte a volta à
província, o Integralismo não reivindicava menos um retorno às
circunscrições e autarquias provinciais, dotadas de ampla autonomia.
Logo em 1930, por portaria de 17 de
Outubro, o Governo nomeia uma comissão encarregada de proceder à
remodelação provincial do País, de que saiu um projecto de divisão
do território do continente em onze províncias. E em 1933,
finalmente, a província ascende ao plano da Constituição, dispondo o
seu art.º 125.º que «o território do continente divide-se em
concelhos, que se formam de freguesias e se agrupam em distritos e
províncias, estabelecendo a lei os limites de todas as
circunscrições». O artigo seguinte, em que se prescreve que «os
corpos administrativos são as câmaras municipais, as juntas de
freguesia e as juntas de província» (conselhos de província, no
texto primitivo) deixou perceber que, enquanto a província passava a
ser uma autarquia local, o distrito seria, daí em diante (ou logo
que se legislasse sobre a organização administrativa local), uma
simples circunscrição administrativa, tendo à sua frente, para
efeitos de administração geral, uma autoridade delegada do Poder
Central.
Quando se votaram as bases a que se
subordinaria o Código Administrativo a publicar e se elaborou este
diploma, não deixou naturalmente de se respeitar o preceituado na
Constituição,
/ 49 / aí
surgindo a província como autarquia local e o distrito como mera
circunscrição da administração comum do Estado, tendo à frente um
magistrado administrativo, imediato representante do Governo, com a
designação de Governador Civil.
Não tardou que se suscitasse
polémica sobre os méritos relativos do distrito e da província (e,
consequentemente, sobre os méritos dos respectivos corpos
administrativos). Polémica acesa, em que entraram as armas do
sentimento (quando não do ressentimento daqueles que não viram a
cidade capital do seu distrito tornada capital de província...), as
da história e da erudição e, finalmente, as da geografia humana e
suas ciências auxiliares. O sentimentalismo repartiu-se pelos dois
campos. A geografia humana e as ciências suas auxiliares estiveram
especialmente ao lado dos defensores da província, evidenciando –
dizia-se – que a divisão provincial oferece, muito melhor que a
divisão em distritos, satisfação às exigências, aspirações e
necessidades das populações, dada a pretendida concorrência dessa
divisão com as condições fisiográficas, sociais e económicas do
País, entrando em linha de conta com as afinidades naturais as
indicações antropogeográficas, os interesses da produção e da troca,
as relações tradicionais, a facilidade das comunicações, o valor
económico das regiões, o interesse geral, em suma. É justo
mencionar-se aqui o nome de um grande paladino da divisão
provincial, que argumentou no plano da geografia humana: O Prof.
Doutor Amorim Girão.
O período de experiência que vai
decorrido desde 1937, em que se deu efectivação, pela entrada em
vigor do Código Administrativo, ao pensamento constitucional quanto
à instauração da nova autarquia, não provou francamente a favor
dela.
Não se nega que as províncias
instituídas com a Constituição e o novo Código Administrativo
correspondam às grandes unidades regionais do território português
continental; noutras palavras, não se nega que se tenha dado assim
consagração legal à província-região, entendendo por região uma
unidade territorial definida por características geográficas,
geomanas e geoeconómicas diferenciadas.
Simplesmente, estas regiões não
possuem hoje, ao contrário do que se imaginou, interesses comuns, no
plano económico, cultural e de assistência, que possam explicar a
sua personalização e a consequente atribuição de uma orgânica
adequada à prossecução de tais interesses em bases autonómicas. A
região, em suma, não tem de ter, necessariamente, uma expressão
administrativa, embora seja de facto uma realidade.
Os interesses económicos regionais
não têm praticamente relevância no plano da administração comum
descentralizada – e a prova está em que as juntas de província nunca
exerceram ou só exerceram muito discretamente, as suas atribuições e
competência legais em matéria de fomento e coordenação económica.
Sem dados seguros e completos sobre
o seu activo no domínio das suas finalidades culturais, presumimos
que a sua actuação em tal sector foi, no
/ 50 / geral,
também muito modesta: não há portanto, parece, verdadeiros
interesses provinciais comuns, no sector cultural, pelo menos que
tenham de ser geridos no plano da administração local autárquica.
Quanto finalmente, às atribuições de
assistência, a legislação posterior no Código Administrativo pôs os
respectivos problemas em planos tão diferentes e deu-lhes soluções
tão afastadas da competência das juntas de província (no que se não
deixou, certamente, de ter em conta a, em geral, deficiente e
ineficaz acção destes órgãos da administração provincial nesse
domínio) que não pode hoje pretender-se que a acção assistencial
tenha uma base regional expressa em entes autárquicos deste tipo.
Assim como não tem sentido, no plano da administração comum, um
regionalismo económico e cultural, também deixou de o ter, se já o
tivera, um regionalismo assistencial, uma ou outra junta de
província se distingue nunca foi mais do que a consequência de
substanciais contribuições do Estado ou de beneméritos particulares.
Bem se pode concluir, com o Prof. M.
Caetano (Manual, 4.ª edição, p. 404) que «a autarquia provincial,
nos moldes em que foi instituída, é simples homenagem a um
regionalismo ineficiente».
Se tem de haver uma autarquia local
de grau superior ao concelho, que exprima a solidariedade e
cooperação dos municípios na realização de interesses comuns dos
povos de uma área mais extensa que a circunscrição municipal, parece
que essa autarquia só pode ser hoje o distrito, por muito verdade
que seja ter este surgido entre nós como uma instituição artificial
e importada.
O distrito, não obstante ter
subsistido desde 1937 como simples circunscrição administrativa,
mantém-se como verdadeira comunidade de interesses, de
conveniências, de afinidades e de sentimentos das populações e dos
municípios, como realidade mais ou menos viva que – parece – não
deve desprezar-se. Corno se disse numa das declarações de voto ao
parecer sobre o projecto de Querubim Guimarães (D. S., n.º 187, de
21-4-1938), a divisão provincial, longe de haver melhorado a
administração local, veio complicá-la e torná-la mais dispendiosa e
menos eficiente. A divisão distrital está mais de harmonia com as
realidades.
Como corpo administrativo do
distrito prevê a proposta ao órgão a que se dá a designação de junta
distrital, em vez de junta geral, como tradicionalmente foi
conhecida. A questão é irrelevante e não custa por isso concordar
com a denominação proposta.
Em hora a província não tenha
tradição entre nós como circunscrição administrativa e como
autarquia local, o certo é que, mais ou menos oficial, houve desde
cedo uma nomenclatura geográfica para as regiões do País a que os
coreógrafos portugueses desde os fins do séc. XVI, passaram a chamar
«províncias». Estas são, portanto, verdadeiras realidades
geográficas e históricas. Já por exemplo em tempos de D. Dinis se
falava em Antre Tejo e Odiana, Estremadura, Antre Douro e Mondego,
Beira, Trallos Montes, etc. No início do constitucionalismo as
províncias em que o País se considerava dividido eram cinco, além do
reino do Algarve». |